quarta-feira, 6 de março de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Superterça consagra reprise de 2020 nos EUA

O Globo

Trump começa disputa como favorito, mas Biden ainda dispõe de oito meses para convencer o eleitor

Realizadas ontem, as 15 disputas republicanas e 16 democratas que formam o maior conjunto de prévias no calendário eleitoral americano — coletivamente chamadas de Superterça — em nada mudaram as projeções. O presidente Joe Biden e o e ex-presidente Donald Trump seguem rumo à confirmação de suas candidaturas nas convenções e deverão disputar a eleição em novembro. Entre os democratas, não há sombra para Biden. Nikki Haley, ex-governadora da Carolina do Sul, não provou ser páreo para Trump, força hegemônica entre os republicanos. Salvo motivo de força maior, o pleito de 2024 será uma reprise de 2020.

Desta vez, Trump larga na frente. Na média das pesquisas nacionais, ele aparece 2 pontos à frente de Biden. Entre os seis estados considerados decisivos, apenas na Pensilvânia Biden leva pequena vantagem. Nos demais — Arizona, Georgia, Michigan, Nevada e Wisconsin —, Trump lidera. Para completar, ele celebrou nesta semana uma vitória fundamental na Suprema Corte: por unanimidade, os juízes derrubaram a decisão do Judiciário do Colorado que tirara seu nome das cédulas do estado, sob a acusação de ter participado da “insurreição” de 6 de janeiro de 2021. Com isso, acabou a esperança da ala do Partido Democrata que esperava vê-lo desqualificado pela Justiça.

Vera Magalhães - Na política, não se vence pelo cansaço

O Globo

Haddad insistiu em MP 'natimorta' e não conseguiu suprir a interdição de diálogo entre a Câmara e a articulação política do governo

Fernando Haddad foi o grande destaque positivo no ministério de Lula no primeiro ano do terceiro mandato. Venceu prognósticos negativos para a economia, surpreendeu aqueles que esperavam que ele cerrasse fileiras com a defesa da gastança desenfreada e teve coragem de colocar em curso uma agenda para reduzir benefícios setoriais que reduziam a capacidade arrecadatória da União.

Não menos notável foi uma mudança de estilo do titular da Fazenda: abandonou o tom professoral com que muitas vezes tentou justificar suas ideias na Prefeitura de São Paulo e arregaçou as mangas da negociação política com o Congresso, considerada por aliados e vereadores na encarnação anterior um de seus pontos fracos.

Mas, com a Medida Provisória 1.202, o ministro teve uma espécie de “recaída” na teimosia que lhe era atribuída antes de chegar à pasta. O resultado tem sido atraso na implementação de sua própria agenda e a necessidade de recuos que o enfraquecem quando ele mais precisa sair fortalecido.

Elio Gaspari - O golpinho de Bolsonaro

O Globo

A mesa não virou porque a voz das urnas foi respeitada

A exumação da tentativa de golpe de Estado de Jair Bolsonaro corre o risco de se transformar num teatro do absurdo, com a reconstrução de algo que não houve. Uma mistura da trama da peça “Esperando Godot”, de Samuel Beckett, com o poema “À espera dos bárbaros”, de Konstantinos Kaváfis. Godot não chega, nem os bárbaros, mas tanto a peça como o poema são obras-primas.

O golpinho de Jair Bolsonaro bebeu na fonte do golpe de Getúlio Vargas, em 1937. Este foi impecável.

Primeiro Vargas mandou um emissário aos governadores de sua confiança. Depois, pediu ao ministro da Justiça, Francisco Campos, que redigisse uma nova Constituição. Finalmente, armou o esquema militar com o ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra, e o condestável do Exército, general Góes Monteiro. Dado o golpe, arrasou as instituições políticas e instalou o Estado Novo, que duraria oito anos.

Bernardo Mello Franco – A ocorrência de um infortúnio

O Globo

Ministro viu "ameaça imaginária" e alegou "infortúnio" em fuzilamento de inocentes no Rio

Aconteceu em 2019, na Zona Norte do Rio. Numa tarde de domingo, militares metralharam um Ford Ka com duas mulheres e uma criança a bordo. A ação matou o músico Evaldo Rosa, que levava a família a um chá de bebê, e o catador Luciano Macedo, que passava pelo local e tentou socorrê-lo.

