sábado, 13 de abril de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Desarmonia entre Poderes é ameaça à democracia

Correio Braziliense

Administrar (Executivo), legislar (Congresso) e julgar (Supremo) são atribuições distintas e separadas dos Poderes da República, que precisam ser revigoradas sempre que houver a pretensão de se estabelecer um poder dominante sobre o outro

Montesquieu, no O Espírito das Leis, enunciou o princípio da separação entre os Poderes como um dos fundamentos da democracia, com seu sistema de freios e contrapesos (check and balances). Quando as funções do poder público são repartidas entre o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, a democracia impede que decisões autoritárias sejam adotadas, sem possibilidade de reversão. Isso possibilita um controle mais adequado da sociedade civil sobre o Estado.

Na Constituição de 1988, essa separação é muito relevante. Aparece em dispositivos como os vetos presidenciais a decisões do Congresso por estreita maioria, o impeachment do presidente da República por crime de responsabilidade e a forma como os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) são escolhidos, por indicação do presidente e homologação do Senado.

Entretanto, a Constituição de 1988 atribui ao Supremo o duplo papel de última instância do sistema judiciário e de Corte Constitucional, a qual cabe analisar a compatibilidade de atos normativos, leis e sentenças emanados pelos Três Poderes em relação à Constituição Federal. São as cláusulas pétreas enumeradas no art. 60, §2ª, incisos I e III, da Carta Magna — entre as quais, a forma federativa de Estado e a separação dos Poderes. Uma emenda constitucional que pretenda abolir tais institutos é inconstitucional na sua origem.

Pablo Ortellado - Mídias sociais produzem geração ansiosa

O Globo

Psicólogo social Jonathan Haidt diz que elas estariam roubando de crianças e jovens tempo de experimentação e convívio, o que seria a causa imediata da atual epidemia de ansiedade e depressão

Acaba de sair nos Estados Unidos o novo livro do psicólogo social Jonathan Haidt, “The anxious generation”, pela editora Penguin. No livro, Haidt argumenta que o uso intensivo de mídias sociais rouba das crianças e dos jovens tempo de experimentação e de convívio, causa imediata da atual epidemia de ansiedade e depressão. Mas as raízes do problema, segundo ele, estão nas mudanças culturais que levaram os pais da Geração X a superproteger os filhos.

O livro de Haidt começou como blog na plataforma Substack. Lá, ele propôs a tese —naquele momento controversa —de que o grande aumento nos indicadores de depressão, ansiedade, automutilação e suicídio entre os jovens nos anos 2010 estava ligado ao uso de mídias sociais.

Eduardo Affonso – Creio porque é absurdo

O Globo

No Brasil, o impossível não é apenas provável como acontece com desconcertante regularidade

O portal de notícias g1 publicou nesta semana:

— Circula nas redes sociais uma imagem que imita a aparência de uma página do g1 com o título: “Moraes dá 24 horas para Elon Musk entregar o passaporte e a chave do foguete SpaceX na Polícia Federal e proíbe o bilionário de deixar o planeta”. É #FAKE.

Era mesmo preciso dizer que se tratava de feiquenius? Pelo jeito, era. A ordem para entregar a chave do foguete (!) e a proibição de deixar o planeta (!!) não seriam indícios de sobra para caracterizar uma piada sobre os eventuais excessos do ministro Alexandre de Moraes? Aparentemente, não. Decisões absurdas (como as que anularam condenações da Lava-Jato) criaram a percepção geral de que, vindo do STF, tudo é possível.

Este deve ser o maior desafio no enfrentamento à desinformação: termos chegado ao ponto em que ironia, sarcasmo, deboche, mentira deslavada e realidade pareçam intercambiáveis — e indistintamente críveis ou risíveis. Num país que censura piadas, não espanta que alguém, além dos censores, as leve a sério.

Carlos Alberto Sardenberg - Não pode haver censura

O Globo

Musk não é um libertário. É um cara de negócios. Mais um motivo para o STF não se meter com tal personagem. Descumpriu a lei? Processo nele

A primeira imagem me veio logo: Musk deixou a bola pingando na pequena área. Xandão, centroavante rompedor, encheu o pé. Muito possivelmente estava impedido, mas, como ninguém pediu o VAR, o gol valeu. Mesmo porque o VAR, no caso, seria o próprio Xandão, quer dizer, o ministro Alexandre de Moraes. Não apenas o gol valeu, como o VAR deu falta cometida por Musk, cartão amarelo, com ameaça de vermelho.

Logo, o centroavante/VAR levou a melhor e conseguiu apoio de seu time. Entusiasmado, mandou ver:

— Tenho absoluta convicção de que o Supremo Tribunal Federal, a população brasileira e as pessoas de bem sabem que liberdade de expressão não é liberdade de agressão.

