sábado, 10 de agosto de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Transparência é base do gasto público

Correio Braziliense

Flávio Dino, do STF, acerta ao determinar uma auditoria nas emendas do Congresso liberadas desde 2020. Na avaliação do ministro, não há como saber se os recursos das emendas Pix são, de fato, aplicados naquilo que se destina

O Orçamento da União é muito importante para a sociedade, porque contém medidas que afetam diretamente nosso dia a dia. É nele que se encontram os aportes de dinheiro a programas públicos, redução ou aumento de verbas para determinados setores e a previsão de quanto deve ser gasto a cada ano pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

A elaboração do Orçamento segue regras constitucionais, denominadas princípios orçamentários, estabelecidas em 1964 — portanto, há seis décadas —, para padronizar e garantir que os recursos públicos sejam utilizados da forma mais correta. Foram criadas para garantir eficiência, racionalidade e transparência na hora de decidir a aplicação do dinheiro público. Isso evita crises orçamentárias, nas quais o governo não consiga honrar seus compromissos, como o pagamento das aposentadorias.

A Constituição Federal, a Lei 4.320/64 (Lei de Finanças Públicas), a Lei 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e as Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDOs) obedecem a esses princípios. Graças a eles, principalmente à transparência, os cidadãos podem se organizar e controlar a execução orçamentária. 

Cristovam Buarque - Mesa, escola e bola

Veja

A desigualdade na qualidade do ensino ainda domina o jogo

O presidente Lula demonstra indignação com a realidade das famílias sem comida farta à mesa nem diploma universitário na parede. Daí sua ênfase no ProUni, nas cotas, no Fies, na abertura de universidades públicas e no apoio às particulares. Graças a ações como essas, o Brasil mudou o perfil racial e social da população com acesso ao ensino superior. Porém, a desigualdade educacional conforme a renda e o endereço do aluno não diminuiu. Apesar dos avanços na democratização da educação, aumentou a distância entre pobres e ricos quando comparamos a qualidade do ensino.

Oscar Vilhena Vieira - A dupla face do Supremo

Folha de S. Paulo

Não é hora de a corte recuar no exercício de suas funções

Duas são as funções fundamentais de tribunais e cortes constitucionais em regimes democráticos: habilitar a vontade da maioria e ao mesmo tempo defender os direitos das minorias.

A função habilitadora da vontade da maioria está associada à proteção das regras do jogo democrático. Para que a vontade da maioria possa florescer, os canais institucionais de representação e participação não podem estar obstruídos; as regras eleitorais devem assegurar iguais oportunidades aos cidadãos; as eleições precisam ser conduzidas com honestidade; o direito à informação, à liberdade de expressão e oposição devem ser assegurados; por fim, os eleitos devem se conformar ao império da lei.

A função contramajoritária está, por sua vez, associada à defesa dos direitos essenciais de minorias —especialmente aquelas vulneráveis e historicamente discriminadas— em face de ataques de maiorias circunstanciais ou de governos arbitrários.

Carlos Andreazza - ‘Direito adquirido’ para assaltar a Constituição

O Estado de S. Paulo

Com atraso, Dino agiu contra emendas Pix. Os Imperadores do Congresso não gostaram

Flávio Dino decidiu – com atraso – tomar providências contra o orçamento secreto e seu mais sofisticado desenvolvimento, a emenda Pix. Os imperadores do Congresso não gostaram. O poder anômalo de Arthur Lira, Davi Alcolumbre e seus elmares deriva da forma opaca e autoritária como dispõem de fundos orçamentários.

Natural que reagissem. Em várias frentes. Numa delas, o presidente da Comissão Mista de Orçamento, Júlio Arcoverde, informou que não votará a Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2025 neste agosto. Só depois das eleições. Arcoverde é do PP do Piauí. É Lira e Ciro Nogueira.

O governo tem de enviar a proposta de Lei Orçamentária até 31 de agosto. Tudo o mais constante o fará sem as balizas da LDO. Não se trata apenas de retaliação a Lula – que os donos do Parlamento consideram manobrar por meio de Dino. Retalia-se a constituição do Orçamento da União, donde o planejamento estatal, de modo a ganhar tempo; para que se possa formular-negociar de que maneira será novamente burlada uma determinação do Supremo sobre o orçamento secreto.

