sexta-feira, 10 de novembro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Reforma acaba com aberração do sistema tributário

O Globo

Deputados devem fazer uma análise criteriosa das exceções introduzidas pelo Senado e ser ágeis na aprovação

O Senado aprovou enfim a reforma tributária. Não se trata apenas da maior mudança no sistema de impostos do país em quatro décadas. Uma vez chancelada pela Câmara, ela porá fim ao manicômio tributário que atormenta empreendedores, trava o crescimento da economia e faz do Brasil motivo de chacota mundo afora. Mesmo com todos os defeitos, coloca o país noutro patamar. Espera-se que os deputados não percam tempo para analisar as mudanças feitas no Senado e a aprovem quanto antes.

O Brasil é o país onde as empresas gastam mais tempo tentando administrar os impostos que têm a pagar devido à barafunda de normas e leis. O IPI é o paraíso das exceções e o inferno para quem tenta entender as regras. A alíquota para bombom é de 5%. Para wafer, zero. Perfume paga 40%. Água- de-colônia, 10%. Cada uma das 27 unidades da Federação tem regulamentos próprios de ICMS. Os de São Paulo têm mais de 600 artigos e 20 anexos, com centenas de itens e incisos. No restante do país, a situação é semelhante.

Fernando Abrucio* - Municípios precisam entrar no século XXI

Valor Econômico

A transformação do sistema político brasileiro começa com um debate mais qualificado sobre o destino de nossas cidades

As eleições municipais ganharam uma centralidade impressionante no sistema político brasileiro. Elas não só selecionam os governantes que vão gerir políticas públicas fundamentais para a garantia dos direitos dos cidadãos, como também são peças-chave para as estratégias eleitorais de políticos estaduais e federais, que imaginam ter um terreno mais sólido para suas ambições futuras caso tenham aliados fortes nos governos locais. A despeito dessa relevância, os últimos pleitos municipais têm sido marcados por um debate público que não enfrenta os principais desafios contemporâneos das cidades brasileiras.

A noção de que o município faz diferença na política e nas políticas públicas é muito recente no país. A história brasileira, desde a Independência, foi de sufocamento do poder local, dando mais poderes aos estados/províncias e/ou ao governo central/governo federal. A Constituição de 1988 alterou radicalmente essa rota, dando aos municípios o caráter de ente federativo, o que significou um repasse inédito de autonomia política, financeira e administrativa.

Junto com a autonomia vieram novas, amplas e desafiadoras responsabilidades. O fato é que o Brasil combinou uma forte expansão do Estado de Bem-Estar Social, antes muito restrito a poucos, com uma grande descentralização municipalista dos encargos. Não foi um processo fácil, uma vez que as municipalidades tinham poucas funções de garantia universal dos direitos dos cidadãos. A maior parcela das prefeituras funcionava tal qual a famosa Sucupira de “O Bem-Amado”, que fez sucesso na década de 1970 na TV Globo. Para quem não se recorda, a principal bandeira do prefeito Odorico Paraguaçu era tentar inaugurar um cemitério - e, ironicamente, ninguém morria na cidade. Tratava-se de uma excelente metáfora sobre o sentido dos governos municipais de então.

Sérgio Abranches - A força dos privilégios e do conservadorismo

Headline

Qualquer reforma é melhor do que o sistema tributário que temos. Ele é iníquo, dispendioso para a sociedade e para a economia. É muito ineficiente e a montanha de incentivos que ele abriga exige uma carga tributária muito alta

O relatório da reforma tributária apresentado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM) é um ótimo exemplo de como os interesses da elite penetram as decisões no Congresso brasileiro, sempre com efeitos distributivos negativos. As exceções criadas primeiro na Câmara, agora no Senado, inoculam a lógica do velho e complexo sistema tributário em vigor no novo imposto sobre valor adicionado.

