sexta-feira, 24 de junho de 2022

Vera Magalhães: Tudo ou nada à custa do Tesouro

O Globo

A pesquisa Datafolha que mostra um quadro de estabilidade no cenário eleitoral foi recebida quase com comemoração no QG de Jair Bolsonaro.

A maré de más notícias — que incluiu, nas últimas semanas, o assassinato duplo no Vale do Javari, de ampla repercussão interna e internacional, o descontrole no preço dos combustíveis combinado à intensa intervenção na Petrobrás e, nos últimos dois dias, o prende-solta do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro — sugeria a opositores e aliados de Bolsonaro uma distância ainda maior entre ele e o ex-presidente Lula.

Nada mais expressivo desse alívio que os ministros que, em maio, denunciavam fraude na pesquisa, descascavam o instituto nas redes sociais e propunham até enquetes sobre quem era mais confiável, o Datafolha ou figuras mitológicas, desta vez terem respirado aliviados.

Não será essa a única reação aos números. Vem aí uma licença para gastar até o último centavo para tentar reverter a distância e evitar que se acentue a possibilidade, confirmada nos dados do último levantamento, de que Lula obtenha uma vitória em primeiro turno, algo que não acontece no Brasil desde 1998.

No calor do pânico causado pela prisão de Milton Ribeiro e dos pastores lobistas amigos de Bolsonaro que, segundo a Polícia Federal, operavam um esquema de favorecimento mediante propina para destinar verbas do MEC, surgiu a ideia de turbinar o Auxílio Brasil para R$ 600, mesmo valor pago no auge da pandemia, em caráter emergencial, para desgosto do governo e graças a uma articulação que, na época, nasceu na Câmara, sob Rodrigo Maia.

Malu Gaspar: Lira errou ‘previsão’ de que Bolsonaro assumiria liderança

O Globo

Os números da pesquisa Datafolha divulgada ontem (23), que reiterou a liderança isolada de Luiz Inácio Lula da Silva na corrida presidencial apontada no mês passado, mostram que o núcleo da campanha de Jair Bolsonaro à reeleição errou o prognóstico eleitoral a curto e médio prazo. 

Em maio passado, Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados e conhecido por sua habilidade na leitura de cenários políticos, apostou que o presidente já estaria liderando as pesquisas de intenção de voto a essa altura. A previsão, anunciada em entrevista ao Valor Econômico, foi repetida por Lira em outras ocasiões.

O otimismo era compartilhado por outros nomes que trabalham pela reeleição de Bolsonaro, como seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Dias após a entrevista de Lira, Flávio declarou ao SBT Brasil que o “Datapovo” e “pesquisas internas” indicavam a vitória de Bolsonaro ainda no primeiro turno. 

Contudo, ao contrário do que previu Lira, Lula lidera a pesquisa com 47% dos votos, 19% à frente do incumbente. Ou seja, se as eleições presidenciais ocorressem hoje, o petista seria eleito no primeiro turno com 53% dos votos válidos. 

Fernando Gabeira: O combustível da insensatez

O Estado de S. Paulo

Desespero de Bolsonaro o leva a se perder em iniciativas estúpidas como a de uma CPI da Petrobras. A oposição não pode acompanhá-lo nesse abismo

O desejo de conquistar eleitores produziu um psicodrama político em busca de soluções para conter o preço da gasolina. Tudo indica que os atores reconhecem seu fracasso, mas se esforçam para mostrar que deram tudo para evitar a derrota.

Talvez, lá atrás, tenha havido uma modesta saída, a formação de um fundo com os dividendos do governo, sócio majoritário da Petrobras, destinado a suavizar o aumento dos preços, determinado pela conjuntura internacional. Agora, é tarde, e as tentativas de última hora parecem cenas de um teatro do absurdo.

Durante duas semanas, o Congresso Nacional se dedicou a aprovar uma redução de ICMS para baixar os preços. Todos sabiam que eles estavam defasados e que, no primeiro movimento de atualização, a Petrobras neutralizaria com um novo aumento qualquer variação de ICMS. Resultado: Congresso funcionando custa dinheiro, Estados com menos recursos para educação, saúde e segurança, e, em termos de preço na bomba, resultado nulo.

