sábado, 1 de junho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Julgamento mais importante de Trump será na urna

O Globo

Condenação criminal inédita do ex-presidente lança disputa eleitoral deste ano em território desconhecido

Momentos depois de tornar-se o primeiro ex-presidente americano a ser condenado por um crime, ainda nas dependências de um tribunal em Nova York, Donald Trump declarou que o veredito será dado pelo povo em 5 de novembro, dia da eleição americana. Trump é conhecido por proferir mentiras em série, mas até o mais inflamado de seus críticos será obrigado a concordar que desta vez falou uma verdade: apenas as urnas terão o condão de decidir seu destino — e o de todo o país.

Os Estados Unidos não contam com lei semelhante à da Ficha Limpa, portanto, mesmo condenado, o nome de Trump estará nas cédulas depois de referendado na convenção republicana de julho. A sentença será proferida também em julho, dias antes da convenção. Como Trump não tem antecedentes criminais, é remota a chance de ser preso. O cenário mais provável é uma multa acompanhada de liberdade condicional. Ainda assim, o ineditismo da situação lança desde já a disputa deste ano em território desconhecido.

Oscar Vilhena Vieira -Desenraizamento institucional

Folha de S. Paulo

Nesta semana assistimos a mais um festival de deslealdades com o nosso combalido Estado de Direito

O ambiente institucional brasileiro vem passando por um preocupante processo de degradação na última década, que se reflete numa dificuldade cada vez maior de a lei servir como instrumento de determinação de condutas e estabilização de expectativas. E onde a lei não impera, prevalecem o arbítrio, a violência, o oportunismo, o mandonismo e uma perversa forma de extrativismo institucional.

A fragilidade do direito brutaliza a vida das pessoas, especialmente daquelas que estão mais vulneráveis ao crime, ao arbítrio e à negligencia do Estado ou mesmo à ação predatória de algumas poderosas corporações. A fragilidade da lei deteriora a eficácia das políticas públicas, das instituições democráticas e, por consequência, a confiança na democracia. A fragilidade da lei, por fim, reduz a eficiência dos mecanismos de mercado, inibe investimentos e emperra processos de desenvolvimento econômico e social mais sustentáveis e equitativos.

Dora Kramer - Sem rumo nem prumo

Folha de S. Paulo

Lula deixou o Congresso no vácuo, semeou descaso, natural que colha derrotas


Ainda na campanha, quando indagado sobre seus planos para se relacionar com um Congresso cheio de novos poderes, o então candidato Luiz Inácio da Silva (PT) não demonstrava preocupação. Dizia que resolveria tudo com muita conversa.

Transcorrido praticamente um ano e meio de governo, o presidente muito discursou, mas não resolveu nem conversou na forma e no conteúdo exigidos pela atual configuração do Parlamento.

Hélio Schwartsman - Trump condenado

Folha de S. Paulo

Veredicto do júri não deverá mudar muito as pesquisas eleitorais e mesmo assim poderá mostrar-se decisivo

Como a condenação criminal de Donald Trump afeta a eleição presidencial? A resposta tem algo de paradoxal. Não se esperam grandes movimentações nas pesquisas de intenção de voto. Com a polarização afetiva, eleitores fiéis ao ex-presidente devem tornar-se ainda mais trumpistas. Verão na decisão do júri nova-iorquino um ato de perseguição política, uma nova tentativa de "roubar" a Presidência ao magnata laranja. Já os democratas tenderão a ler o episódio como uma confirmação do que sempre souberam: Trump não passa de um bandido, indigno de ocupar o cargo mais alto do país.

Guga Chacra - Condenado, mas ainda admirado por republicanos

O Globo 

Apesar do sólido apoio entre apoiadores do seu partido, ainda é cedo para saber qual será impacto a condenação do ex-presidente e candidato terá no eleitorado como um todo

“Nada na Constituição (dos EUA) impede um criminoso condenado de ocupar a Casa Branca. E, para a base de Trump, ele não é apenas um homem, mas um movimento. Quantos mais problemas ele enfrenta na Justiça, mais seus apoiadores o reverenciam. Na campanha, a expectativa é de que ele aproveite a imagem de ídolo fora da lei, usando a sua condenação para se retratar como um prisioneiro político e vítima de uma conspiração democrata”, escreveu o New York Times em seu artigo para a posteridade na edição histórica do jornal desta sexta-feira, com a manchete de "GUILTY" ("culpado", em português), em fonte gigantesca, ocupando todo o topo da capa do jornal.