Toda elite usa seu poder político para manter seus privilégios e interesses “especiais”. No Brasil, porém, alguns setores da classe dominante têm se perenizado no poder. É quase impossível eliminar qualquer privilégio no Brasil. A ruptura consumada em 2018 reduziu a fragmentação partidária no plano eleitoral e provocou a redução do tamanho médio das bancadas no Congresso. O encolhimento das grandes bancadas deu ao Centrão o domínio do plenário. A força do conservadorismo, cuja prioridade é a manutenção do sistema de privilégios tal como está, se ampliou com essa miniaturização das bancadas parlamentares.

José de Souza Martins* - Começa com L

Valor Econômico

As reiteradas indicações de intolerância e prepotência política nas duas casas do Congresso Nacional expressam a mentalidade dos régulos de província  

Duas palavras de duas sílabas e de quatro letras. Esse, ao que parece, é o enigma pendular da República neste momento. Quem a preside? Nas eleições de 2022 o eleito foi Lula. Mas as miudezas visíveis e invisíveis do poder dão a impressão de que é Lira, presidente da Câmara dos Deputados, quem age como se mandasse.

Por meio dele o Legislativo minimiza o Executivo. Há uma função histórica nessa anomalia: exaurir a competência social que a presidência da república pode e deve ter, em relação a outras competências tópicas e subsidiárias: econômica, militar e a propriamente política.

Essa minimização tem funcionado como meio de garantia de uma estrutura de poder que é a base de um modelo de economia: o do crescimento econômico em detrimento do desenvolvimento social. Uma técnica política de assegurar lucro extraordinário dos empreendimentos econômicos com o questionamento da legitimidade das reivindicações sociais.

César Felício - Leque da reforma deve fechar na Câmara

Valor Econômico

Grupos de pressão terão que ser organizar para tentar repactuar os termos da reforma em um ambiente de muito maior controle pela cúpula

De 837 emendas recebidas o relator da reforma tributária, senador Eduardo Braga (MDB-AM), acatou 285. É um número significativamente maior do que as 158 emendas acolhidas na Câmara pelo relator daquela casa, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Não se pode por si só considerar que o senador foi mais flexível do que o deputado porque há uma diferença de universo nos pareceres. A questão é estrutural.

No caso da Câmara, Ribeiro opinou sobre 219 propostas de modificação. Fica nítido com esses números que a discussão da reforma tributária na Câmara foi mais centralizada e com menor capacidade de pressão de grupos organizados para buscar tratamento diferenciado.

Claudia Safatle - Lupi comete erro primário em aposta no consignado

Valor Econômico

Ministro parece ter fé inabalável de que a redução da taxa de juros, de forma aleatória, levará ao aumento do saldo das operações

O corte no teto de juros do INSS resultou na redução da oferta do crédito consignado pelo mercado, um efeito exatamente o contrário do que pretendia o ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, quando começou a sua batalha pela diminuição do teto da taxa de juros para os aposentados do INSS.

De maio a setembro houve uma queda de 35% na quantidade de empréstimos ofertados para o público com mais de 70 anos, se comparado a igual período de 2022. Para os aposentados em geral, a queda foi de mais de 10%.

Vera Magalhães – Essa ministra tá diferente

O Globo

Ministra passou a comunicar diretamente, sem intermediários nem a timidez do ‘off’, os avanços que obteve em pouco tempo na pasta que voltou a ocupar

Marina Silva teve uma grande vitória ontem, com o anúncio da queda robusta do desmatamento na Amazônia, um dos carros-chefes de sua pasta e grande preocupação do mundo em relação ao Brasil. A divulgação dos dados e a forma como a ministra fez questão de enfatizar em suas declarações a importância histórica e política deles mostram que ela está muito diferente daquela Marina que ocupou o mesmo ministério duas décadas atrás.

Por muito tempo, a titular do Meio Ambiente sofreu com uma pecha que lhe impingiram de forma sorrateira e cínica: era intransigente, inflexível, intratável. Foi muito conveniente para que as derrotas que sofreu pela falta de convicção ambiental do governo fossem debitadas da sua conta.

