quarta-feira, 30 de outubro de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Prisão de bicheiro traz oportunidade contra o crime

O Globo

Desta vez, Justiça não deveria impedir que Rogério Andrade fique preso e que sua quadrilha seja desbaratada

A prisão do bicheiro Rogério Andrade, na manhã desta terça-feira no Rio de Janeiro, representa um passo importante no enfrentamento à máfia dos jogos de azar que há anos, graças à leniência das autoridades, protagoniza uma guerra sangrenta pela disputa de território na cidade. Sobrinho do conhecido bicheiro Castor de Andrade, que morreu em 1997, Rogério é acusado de ser o mandante do assassinato do também contraventor Fernando Iggnácio (genro de Castor) em novembro de 2020. Na decisão judicial , Rogério é citado como chefe de um grupo criminoso “voltado para a prática de diversos crimes”, entre os quais homicídio, corrupção, contravenção e lavagem de dinheiro.

A escuta contra a política troncha - Vera Magalhães

O Globo

População se deixou seduzir por candidatos mais pragmáticos, que olham para suas necessidades sem superioridade sociológica da esquerda

Raro exemplo de renovação da centro-esquerda brasileira, o prefeito reeleito do Recife, João Campos (PSB), forneceu na última segunda-feira, no Roda Viva, reflexões valiosas para seu campo político a respeito do muito que deveria mudar para responder à preocupante desconexão com o eleitorado evidenciada pelas disputas municipais.

Um dos maiores erros que os políticos podem cometer, disse ele, é achar que sabem tudo, que têm solução para tudo sem ouvir o povo. Contou a história de uma obra da prefeitura que comanda para reformar um campo de várzea que era troncho (torto), e a comunidade fez um protesto para evitar que fosse deixado reto. Ele mandou parar a obra e ouvir todos os que usavam o campo.

— Ganhou para ficar troncho mesmo. Você precisa combinar com o povo — contou.

A parábola — saborosíssima, à moda das que seu pai, Eduardo Campos, que morreu em plena campanha presidencial há dez anos, adorava contar — ilustra à perfeição um dos pecados mortais da esquerda lulista: achar que tem o mapa para o coração dos mais pobres e a receita de como resolver a vida deles.

Um carimbo para o PCC - Bernardo Mello Franco

O Globo

Ao citar facção contra rival, governador admitiu que crime manda cada vez mais em estado que o elegeu

Ao festejar a reeleição em São Paulo, o prefeito Ricardo Nunes chamou Tarcísio de Freitas de “líder maior” e o lançou à Presidência em 2026. “Seu nome é presente, mas seu sobrenome é futuro”, proclamou.

O saldo das urnas reforçou Tarcísio como virtual candidato das direitas caso seu padrinho, Jair Bolsonaro, permaneça inelegível. Mas o governador manchou a vitória ao jogar sujo para ajudar Nunes no dia da eleição.

Sem apresentar provas, Tarcísio disse que o Primeiro Comando da Capital (PCC) teria orientado voto em Guilherme Boulos, adversário do prefeito. Depois seus aliados atribuíram a acusação a bilhetes apócrifos, vazados pela polícia que ele controla.

Tarcísio só erra numa direção – Elio Gaspari

O Globo

O governador teve seu momento Pablo Marçal

Pelo andar da carruagem, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, será candidato à Presidência em 2026. Sua vitória eleitoral e muitos aspectos de sua gestão qualificam-no para isso. Ele produziu uma imagem austera, próxima do unicórnio de político técnico. Como se sabe, unicórnio não existe.

Tarcísio de Freitas é um exemplo dos poucos momentos virtuosos na passagem de Jair Bolsonaro pela Presidência da República. Ele o escolheu para o Ministério da Infraestrutura sem conhecê-lo. No Planalto, foi Bolsonaro quem o convenceu a disputar o governo de São Paulo.

Tarcísio seria um bolsonarista moderado. Como ensina a repórter Flávia Oliveira, “bolsonarista moderado é como cabeça de bacalhau, não existe”. Na tarde de domingo, tendo ao lado o prefeito Ricardo Nunes, Tarcísio disse o seguinte:

Há boas notícias no resultado das eleições – Zeina Latif

O Globo

A vitória do centro poderá influenciar o pleito em 2026. Há boas chance de haver candidatos competitivos de perfil moderado

A melhor notícia das eleições municipais é o sinal de redução da polarização (entre extremos), tema já discutido aqui. Somados, os partidos de centro — PSD, MDB, PP, União Brasil, Republicanos e Podemos — conquistaram 19 capitais e 3.365 municípios.

Não que os partidos de centro sejam garantia de gestão eficiente e probidade administrativa. Trata-se, na verdade, de ter um ambiente mais propício ao diálogo, ingrediente fundamental para o avanço de reformas.