Bernardo Mello Franco: O relógio corre a favor de Lula

O Globo

No futebol e na política, o relógio corre a favor de quem está ganhando. A nova pesquisa Datafolha apontou um cenário de estabilidade na disputa presidencial. É boa notícia para Lula, que mantém uma liderança folgada a cem dias do primeiro turno.

O ex-presidente tem 47% das intenções de voto, contra 28% de Jair Bolsonaro. Há um mês, os dois apareciam com 48% e 27%, respectivamente. O terceiro colocado, Ciro Gomes, também não se moveu fora da margem de erro: oscilou de 7% para 8%.

Em votos válidos, que excluem brancos, nulos e indecisos, Lula chega a 53%. Isso não garante que ele terá fôlego para vencer no primeiro turno, mas reforça os argumentos dos dirigentes petistas que defendem um giro ao centro para liquidar a fatura em 2 de outubro.

César Felício: No Orçamento, a batalha pelo 2º turno

Valor Econômico

Diante da perspectiva de perder a eleição no primeiro turno, Bolsonaro articula a mudança na Constituição para permitir novas despesas sociais em período de vedação eleitoral

O aumento brutal dos combustíveis, o bárbaro assassinato na Amazônia, a prisão de um ex-ministro envolvido em corrupção, nada disso abalou o presidente Jair Bolsonaro. Ele tinha 27% das intenções de voto no Datafolha de maio e tem 28% agora. Na pesquisa espontânea, passou de 22% para 25%.

A resiliência de Bolsonaro parece um dado definitivo, que torna praticamente impossível a sua ausência de um segundo turno das eleições presidenciais, se segundo turno tiver. Lula oscilou pra baixo tanto na estimulada (de 48% para 47%) quanto na espontânea (38% para 37%). A soma de todos os seus adversários era de 40% há um mês. É 41% agora.

Faltam apenas 100 dias para a eleição. Já é possível afirmar que há uma cristalização do quadro. Mantidas as condições naturais de temperatura e pressão, o nome que se projeta como solução à polarização é o de Ciro Gomes (PDT), que antes tinha 7% e agora está com 8%, e ele não demonstra fôlego para alcançar Bolsonaro. A possibilidade de Bolsonaro virar a eleição e ultrapassar Lula antes do primeiro turno está próxima do delírio. A dúvida subsistente é sobre a realização ou não de um segundo turno.

Hélio Schwartsman: No mundo dos fatos objetivos

Folha de S. Paulo

Só quem estava em transe nestes três anos e meio não viu

Leio nos jornais que aliados de Jair Bolsonaro estão preocupados com a fugaz prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, porque ela tira do presidente seu discurso anticorrupção. Bolsonaristas são definitivamente fãs de "fake news". No mundo dos fatos objetivos, o capitão reformado já havia traído todas as principais bandeiras da sua vitoriosa campanha de 2018 e a primeira a cair foi justamente a de combate à corrupção.

Ainda antes da eleição, a Folha mostrou que a famosa Wal do Açaí era funcionária-fantasma do então deputado Bolsonaro. A menos que se considere que é correto usar dinheiro público para pagar gente que presta serviços particulares a autoridades, o caso entra no rol dos delitos que o senso comum classifica como de corrupção (tecnicamente, é um peculato).

Bruno Boghossian: Um programa para o 3º turno

Folha de S. Paulo

Ajustes nas diretrizes foram feitos para permitir negociações também depois da eleição

Os ajustes feitos pelo PT no programa de governo de Lula foram calculados para atravessar o que o partido trata como uma eleição em três turnos. Os acenos incluídos no texto e as lacunas mantidas em certas diretrizes têm o objetivo de preservar eleitores fiéis, deixar a porta aberta para novas adesões e, principalmente, permitir negociações caso chegue a hora de governar.

De saída, a plataforma de Lula buscou uma marca social para consolidar o favoritismo do ex-presidente no primeiro turno em segmentos como o eleitorado de baixa renda. Além disso, sustentou bandeiras tradicionais da esquerda na economia, como o veto a privatizações e a reversão de normas trabalhistas.