Demétrio Magnoli - Musk, bananas e bandeiras

Folha de S. Paulo

Seguiremos fingindo que os crimes digitais de verdade não existem

O negócio mais lucrativo das plataformas de redes sociais –como o X, de Elon Musk, e a Meta, de Mark Zuckerberg– é impulsionar mensagens criminosas. Lá na Índia, são conclamações à violência contra muçulmanos. Lá em Mianmar, uma campanha de limpeza étnica contra os rohingya. A União Europeia regulamentou as redes. Nós, não. Para compensar, tal qual uma república bananeira, convertemos Musk em vilão ou herói.

A Câmara paralisou o debate sobre a regulamentação. Os partidos e os nobres deputados beneficiam-se do faroeste virtual, investindo na calúnia envelopada em fake news. Havia um álibi: os regulamentadores anunciaram seu desejo de "banir a desinformação", uma senha quase explícita para a censura política. Nada feito. Vitória das bananas.

Alvaro Costa e Silva - O pai do Nelson e o Congresso

Folha de S. Paulo

Tentativa de soltar Brazão foi ensaio para anistiar Bolsonaro

"O Congresso Nacional é a fonte de corrupção do regime, é a massa plástica de todas as imoralidades que deprimem e aviltam a nacionalidade (...) É assim o Congresso Nacional, uma cidadela de negocistas repelentes, a sangrar o erário debilitado (...) É esse reduto de desfibrados o gerador das discórdias políticas que dividem a família brasileira (...) Para que serve esse Congresso despudorado, traficante, desacreditado perante a opinião pública?"

Calma no Brasil. Apesar da contemporaneidade e da virulência do ataque (que, de certa maneira, lembra as mídias sociais), o texto acima data de 1927. É um trecho do editorial do periódico A Manhã, no qual se reconhece o estilo de Mario Rodrigues, o jornalista panfletário que, entre outras mil coisas, foi o pai de Nelson Rodrigues e Mario Filho.

Fernando Canzian - Lula está nu

Folha de S. Paulo

Não há muita perspectiva para investimentos produtivos sustentarem o PIB

"Só quando a maré baixa é que descobrimos quem estava nadando pelado." Atribuída ao investidor Warren Buffett, a máxima expôs nesta semana a fragilidade de Lula na economia.

Bastou o mercado global ver sinais de que os EUA não baixarão os juros tão cedo, frente a pressões inflacionárias, que as perspectivas para emergentes desajustados azedaram. Moedas locais perderam valor, com impactos na inflação, à medida que investidores correram para títulos dos EUA.

Caso do Brasil, onde o arcabouço fiscal oferece baixa credibilidade de que diminuirá a relação entre a dívida bruta e o tamanho do PIB —indicador de solvência do país. No fim de 2023, a proporção era de 74,3%, mas o mercado (Focus) enxerga 87% em 2030.

Hélio Schwartsman - Envelheceu mal

Folha de S. Paulo

Democracia americana corre riscos por seu pioneirismo; instituições não conseguem se renovar

A democracia americana tem um problema. Ali é possível tornar-se presidente mesmo recebendo menos votos que o adversário. Das últimas três eleições de presidentes republicanos, George W. Bush em 2000 e 2004 e Donald Trump em 2016, duas se deram com o vitorioso no colégio eleitoral perdendo no voto popular (2000 e 2016). Antes desses casos, isso só ocorrera um par de vezes no século 19.

O fenômeno se deve a uma combinação de mudanças demográficas, como urbanização e imigração, que fortaleceram a base eleitoral dos democratas, com a rigidez da Constituição americana, que só pode ser alterada se houver virtual consenso sobre a matéria, o que não acontece porque republicanos não votarão para reduzir suas chances de chegar à Casa Branca.

Antonio Cláudio Mariz de Oliveira - Bem comum, mera figura de retórica

O Estado de S. Paulo

Atualmente, assiste-se ao coletivo ser superado pelo particular. Um fenômeno que é visto nas próprias instituições do Estado

O homem é um animal gregário e, como tal, tem necessidade indeclinável de viver em conjunto com os seus semelhantes. Para que haja uma coexistência pacífica e harmoniosa, é imprescindível um esforço comum, que se desdobra em vários aspectos. Entre eles, é fundamental que haja uma clara limitação imposta pelos interesses da coletividade àqueles de natureza exclusivamente pessoal. O bem comum como meta de todos até para que se possa alcançar os interesses individuais.