Flávia Oliveira - Mulherada equilibrista

O Globo

O Brasil avançou em arcabouço legal, mas ainda deve um monte à população feminina

É na corda bamba da violência extrema e da luta por direitos que se equilibram meninas, jovens e mulheres no Brasil e mundo afora. Num punhado de dias, o estupro de uma adolescente de 15 anos na Baixada Fluminense cometido, filmado e divulgado e, em São Paulo, um crime sexual evitado, porque um motorista de ônibus atento a sinais resgatou a vítima. De um lado, um grupo de estudantes de não mais de 16 anos usando criminosamente a inteligência artificial para produzir e compartilhar fotos de nudez de duas dezenas de meninas, também menores de idade; de outro, o tema de redação do Enem convidando futuros universitários a refletir sobre carga de afazeres domésticos e de cuidados impostos às mulheres desde sempre.

Bernardo Mello Franco - Privatizaram o apagão

O Globo

Blecaute da Enel em SP põe em xeque discurso de que concessão à iniciativa privada é sinônimo de eficiência; empresa desdenhou críticas e tentou botar culpa no vento

A maior metrópole do país voltou ao tempo da luz de velas. Um apagão deixou 2,1 milhões de imóveis sem eletricidade na Grande São Paulo. O blecaute fechou escolas, causou prejuízos, irritou consumidores e reabriu o debate sobre as privatizações.

A pane começou na sexta-feira, quando um temporal derrubou árvores e provocou danos à rede elétrica. Depois de 48 horas, 1 milhão de lares e comércios continuavam sem luz.

A concessionária Enel prometeu que a situação seria resolvida até terça. Depois de descumprir o prazo, tentou empurrar a responsabilidade para a natureza. “Não é para nos desculparmos, não. O vento foi absurdo”, desconversou o presidente da empresa.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, Nicola Cotugno desdenhou as críticas e disse que a Enel fez um “trabalho incrível”. A julgar pelas palavras do executivo, os consumidores é que deveriam se desculpar por terem ficado no escuro.

Rogério Furquim Werneck - O arcabouço fiscal como ele é

O Globo

Não faltou quem se permitisse acreditar que as metas fiscais anunciadas eram para valer

Para que a ruidosa discussão sobre o abandono da meta de déficit primário zero em 2024 seja corretamente entendida, é preciso ter clareza sobre a real natureza do novo arcabouço fiscal proposto pelo governo e, afinal, aprovado pelo Congresso em substituição ao teto de gastos.

A esta altura, já não há como ter dúvida de que se trata de um mal disfarçado esquema de expansão fiscal inconsequente. Simulações de dinâmica de dívida sugerem que, do manejo das contas públicas que o governo pretende adotar, decorrerá um salto de pelo menos 10 pontos percentuais na dívida bruta como proporção do PIB ao longo do atual mandato presidencial.

De menos de 73% do PIB, no final de 2022, para 83% do PIB, ou mais, ao fim de 2026.

Para atenuar resistências a tamanha expansão fiscal, o governo anunciou, no final de março, como prova de seu pretenso compromisso com a responsabilidade fiscal, que o déficit primário ficaria limitado a 0,5% do PIB em 2023, seria zerado em 2024 e convertido em um superávit de 0,5% do PIB em 2025, que chegaria a 1% do PIB em 2026.

Fernando Gabeira - O déficit zero que subiu no telhado

O Estado de S. Paulo

Não basta saber se haverá desordem fiscal ou contas no azul. É essencial saber onde estaremos num mundo transformado pelas mudanças climáticas e o avanço da revolução digital, por exemplo

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, prometia um déficit zero no Orçamento. O presidente indicou duas vezes que isso era impossível. Abriu-se uma grande discussão.

O que é melhor para o País, perguntam os economistas? Equilíbrio fiscal, baixa taxa inflacionária, crescimento estável ou garantia de uma rede de proteção social e infraestrutura? É um debate clássico, que tem raízes até no nosso inconsciente infantil, marcado pelas histórias da cigarra e da formiga e da frágil casa dos três porquinhos.

Para além da discussão puramente econômica, há outros fatores que também são discutidos ou fatores que nem aparecem no debate.