Alvaro Costa e Silva - Cria cuervos

Folha de S. Paulo

Candidatos linha-dura têm planos bélicos para guardas civis

Investigado por espionar o STF e a Receita e atacar o sistema eleitoral, Alexandre Ramagem perdeu a alcunha. Na hora de pedir votos à Prefeitura do Rio, não será mais o "delegado". A decisão de retirar o termo se justifica, segundo os marqueteiros, para não ferir a sensibilidade de quem vive nas favelas. Parece piada. Quando a campanha não engrena, inventa-se um factoide. Mentiras que não fazem o menor sentido e não enganam ninguém.

O PL, partido de Ramagem, arregimentou uma escuderia de policiais militares, delegados, militares do Exército e até mesmo guardas municipais para formar as chapas que vão concorrer a prefeituras das capitais sem nem sequer pensar em favelados. As escolhas tiveram interferência direta de Bolsonaro, o cabo eleitoral que é dono da sigla.

Hélio Schwartsman - Na pessoa de...

Folha de S. Paulo

Decisão do TCU sobre caso de Lula visa a aliviar situação de Bolsonaro, mas não deve mudar muito a situação penal

Quem costuma presenciar discursos oficiais deve estar familiarizado com a expressão "na pessoa de...". É o artifício retórico de que oradores se valem para, referindo-se apenas à figura mais ilustre ali presente, estender suas homenagens a todos os que ela representa: "na pessoa do doutor Fulano de Tal, eu saúdo a todos os professores aqui reunidos".

Algo parecido vale para as trocas de presentes entre autoridades. Quando potentados árabes regalaram Jair Bolsonaro com mimos em valores de milhões de reais, estavam presenteando o povo brasileiro "na pessoa de seu presidente".

Carlos Góes - Como as economias morrem

O Globo

Como gritar em defesa da democracia, como na última eleição, quando se toma o lado de um Estado autoritário?

Nas últimas semanas, a Venezuela voltou aos noticiários. O chavismo reivindicou vitória enquanto a oposição divulgou mais de 70% dos relatórios de urnas e denunciou fraude. Desta vez, importantes figuras da esquerda sul-americana, como os presidentes chileno Gabriel Boric e o colombiano Gustavo Petro, se recusaram a reconhecer o resultado das eleições.

Mas a deterioração político-econômica da Venezuela não ocorreu do dia para a noite. Na esfera política, o país se encaixa bem na categorização dos cientistas políticos Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, no best-seller “Como as democracias morrem” (Ed. Zahar, 2018) sobre processos de colapso democrático.

Segundo os autores, o colapso começa com a eleição de um líder autoritário, passa pela concentração e abuso do poder nas mãos desse líder e termina com a repressão explícita da população.

Pablo Ortellado - Desinformação como bode expiatório

O Globo

Reino Unido recebe muitos imigrantes e isso gera um incômodo enorme

A desinformação é um problema real. Muitas vezes, porém, é utilizada para não olhar para problemas sociais difíceis, fazendo parecer que a principal causa deles é a difusão de mentiras.

Há dez dias o Reino Unido assiste a protestos anti-imigração cada vez mais violentos em resposta a um ataque à faca contra crianças na cidade de Southport, norte da Inglaterra. No dia 29 de julho, um adolescente de 17 anos invadiu uma oficina de dança e ioga para crianças e esfaqueou 11 crianças e dois adultos, matando três meninas. O crime bárbaro, que teve como alvo um grupo de meninas de 6 a 11 anos, chocou o país. O agressor foi imediatamente preso pela polícia, ainda na cena do crime, e sua identidade não foi revelada em respeito às leis que garantem o anonimato de menores acusados de crimes.