Em poucas horas, o Comando Militar do Leste deu o caso por encerrado. Chamou as vítimas de “criminosos” e “assaltantes” e disse que os soldados teriam reagido a uma “injusta agressão”.

Quando a farsa ficou evidente, o então ministro da Defesa prometeu “cortar na carne”. Em 2021, oito militares foram condenados em primeira instância por duplo homicídio. Na última quinta-feira, o Superior Tribunal Militar abriu caminho para livrá-los de pagar pelo crime.

Vera Rosa - Centrão se articula para enfrentar Lula

O Estado de S. Paulo

Plano de superfederação embute estratégia para lançar uma candidatura contra o PT em 2026

Enquanto as investigações sobre a tentativa de golpe no País atingem o ex-presidente Jair Bolsonaro, o Centrão se articula para ficar mais turbinado e dar as cartas da direita na próxima disputa pelo Palácio do Planalto, em 2026.

O plano dos principais partidos do grupo (PP, União Brasil e Republicanos) de formar uma superfederação tem na mira não apenas a eleição para o comando do Congresso, daqui a 11 meses, como o fortalecimento do trio para enfrentar a provável candidatura do presidente Lula à reeleição. Juntas, as três siglas controlam cinco ministérios e estão de olho na pasta da Saúde, que tem orçamento de R$ 232,06 bilhões.

César Felício - Depoimento pode não bastar para condenar ex-presidente

Valor Econômico

No campo jurídico, é possível que a defesa do ex-presidente argumente sobre a diferença técnica entre tentativa de crime, ato preparatório para um delito e a sua cogitação

Partindo do pressuposto de que o general Marco Antonio Freire Gomes, ex-comandante do Exército no fim da gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, confirmou em seu longo depoimento a discussão de uma minuta de golpe de Estado com o próprio chefe, a situação jurídica de Bolsonaro se complica, mas com zonas de incerteza. No campo político, os militares saem da armadilha em que estavam colocados.

Em relação ao campo jurídico, é possível que a defesa do ex-presidente tente levantar uma discussão sobre a diferença técnica entre tentativa de crime, ato preparatório para um delito e a sua simples cogitação.

Um presidente da República chamar os comandantes das três Forças para discutir uma minuta que prevê a abolição violenta do Estado Democrático de Direito configura em si ilícito? O senso comum diz que sim, o mundo político pode entender que sim, mas uma discussão no Judiciário deve ser colocada.

Fernando Exman - Trabalho por aplicativos na agenda dos três Poderes

Valor Econômico

Lula espera reconhecimento pelo esforço do governo para a criação do que chama de “nova modalidade no mundo do trabalho”

O dia 4 de março de 2024, diz o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ficará para a história como uma data “muito diferente”. Pode ser.

Ele espera que isso ocorra quando for reconhecido o esforço liderado pelo governo para a criação do que chama de “nova modalidade no mundo do trabalho”. Guardando as devidas proporções, está nos livros o discurso feito em São Januário pelo ex-presidente Getúlio Vargas em 1º de maio de 1943, ano do estabelecimento da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Mas o “mundo do trabalho” era outro. E guardando as devidas proporções futebolísticas, o estádio do Vasco da Gama também era um dos maiores da América do Sul. Além disso, ainda há um longo caminho até que o trabalho por aplicativo seja definitivamente regulamentado.

Lu Aiko Otta - Os próximos passos da taxação dos super-ricos

Valor Econômico

Nos bastidores do Ministério da Fazenda, comemora-se a boa recepção internacional à proposta

Nos bastidores do Ministério da Fazenda, comemora-se a boa recepção internacional à proposta de se criar uma taxação mínima global sobre os super-ricos, apresentada na semana passada, durante a reunião de ministros de finanças e presidentes de bancos centrais do G20. Ao apadrinhar um tema de grande apelo popular mundo afora, o ministro Fernando Haddad cravou uma marca para a presidência brasileira no bloco das principais economias do planeta.

Mas esse foi, basicamente, um balão de ensaio: a proposta ainda precisa ganhar carne e osso, e só então eventuais resistências aparecerão.

O ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel foi taxativo em sua conversa com a coluna: “Não tem a mais remota possibilidade de prosperar”.