Os também clássicos temas discutidos referem-se ao comportamento de um governo em ano eleitoral. Sempre que houver um dilema entre austeridade e aumento de gastos, a tendência no período de eleições é optar pelo segundo.

Mas não é uma discussão tranquila. Há uma frase inspirada num analista americano que costuma explicar o resultado eleitoral assim: É a economia, estúpido!

Eliane Cantanhêde - O Brasil sobe o tom contra Israel

O Estado de S. Paulo

As famílias em Gaza, o uso político de ações da PF e as ações do embaixador israelense irritam Brasil

Ao usar a palavra “genocídio” para falar sobre os ataques aos palestinos em Gaza, o assessor internacional do presidente Lula, ex-chanceler Celso Amorim, deixa evidente que o governo brasileiro está subindo o tom em relação a Israel. Tem motivos para isso, inclusive o destempero e as ações, digamos, pouco diplomáticas, do embaixador do regime de Bibi Netanyahu em Brasília, Daniel Zonshine.

Em Paris, Amorim reiterou a condenação do Brasil aos ataques terroristas do Hamas e a tomada de reféns israelenses, que classificou de “atos bárbaros”, mas disse que isso não justifica “ações indiscriminadas contra civis” e foi adiante: “A morte de milhares de crianças é chocante, a palavra genocídio inevitavelmente vem à mente”.

Simon Schwartzman* - A guerra de cada um

O Estado de S. Paulo

As décadas de relativa paz que sucederam à grande guerra parecem estar se esgotando, os fantasmas voltam a assombrar e é preciso lembrar de onde viemos

Existiram um dia a Ucrânia, a Palestina, Israel, e têm direito de continuar existindo? Como? São perguntas que afloram ao ler A Ucrânia de cada um, livro organizado por Flávio Limoncic e Monica Grin na emoção da guerra fratricida da Ucrânia, publicado agora à sombra da também fratricida batalha de Gaza.

Não é um livro propriamente sobre a Ucrânia nem sobre as guerras, mas um conjunto de relatos e testemunhos de descendentes de judeus do leste europeu que sobreviveram ao holocausto e reconstruíram sua vida no Brasil e em outros países das Américas. São memórias pouco conhecidas, porque a velha geração preferia poupar os filhos das histórias de sofrimento e horror por que passou. E estes, estimulados a construir sua vida no novo mundo, olhavam para a frente, nem sempre com tempo e espaço interno para os relatos de seus pais. Agora, as décadas de relativa paz que sucederam à guerra parecem estar se esgotando, os fantasmas voltam a assombrar e é preciso lembrar de onde viemos.

Luiz Carlos Azedo - Entre o ódio e a vingança, o trauma do cerco e aniquilamento de Gaza

Correio Braziliense

O conceito de guerra justa está em xeque em razão dos sofrimentos impostos aos civis, sobretudo idosos, mulheres e crianças, além de destruição de seus lares, hospitais e escolas

Adeus às Armas, de Ernest Hemingway, publicado em 1929, é um romance quase autobiográfico, cujo protagonista é um americano que participa da Primeira Guerra Mundial como voluntário no exército italiano. É uma história de amor entre um soldado ferido na perna e uma enfermeira, que se conheceram no hospital. O relacionamento se consolidou e resultou num filho do casal, mas o soldado teve que voltar à guerra. Ao retornar, já estava exausto do conflito, como a maioria dos seus companheiros. O herói deserta. A guerra se estendia por tempo demais.

Esse tipo de situação fora comum no front da Primeira Guerra Mundial, entre soldados alemães e ingleses, que chegaram a se confraternizar no Natal e realizar animadas partidas de futebol. Com base no que ocorreu, o Estado-maior britânico desenvolveu o conceito de "sombra de futuro": os soldados procuram ganhar tempo, em ataques e retaliações quase que combinadas, à espera de que os políticos e os generais assinem um armistício. Isso acontecia entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza, até 7 de outubro passado, quando a milícia palestina realizou um inédito ataque terrorista a Israel, que matou 1.400 pessoas, das quais 828 civis e 31 crianças. Mais de 240 pessoas foram feitas reféns.

