terça-feira, 1 de agosto de 2023

Merval Pereira - Tudo misturado

O Globo

Arthur Lira tenta influenciar na escolha do PGR

O Centrão voltou do recesso com o apetite redobrado, tanto que o presidente Lula já antecipa uma reforma ministerial ainda para agosto. Com a coincidência de datas, pode ser que o governo aproveite para misturar as cenouras, decidindo sobre a escolha do novo procurador-geral da República, do novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) com a aposentadoria da ministra Rosa Weber, de alguns ministérios negociáveis e de três vagas no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Com isso, o presidencialismo de coalizão, que se inviabilizou com a pulverização partidária, se transforma em “parlamentarismo manco e cambeta, onde o Parlamento tem muito poder, e não as responsabilidades proporcionais”, na análise do ex-deputado federal de Minas Marcus Pestana, um especialista em reformas partidárias. Foi das comissões de reforma política em 2011, 2013, 2015 e 2017. Era assim naquela época no Brasil: ano par, eleição, ano ímpar, reforma política.

Pestana foi autor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do voto distrital misto na reforma de 2015, a única que chegou ao plenário, obtendo apenas 99 dos 308 votos necessários. Nenhuma das reformas prosperou porque a pulverização partidária já imobilizava qualquer mudança. Na era de Fernando Henrique Cardoso, a equação era mais fácil, com a governabilidade garantida por apenas três partidos (PSDB, PFL e PMDB).

Carlos Andreazza - Bom ambiente

O Globo

Progressistas e Republicanos — refiro-me aos partidos — no governo Lula. Agora vai. Será? Mais seguro seria: Progressistas e Republicanos, os partidos de Ciro Nogueira (Arthur Lira) e Marcos Pereira (Tarcísio de Freitas), com filiados no governo.

Agora firma.

É como se têm vendido terrenos na Lua. Miragem de oásis no deserto. Os vendedores, registre-se, estiveram sobre o palanque de Jair Bolsonaro até ontem.

O Planalto detém as cadeiras. A turma as aceita. Não entrega apoio — certamente não estabilidade. Ou entrega pouquíssimo. (Entrega nada sem negociações caso a caso — sem a liberação de milhões em emendas.) E depois diz que não prometera fidelidade. Que não integra a tal base. Mas que, perdendo os cargos que levou, opa: pegará mal. E que, por outra, ganhando ainda mais funasas, terá “boa vontade” para com o governo.

Luiz Carlos Azedo - CPMI dos atos golpistas divide atenções com reforma tributária no Senado

Correio Braziliense

A comissão tomará, nesta terça-feira, o depoimento de Saulo Moura da Cunha, que ocupava o cargo de diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) no 8 de janeiro

A semana começa no Senado em duas frentes: a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (PMI) dos atos golpistas de 8 de janeiro retoma seus trabalhos, já agora com mais informações fornecidas pelo Ministério da Justiça sobre os investigados pela Polícia Federal; e a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) inicia a discussão da reforma tributária, que veio da Câmara com um carregamento de jabutis que mantêm privilégios fiscais de diversos setores.

A CPI tomará, nesta terça-feira, o depoimento de Saulo Moura da Cunha, ex-diretor-adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), que ocupava o cargo de diretor da agência em 8 de janeiro, quando ocorreu a depredação de prédios públicos na Praça dos Três Poderes. Ele deixou a função no início de março. Seu depoimento é importante porque a Abin produziu diversos alertas sobre riscos de um ataque a prédios públicos de Brasília, inclusive na véspera das invasões e depredação de patrimônio público no domingo.

Míriam Leitão - Imposto para os mais ricos

O Globo

Cobrar imposto sobre fundos exclusivos, dos muito ricos, é uma das formas de fazer justiça tributária e arrecadar mais

O Brasil sempre discutiu se deveria ou não ter imposto sobre grandes fortunas. Na verdade, o país está no estágio até anterior a isso. Discute como acabar com a isenção sobre grandes fortunas. É isso que pode acontecer com iniciativas como o imposto de renda sobre fundos exclusivos, a exigência de pagar tributo sobre fundos offshore ao fim de cada exercício, e mudanças nos juros sobre capital próprio, para evitar manobras contábeis. Hoje quem tem grande patrimônio, ou muito dinheiro poupado, tem estímulos tributários, o que é um completo absurdo.

