domingo, 26 de maio de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

IDH indica ineficiência do Estado brasileiro

Folha de S. Paulo

Com carga tributária elevada e iníqua, além de gasto mal direcionado, país não alcança nível elevado de desenvolvimento

Entre os 30 países com maior carga de impostos, o Brasil é o que apresenta o pior índice de desenvolvimento humano (IDH). O dado, apurado pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, evidencia de modo eloquente distorções do Estado brasileiro.

Em 2022, ano que serviu de base para o levantamento, a arrecadação tributária brasileira, nos três níveis de governo, correspondeu a 32,4% do Produto Interno Bruto —a 24ª posição da lista, encabeçada pela Noruega (44,3%) e quase toda composta por economias ricas.

Já nosso IDH, de 0,76 numa escala de 0 a 1, é o único na relação abaixo do patamar classificado como alto desenvolvimento (0,80).

O índice leva em conta renda per capita, educação e longevidade. No primeiro critério, corrige-se o poder de compra em cada país, de modo a se obter uma régua comum, dado que regiões com renda superior têm nível de preços mais alto.

Luiz Sérgio Henriques - Esquerda, democracia e despolarização

O Estado de S. Paulo

Se não é novidade, a polarização atual vale-se da velocidade das redes e da quase ilimitada possibilidade de manipulação de consciências

Parece algo distante no tempo, mas pouco mais de 30 anos se passaram desde que pareceram se desfazer no ar as razões da esquerda, identificadas sumariamente com o comunismo histórico e o tipo de sociedade que criou na União Soviética e em seus satélites. O mundo se mostrava plano, os enigmas estavam decifrados. Um certo tédio, aliás, se anunciava: uma democracia formal, de baixa intensidade, poderia apoiar-se indefinidamente em mercados globais e numa cultura de consumo capaz de avassaladora universalização.

Relativamente pouca gente se manifestou contra esse bizarro panorama de terra plana. Na época, num pequeno livro, o italiano Norberto Bobbio teve a coragem de divergir. Sem arroubos retóricos, como de hábito, defendeu a pertinência da oposição entre direita e esquerda no novo contexto global. A velha distinção, nascida casualmente com a distribuição de cadeiras na convenção francesa de 1793, ainda seguiria sendo uma boa chave interpretativa. A igualdade, segundo Bobbio, haveria de se enriquecer com conteúdos novos. Além das diferenças de classe, mal teriam começado a ser arranhadas as de gênero e raça. E o caminho da esquerda, em sentido lato, longe de haver terminado, estava rigorosamente no início.

Manuel Castells* - Nosso mundo, nossas vidas

SOPRAM VENTOS MALIGNOS no planeta azul. Nossas vidas titubeiam no turbilhão de múltiplas crises. Uma crise econômica que se prolonga em precariedade de trabalho e em salários de pobreza. Um terrorismo fanático que fratura a convivência humana, alimenta o medo cotidiano e dá amparo à restrição da liberdade em nome da segurança. Uma marcha aparentemente inelutável rumo à inabitabilidade de nosso único lar, a Terra. Uma permanente ameaça de guerras atrozes como forma de lidar com os conflitos. Uma violência crescente contra as mulheres que ousaram ser elas mesmas. Uma galáxia de comunicação dominada pela mentira, agora chamada pós-verdade. Uma sociedade sem privacidade, na qual nos transformamos em dados. E uma cultura, denominada entretenimento, construída sobre o estímulo de nossos baixos instintos e a comercialização de nossos demônios. 

Míriam Leitão - O que Porto Alegre ensina para Belém

O Globo

Cientista José Marengo, do Cemaden, diz que Rio Grande do Sul pode sair de um período de enchente para o oposto, a estiagem

O cientista José Marengo do Cemaden, Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, usa uma expressão forte para explicar o que está acontecendo agora no clima, após o aquecimento simultâneo do Pacífico e do Atlântico. “A América Latina está como num sanduíche entre dois oceanos quentes”. É o retrato do tempo atual que tem provocado a inundação tão prolongada do Rio Grande do Sul. Marengo acha que a situação no território gaúcho deve durar um mês ainda para se normalizar e, depois, o clima pode ir para o extremo oposto. “Da enchente para a seca”.

Cacá Diegues - Moramos no mesmo espaço

O Globo

Percebi como o Brasil é igual em todas as suas paragens

Nesses últimos dez dias, acompanhei a tragédia sem trégua que acontece no Rio Grande do Sul, na Praia de Ipioca, ao norte de Maceió. Percebi como o Brasil é igual em todas as suas paragens. Na época do CPC (Centro Popular de Cultura da UNE), defendíamos com entusiasmo a tese de que a Cultura Popular tinha em uma de suas ondas principais a de que era formada inicialmente pelas questões sociais de cada região do país. Hoje sabemos que não é bem assim.