A campanha decidiu recuar de outras mensagens direcionadas a esse público próximo. Sumiu do plano, por exemplo, a sugestão de uma flexibilização do direito ao aborto. Assim, os petistas querem evitar uma fuga, ainda na primeira etapa, de eleitores conservadores que podem votar em Lula pela economia.

Reinaldo Azevedo: Datafolha mostra buraco civilizatório

Folha de S. Paulo

Tempestade de más notícias não alterou adesão a Bolsonaro

A pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta-feira evidencia, uma vez mais, a estabilidade do quadro eleitoral, mas também demonstra a ameaça de um buraco civilizatório. O mal atinge outras democracias.

Se a eleição fosse hoje, Lula (PT) venceria no primeiro turno: oscilou de 48% em maio para 47%. Jair Bolsonaro (PL) variou de 27% para 28%, e Ciro Gomes (PDT), de 7% para 8%. André Janones (Avante) segue com 2%. Simone Tebet (MDB) foi de 2% para 1%, mesmo índice de Pablo Marçal (PROS) e Vera Lúcia (PSTU), que repetem desempenho anterior. No segundo turno, o ex-presidente venceria o atual por 57% a 34%. Antes, 58% a 33%. A margem de erro é de dois pontos percentuais.

Assim, o mais provável é que nada de relevante tenha acontecido nas intenções de voto. Mas muita coisa aconteceu. Eis o buraco que pode inviabilizar o país caso se expanda.

Entre o levantamento anterior e este, houve os assassinatos de Bruno Araújo Pereira e Dom Phillips no Vale do Javari. A tragédia não se deu no vácuo, mas num meio ambiente político de incentivo ao vale tudo. A pergunta é óbvia e a resposta não menos: os valores que emanam do Palácio do Planalto e suas políticas públicas estão mais afinadas com Bruno e Dom ou com seus executores? O próprio Bolsonaro, Hamilton Mourão, a Polícia Federal e os tais "bolsominions" nas redes sociais não hesitaram em apontar o dedo acusatório para as vítimas.

Vinicius Torres Freire: Primeiro turno e Auxílio de R$ 600

Folha de S. Paulo

Tanto faz se quebre o país, Bolsonaro vai fazer o que puder para evitar derrota precoce

Lula da Silva (PT) ganha a eleição no primeiro turno, com 53% dos votos válidos, no Datafolha desta semana. A pesquisa não permite dizer quase nada a respeito do que vai ser da votação dos candidatos nos cem dias até o primeiro turno. Mas a prioridade da campanha de Jair Bolsonaro (PL) é diminuir o risco de perder já no dia 2 de outubro.

Para tanto, Bolsonaro precisa não apenas ganhar votos, mas tem de tirá-los de Lula. Ou, com possibilidade de sucesso muito menor, também teria de conseguir votos de eleitores avessos a votar em alguém. De resto, tem de torcer que o eleitorado de Ciro Gomes (PDT) ou Simone Tebet (MDB) não debande,

Em tese, pela aritmética simples da pesquisa, a tarefa bolsonarista está longe de impossível. Cerca de 20% dos ora eleitores de Lula dizem que podem votar em Bolsonaro e vice-versa. A questão é descobrir o que pode mover o eleitorado.

A resposta fica mais nebulosa quando se nota que, desde março, os resultados das pesquisas pouco mudaram, afora ninharias estatísticas. Do final de 2021 até março, Bolsonaro ganhou uns pontos. Desde então, sua votação ou a nota para seu governo mudaram quase nada. Lula também ficou na mesma. As taxas de rejeição ficaram na mesma. Os demais candidatos continuaram nos seus pequenos nichos eleitorais.

José de Souza Martins*: O drama da fome

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Temos hoje 125,2 milhões de brasileiros em situação de insuficiência alimentar. O problema não se resolverá com providências tópicas e emergenciais.

Entre o acúmulo de dramas que se tornaram visíveis na sociedade brasileira nos últimos dias, está o não pequeno drama da fome. O país do futuro está sendo devorado pelo presente.

Os dados mais recentes sobre a fome, divulgados pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar, colhidos em entrevistas realizadas em 12.745 domicílios, dão um retrato objetivo da situação em todas as regiões do país, na zona urbana e na zona rural. Constituem indicadores de uma parte do que é a nossa pobreza, pois se referem apenas à situação alimentar. Haveria que levar em conta o restante do que é a pobreza entre nós quanto à moradia, ao consumo não alimentar, à saúde, à educação.