Eduardo Affonso - Ao vencedor, a reverência

O Globo

Reduzem Beatriz Souza a ‘preta gorda’. Ela é também uma militar heterossexual, mas esse recorte não interessa

‘A arte de perder não é nenhum mistério’, escreveu Elizabeth Bishop no mais famoso dos seus poemas. Mas é uma arte que exige grandeza. Muita. Que o digam Simone Biles e Jordan Chiles, capazes de transformar a perda da medalha de ouro para Rebeca Andrade num dos momentos mais bonitos destes Jogos Olímpicos de Paris.

O que houve ali não foi a oficialização de uma vitória e duas derrotas, como em tantos pódios — destinados, por banais, ao esquecimento. Aconteceu o reconhecimento da excelência, da competição saudável e (lá vêm os inevitáveis clichês...) a celebração do espírito olímpico, o regozijo pela superação dos próprios limites.

Carlos Alberto Sardenberg - Uma praia para Maduro?

O Globo

Ditador só largará o osso se perceber que ficará tão isolado a ponto de isso inviabilizar seu regime. Ou se notar que corre o risco de ser traído

Da revista The Economist: “O mundo tem uma última coisa a oferecer: uma saída segura para Maduro e seus camaradas mais próximos, proporcionando-lhes uma vida confortável numa praia brasileira ou caribenha, possivelmente com imunidade a processos judiciais. Isso revoltaria aqueles que querem ver Maduro enfrentar a Justiça em Haia. Mas é um preço que vale a pena pagar para evitar derramamento de sangue e começar a reconstruir a Venezuela”.

A sugestão aparece em texto desta semana. É uma saída, mas, claro, exige um tremendo arranjo diplomático. Brasil, México e Colômbia, que já se candidataram ao papel de mediadores, poderiam trabalhar nisso.

Exige também uma forte pressão sobre Maduro — e aqui reside a questão central: o governo Lula teria disposição, primeiro, e condições, depois, de exercer essa pressão?

Demétrio Magnoli - Um funeral em Caracas

Folha de S. Paulo

Gesto brasileiro por reunião com opositora de Maduro formaria um anel de proteção

Inutilmente, Lula exibiu-se como mediador ideal na Ucrânia e no Oriente Médio, esferas fora do alcance da política externa brasileira. A prova de fogo chegou na Venezuela, desenrolando-se como espetáculo humilhante: em Caracas, junto com a esperança de transição democrática, enterra-se a credibilidade da palavra do Brasil.

Celso Amorim fala como enviado diplomático de Maduro ao mundo democrático. "A oposição coloca dúvidas, mas não consegue provar o contrário." Falso: a oposição publicou as atas de votação escondidas pelo ditador —e a autenticidade delas foi confirmada por especialistas independentes.

Bolívar Lamounier - Um espelho para Maduro

O Estado de S. Paulo

A diferença entre a transição da África do Sul e a estupidez em que os adeptos de Maduro insistem em permanecer é que a elite sul-africana assimilou uma noção racional de política

A política brasileira não chega a ser um brilho, mas nela o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, encontraria um roteiro bem melhor do que o que vem seguindo para sair de sua enrascada.

O Brasil, após 21 anos, soube equacionar uma saída para o ciclo militar iniciado em 1964. Foi o que se pode apropriadamente denominar uma “abertura pela via eleitoral”. De eleição em eleição, à frente de oposições agrupadas no então Movimento Democrático Brasileiro (MDB), encantoou e venceu a candidatura apoiada pelos militares no Colégio Eleitoral, geringonça que eles haviam montado logo no início justamente para impedir que um oposicionista chegasse à Presidência da República. Justiça lhes seja feita, eles foram sábios em três pontos cruciais: 1) preservaram em linhas gerais o processo eleitoral, mesmo tendo-o manipulado diversas vezes e de diversas maneiras; 2) reconheceram a legitimidade dos votos oposicionistas; 3) aceitaram a vitória final de Tancredo Neves sobre Paulo Maluf na contenda de janeiro de 1985.

