quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Fernanda Magnotta* -Falar sobre direita radical tornou-se imperativo para Lula e Biden

 

O Estado de S. Paulo.

Lula e Biden encontram-se pessoalmente amanhã. Trata-se de uma das reuniões mais esperadas dos últimos tempos – e não apenas pelos motivos corriqueiros, típicos das visitas diplomáticas. Sabemos que os Estados Unidos são parceiro prioritário para o Brasil e as relações bilaterais, por si só, são importantes em múltiplas dimensões. Apesar disso, em 2023, o aperto de mão entre os líderes pode selar, ao menos do ponto de vista simbólico, um compromisso diferente. Lula e Biden buscam, no campo internacional, meios para fortalecer a cruzada doméstica que travam contra a direita radical.

É claro haverá espaço para o diálogo que envolve interesses nacionais dos dois países. Temas como dinamização do comércio, ampliação de investimentos, cooperação em defesa e segurança, além de proteção da Amazônia, certamente estarão na pauta das reuniões.

Maria Hermínia Tavares* - Isolar os radicais para desradicalizar a política

Folha de S. Paulo

Direita radical representa algo como 1/4 do eleitorado

A imensa maioria dos ricos e muito ricos certamente votou em Bolsonaro nos dois turnos. Muitos deles, decerto, terão desejado que, vitorioso, Lula não conseguisse tomar posse. É provável que alguns tenham ajudado de diferentes formas a invasão golpista de 8/1. É de esperar que as investigações em curso os identifiquem. Mas é irrealista imaginar que seja obra exclusiva deles a fracassada tentativa de negar pela força a vontade das urnas. Muito menos supor que a direita neles se esgote.

A força dos populismos de ultradireita que prosperam mundo afora –assim como a de seus antecessores do nazifascismo– vem do fato de serem policlassistas, ou seja, recrutam adeptos em diferentes estratos da sociedade e, sobretudo, mostram-se capazes de atrair a simpatia de contingentes consideráveis das camadas populares. Daí por que constituem alternativa eleitoral viável; nessa medida, quando a disputa é polarizada, acabam conquistando o voto dos mais moderados.

Vinicius Torres Freire - EUA cuidam da sua indústria

Folha de S. Paulo

País aprovou planos enormes de incentivo à economia verde. E o Brasil com isso?

No ano passado, os EUA aprovaram duas grandes leis de incentivo à indústria nacional, à pesquisa e à formação de mão de obra qualificada. Trata-se da "CHIPS e Ciência" e da lei de Redução de Inflação ("IRA", nome fantasia, pois o pacotão trata de outra coisa).

Entre outros estímulos do governo, a lei prevê despesas ou descontos de impostos de US$ 280 bilhões (em cinco anos) para estimular a produção de semicondutores ("chips") e pesquisa em energia, física nuclear etc.; de pelo menos US$ 400 bilhões (em dez anos) para financiar indústrias e iniciativas de energia limpa.

No caso do pacote verde, como muito incentivo tributário não é limitado, a dinheiro pode chegar a US$ 800 bilhões, na estimativa do Credit Suisse (o total depende da quantidade de investimento e do consumo "verdes").

Luiz Carlos Azedo - Debates sobre juros e BC mudam o foco da política

Correio Braziliense

Criticado pela forma e oportunidade das declarações, Lula manteve sua posição em reunião com presidentes de partidos e líderes da bancada, ontem, no Palácio do Planalto

Um mês após a tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro, cujos responsáveis estão sendo investigados, a polêmica sobre os juros altos e a atuação do presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, mudaram o foco do debate político da questão democrática para a economia, principalmente a retomada do crescimento e a questão social. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que contava com a irrestrita solidariedade do mundo político, dos agentes econômicos e da mídia, em decorrência dos atos antidemocráticos, passou a sofrer fortes críticas em razão das suas declarações contra Campos Neto e a taxa Selic 13,75%.

Criticado pela forma e oportunidade das declarações, Lula manteve sua posição em reunião com presidentes de partidos e líderes da bancada, ontem, no Palácio do Planalto. Entretanto, a oposição no Congresso passou à ofensiva. A independência do BC não está em questão, segundo o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, mas a política de juros realmente passou a ser a grande preocupação do presidente. A situação da economia é um flanco aberto para a oposição bolsonarista e moderada.