Mas, atualmente, assiste-se ao coletivo ser superado pelo particular. Esse fenômeno é visto nas próprias instituições do Estado. Verifica-se que muitos servidores públicos colocam em seu benefício os vários setores nos quais intervêm, ao contrário de os utilizar como instrumentos de apoio e amparo aos interesses da sociedade.

Cristovam Buarque* - Democracia devedora

Revista Veja

A maior dívida é com a educação de base 

Na mesma quinzena de março, o golpe militar fez sessenta anos e o fim de sua ditadura 39. Os que repudiam 1964 denunciam os golpistas, sem a autocrítica de onde os democratas erraram nos anos anteriores, e os que hoje celebram a redemocratização não percebem as dívidas que a democracia ainda tem com o Brasil. Apesar de o SUS e as Bolsas terem diminuído a penúria, o quadro de pobreza e miséria se mantém equivalente a 1985; ajudamos pobres, mas não implantamos estratégia para a abolição da pobreza. Nenhum passo estrutural foi dado para que o Brasil deixasse de ser campeão em desigualdade: na verdade, os benefícios aos ricos cresceram, aumentando a brecha na qualidade de vida entre o topo e a base da pirâmide social. A democracia explicitou a apartação brasileira e aumentou a violência nas cidades. A persistência da concentração de renda é uma dívida.

Luiz Gonzaga Belluzzo* -Assim caminha a humanidade

CartaCapital

Em campo, as artimanhas do capitalismo para ocultar as iniquidades do racismo

No tropel de mensagens que invadem meu WhatsApp sofri a trombada do antirracismo racista da Nega Agridoce. Ela fica muito triste quando vê um negrão ou negrona torcendo pro Palmeiras.

Essa manifestação desvela a apropriação da consciência da Nega Agridoce pelo racismo que ela supostamente se empenha em amaldiçoar. Imagino que a senhora Agridoce buscasse fazer uma increpação de racismo ao clube dos “italianinhos”.

Atribuir ao clube dos “italianinhos” o propósito de discriminar os negrões e as negronas carrega em seu embornal de significados a duplicação do preconceito racista. Os malditos italianinhos não merecem o afeto dos negrões e negronas.

Na conquista do tricampeonato paulista, enquanto os jogadores e dirigentes celebravam, fiquei atento à entrevista dos pais do ­Endrick, Cíntia e Douglas. Eles se emocionaram ao relatar a trajetória do filho, acolhido pelo Palmeiras desde os 11 anos de idade. Agradeceram ao clube que abrigou o menino, agora encaminhado para jogar no Real Madrid.

Aldo Fornazieri* - Enredado em si mesmo

CartaCapital

O principal problema do governo é o próprio governo

A queda de popularidade, seus impasses internos e na relação com o Congresso, os ziguezagues da política externa, sua incapacidade de mobilizar as bases sociais para um engajamento mais ativo, as confusões na Petrobras, desarticulação política e falhas de comunicação são ingredientes, entre outros, que explicam o mau momento do governo perante a opinião pública. Esses elementos mostram que o principal problema do governo é o próprio governo. Um governo enredado em suas próprias incapacidades.

As principais são de natureza política, pois no plano da economia não se pode dizer que o governo vai mal. O desemprego no período do terceiro mandato de Lula tem caído. A taxa para o mês de fevereiro é a menor desde de 2015. No ano passado, a renda do trabalho cresceu 11,7% e o número de empregos com carteira assinada continua acima dos 100 milhões. O Banco Central, o Ministério da Fazenda e os analistas de mercado elevaram as previsões de crescimento do PIB para 2024. Há indícios de que ele poderá ser superior aos 2%, acima das expectativas iniciais. É verdade que há uma elevação dos preços dos alimentos, mas esta inflação tem uma natureza sazonal e logo, principalmente os preços dos hortifrútis, deverá cair.

Marcus Pestana* - O Brasil e as turbulências globais

Discutimos, na última semana, as diversas fontes de instabilidade no mundo atual: o fantasma de Trump, o conflito Israel-Hamas, a Guerra da Ucrânia, ditaduras de direita e esquerda ameaçando a democracia, as enormes desigualdades sociais que separam povos e Nações.

A apropriação dos frutos da globalização é desigual, reafirmando iniquidades históricas. A imigração em massa de países pobres patrocinou o aguçamento de sentimentos hostis de xenofobia e exclusão, fortalecendo uma extrema-direita míope e excludente. O mercado, em escala global, permite o livre trânsito de capitais (com um simples clique de computador se transfere bilhões de dólares de um país para outro) e de mercadorias (embora o protecionismo sobreviva disfarçado ou não), mas não de mão-de-obra. Daí o drama dos imigrantes na fronteira do México ou na Europa.