sábado, 11 de fevereiro de 2023

Pablo Ortellado - Chance de regular as mídias sociais

O Globo

A regulação europeia cria um precedente oportuno

Depois dos eventos de 8 de janeiro, formou-se o consenso de que as mídias sociais e os aplicativos de mensagem precisam de regulação. Mas iniciativas concorrentes e desarticuladas do Legislativo e do Executivo podem desperdiçar a oportunidade que se abriu para uma regulação robusta, amparada pela experiência internacional.

Logo depois do 8 de Janeiro, o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, e o ministro da Justiça, Flávio Dino, anunciaram separadamente iniciativas legislativas para regular as mídias sociais.

Lira anunciou que retomaria a tramitação do PL 2630, conhecido como PL das Fake News, uma proposta elaborada pelo Senado no começo do governo Bolsonaro, que empacou na Câmara, cercada de controvérsias. O projeto do Senado foi aperfeiçoado pelo trabalho cuidadoso do relator Orlando Silva (PCdoB-SP), mas também limitado e distorcido pelo lobby das plataformas de mídia social e pelas condições políticas de uma Câmara alinhada com o governo Bolsonaro.

Eduardo Affonso - Eu, máquina de escrever sozinha

O Globo

A I.A. se encarrega de encadear assuntos e preparar um rascunho. Adeus, angústia diante da tela em branco

Todo avanço tecnológico implica uma reação de igual intensidade, em sentido contrário, por parte de quem acha que perderá o ganha-pão. Foi assim que os acendedores de lampiões receberam a chegada da luz elétrica. Ou que os fabricantes de ficha telefônica viram o advento do celular. Com a inteligência artificial não havia por que ser diferente.

O que acontece a um escritor quando aparece uma “máquina de escrever” que, diferentemente das Remingtons e Olivettis da nossa juventude, escreve sozinha? E — o que é pior — escreve em segundos, de forma articulada, sem a autoexigência de ser (ou parecer) original e sem erros de português? O mesmo que em qualquer luto: negação, revolta, barganha, depressão e — ufa! — aceitação.

Rubens Barbosa* - Países falam uma mesma língua em muitas áreas

O Estado de S. Paulo.

O encontro Lula-Biden marca a volta das relações institucionais entre os governos do Brasil e dos Estados Unidos, depois do que se viu no relacionamento pessoal entre Bolsonaro e Trump. Cercada de forte simbolismo, a reunião procurou acentuar as convergências na defesa da democracia e dos direitos humanos, e contra a extrema direita, depois das experiências traumáticas com a invasão do Congresso norte-americano e da Praça dos Três Poderes, exemplos da divisão política existente nos dois países.

Além desses temas políticos, foi ressaltada a coincidência de percepções nas questões de meio ambiente e mudança de clima. Lula insistiu na governança global e na cooperação internacional para ajudar o governo brasileiro no combate aos ilícitos na Amazônia: queimadas, destruição da floresta e garimpo ilegal. Não foi surpresa a intenção de Biden de passar a contribuir para o fundo amazônico.

João Gabriel de Lima* - Lá fora, nosso nome é Amazônia

O Estado de S. Paulo.

Na economia do futuro, o Brasil tem sua grande chance de protagonismo internacional

Não existe ferramenta capaz de aferir, com precisão, a contribuição de cada país no combate às mudanças climáticas. O Climate Scanner, apresentado na semana passada em evento em Lisboa, pretende suprir essa lacuna. A plataforma digital será alimentada com informações confiáveis sobre financiamento, políticas públicas e governança.

A ferramenta está sendo desenvolvida pela Intosai, entidade que congrega órgãos de controle de diversos países – entre eles o nosso Tribunal de Contas da União (TCU). O Brasil assume a presidência do Intosai em novembro deste ano, quando o Climate Scanner será lançado oficialmente. “Será uma oportunidade de recuperar a liderança e o respeito que sempre tivemos quando falamos em meio ambiente”, diz Bruno Dantas, presidente do TCU. Ele é entrevistado no minipodcast da semana.

Bolívar Lamounier* - Grande país, ideias pífias

O Estado de S. Paulo.

O leitor consegue imaginar um país onde os ricos estudem de graça nas melhores universidades e a pequena classe média estude à noite em instituições medianas?

Pelo que sei, a situação oftalmológica individual dos brasileiros tem melhorado muito, mas a do País como um todo, nem tanto. Nunca enxergamos muito, e nada indica que estejamos melhorando.

Tentarei esclarecer meu argumento. Sabemos que alguns países enriqueceram notavelmente. Outros decolaram, mas estancaram num nível mal e mal aceitável, ou regrediram. Não me consta, porém, que algum tenha dado certo começando pela distribuição da pobreza, quero dizer, distribuindo o que não tinha e deixando para depois a realização de suas aspirações. (Se é que aspirava a alguma coisa.) Neste último caso, o disparate seria ainda maior se, além da inversão do curso lógico das coisas, tal país sofresse da já referida deficiência oftalmológica coletiva. Neste caso, nem sequer perceberia que estava buscando o levante pelo poente.