A porcentagem dos que em 2004 viviam em situação de segurança alimentar era de 64,8%; em 2020/2021 caíra para 41,3%. Mesmo que se considere, como é necessário, a situação anômala criada pela pandemia, a intensidade de sua influência nos números foi agravada pela vulnerabilidade da sociedade brasileira ao impacto de desastres de todos os tipos, incluídos os decorrentes da incapacidade dos governos para lidar com situações excepcionais em todos os campos.

Entre o final de 2020 e o início de 2022, o número de pessoas em situação grave de fome saltou de 19,1 milhões para 33,1 milhões, 15,1% da população. Em pouco mais de um ano, 14 milhões de brasileiros passaram a viver em situação de fome, a forma mais acentuada de decadência social da pessoa. Temos hoje 125,2 milhões de brasileiros em situação de insuficiência alimentar.

Maria Cristina Fernandes: O Brasil que aconteceu entre os dois Amarildos

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

A morte de um revelou o fim de utopia civilizatória; o crime cometido pelo outro escancarou a dor e a vergonha da identidade nacional

Amarildo de Souza, 43 anos, casado, seis filhos, vivia na Rocinha, zona sul do Rio, trabalhava como ajudante de pedreiro e pescava aos domingos com vara de bambu. Na comunidade, era conhecido como “Boi”, por carregar, nos braços, de sacos de cimento a idosos inválidos. Ganhou o apelido aos 11 anos quando salvou um sobrinho de 4 num incêndio.

Amarildo da Costa Oliveira, 41 anos, casado, mora em São Gabriel, comunidade de Atalaia do Norte, município vizinho à reserva indígena Vale do Javari. Lá é conhecido como “Pelado”, por ter nascido com poucos pelos no corpo. Pescador, tem uma lancha de 60 HP (sigla em inglês para cavalo de potência).

No domingo 14 de julho de 2013, Amarildo saiu para pescar em São Conrado para garantir a refeição da família. Depois do almoço, “Boi” saiu de casa e passou em frente a um bar, quando foi interpelado e levado por policiais que, depois de um arrastão perto dali, tinham iniciado uma operação na comunidade. Estava com todos os seus documentos.

No domingo 5 de junho deste ano, “Pelado” saiu de manhã cedo com sua lancha. Foi visto passando pela comunidade de São Rafael, a dez minutos de sua casa, logo depois que a lancha do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista Dom Phillips deixou o local. Ficou o dia inteiro fora, apesar de, como disse sua esposa aos jornalistas que a procuraram, não pescar aos domingos.

Assis Moreira: A imagem do Brasil no exterior não melhora

Valor Econômico

Alguns investidores querem distância dos problemas ambientais

O desgaste da imagem do Brasil e do capital de simpatia que sempre teve no exterior continua. Em paralelo, prosseguem as denúncias contra o país no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, como ocorreu nesta semana e deve se repetir na semana que vem.

Um dos choques recentes procedentes do Brasil veio com a imagem aterradora do assassinato de Genivaldo de Jesus Santos por agentes da Polícia Rodoviária Federal (PRF) em Umbaúba (SE). Truculentos policiais da PRF imobilizaram e trancaram Genivaldo, 38 anos, em uma viatura da corporação e jogaram bomba de gás dentro do veículo. A imagem da “câmara de gás” da PRF deu a volta ao mundo.

Em seguida, os assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips na região do Vale do Javari ilustraram o perigo que correm defensores da Amazônia, sobretudo nos últimos tempos. Chamou atenção a dimensão da ausência do Estado na região, estampada numa declaração do vice-presidente, o general Hamilton Mourão. Segundo o general, Bruno e Dom passaram a correr risco depois de ingressarem em uma “área que é perigosa sem pedir uma escolta”. Ou seja, a “Amazônia é nossa” é na verdade cada vez mais do crime organizado. O general Mourão preside o Conselho Nacional da Amazônia Legal.

Laura Karpuska*: Carta ao povo brasileiro

O Estado de S. Paulo.