Mesmo nos municípios, há importantes agendas estruturantes a serem abraçadas, como nas políticas de uso e ocupação do solo, na agenda ambiental, na educação infantil e nos marcos regulatórios para o empreendedorismo. A missão de prefeitos vai muito além da zeladoria.

Lula e Bolsonaro ficaram em segundo plano nas campanhas.

Trump é o homem que queria ser rei - Martin Wolf

Valor Econômico

Com os EUA, o grande bastião da democracia no século XX, sob controle autoritário, haveria uma oscilação no equilíbrio global contra a democracia liberal, não só em termos de poder, mas também em termos de credibilidade ideológica

O que um segundo mandato de Donald Trump significaria para os EUA e o mundo? Os otimistas podem apontar para o que aconteceu da última vez: sua presidência, eles poderiam afirmar, foi cheia de alarde e fúria. Mas isso pouco significou. Ele governou de maneira mais convencional do que muitos temiam. Além disso, no fim, foi derrotado por Joe Biden e partiu. Partiu com má vontade, é verdade. Mas o que mais se poderia esperar? Ele partiu mesmo assim. Por que não seria parecido se ele conquistasse um segundo mandato, como sugerem as pesquisas?

Trump é especialista em promessas vazias. Em 2016, uma peça central de sua campanha foi o “muro” pelo qual o México pagaria. No fim, não houve muro, quanto mais qualquer dinheiro do México. Desta vez ele prometeu reunir e deportar até 11 milhões de estrangeiros em situação irregular. A operação necessária para isso seria imensamente cara e polêmica. De fato, como exatamente muitos milhões seriam deportados e para onde?

O complexo processo de reflexão interna do PT - Fernando Exman

Valor Econômico

Avanço nas eleições, além de reduzido, foi muito concentrado e frustou o Palácio do Planalto

A reação de parte da cúpula do PT ao balanço eleitoral feito pelo ministro da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência, Alexandre Padilha, evidencia como vai ser complexo o processo de reflexão interna que o partido inevitavelmente enfrentará.

Complexo e intenso. Ele terá como pano de fundo as articulações para a sucessão da presidente do partido, a deputada Gleisi Hoffmann (PR). Uma disputa que definirá, entre outros aspectos, qual será a postura da sigla nas negociações com os partidos de centro para as eleições de 2026 e seu discurso em relação à política econômica do Ministério da Fazenda e, também, ao Banco Central sob o comando de Gabriel Galípolo.

De forma franca, Padilha colocou o dedo na ferida. Após reunir-se com Gleisi e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio da Alvorada na segunda-feira (28), avocou a condição de filiado e integrante da bancada federal do PT para defender que a sigla faça “uma avaliação profunda” do resultado das eleições. Disse que a legenda permanece na zona de rebaixamento em que entrou nas eleições municipais de 2016, o que irritou os correligionários e provocou o embate.

Eleição não muda jogo para Lula e Bolsonaro - Christopher Garman

Valor Econômico

É preciso ter muita cautela para não extrapolar para a disputa presidencial de 2026 conclusões exageradas sobre as eleições municipais

Passado o segundo turno das eleições municipais, comentaristas e lideranças partidárias estão tirando duas conclusões sobre os resultados das urnas - ambas tremendamente exageradas.

A primeira é que a dominância dos partidos de centro e direita mostraria que o país está migrando para a direita, criando um cenário difícil para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o Partido dos Trabalhadores em 2026. A segunda é que o ex-presidente Jair Bolsonaro teria perdido força, já que não conseguiu eleger seus candidatos em várias cidades (particularmente Goiânia e Belo Horizonte), indicando que o eleitorado estaria começando a privilegiar candidatos mais ao centro e a rejeitar a polarização.

De fato, o resultado das urnas sinaliza que partidos de centro e direita reforçaram sua posição nas prefeituras locais, o que vai ajudá-los a eleger deputados em 2026. Mas diz pouco sobre a eleição presidencial de 2026, e não deve ser visto como um sinal de fragilidade - nem de Lula, nem de Bolsonaro.

O ‘modo disputa’ de Lula e o fator Dirceu - Vera Rosa

O Estado de S. Paulo

Presidente acha que ex-chefe da Casa Civil pode ajudar o PT e o governo no diálogo para 2026

Encerradas as eleições municipais, com desfecho favorável à centrodireita, o governo Lula vai ligar agora o “modo disputa” 2026. Além de promover uma reforma ministerial para a segunda metade de seu mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tentará reforçar a articulação política com o Congresso e acha que o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu pode ajudar nessa tarefa.