Por mais atrasado que seja o país, alguma coisa claramente o une em uma dimensão cultural inesperada. No caso do Brasil, por exemplo, existem os valores que herdamos de uma cultura sofisticada que não nos foi possível exercer ou o que fomos obrigados a inventar outra coisa para resistirmos a essa obrigatoriedade de uma cultura especificamente nossa. Isso pode gerar, como é o caso brasileiro, análises equivocadas sobre o que finalmente somos.

Dorrit Harazim - Choque

O Globo

Assim como Netanyahu, também o Hamas é contra criar uma Palestina convivendo com Israel

A fotógrafa americana Dorothea Lange, que documentou de forma indelével a essência da desolação humana na Grande Depressão do século passado, considerava o rosto humano uma língua universal.

— Suas expressões podem ser lidas e compreendidas em qualquer lugar do planeta — ensinava.

Na semana passada, o rosto opaco de uma gaúcha de meia-idade dizia o indizível. Estava simplesmente em choque, esvaziada da capacidade de sentir o que quer que fosse. Lembrava as imagens icônicas de soldados da Guerra da Crimeia, da Primeira e Segunda Guerras Mundiais, do Vietnã, retratados em momentos de total abstração da crueza em volta.

Luiz Carlos Azedo - Não há anjos na política, nem mesmo no STF

Correio Braziliense

A atuação da Corte é polêmica, seja por causa do protagonismo político de alguns ministros, seja por decisões contraditórias

Quarto presidente norte-americano, James Madison teve um papel fundamental na elaboração da Constituição e da Declaração de Direitos dos Estados Unidos, com Alexandre Hamilton e John Jay, nos ensaios de “O federalista”, a publicação do fim do século 18 que se tornou um clássico da ciência política. “Se os homens fossem anjos, não seria necessário haver governos”, resumiu (“O federalista”, nº 51), ao se referir aos políticos de um modo geral. A citação é oportuna porque estamos diante de polêmicas decisões monocráticas de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que parecem mais pautadas pelo jogo político e grandes interesses econômicos do que pela legislação vigente.

Eliane Cantanhêde - Efeito dominó

O Estado de S. Paulo

Governo brasileiro vê Netanyahu cada vez mais isolado e isolando Israel no mundo

Com a adesão de Espanha, Noruega e Irlanda, 146 dos 193 países que integram a ONU apoiam o reconhecimento pleno da Palestina como Estado e, portanto, com status para dialogar e negociar em condições de igualdade com Israel. “Hoje, não há diálogo entre eles, o que há um monólogo”, diz o chanceler Mauro Vieira. Pode-se ler que só Israel “fala”, subjugando a Palestina e impondo suas regras, interesses e poderio econômico e militar.

O movimento internacional pró estado Palestino tende a ter “efeito dominó”, inclusive pela simbologia da Noruega, que há 30 anos sediou o “Acordo de Oslo”,

entre Israel e Palestina, mediado pelos Estados Unidos e nunca cumprido pelos israelenses. Essa posição birrenta tornou-se irritante na era Netanyahu e inaceitável com a carnificina em Gaza e a escalada em Rafah. Agora mesmo Israel dá de ombros para uma decisão da Corte Internacional de Justiça, tribunal máximo da ONU, e mantém os ataques a Rafah.

Rolf Kuntz - Gastança versus crescimento

O Estado de S. Paulo

O presidente da República daria uma preciosa contribuição à política monetária se assumisse, logo, um compromisso claro com a estabilização dos preços

Mais empenhado em gastar do que em governar, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve fechar este ano com um buraco fiscal de R$ 14,5 bilhões, segundo a nova projeção orçamentária. Pela estimativa anterior, haveria um déficit de R$ 9,3 bilhões. Esses números incluem apenas as contas primárias, sem os juros, portanto. Também os custos vinculados ao desastre climático do Rio Grande do Sul estão fora desses valores. Permanece a pergunta: para que serve aquela gastança? A indagação pode parecer estranha ao presidente, a alguns de seus auxiliares e a muitos petistas. Afinal, quem assume o poder público, podem argumentar, assume também o direito de usar o dinheiro público e até de endividar o Tesouro. Tudo bem, pode responder o cidadão teimoso, mas sem desistir da pergunta: gastar para quê?

Luiz Gonzaga Belluzzo - Trepidações da globalização

CartaCapital

As novas condições econômicas foram apontadas como o rumo da eficiência, mas só incautos acreditaram

O Centre d’Études Prospectives et d’Informations Internationales (CEPII) arriscou uma investigação cuidadosa a respeito do avanço da China nos mercados globais. Vou reproduzir, com as adaptações necessárias, as observações mais pertinentes do estudo da importante instituição francesa.

Em 2019, a China detinha uma posição dominante na economia global, definida por uma participação de mais de 50% do mercado mundial de exportação de quase 600 produtos. Essa avaliação foi obtida a partir de uma investigação realizada em um universo de classificações comerciais que abrangem cerca de 5 mil produtos.

Isso significa que a China fornece pelo menos metade das importações globais desses produtos. Este número é seis vezes maior do que o número equivalente para os Estados Unidos, Japão ou qualquer outro país. Mesmo a União Europeia, considerada como um todo, não atinge metade desse nível.