André Barrocal - Luz nas sombras

CartaCapital

A investida do STF contra o ‘orçamento secreto’ é o prenuncio de um vendaval político e favorece Lula no congresso

Na eleição, o presidente Lula chamou mais de uma vez de “excrescência” o “orçamento secreto”, aquela invenção do Congresso na era Bolsonaro para controlar bilhões de reais sem ter de prestar muita conta a ninguém. Chegou a comentar em um debate em Brasília que o tal “mensalão” causou “um tremendo carnaval” e o “orçamento secreto”, não. “O presidente não tem poder sobre o orçamento, é a Câmara dos Deputados que dirige o orçamento”, disse. Eleito, Lula viu o Supremo Tribunal Federal decretar a morte dos sigilos às vésperas de tomar posse, com o voto decisivo de Ricardo Lewandowski, hoje ministro da Justiça. Voto dado um dia após Lula receber em um hotel, para uma conversa pouco amigável, o presidente da Câmara, deputados Arthur Lira, comandante em chefe do “orçamento secreto” juntamente com o senador Davi Alcolumbre.

Luiz Gonzaga Belluzzo e Manfred Back - O cachorro abana o rabo

CartaCapital

A crise iniciada no Japão revela o caráter desestabilizador dos capitais inflados pelos derivativos locais

O artigo da terça-feira 6 na Folha de S.Paulo, do jornalista José Paulo Kupfer, teve a saudável ousadia de explicar o papel dos mercados futuros – derivativos – nas fortes flutuações do câmbio no Brasil.

Peço licença para discordar do refrão reproduzido pelo competente jornalista, “o rabo abana o cachorro”. Não se trata de o rabo abanar o cachorro. É o rabo do cachorrão-dólar que move o cachorrinho real.

Talvez possa ser conveniente designar a concentração das posições “compradas” na moeda de Tio Sam no mercado futuro de câmbio em Terra ­Brasilis como “fuga para dentro”. Correm para o dólar, operando em reais.

Na segunda-feira 5 de agosto, o mercado acordou com uma queda de 12% da Bolsa japonesa, o pânico nas praças financeiras espalhou-se cheio de dúvidas. Recessão americana ou Circuit Breaker mental?

Marcus Pestana - O mundo de cabeça para baixo

A ferro e fogo, não é possível alimentar otimismo em relação ao mundo atual. Tudo parece de pernas para o ar.

O Reino Unido embarcou na aventura do Brexit, bandeira patrocinada pelos conservadores liderados pelo populista Boris Johson. Deu no que deu, a crise social e econômica se instalou em escala maior da que já seria natural em função da pandemia (2020) e da crise energética (guerra da Ucrânia). O Partido Conservador se desgastou, não entregou o prometido. A oposição trabalhista promoveu sua reinvenção com a superação das ideias anacrônicas e atrasadas da ala esquerda dominante e produziu um giro ao centro. Com isso, deu uma goleada nas eleições. Assumiu o primeiro-ministro, Keir Starmer, há poucas semanas, com uma agenda moderada e reformista. Que ótimo! A poeira baixou? Ledo engano. Nada disso. As ruas do Reino Unido ardem em protestos violentos contra os imigrantes, particularmente os de origem islâmica.

Marcus Cremonese* - Sobre as frequentes "facadas" virtuais...

Em 13 de abril passado um homem acometido de uma crise de esquizofrenia matou a facadas seis pessoas em um shopping centre de Sydney, Austrália. Dois dias depois, num outro bairro desta mesma cidade – e durante uma missa – um jovem esfaqueou um bispo e um padre de uma igreja Cristã Ortodoxa Assíria, por "motivação religiosa", segundo a polícia.

O primeiro caso foi imediatamente tratado por dezenas de portais como sendo "o ataque de um islamista ocorrido num bairro de judeus". O homicida, um australiano, foi abatido por uma policial que tentou impedi-lo.

No segundo, o delinquente foi preso pela polícia. Como a missa estava sendo transmitida online, além de policiais o esfaqueamento levou cerca de duas mil pessoas para o redor da igreja. No confronto, vários carros da polícia foram danificados e alguns agentes foram feridos, já que os presentes queriam executar ali mesmo o esfaqueador. Defendido pela polícia, ele ainda aguarda julgamento.