Raul Jungmann* - Novo tributo para exportar impostos e inflacionar preços

Correio Braziliense

Estudo enfatiza os efeitos do Imposto Seletivo (IS) sobre os minerais metálicos, alertando que o aumento de custos nesse setor terá implicações tanto no mercado interno quanto nas exportações

A implementação do Imposto Seletivo (IS), contida na PEC 45 da reforma tributária, pode desencadear consequências adversas para a economia brasileira, conforme evidenciado por um estudo técnico do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) e da consultoria LCA. O IS tem o potencial de afetar não apenas os setores produtivos, incluindo a indústria de mineração e o setor de óleo e gás, mas também de alimentar a inflação e prejudicar as exportações.

O estudo enfatiza os efeitos do IS sobre os minerais metálicos, alertando que o aumento de custos nesse setor terá implicações tanto no mercado interno quanto nas exportações. Setores como siderurgia, automotivo, construção civil, utilidades domésticas, alimentos enlatados e embalagens, entre outros, dependem dos minérios como matéria-prima para a fabricação de seus produtos. Assim, a mineração, as cadeias industriais, o atacado, o varejo e, finalmente, o consumidor terão que suportar o ônus do Imposto Seletivo.

Com a aprovação do IS pelo Senado Federal — apesar das argumentações contrárias e alertas apresentados pelos setores diretamente atingidos —, os senadores julgaram que mais essa conta pode ser atribuída às empresas desses setores. No caso da indústria da mineração, o Brasil poderá se tornar o único do planeta a taxar o setor com o IS, como forma de compensar seus impactos. No entanto, a mineração já recolhe uma compensação em relação a isso (chamada CFEM) e ainda detém o título de aplicar a maior carga tributária sobre 12 dos principais minérios para a economia brasileira, na comparação com países concorrentes — apontam estudos da consultoria EY (Ernst & Young).

Vinicius Torres Freire - Ruína menor da Amazônia mostra como Bolsonaro era o governo da morte

Folha de S. Paulo

Desmatamento cai 22% em um ano; parte da elite se juntou à destruição, golpe e calote bolsonarista

O desmatamento na Amazônia Legal diminuiu 22,3% em um ano, segundo a medição do sistema Prodes, diz o Inpe. Isso no ano encerrado em julho. Quer dizer, a medida inclui dados do semestre final do governo das trevas e da morte de Jair Bolsonaro.

Além disso, o esforço de controle da razia foi limitado pelo efeito da destruição institucional, quando equipes foram desmontadas, desestimuladas e sujeitas a ameaças do crime ambiental organizado, que se expandiu.

Mesmo assim, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, com Marina Silva outra vez no ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, conseguiu remediar a situação. É apenas um começo. A área desmatada ainda é equivalente ao território de seis cidades de São Paulo.

Gustavo Patu - Reforma dos impostos é histórica e incerta

Folha de S. Paulo

Maior mudança tributária em quase 60 anos seguirá sujeita a lobbies contrários

A reforma dos impostos que se aproxima da aprovação no Congresso será tratada, com bons argumentos, como histórica. A última mudança tributária de tal profundidade, afinal, foi promovida em 1965, sob os fuzis da ditadura militar.

Trata-se de intervir na mais básica relação entre os cidadãos e o poder público, o que impulsionou não poucas insurreições e revoluções ao longo da evolução do Estado.

Fazê-lo em uma democracia, e sobretudo em um país de forças políticas tão fragmentadas, é um feito raríssimo —e, pelos mesmos motivos, ainda incerto.

A reforma em curso parte de um diagnóstico quase consensual na academia, no empresariado, na administração pública e no meio político. A convergência se desfaz, porém, quando se avança da teoria à prática.