Todo governo, embora eleito por uma maioria, sempre terá de governar para todos

A Carta ao Povo Brasileiro fez 20 anos nesta semana. “Há outro caminho possível. É o caminho do crescimento econômico com estabilidade e responsabilidade social”, dizia o documento.

Gleisi Hoffmann, presidente do PT, afirma que Lula não precisa de uma nova carta, pois seus dois mandatos falam por si só. Na carta de 2002, Lula e sua equipe deixaram claras quatro diretrizes do seu governo: respeito às contas públicas, respeito aos contratos brasileiros, combate à inflação e uma política conciliadora. Entre os apoiadores do PT, os dois governos devem servir como compromisso de que caminho tomaria um novo governo. Mas e entre os demais?

Nesta semana, o PT divulgou as diretrizes do programa de governo Lula-Alckmin. Na economia, foram destacados quase 50 pontos. Fica difícil identificar neles o que poderia ser um programa de governo. Como conciliar o desejo de “superar o modelo neoliberal que levou o País ao atraso”, a disposição para revogar o teto de gastos e rever o atual regime fiscal brasileiro, as discussões sobre transformação ecológica, a defesa da Amazônia e o combate às desigualdades regionais?

Mas o documento deve ser lido com lentes políticas, e não técnicas. E aqui fica a pergunta: com quem a coligação LulaAlckmin queria dialogar?

Celso Ming: A Petrobras sob ataque

O Estado de S. Paulo.

As propostas sem pé nem cabeça se sucedem. Nem o governo nem o Congresso sabem o que fazer para derrubar os preços dos combustíveis. É improviso seguido de improviso, enxurrada de balões de ensaio com o objetivo de criar confusão e restabelecer o domínio clientelista sobre a Petrobras e, é claro, puxar pela boa vontade do eleitor.

O presidente Bolsonaro já destituiu três presidentes da Petrobras e sabe-se lá quantos conselheiros, como se o problema fosse de governança.

A ideia da CPI vai pelo mesmo caminho. Tenta culpar os diretores por tomarem as decisões para as quais foram nomeados. Agora querem revogar a

Lei das Estatais por medida provisória, para fazer da Petrobras gato e sapato dos políticos.

O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, veio com a proposta de taxar as exportações da Petrobras. Não há como taxar exportações de uma única empresa. A taxação teria de recair sobre um ou vários produtos, seja de que empresas forem. Lira finge ignorar que operam no Brasil 42 petroleiras, em 286 áreas produtoras de petróleo, algumas em associação com a Petrobras, de capital nacional ou estrangeiro. E não bastaria taxar exportações de óleo cru. Seria necessário alcançar também os derivados, para evitar desvios para o exterior. Mas esta seria a senha para afugentar capitais.

Rogério Furquim Werneck: Convergência populista

O Globo

Querem todos, cada um a sua maneira, voltar a poder 'botar as mãos' na estatal

Só não vê quem não quer. O populismo se alastra. No governo, na oposição, no Congresso e no Judiciário. O alastramento salta aos olhos na celeuma em torno da Petrobras.

Alarmado com as dificuldades da reeleição, Jair Bolsonaro parece mais e mais enfurecido com sua incapacidade de sustar os reajustes de preços de combustíveis que, na esteira da elevação dos preços internacionais, continuam a ser feitos pela empresa.

A oposição festeja a impotência de Bolsonaro. Lula alega que, se tivesse “coragem”, o presidente poderia resolver o problema com uma canetada (Estado, 9/6). Mas não deixa de se mostrar perfeitamente alinhado com a irritação de Bolsonaro com a Petrobras: “Por que impor um preço internacional a um produto nacional? Isso é perda de soberania” (Folha, 18/6).

Em tempo: uma boa alma poderia tentar explicar a Lula o significado de soberania, palavra que passou a usar a cada três frases, quase sempre de modo despropositado, como na declaração acima.