Ricardo Rangel* - É melhor o presidente descer do palanque

O Globo

Atitude beligerante de Lula só agrada à base petista e irrita aqueles de quem depende o sucesso de seu governo

O golpe falhou, o país se uniu, e Bolsonaro se isolou. Centenas de golpistas foram presos, novas manifestações golpistas fracassaram, o comandante do Exército foi substituído.

Ufa, a democracia sobreviveu.

Mas quem acha que ela está segura deve pensar melhor. O antipetismo segue fortíssimo, Lula tem baixa popularidade e pouco apoio num Congresso fortemente de direita. O panorama econômico é preocupante. Os algoritmos das redes sociais favorecem fake news, e ninguém os compreende melhor que os bolsonaristas; a maior parte do governo é digitalmente iletrada (o presidente nem tem celular). As legiões bolsonaristas permanecem mobilizadas, agressivas e desleais. O Exército, cuja tradição golpista é centenária, segue num patamar de radicalização e indisciplina que não se vê desde 1964.

Malu Gaspar - Um cercadinho para Lula

O Globo

Lula se bolsonarizou? A insólita pergunta e suas variações vêm sendo ouvidas nos gabinetes do Congresso Nacional e nas salas de reunião da Faria Lima nos últimos dias. Antes que comece a grita da falsa simetria: é claro que não estão falando de golpismo nem de nenhuma aberração antidemocrática.

Bolsonarizar, na linguagem usada por esse pessoal, é uma alusão à estratégia do ex-presidente da República de, não podendo fazer o que quer em razão de alguma barreira institucional, partir para o ataque contra a autoridade que atravessa seu caminho.

Foi o que Jair Bolsonaro fez várias vezes, como quando atirou contra três presidentes da Petrobras, que não baixavam o preço dos combustíveis como ele queria, ou contra o presidente da Anvisa, que não aprovava o uso da cloroquina para o tratamento da Covid-19.

Bruno Boghossian - Lula joga o BC na oposição

Folha de S. Paulo

Presidente convoca aliança para ampliar pressão sobre órgão e manter agenda econômica

Lula convocou o mundo político para a briga com a cúpula do Banco Central. Em reunião com partidos aliados, o petista argumentou que o presidente e o Congresso foram eleitos pelo povo e, por isso, não precisam "pedir licença" para escolher a política econômica que vai ser implementada pelo governo.

No encontro, pipocaram críticas à taxa de juros estabelecida pelo banco sob o comando de Roberto Campos Neto. A ideia de Lula era fazer um apelo ao espírito de corpo da classe política e firmar um compromisso a favor de uma agenda econômica que estimule o crescimento.

Maria Cristina Fernandes - Êxitos pós 8/1 turvam visão de Lula sobre BC

Valor Econômico

Lula não pode trocar o comandante do BC como quem troca o comandante do Exército

Aos 77 anos, depois de amargar 580 dias numa prisão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ganhou uma eleição e, há um mês, venceu uma guerra. Agora acredita que pode trocar o presidente do Banco Central da mesma forma que substituiu o comandante do Exército. Os cartuchos hoje lhe sobram mas, desperdiçados, podem lhe faltar.

Nenhuma outra liderança teria conquistado as duas vitórias. Já tem um lugar na história a visão estratégica de Lula de recusar a decretação da operação de Garantia da Lei e da Ordem com a qual se pretendia limpar o passivo da adesão militar ao bolsonarismo e manter as Forças Armadas no eixo do poder.

Some-se à primazia, a chance de conquistar a opinião pública mundial como o líder que salvou a maior reserva indígena do país. Para completar, o capitalismo tupiniquim tipo exportação mostrou, no caso das Americanas, que a ação predatória não é uma prerrogativa do Estado e embaralhou o jogo ideológico do bolsonarismo.

Cristiano Romero - Constituição é fonte de instabilidade na economia

Valor Econômico

Temas econômicos da Carta Magna são alvos constantes de emendas

Perto de completar 35 anos de existência, a Constituição brasileira, a lei fundamental do país, já passou por 128 mudanças. Considerando-se emendas referentes à assinatura de acordos internacionais, o número de mudanças alcança 140. Todavia, levando-se em conta as alterações do conteúdo promulgado em 5 de outubro de 1988, foram aprovadas em média.

Na última legislatura (2018-2022), o ativismo por mudanças na Carta Magna acelerou - aprovaram-se 29 emendas, das quais, 14 apenas no ano passado, recorde para o período de 12 meses. A explicação para tantas alterações, talvez, esteja na própria Constituição, isto é, na quantidade de temas tratados ao longo de 250 artigos e, também, no objeto dos assuntos abarcados.