O ministro Fernando Haddad tem dito que quer taxar os fundos exclusivos. Essa é uma briga por justiça, que outros governos tentaram e perderam, mas que vale a pena ser enfrentada. Em geral, o fundo exclusivo mira a administração do patrimônio de quem tem muito dinheiro.

Dora Kramer - Gratidão premiada

Folha de S. Paulo

Lula contraria o rumo do governo na economia para laurear os aliados das horas difíceis

Apesar das críticas —"um pouco exageradas" (não disse "despropositadas"), segundo Fernando Haddad—, Luiz Inácio da Silva quis e, com todos os pesares, emplacou Marcio Pochmann na presidência do IBGE. Faz parte das prerrogativas presidenciais, embora o atropelo a Simone Tebet não se adeque às regras da boa educação.

O jogo parecia jogado e encerrado com a habilidosa reação da ministra do Planejamento, mas se mantém em aberto devido à intenção do presidente de influir na escolha de um novo CEO da mineradora Vale ao fim do mandato de Eduardo Bartolomeo, em maio de 2024.

E qual é o jogo? A vontade de Lula para recompensar aqueles que reconhece como fiéis das horas difíceis: foi assim com Dilma Rousseff para o banco dos Brics, com Pochmann e é assim agora com a tentativa de alojar Guido Mantega no comando da empresa (privada) que, junto com a Petrobras e o agronegócio, lidera a pauta de exportações do Brasil.

Joel Pinheiro da Fonseca – Golpismo digital

Folha de S. Paulo

As redes sociais são para Bolsonaro o que o cinema foi para Hitler

A reportagem de Juliana Dal Piva e da Agência Pública ("Eduardo Bolsonaro foi em missão oficial ver argentino que mentiu sobre urna"), publicada nesta segunda no portal UOL, veio em boa hora; boa hora para lembrar que o Brasil sofreu uma tentativa de golpe contra seu sistema eleitoral.

O lado bolsonarista partia de uma certeza: se perdessem, é porque as eleições foram roubadas. Faltava apenas encontrar uma história convincente. Descredibilizar as urnas era parte do plano. Era preciso ter alguma narrativa que justificasse o desrespeito ao resultado das eleições, e uma parte relevante da população que apoiasse essa narrativa. Qual mentira ia colar era o de menos; o importante era que alguma colasse.

Hélio Schwartsman - Bondes da história

Folha de S. Paulo

Ao retomar julgamento sobre drogas, STF vai definir os limites da autonomia individual

Albert Camus afirmou que o suicídio era a única questão filosófica realmente séria. Decidir se a vida vale a pena ser vivida é o problema fundamental da filosofia; todos os demais são secundários. Transpondo a fórmula para o direito, podemos dizer que existe uma única questão constitucional realmente séria, que é a de determinar o alcance da liberdade no ordenamento jurídico, que é o que dá a base ao contrato social; todas as demais lhe são secundárias.

É sobre esse problema que o STF volta a debruçar-se esta semana, ao retomar o julgamento sobre a descriminalização do uso de drogas. Mais do que um "tópos" do direito penal, o que os ministros estão debatendo é se o artigo 28 da Lei Antidrogas (nº 11.343/2006), que penaliza a posse de entorpecentes para uso próprio, fere ou não o princípio da inviolabilidade da vida privada (CF, art. 5º, X).

Andrea Jubé - Carência de vitamina “P” tira o fôlego da reforma ministerial

Valor Econômico

Dor e mau humor de Lula desaceleram mudanças no ministério

Certa feita, em 1984, na campanha das “Diretas Já”, perguntaram a Tancredo Neves, 74 anos, como ele tinha pique para a agenda frenética que cumpria pelo país em defesa da retomada democrática.

Ele respondeu: “Eu sou movido a vitamina P, meu filho”. Era “P” de política, lógico. O diálogo foi registrado pelo jornalista Ricardo Kotscho em seu livro de memórias.

Em tempos de uma arrastada reforma ministerial sob Lula 3, vale lembrar que Tancredo Neves, então um jovem deputado federal do PSD, foi um dos protagonistas de uma dança das cadeiras promovida pelo presidente Getúlio Vargas em 1953, num momento em que o caudilho enfrentava uma crise, com greves, inflação em alta e cruzeiro desvalorizado.