Dom Odilo P. Scherer* - Fome outra vez

O Estado de S. Paulo.

Neste ano, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) escolheu novamente o tema para a Campanha da Fraternidade

Estudos sobre a segurança alimentar no Brasil dão conta de que, em 2022, cerca de 58% dos brasileiros enfrentavam alguma situação de insegurança alimentar e nutricional, o que significa alimento insuficiente e de baixa qualidade. Destes, 15,5% conviviam com a fome, o que corresponde a cerca de 33 milhões de pessoas. O problema é mais acentuado em 18,6% de domicílios rurais, que convivem diariamente com a fome. Quase a metade dessa população com fome vive nas Regiões Norte e Nordeste do Brasil.

A fome está diretamente relacionada com a questão do trabalho e do nível da renda. Como pode assegurar uma alimentação minimamente adequada a família ou o domicílio com renda inferior a um quarto de salário mínimo por pessoa? Os diversos benefícios sociais apenas conseguem mitigar essa situação, sem, contudo, resolvê-la. A pandemia de covid-19 agravou ainda mais este quadro preocupante. Mas, depois dela, a fome persiste e até se agravou. Mesmo se a fome não consta oficialmente como causa mortis de tantas pessoas, aquelas que dela padecem podem sofrer consequências graves, como a subnutrição crônica, danos ao desenvolvimento físico e intelectual e a fragilização da saúde, que marcam o resto de sua vida.

Hélio Schwartsman - Para salvar a Bíblia e Marx

Folha de S. Paulo

Defesa abstrata, mesmo das ideias mais loucas, não deve ser reprimida

intentona golpista reforçou o clamor por uma revisão da legislação sobre redes sociais. Não sou contra mudanças, mas lembro que esse é um assunto complexo, no qual precisamos estar atentos a nossos vieses. Temos forte tendência a ver a expressão de teses que desprezamos como crime e a classificar no máximo como deslize a propagação, ainda que violenta, de ideias com que concordamos.

Um exemplo real? Será difícil enquadrar os atos de janeiro como terrorismo porque a esquerda, a fim de proteger movimentos sociais como o MST, excluiu da Lei Antiterrorismo, de 2016, a motivação política do rol de razões que permitem tipificar uma ação como terrorista. Com isso, poupou a turba bolsonarista de responder por um delito mais grave.

Cristina Serra - Os extremistas do mercado

Folha de S. Paulo

Debate sobre juros não pode ser interditado

Faz um mês que terroristas contrariados com o resultado da eleição tentaram um golpe de Estado. Não são os únicos a criar dificuldades para o novo governo. Os fundamentalistas do mercado também não se conformam com a vitória de Lula e promovem alarido em tom de ameaça e intimidação cada vez que o presidente questiona dogmas do extremismo liberal.

Quem está feliz com a taxa de juros a não ser aqueles que têm dinheiro sobrando para investir no tal mercado? Mas Lula mal abre a boca e já é chamado de populista e gastador. O debate sobre juros não pode ser interditado. Qual a dose certa do remédio? Quando ele vira veneno?

Demétrio Magnoli - Senhor Polarização

Folha de S. Paulo

Retórica polarizadora fabrica um conveniente 'inimigo do povo'

Diz-se por aí que Lula ainda não desceu do palanque. De fato, na campanha eleitoral, o candidato até que evitou o proverbial palanque: buscou aliança com o centro democrático, sinalizou uma pacificação nacional, prometeu governar para todos. Foi só depois dela que o presidente subiu no palanque, reacendendo a fogueira da polarização. A estratégia discursiva organizou-se sobre quatro eixos, pontilhados por mentiras factuais e clamorosas contradições.

1) Independência do Banco Central

A linha definida por Lula foi exibir o BC como inimigo: um agente do bolsonarismo engajado na elevação dos juros para sabotar o crescimento econômico. Gleisi Hoffmann declarou que "o BC não deu um pio sobre as façanhas orçamentárias de Bolsonaro". É fake news impune: durante o (des)governo bolsonarista o BC elevou a Selic de 2% para 13,75% e, ata após ata, o Copom alertou para as "façanhas" cometidas contra a responsabilidade fiscal. O BC é o STF de Lula.

Entrevista | Gleisi Hoffmann*: União Brasil precisa de freio e PT não vai ceder mais espaço no governo

Presidente do partido defende reeleição de Lula e afirma que há como atrair outros partidos sem negociação de ministérios

Catia Seabra e Thiago Resende  /Folha de São Paulo

BRASÍLIA - presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann, rejeita a hipótese de reduzir o número de ministérios ocupados pelo partido para acomodação de novos aliados à base do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

"Não vejo como o PT ceder mais espaço no governo para contemplar outras forças", diz em entrevista à Folha.