Zeina Latif - Ouvidos moucos para o rombo da previdência

O Globo

O atual governo evita o tema e defende apenas o 'pente-fino' nos benefícios do INSS

A necessidade de uma nova reforma da Previdência voltou ao radar de especialistas. Vale lembrar que o Brasil gasta cerca de 12% do PIB com a Previdência (total), cifra observada em poucos países, mais ricos e mais velhos — na média da OCDE, a despesa é cerca de 8% do PIB.

A retórica oficial acerca da reforma de 2019 era grandiosa. Certamente foi um passo largo, mas naturalmente insuficiente.

Falava-se em “economizar” R$ 800 bilhões em dez anos. Não é bem assim. Tratava-se, na verdade, de medida para conter o crescimento de gastos previdenciários em um país que envelhece rapidamente. E, lamentavelmente, a reforma elevou a judicialização.

Vinicius Torres Freire - A guerra dos impostos de Haddad

Folha de S. Paulo

Ministro recua, perde tempo político e tem agenda pesada em ano curto e de ambiente mais azedo

No último dia útil de 2023, o governo baixou uma medida provisória politicamente temerária a fim de aumentar ou evitar a perda de receitas, tentando em especial obter mais dinheiro de empresas.

Como previsto, Fernando Haddad apanhou, recuou e teve de renegociar as providências, que voltarão ao Congresso por meio de projetos de lei, fora o desgaste político e o atraso adicional no ano legislativo.

"Adicional": as lideranças parlamentares do centrão dominante criavam encrenca porque queriam em primeiro lugar emendas, mais dinheiro para emendas, cargos e cabeças de ministros e secretários, "business as usual".

Paul Krugman* - Diferentes taxas de inflação para diferentes classes sociais

Folha de S. Paulo

Há boas razões para acreditar que a inflação recente tem sido pior para pessoas de renda mais baixa

Na minha coluna mais recente, diverti-me um pouco com Donald Trump fazendo uma afirmação que mostra que ele não voa em aviões comerciais há muito tempo —dizendo que os terríveis aeroportos dos Estados Unidos nos fazem parecer uma nação do terceiro mundo.

Acontece que, alguns dias atrás, voei para o novo Terminal A do Aeroporto Internacional de Newark, o que me fez perceber algo óbvio para quem voou comercial nos últimos anos: os aeroportos dos EUA de fato estão muito mais sofisticados.

Eu certamente preferiria voar para Newark do que para muitos aeroportos europeus onde ainda é necessário pegar um ônibus do avião até o terminal.

Mas isso me fez pensar. Por que os aeroportos dos EUA têm tantas comodidades a mais do que costumavam ter? (A experiência de voar ainda pode ser deprimente por causa das filas de segurança, mas isso é outra questão).

A resposta óbvia é que eles estão atendendo à sua clientela, mas isso certamente sempre aconteceu.

Martin Wolf* - O perigoso excesso de poupança da China

Valor Econômico

Pequim deve ousar escolher remédios radicais

China é a superpotência global da poupança. No passado, em uma economia em rápido crescimento com oportunidades de investimento excelentes, suas altas poupanças foram um grande ativo. Mas também podem causar grandes dores de cabeça.

Hoje, com o fim do boom imobiliário, gerenciá-las se tornou um desafio. O governo chinês deve ousar escolher remédios relativamente radicais.

De acordo com o FMI, a China gerou 28% da poupança global total em 2023. Apenas um pouco menos do que a participação de 33% dos EUA e da UE combinados. Isso é bastante extraordinário.

Também tem várias implicações. Uma delas é que se a China fosse uma economia de mercado aberto, seus mercados de capitais seriam os maiores do mundo. Outra é que a forma como essa poupança é gerenciada provavelmente será o determinante mais importante das taxas de juros globais e do balanço de pagamentos globais.

Luiz Carlos Azedo - Política antidrogas é ultrapassada e realimenta o tráfico

Correio Braziliense

Portugal e França, que incluiu o direito ao aborto na Constituição, são exemplos a serem estudados no campo das políticas contra a violência

O Supremo Tribunal Federal (STF) retoma, nesta quarta-feira, o julgamento sobre a "descriminalização" da maconha para uso pessoal, sob forte pressão da bancada evangélica, que, nesta terça-feira, se reuniu com o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso. Pautado pela ex-presidente do STF Rosa Weber, a Corte está a apenas um voto de decidir a questão. Nesta terça-feira, Barroso afirmou que não haverá "descriminalização", mas uma definição de critério objetivo e universal para distinguir os usuários dos traficantes.