Marcos Augusto Gonçalves - Einstein, Freud, a guerra e os chimpanzés

Folha de S. Paulo

Diálogo entre os dois gênios ressalta pulsões destrutivas ancestrais

Em 1932, a Liga das Nações convidou Albert Einstein, já então um gigante da física, a escolher uma personalidade intelectual de vulto para questioná-la sobre o tema da guerra. Einstein aceitou a proposta e decidiu dirigir suas inquietações a Sigmund Freud, como ele um grande desbravador do desconhecido –no caso, a mente humana.

Em recente e boa coluna na FolhaCida Bento rememorou o episódio. Vou retomá-lo aqui, pois é rico em facetas e merece ser revisitado. Além do mais, eu gostaria de ligá-lo aos chimpanzés.

Em 1932, o mundo vivia a ressaca da Primeira Guerra e as apreensões quanto às perspectivas de um novo conflito. Em sua carta, Einstein (como Freud, filho de família judaica) aventou possíveis soluções racionais para preservar a paz, como a organização de um hipotético tribunal de nações ao qual todos se submeteriam. Ele mesmo, contudo, tratou de apontar a impossibilidade de que tais arranjos institucionais pudessem funcionar ao menos àquela altura.

André Roncaglia* - O apagar das luzes do neoliberalismo

Folha de S. Paulo

Serviços de utilidade pública requerem uma visão integrada e de longo prazo.

Na mais rica cidade do país, mais de 2 milhões de pessoas ficaram sem energia elétrica na semana passada. Desde 2018, o fornecimento de eletricidade na cidade e em outros 23 municípios da região metropolitana de São Paulo é feito pela Enel, empresa de economia mista controlada pelo Estado italiano (23,8% do capital).

Apesar dos bilhões em investimentos anunciados pela empresa desde 2020, a qualidade relativa do atendimento ficou inalterada, de acordo com o ranking de continuidade de serviço da Aneel, cujo rigor deixa muito a desejar. Ademais, gastos insuficientes com redução de riscos e manutenção da rede de distribuição já levantavam dúvidas sobre a capacidade de resposta a emergências.

Os cortes de 43% nos investimentos em manutenção no segundo trimestres de 2023 —e de 28%, em relação ao segundo trimestre de 2022— ajudaram a engordar os lucros da monopolista Enel na Grande São Paulo. Os valores de R$ 1,4 bilhão em 2022 e de R$ 900 milhões, no primeiro semestre deste ano, poderiam ter sido destinados, em parte, a enterrar a fiação aérea. Como o contrato de concessão não exige esse investimento, o dinheiro vai parar nos cofres do governo italiano.

Hélio Schwartsman - De exceção em exceção

Folha de S. Paulo

Brasil tende a adiar reformas e a perenizar privilégios

aprovação da Reforma Tributária pelo Senado deve ser celebrada, mas não dá para deixar de observar o padrão, que é inequívoco. Depois que especialistas chegam a um razoável consenso técnico sobre a necessidade de uma reforma estrutural, o Parlamento passa uma ou mais décadas só flertando com ela. Quando os legisladores finalmente se decidem a aprová-la, sarapintam-na com tantas salvaguardas e exceções que, se não a desfiguram, reduzem muito de sua potência. Foi assim com as várias reformas da Previdência; está sendo assim com a Tributária.

Ruy Castro - Recado a Lula

Folha de S. Paulo

Saibam os bolsonaristas que, a partir de agora, estou de olho no homem e não pretendo dar-lhe boa vida

Às vezes, pela maneira levemente brusca com que me refiro a Bolsonaro neste espaço, alguns de seus devotos me acusam de fazer vista grossa para as bandalheiras de Lula, por quem teria sido hipnotizado. Sem que isso tenha a menor importância, informo que almocei várias vezes com um ex-presidente (Juscelino), bebi com outro (Janio) e tenho dois outros como confrades na ABL (Sarney e FHC). De calças curtas e dedo no nariz, estive também a dois metros da cama, no Catete, onde Getulio se sentou para dar aquele tiro no peito. Foi poucos meses depois do dito tiro, assim que abriram o quarto ao público, e saí de lá assobiando. Devo ser difícil de hipnotizar.