Pablo Ortellado - Chico Bosco tem razão!

O Globo

As universidades são mesmo muito de esquerda. Mas esse problema não foi gerado por uma conspiração

Na semana passada, Francisco Bosco concedeu ao jornal O Estado de S.Paulo uma entrevista sobre seu novo livro, “Meia palavra basta”. A certa altura, observou que nas universidades predominam visões políticas de esquerda e reconheceu que, com respeito a esse ponto específico e sem que tenha dito da melhor maneira, Olavo de Carvalho tinha razão. A menção ao infame ideólogo do bolsonarismo acendeu a fábrica de cancelamentos, e o necessário debate sobre a pluralidade política na universidade foi trocado pela condenação moral do ensaísta.

Carlos Alberto Sardenberg - A destruição das federais

O Globo

Professores e funcionários, no geral, não topam conversa sobre ganhos de produtividade, avaliação de desempenho

A greve dos docentes das universidades federais chega a 60 dias, aproximando-se do movimento de 2015, que deixou as faculdades paradas por mais de cem dias. Há muitas semelhanças: o governo é do PT, e os professores são representados por dois sindicatos que não se entendem, um petista (Proifes), outro mais à esquerda (Andes).

O Ministério da Gestão, petista, acertou um acordo com o Proifes (reajuste salarial e fim da greve), mas o Andes foi à Justiça e derrubou o acerto. Estaca zero.

Reparem: 60 dias de greve em escolas públicas, que vivem do dinheiro do contribuinte, era para ser um desastre nacional. Milhares de alunos sem aulas e tudo bem? Dinheiro público pode ser assim tratado?

Eduardo Affonso - A vingança de Machado

O Globo

Escritor continua moderno depois de os modernistas terem saído de moda. Não para de surpreender velhos leitores

Em 2023, a Fuvest decidiu deixar na geladeira, por três anos, os escritores que portassem (ou tivessem portado) cromossomos Y. O x da questão para estar na lista de autores a ser lidos para o vestibular não era o gênero literário, mas o biológico. Saíram Carlos Drummond e Machado de Assis, entre outros, e entraram, entre outras, Djaimilia Pereira de Almeida e Conceição Evaristo.

Num país onde as escolas tratam a leitura (e a literatura) a pontapé (vide os resultados do Pisa), os livros indicados para o vestibular costumam ser o primeiro contato dos futuros universitários com a obra (ou pelo menos um livro inteiro) de autores fundamentais —caso de Machado e Drummond. (Pausa para um flashback: fui apresentado a Osman Lins e Ivan Ângelo, aos contos de aprendiz de Drummond e ao narrador além-túmulo de Machado nas leituras obrigatórias, em 1976. Obrigado, UFMG!)

Alvaro Costa e Silva - Amor e ódio em Chico Buarque

Folha de S. Paulo

Dois livros abordam a relação do compositor com a censura e a sociedade brasileira

Em 1973, os censores da ditadura escandalizaram-se com a letra de "Flor da Idade", em que Chico Buarque arma uma ciranda amorosa —Dora amava Lia que amava Léa que amava Paulo que amava Juca— inspirada no poema "Quadrilha", de Drummond, àquela altura já clássico.

O regime preparava a "distensão lenta e gradual", mas nada mudara entre Chico e a censura. O jogo de gato e rato se estendeu ao longo de três décadas, com episódios de repressão artística explícita e outros de ridículo universal —a proibição de a escola de samba Canarinhos da Engenhoca exibir um enredo em homenagem ao compositor, em 1974.

Miguel Reale Júnior - Em proteção da verdade

O Estado de S. Paulo.

Exemplos justificam que, no vazio legislativo, o TSE tenha vindo a proibir abusos prováveis comprometedores da legitimidade das eleições

A ministra Cármen Lúcia assume segunda-feira a presidência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e é sua preocupação principal prevenir e reprimir as fake news, mormente com o uso da inteligência artificial (IA). Por ora, há frágil controle de conteúdo na internet, no art. 19 do Marco Civil (Lei n.º 12.965/2014). Dois projetos sobre a matéria esperam votação: o projeto n.º 2.630, aprovado no Senado, está paralisado na Câmara dos Deputados; e o projeto n.º 2.338 do Senado, sobre sistemas de inteligência artificial, encontra-se na Comissão Temporária Interna sobre Inteligência Artificial no Brasil, sendo relator o senador Eduardo Gomes.