Celso Rocha de Barros - Onde fica o centro?

Folha de S. Paulo

Única área em que governo Lula de fato se distanciou do centro de 1994-2014 foi em parte da política externa

Boa parte da discussão política nos últimos meses tem sido sobre quem, entre os políticos de direita, é "de centro". Em parte, trata-se de saber quem herdará o legado político de Jair Bolsonaro. Mas é mais do que isso: trata-se de discutir onde deve ficar "o centro" no debate político brasileiro.

Isso é importante porque, quando marcamos o lugar do centro, fica estabelecido que há uma distância X a partir dali, nas duas direções do espectro político, a partir da qual está a falta de bom senso, o radicalismo e, conforme se ande ainda mais para longe, o extremismo.

Vinicius Torres Freire - Como arrumar a bagunça nos juros

Folha de S. Paulo

Mancadas de Lula, BC e Fazenda elevam o custo do dinheiro, dólar e projeção de inflação

As taxas de juros estão em nível de exagero faz pelo menos duas semanas, dizem executivos e negociantes de dinheiro de bancos maiores. A efervescência poderia diminuir um pouco caso governo, Fazenda Banco Central falassem menos e dessem menos mancadas.

"Diminuir um pouco." Gente variada do BC e até do Ministério da Fazenda diz que um sedativo duradouro vai exigir mais do que gogó e compostura.

Vai exigir o quê?

Bruno Boghossian - Uma pizza de R$ 15 bi

Folha de S. Paulo

Lira e Alcolumbre controlam partilha de verba que se tornou ferramenta importante de poder

Cardeais da Câmara e do Senado assumiram a partilha de R$ 15 bilhões em emendas reservadas para as comissões do Congresso. O critério para dividir a verba ganhou de parlamentares o apelido de "pizza".

A distribuição é controlada por Arthur Lira (PP), na Câmara, e por um grupo representado por Davi Alcolumbre (União Brasil), no Senado. O líder de cada partido recebe uma fatia da verba para repartir entre os integrantes da bancada. A divisão segue orientações apresentadas num gráfico em formato de pizza, com a porção que deve ser indicada para cada ministério. A palavra final é dos gabinetes de Lira e Alcolumbre.

Muniz Sodré - Guerra molecular

Folha de S. Paulo

Quem restringe guerra a conflito entre Estados acha excessivo identificá-la à violência de milícias, terroristas e neonazistas e não vê que hater é hoje identidade sociopolítica

No anseio necropolítico do Bozo, a ditadura militar deveria ter matado 30 mil pessoas. Não é bizarrice, nem número aleatório, é o total estimado de mortos por Pinochet. Não se conectou essa intenção dolosa ao descaso com a morte de brasileiros durante a pandemia. Mas uma linha de sentido contínua passa pelo caos golpista até o negacionismo ecocida. A explicação cândida, em look colete laranja, do governador gaúcho para a falta de prevenção da catástrofe apesar dos avisos, é uma derivada: "Tínhamos outras prioridades". Entre elas, 50 atos ofensivos ao meio ambiente.

Ruy Castro - O Leblon careta

Folha de S. Paulo

O bairro pacato e família durante o dia se torna a zorra noturna pela qual todos o conhecem

A história das duas mulheres que passaram semanas morando no McDonald’s do Leblon, aqui no Rio, só me chocou pela escolha do anfitrião. Eu preferiria o Degrau ou o Alvaro’s, sexagenários altares da gastronomia e da boemia carioca, típicos do calor humano e da suavidade do Leblon.

Calor humano e suavidade? ---perguntará você. O Leblon não é o inferno noturno, com multidões nas calçadas das boates e dos botequins? É. E é também um dos bairros mais pacatos da cidade. Refiro-me ao Leblon diurno, ideal para flanar, com seu morno silêncio, ruas vazias e tudo o que um cidadão pode querer ao alcance das pernas. Duvida?

Ivan Alves Filho* - Frente Ampla Já!

O nazifascismo começa a levantar novamente a cabeça no mundo. O noticiário internacional indica que a formação de um novo Eixo é, hoje, uma possibilidade concreta. Ela passa pelo fortalecimento da extrema-direita na Europa, isto é, em países como Portugal, França, Suécia, Holanda, Alemanha e Itália. E, também, pela escalada expansionista cada vez mais agressiva implementada pelo governo de Vladimir Putin, defensor de uma propalada "limpeza étnica" na Ucrânia.  E, como se tudo isso não bastasse, temos as constantes ameaças golpistas e loas ao Terceiro Reich de Adolf Hitler por parte de Donald Trump. Uma eventual vitória desse aventureiro norte-americano nas eleições de outubro de 2024 poderá ter consequências gravíssimas para todos nós. As posturas terroristas dos governos atuais do Irã, de Israel e da Venezuela, endossadas igualmente pelo Hamas, tornam o quadro mundial mais tormentoso ainda.