William Waack – O perigo da ideias

O Estado de S. Paulo.

A campanha de Lula contra Banco Central é por convicção e não por cálculo político

Central ter mandato não dá a ele autorização para irresponsabilidade”, disse a presidente do PT, Gleisi Hoffmann. Dirigentes petistas, assim como Lula, criticam a taxa básica de juros da economia, de 13,75% ao ano.

Ideias sobrevivem adormecidas durante muito tempo, mas precisam do momento certo para serem realizadas. É o que parece estar acontecendo agora no embate Lula versus Banco Central e as taxas de juros.

A ideia de que desequilíbrio fiscal não é o precursor de colapsos econômicos ou de inflação é debatida há muito no mundo acadêmico. Simplificando brutalmente, não haveria nada errado com um governo que pretende estimular a economia gastando muito mais do que arrecada, pois os benefícios (renda, crescimento, arrecadação, popularidade) vêm logo ali.

Eugênio Bucci - Muito mais que liberdade de expressão

O Estado de S. Paulo.

Conversas que repórteres mantiveram com suas fontes e resolveram não levar a público devem ser protegidas, não expostas pela Justiça

Na semana passada, aconteceu de novo. Um pequeno incidente veio mostrar, mais uma vez, que a cultura política e a cultura jurídica brasileiras ainda não compreendem bem a substância da liberdade de imprensa.

Desta vez, o episódio ocorreu no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). O despacho em que o ministro Alexandre de Moraes solicitou a empresas jornalísticas que entregassem a íntegra dos áudios de entrevistas concedidas pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES) tropeçou numa hesitação inicial reveladora, que deveria nos servir de alerta. Conforme noticiado amplamente, a primeira versão da ordem judicial estabelecia multa para quem não a cumprisse e – ainda mais preocupante – não deixava claro se o magistrado exigia a apresentação de todos os diálogos gravados com o senador ou apenas daqueles que tivessem sido efetivamente publicados pelos órgãos de imprensa. Em seguida, numa benfazeja correção de curso, as coisas se acertaram: além de retirar a previsão de multa, o ministro explicitou que estava se referindo apenas aos conteúdos, nos termos dele, “já publicizados”. Ficou melhor assim. Ficou direito, como deve ser.

José Serra* - A reforma tributária possível

O Estado de S. Paulo.

Sugiro que façamos o bom e o possível, e não fiquemos buscando eternamente o ótimo, como vem ocorrendo há anos, sem sucesso

Há muito tempo discute-se no Brasil a necessidade de uma reforma tributária, pois o sistema atual é caótico, tributa em demasia o consumo – onerando proporcionalmente mais quem ganha menos – e subtributa a renda e o patrimônio. Não é à toa que isso ocorre. É bem mais fácil cobrar tributos indiretos, como ICMS, IPI, ISS, o PIS e a Cofins, do que os diretos, como o Imposto de Renda, IPVA ou IPTU, por exemplo.

O caso do ICMS se destaca, provavelmente, como o maior problema do sistema tributário, tendo 27 legislações diferentes, que se multiplicam em milhares de normas fiscais, impossíveis de serem observadas na sua totalidade por empresas que operam em várias unidades da Federação. Os conflitos e a judicialização crescem exponencialmente.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Reunião com Biden abre oportunidade para governo Lula

O Globo

Além da defesa da democracia, agenda deveria abranger Amazônia, armas, OCDE e até vistos de entrada

O principal tema do encontro entre Luiz Inácio Lula da Silva e Joe Biden amanhã em Washington serão os ataques violentos da extrema direita no Brasil e nos Estados Unidos. Ambos os presidentes simbolizam a vitória de forças democráticas ameaçadas pelo populismo e pelo autoritarismo. Seria também uma excelente oportunidade para Lula deixar de lado o antiamericanismo e aprofundar a agenda comum entre as duas maiores democracias das Américas. Os dois países só teriam a ganhar.

São esperados avanços em três áreas: cooperação na defesa da democracia, no combate às mudanças climáticas e em questões militares. Lula não deveria esquecer também dois outros assuntos. Primeiro, o apoio dos Estados Unidos para o Brasil ser aceito na Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), que reúne economias avançadas e dissemina boas práticas no serviço público. Segundo, a isenção de vistos nas viagens de brasileiros ao país — tema há anos na agenda bilateral, congelado depois que o Brasil liberou a entrada de americanos sem exigir reciprocidade.