Carlos Alberto Longo - Reinvenção da política no Brasil

O Estado de S. Paulo

Uma democracia representativa com trinta e tantos partidos torna-se prisioneira de manobras de facções, escorrega para o assembleísmo e cai no populismo

A globalização está na raiz da crise que abala não só o comércio e as finanças mundiais, mas também a legitimidade da democracia representativa praticada no Ocidente. Os problemas e o diagnóstico da crise política no Brasil são idênticos aos de quando se olhava para as eleições de 2018. A polarização entre os partidos de esquerda e de direita não arrefeceu, ao contrário, promete se intensificar nos próximos anos. A crise dos partidos, do sistema político e da democracia representativa não é um problema só nacional.

Uma agenda para contornar a nossa crise e reinventar a política já foi exposta com clareza pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, mas com uma importante restrição: desde que se admita que, no futuro, deverá prevalecer um regime liberal “contemporâneo”, ou seja, formas democráticas menos “verticalizadas”. Isso porque a disseminação de novas tecnologias de informação e comunicação potencializou a voz e a influência dos cidadãos.

Carlos Andreazza – Lira reformando

O Estado de S. Paulo

Presidente da Câmara executa plenamente o seu modelo de atividade legislativa

Barbas de molho para a reforma tributária. A Câmara já trata do primeiro projeto de regulamentação, que definirá a composição da cesta básica e a lista de bens e serviços considerados nocivos à saúde e ao meio ambiente.

Atenção ao “imposto do pecado”, antes aos pecadores. Ainda longo o mar a atravessar. Em curso a forja e a instrumentalização das ondas, ali onde surfam os grupos de pressão influentes. A certeza: você levará o caixote – tomará o caldo.

Alíquota-padrão – alta – a definir. Quão alta será? Os tubarões – novas exceções – rodeiam. E o Planalto, cansado, boia. As condições dadas para que Arthur Lira execute plenamente o seu modelo de atividade legislativa.

Marcus Pestana - O foco em resultados na gestão hospitalar

A administração estatal tradicional gerou uma enorme e lenta máquina, focada em controle dos meios, dos processos, dos carimbos e das formalidades. A administração gerencial procura jogar luzes sobre os resultados para a população. Com esse artigo, eu encerro a série em defesa dos modelos de gestão flexível.

Como já dito, não se trata de questão nova e nem ideológica. Gestões do PT, na Bahia e no Governo Federal, introduziram, inclusive, experiências de parcerias com o setor empresarial. Aqui tratamos apenas de entidades sem fins lucrativos. A prefeita Marília Campos, que tem uma visão moderna de gestão, criou um Serviço Social Autônomo que faz a gestão do Complexo Hospitalar e das UPAs.

Elimar Pinheiro do Nascimento* - Fios do Tempo. Alain Touraine e o protagonismo feminino: uma homenagem

A configuração da nova sociedade ainda é imprecisa, mas para Touraine as mulheres são as atrizes principais das mudanças


Alain Touraine é um dos mais renomados sociólogos do mundo. Nos inícios de sua vida acadêmica lecionou na USP e estudou a América Latina, sobre a qual publicou alguns livros, com destaque para Palavra e Sangue (1988/1989).[1] Esteve sobretudo no Brasil e no Chile. É um dos criadores da expressão sociedade pós-industrial, presente em seu livro Société Postindustrielle (1969/1969)


Trabalhou inicialmente nos campos da sociologia do trabalho e dos movimentos sociais.  Em 1989, na sequência de suas reflexões sobre a contemporaneidade, iniciou um ciclo de publicações sobre as transformações da sociedade moderna-contemporânea, por meio de vários livros, entre os quais O que é a democracia (1994/1996); Crítica da modernidade (1989/1997);  

Poderemos viver juntos? Iguais e diferentes (1997/1999); Um novo paradigma. Para compreender o mundo de hoje (2005/2011); O mundo das mulheres (2006/2008).A tese central de Touraine sobre as transformações da sociedade moderna-contemporânea encontra-se no livro Um Novo Paradigma. Segundo essa tese, no meu ponto de vista uma hipótese, a sociedade moderna-contemporânea teria conhecido três tipos de sociedade, cujos princípios organizadores (ou lógicas) são distintos entre si.