Gleisi, que participou nas negociações para formação do ministério de Lula, defende ajustes no acordo com a União Brasil —sigla que recebeu três pastas e ainda se declara independente em relação ao governo.

"Temos que fazer um freio de arrumação, porque, mesmo sendo contemplado como foi, é um partido que não está fazendo entrega", afirma a petista.

Para a presidente do PT, é natural que o governo imponha um filtro ideológico para nomeações descartando indicados que se alinharam ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). "Se nós ganhamos, nós temos uma posição política clara contra o bolsonarismo."

Uma das principais colaboradoras de Lula, ela defende que ele concorra à reeleição em 2026.

Lula e o PT têm feito duras críticas ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Essa postura tem sido alvo de contestação dentro da própria base governista. Isso não contraria o discurso de pacificação de Lula da campanha? 

A postura que o presidente está tendo é a mesma que teve durante a campanha. Ele prometeu a pacificação, mas não prometeu entregar o país ao retrocesso econômico e ao desemprego. Ele prometeu o crescimento e emprego, prometeu políticas sociais robustas, prometeu um investimento. Tudo que ele está falando é o programa que foi vitorioso.

Lula propõe a Biden órgão multilateral para o clima em visita à Casa Branca

Presidentes de Brasil e EUA ressaltaram importância da preservação ambiental e fortalecimento da democracia

Patrícia Campos Mello e Thiago Amâncio / Folha de S. Paulo

WASHINGTON - Na primeira reunião entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Joe Biden como presidentes do Brasil e dos EUA, realizada na Casa Branca, em Washington, nesta sexta-feira (10), o petista convidou o líder americano para discutir um mecanismo de governança global que force os países a acatar decisões na área climática.

Em declarações dadas na presença de jornalistas no Salão Oval, os dois líderes destacaram a importância da preservação ambiental e reforçaram a necessidade de fortalecer instituições em defesa da democracia.

"A questão climática, se não tiver uma governança global forte e que tome decisões que todos os países sejam obrigados a cumprir, não vai dar certo", afirmou o petista ao democrata. "Não sei qual é o fórum, não sei se na ONU, não sei se é no G20, não sei se é no G8, mas alguma coisa temos que fazer para obrigar os países, o nosso Congresso, os nossos empresários a acatar decisões que tomamos em nível global."

Marcus Pestana - O mundo das ideias e a prática política

Pretendo me afastar do debate conjuntural que não anda nada estimulante. Provocado por alguns amigos leitores, pretendo me refugiar na discussão das ideias e teorias que movem a arena política contemporânea. A desconexão entre a produção teórica e a prática política, e a era das “verdades alternativas” e da torrencial produção de afirmações, verdadeiras ou não, presentes nas redes sociais, têm deixado como legado uma certa indigência intelectual e um sectarismo inédito, interditando o debate.

O próprio papel das ideias na transformação da vida e do mundo é tema controverso. A perspectiva revolucionária sempre acreditou que um conjunto de ideias e valores novos podem dinamitar a velha ordem e construir um mundo novo.  Já a ótica conservadora se ancora na convicção de que as tradições e os costumes devem nos orientar na prudência necessária para a produção de reformas e mudanças.

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Viagem aos EUA resgata status global do Brasil

O Globo

Adesão dos americanos ao Fundo Amazônia mostra que Lula começa a tirar do país a pecha de pária

O encontro dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Joe Biden na Casa Branca rendeu mais que o esperado aperto de mãos no Salão Oval e a condenação do extremismo político dos populistas autoritários. Em comunicado conjunto, os Estados Unidos anunciaram a intenção de destinar recursos ao Fundo Amazônia, que já conta com aportes da Noruega e da Alemanha. Desde o início do governo anterior, o Brasil pedia aos americanos dinheiro para ajudar a preservar a Amazônia, mas as conversas nunca foram adiante devido à política antiambiental do governo Jair Bolsonaro. Em 2019, Noruega e Alemanha congelaram seus repasses ao fundo, enquanto a devastação na floresta batia recordes.

Criado em 2008, o Fundo Amazônia depende de doações para investir em prevenção, monitoramento, combate ao desmatamento e promoção do uso sustentável da floresta. Até o momento, a Noruega já doou R$ 3,1 bilhões, a Alemanha R$192 milhões (e a Petrobras R$ 17 milhões). Gerido pelo BNDES, em 15 anos o fundo já apoiou 384 instituições locais, 195 unidades de conservação, 101 terras indígenas, além de dezenas de milhares de indivíduos em atividades produtivas sustentáveis. As ações permitiram a inscrição de 1,1 milhão de imóveis no Cadastro Ambiental Rural, 1.700 missões de fiscalização e o combate a cerca de 30 mil incêndios e queimadas. Quanto mais recursos, mais projetos podem ser apoiados.