Flávia Oliveira: A tragédia das mulheres

O Globo

O governo Jair Bolsonaro e a pandemia da Covid-19 foram particularmente dramáticos para as mulheres brasileiras — em particular, negras e mães sem cônjuges. A constatação está em diferentes diagnósticos socioeconômicos dos dois últimos anos e ajuda a explicar tanto a baixa intenção de votos quanto a alta impopularidade do candidato à reeleição no eleitorado feminino. O presidente elegeu-se em 2018, a despeito do #EleNão, alerta do movimento de mulheres materializado em robustas manifestações de rua. Era conhecimento de causa, não reivindicação identitária. Trabalhadoras, mães, donas de casa, beneficiárias de políticas sociais, as brasileiras sabíamos que o porvir não nos favoreceria. Taí o resultado.

No fim de 2021, 33,1 milhões de brasileiros não tinham o que comer, salto de 73% sobre um ano antes, o primeiro da pandemia. A proporção de lares em situação de fome saltou de 9% para 15,5% de um ano para o outro. Praticamente seis em dez habitantes (58,7%) sobreviviam com algum nível de insegurança alimentar: substituição de itens mais caros por mais baratos; supressão de refeições; cessão de comida por adultos para crianças ou idosos; falta de alimentos, o drama máximo.

O Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar entrevistou moradores de 12.745 domicílios de fins do ano passado a abril de 2022. Atestou que a fome é rural, negra, feminina. Dois em cada três lares chefiados por mulheres enfrentam insegurança alimentar; neles, a fome passou de 11,2% para 19,3% de um ano para outro. Nas famílias com crianças menores de 10 anos, o percentual igualmente dobrou: de 9,4% para 18,1%.

Nelson Motta: Que liberdade é essa?

O Globo

O liberalismo econômico expressa a liberdade de empreender sem que o Estado atrapalhe, como se vê nos EUA. E não no Brasil, onde o governo quer interferir em tudo que lhe atrapalhe os objetivos

“Ó liberdade, quantos crimes são cometidos em teu nome”, disse a escritora e política Manon Roland, em 1793, a caminho da guilhotina, vítima da própria Revolução Francesa que ajudou a construir.

E um dos piores é matar a liberdade dos outros.

Quando “aquela pessoa” tenta justificar seus passados e futuros crimes dizendo que daria a vida pela liberdade, que a liberdade é mais importante que o oxigênio, o público pergunta: que liberdade é essa? Para mentir, difamar, caluniar, ofender e até ameaçar a democracia? Sim, numa democracia todo mundo pode dizer o que quiser — desde que assuma a responsabilidade, arque com as consequências legais e respeite as decisões da Justiça. Já na receita chavista a democracia é usada para destruir a democracia.

Liberdade é como pastel: todo mundo gosta. Quem não quer ser livre? Mas a liberdade tem um preço: respeitar a liberdade do outro.

Claro: liberdade não se ganha, se conquista, como a nossa foi conquistada a duras penas pelos nossos antepassados e por nós mesmos. E pode ser perdida a qualquer momento, ou gradativamente, até que reste só a liberdade de quem manda.

E, afinal, liberdade para quê? Para não ter trabalho, saúde e educação e passar fome? Liberdade para morrer de uma bala perdida ou assassinado na selva? Que liberdade é essa ?

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Tudo por pontos

Folha de S. Paulo

Estável no Datafolha, Bolsonaro tende a buscar medidas temerárias por 2º turno

A agitação política, o conflito entre Poderes e a escalada dos preços dos combustíveis e de outros produtos parecem por ora não afetar as intenções de voto para presidente.

A nova pesquisa Datafolha mostra um cenário quase inalterado em relação ao de março. De mais significativo, nota-se que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) continua a ter apoio bastante para, em teoria, vencer a eleição no primeiro turno —53% dos votos válidos.

Tal perspectiva tende a incentivar ainda mais o governo de Jair Bolsonaro (PL) a buscar medidas que possam render pontos suficientes para evitar a derrota precoce.

É um estímulo a providências imediatas e imediatistas, tanto na esfera de favores com dinheiro público quanto no combate por meio de mídias digitais ou na procura de bodes expiatórios para desviar a atenção da falta de governo.

Lula continua à frente, com votação quase inalterada em 47%, ante os 28% de Bolsonaro. O petista venceria hoje o presidente por 57% a 34% dos votos em um eventual segundo turno. O mandatário seria também derrotado por Ciro Gomes (PDT), por 51% a 37%. Observe-se que, no primeiro turno, Ciro tem apenas 8% das preferências.