Vargas chamou o então governador de Minas Gerais, Juscelino Kubitschek, principal liderança do PSD, para discutir as mudanças. Pediu a JK a indicação de um deputado mineiro para assumir o Ministério da Educação, e veio à luz o nome de Tancredo.

Mas às vésperas do anúncio, JK voltou ao chefe do Executivo reivindicando que o correligionário assumisse o Ministério da Justiça. JK sabia que as articulações para a escolha do candidato à sucessão de Vargas em 1955 passariam pela prestigiosa pasta.

Passados 70 anos desse episódio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vê-se às voltas com mais uma reforma ministerial, entre tantas outras que foi obrigado a conduzir nos dois mandatos anteriores.

Luiz Gonzaga Belluzzo* - Entre a ciência e a ideologia*

Valor Econômico

Economistas poderiam buscar arrimo na física do século XX, que descobriu que os caminhos não podem ser previstos com exatidão

A indicação do professor Marcio Pochmann para o IBGE suscitou uma avalanche de críticas disparadas dos arraiais que abrigam os que se pretendem “vigilantes” da boa e verdadeira ciência econômica. Esta percepção de excelência científica encarregou-se de atribuir a Pochmann a inquinação de “ideológico.”

A economia é uma (vá lá) ciência difícil. Keynes dizia que os requerimentos exigidos do bom economista eram muitos: ele deveria combinar os talentos do “matemático, historiador, estadista e filósofo (na medida certa). Deve entender os aspectos simbólicos e falar com palavras correntes. Deve ser capaz de integrar o particular quando se refere ao geral e tocar o abstrato e o concreto com o mesmo voo do pensamento. Deve estudar o presente à luz do passado e tendo em vista o futuro. Nenhuma parte da natureza do homem deve ficar fora da sua análise. Deve ser simultaneamente desinteressado e pragmático: estar fora da realidade e ser incorruptível como um artista, estando embora, noutras ocasiões, tão perto da terra como um político”.

Luiz Schymura* - Uma reforma tributária complexa, porém necessária


Valor Econômico

É importante todo o esmero de nossos legisladores na montagem da legislação infraconstitucional da transição dos regimes e o governo deve trabalhar intensamente para evitar uma lista muito extensa de setores beneficiados com IVA reduzido

Em um país com extensão territorial continental, com população que supera a marca dos 200 milhões de habitantes e com expressiva desigualdade não só de renda, mas também educacional e cultural, como é o caso brasileiro, é muito difícil promover grandes mudanças institucionais. Afinal, as reivindicações da população são muitas e variadas, e, por isso, as forças políticas - representantes legítimas de agrupamentos sociais -, quando anteveem prejuízos a serem incorridos por seus representados, acabam se tornando agentes contrários às reformas. A estratégia passa a ser interditar o debate. Não à toa, modificações mais profundas nos marcos institucionais brasileiros levam, por vezes, décadas para serem concluídas. É necessário um longo período de negociação e amadurecimento.

Eliane Cantanhêde - As controvérsias do segundo semestre

O Estado de S. Paulo

Drogas e aborto no STF vão pôr o bolsonarismo na rua?

O segundo semestre de Brasília está, finalmente, começando. Enquanto o BC abre a temporada de queda dos juros, vêm aí pautas econômicas no Congresso e de costumes no Supremo, dividindo a oposição em duas: a parlamentar, que tende a apoiar a âncora fiscal, a reforma tributária e a mudança no Carf; e a popular, que vai fazer barulho contra avanços no Supremo. A estreia do novo ministro, Cristiano Zanin, vai ser quente.

A presidente da Corte, Rosa Weber, que completa 75 anos em 2 de outubro e tem de se aposentar, quer usar agosto e setembro para desengavetar questões polêmicas e empurradas com a barriga, e com pedidos de vista, ano após ano. É a chance de deixar votos e sua marca no STF.

Paulo Hartung * - O valor do percurso ao construir o rumo certo

O Estado de S. Paulo

Livro traz depoimentos de protagonistas da gestão econômica no pós-ditadura militar e inspira o melhor elogio à persistência no rumo certo

Entre deslizes e alguns solavancos, há áreas nas quais o Brasil efetivamente conquistou avanços desde a redemocratização. A realidade dos enormes e permanentes desafios acaba por ofuscar o olhar para acertos de importantes passos dados, como a estabilização da moeda, o controle da inflação, o aumento de reservas internacionais, além de uma ampla agenda reformista que, aos poucos, vem sendo implementada. Como pontua Edmar Bacha, essas conquistas “não deixam dúvidas sobre o quanto o País avançou no exercício da política econômica”, ao mesmo tempo que “revelam também o quanto falta fazer”.