A medida é importante para reduzir o encarceramento em massa e evitar prisões sem justificativa relevante de moradores da periferia, principalmente pessoas negras, que recebem tratamento diferente dos dados a indivíduos brancos e de classe média flagrados portando drogas. Segundo o ministro Alexandre de Moraes, na ausência de uma definição legal da quantidade permitida por usuário, a polícia adota parâmetros arbitrariamente, por conta própria. Moradores da periferia com 10 gramas de maconha são presos enquanto nos bairros de classe média há casos de usuários liberados com mais de 100 gramas.

Muniz Sodré* - Borracha no futuro

Folha de S. Paulo

As massas acordaram para a experiência política, mas sob formas perversas, captadas pela extrema direita

Um estudo revela que 13 milhões de brasileiros deixaram de passar fome em 2023, o custo alto dos alimentos desacelerou, a economia obtém ganhos, a vida democrática supera os sobressaltos, mas decresce a avaliação positiva de Lula (PT). Algo semelhante ocorre nos EUA, onde esses fatores estão normalizados, porém, cresce nas preferências eleitorais a figura de Trump, um delinquente polimorfo. Na Argentina, 60% da população esfomeia, mas é elevado o índice de aprovação de Milei. Na alucinação, osso é filé.

São anomalias. Começa a ficar claro que elas reabrem de algum modo a noção de política. Por menos práticos que sejam pronunciamentos políticos de filósofos, vale evocar as posições públicas de Jurgen Habermas nos anos 1980 contra o neoconservadorismo irracionalista na Alemanha, assim como a sua especulação de que "se tivesse de apostar qual o próximo país que se tornaria fascista, minha aposta poderia ser: os EUA". Sem bola de cristal, anteviu Trump.

Hélio Schwartsman - Proteção contra o legislador

Folha de S. Paulo

Existem níveis de intimidade que devem estar ao abrigo até da caneta dos parlamentares

Supremo Tribunal Federal retoma nesta quarta-feira (6) o julgamento da ação que pleiteia a descriminalização de drogas para uso pessoal. É quase certo que a corte acatará o pedido em relação à maconha (falta apenas um voto). Em reação, o Senado se prepara para votar uma PEC que torna crime a posse de qualquer quantidade de drogas.

A queixa dos parlamentares é que o Supremo, com esse tipo de decisão, estaria criando normas e, portanto, usurpando prerrogativas do Legislativo. Minha leitura é diferente. Alguém precisa evitar que o Parlamento usurpe prerrogativas do cidadão —e esse alguém só pode ser o Judiciário. Existem níveis de privacidade e de intimidade que devem estar ao abrigo até do legislador. "Sobre si mesmo, o seu corpo e sua mente, o indivíduo é soberano", escreveu John Stuart Mill.

Fernando de la Cuadra* - Las luchas de Marielle Franco permanecen más vigentes que nunca

El próximo 14 de marzo se cumple un año más (6 años) desde que Marielle Franco y Anderson Gomes fueron alevosamente asesinados en una calle del barrio de Estácio, región central de Rio de Janeiro. Los dos matadores, Ronnie Lessa, Élcio Vieira de Queiroz y el ex bombero Maxwell Simões Corrêa, continúan presos a la espera del juicio que será realizado con la participación de un jurado popular. A ellos se agregó en esta última semana, el nombre de Edilson Barbosa dos Santos, denunciado por haber desmontado y destruido el auto Cobalt blanco utilizado por los homicidas.

Qué se sabe hasta ahora con relación a la pregunta que desde hace mucho tiempo viene incomodando a la justicia, los investigadores policiales, la prensa y la opinión pública: ¿Quién mandó matar a Marielle Franco y por qué? A partir de la delación premiada efectuada en noviembre del año pasado por el autor de los disparos a la concejala y su chofer, el ex policial militar Ronnie Lessa, se espera que en los próximos días sea difundido oficialmente – por el Director de la Policía Federal – el nombre del o los mandantes del asesinato y las razones que tuvo o tuvieron para encomendar este atentado.