Essa observação está no prefácio do livro A Arte da Política Econômica: Depoimentos à Casa das Garças, organizado por José Augusto C. Fernandes, do qual tenho a honra de participar. A obra, a ser lançada dia 16/8 na Livraria da Travessa Iguatemi (SP), reúne depoimentos de 30 protagonistas da gestão econômica no Brasil no pós-ditadura militar, evidenciando o valor do percurso na construção do rumo certo.

Jorge J. Okubaro* - Sorria, mas com moderação

O Estado de S. Paulo

Como a evolução da classificação do risco Brasil, a mudança da Selic deverá ser modesta, bem modesta

Foi muito pequena, quase nada, a melhora da nota do Brasil pela agência de classificação de risco Fitch anunciada na semana passada. Mas, além de surpreendente, foi também significativa, pois a classificação anterior persistia desde 2018. Em junho, embora sem aumentar a pontuação, outra agência, a S&P Global Ratings, elevara de estável para positiva a perspectiva de classificação do País.

Falta muito para o Brasil ser considerado um lugar seguro e financeiramente recomendável, o que seria atestado com a obtenção do grau de investimento, de que o País já desfrutou há alguns anos. Projeções otimistas apontam que isso não ocorrerá antes de 2027.

Mas, como em outras áreas da economia e da política, a melhora da avaliação resulta de avanços, depois dos quatro anos desastrosos do governo anterior. São mudanças pequenas e um tanto escassas para nossas expectativas, o que recomenda comedimento. Ainda assim, motivos há para esperarmos que amanhã será melhor.

Aylê-Saalassié Filgueiras Quintão* - Glotocídio é pouco!

As ministras do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber e Carmen Lúcia estiveram  a semana que passou no interior do estado do  Amazonas, precisamente,   em São Gabriel da Cachoeira, para lançar o texto da Constituição Federal,  de 1988, em nhengatu, língua indígena  por meio da qual  presume-se poder contatar a maioria dos povos que vivem  às margens dos rios amazônicos. 

Só no município de São Gabriel, que separa o Brasil da Colômbia e da Venezuela, falam-se 25 línguas das famílias aruak, tukano e maku. Em se tratando da língua portuguesa, a população é, no mínimo,  analfabeta funcional. O nhengatu é uma das quatro línguas indígenas  oficializadas no município  junto com o português, o maku e o tucano , usadas tanto do lado do Brasil quanto dos países vizinhos. A remanescencia dessas línguas deve-se, sobretudo, às  várias  associações e entidades civis, religiosas e indígenas    sediadas ali, e que se propõem a organizar aquela multiculturalidade .
 
Juntas, formam o que é conhecido na região  como a  Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (FOIRN), que funciona independente, associativamente, nos moldes do branco,  quase como uma assembleia, na qual cada nação indígena   se faz representada, sem comprometer suas atividades e organização cultural. 

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Copom deve manter diretriz técnica ao decidir sobre juros

O Globo

Perspectiva de corte na Selic abre oportunidade para Planalto praticar o comedimento e evitar conflito

Seja qual for a decisão sobre a taxa básica de juros (Selic) tomada na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começa hoje e termina amanhã, o governo precisará ser contido na reação. Independentemente do teor do anúncio, novos ataques ao Banco Central (BC) vindos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não contribuirão em nada para o país. A Selic não pode ser definida do alto de um palanque. Até aqui, o Copom tem se mantido imune a pressões políticas. É imprescindível que continue assim. Quando se trata de inflação, comedimento é sempre melhor que populismo.

O encontro deste mês é aguardado com ansiedade porque, pela primeira vez desde a posse de Lula, a expectativa de quase todos os analistas é que a Selic, fixada em 13,75% desde agosto de 2022, comece enfim a cair. Os agentes econômicos se dividem entre os que apostam na queda de 0,25 ou de 0,5 ponto percentual. Diante do bom trabalho do BC para conter a espiral inflacionária, o prognóstico é que os juros fechem o ano em 12%.