Dirceu já vem atuando longe dos holofotes. No rol de seus interlocutores estão os ministros Fernando Haddad (Fazenda), José Múcio (Defesa), Alexandre Silveira (Minas e Energia), Renan Filho (Transportes) e Sílvio Costa Filho (Portos e Aeroportos). Para Lula, o ex-chefe da Casa Civil tem como auxiliar em várias “missões”, como a de reconstruir o PT – que vai renovar sua cúpula em 2025 –, melhorar o diálogo com empresários e políticos do Centrão, além de ampliar as conversas com a ala do MDB que não quer se aliar ao governador Tarcísio de Freitas, em 2026.

Sangue na água da direita – Bruno Boghossian

Folha de S. Paulo

Grito de independência da 'direita moderada', no entanto, ainda sai trêmulo

Jair Bolsonaro desfilou pelo Congresso como se não carregasse nas costas um saco de derrotas amargas nas eleições municipais. Circulou por gabinetes para negociar uma anistia e fez pouco caso dos políticos que dizem enxergar uma direita sem seu comando. "Já tentaram várias vezes e não conseguiram", afirmou. "Eles têm uma utopia."

As duas pontas estão conectadas. O plano de Bolsonaro para conseguir uma anistia, emparedar tribunais e recuperar o direito de se candidatar depende da leitura que as elites da direita fazem sobre o poder do ex-presidente. Se esses líderes entenderem que há outros caminhos para o sucesso eleitoral, não haverá muita pressa para salvá-lo.

Brasil um tédio desesperador - Vinicius Torres Freire

Folha de S. Paulo

País fica travado por adiar decisão óbvia, se ocupa de ninharia e o direitão toma conta

Quando se assunta com gente do governo o que seria o plano de contenção de gastos Haddad-Tebet, o que mais se ouve é desconversa, desconhecimento ou desprezo. Quando vazam medidas "em estudo", parte do governo sabota as ideias, até em público.

Deve ser por isso que Fernando Haddad procura despistar todo o mundo a respeito do que seria seu plano, como o fez nesta terça (29): não haveria data para divulgar o pacote ou tamanho dele. Talvez seja melhor não contar nada, discutir o assunto só com o presidente da República e, assim, evitar sabotagens nas internas. Afinal, governo e PT brigam em público até por picuinhas municipais.

Esquerda esqueceu arte de mudar de assunto - Rui Tavares

Folha de S. Paulo

Concentrar campanha na verdade indesmentível de que Trump é horrível não deixa de ser fazer dele o centro da conversa

Sim, foi um circo de horrores o comício de Donald Trump e dos seus aliados no Madison Square Garden, em Nova York. Sim, o racismo, a misoginia e até o fascismo descarado dos discursos é demasiado escandaloso para não merecer resposta. E sim, é possível que alguns dos comentários que ali foram feitos prejudiquem a campanha do republicano a poucos dias das eleições. É compreensível que os democratas cedam à tentação de fazer disso o assunto da campanha na reta final.

Pergunto-me, porém, se foi devidamente levado em conta que concentrar a campanha na verdade indesmentível de que Trump é horrível não deixa de ser, apesar de tudo, fazer de Trump o centro da conversa.

E se há razão para essa eleição estar muito mais difícil para Kamala Harris do que precisaria é que a sua campanha não conseguiu segurar e prolongar o tema da alegria e da novidade que fugazmente foi o seu após a convenção do Partido Democrata em agosto.

O recado das urnas para a esquerda - Wilson Gomes

Folha de S. Paulo

Se fossem seriamente escutados, quem sabe esses eleitores não responderiam?

As semanas seguintes às eleições costumam ser momentos de avaliações sobre perdas e ganhos na política institucional, além de oportunidade para compreender o estado atual da correlação de forças no cenário político. Isso é natural, afinal, mandatos permanecem uma medida objetiva de força política. As urnas sempre transmitem mensagens importantes e cabe aos interessados decifrá-las com precisão para, então, tomar as devidas providências.

Vamos por partes. Quero me concentrar hoje em um aspecto específico da mensagem que a esquerda recebeu nas eleições municipais: sua relação com uma parte significativa dos eleitores parece ter se perdido de vez.

Dirceu volta à cena com anulação de penas - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

Gilmar Mendes anulou todos os atos processuais produzidos pelo ex-juiz Sergio Moro em duas ações penais contra o ex-ministro petista, por parcialidade

A anulação das condenações do ex-deputado federal José Dirceu, pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), trouxe o petista histórico de volta à cena política do país, com plenos direitos políticos. Dirceu havia sido condenado a 23 anos e três meses de prisão pelo então juiz e atual senador Sergio Moro (União-PR), que apontou o ex-chefe da Casa Civil do primeiro governo Lula como suposto beneficiário de R$ 15 milhões em propinas pagas pela empreiteira Engevix, por cinco contratos de obras da Petrobras.

Dirceu vinha mantendo discreta atuação política, sempre nos bastidores, mas circulava com desenvoltura e, toda vez que aparecia em público, em algum evento social que reunisse políticos, era reverenciado pelos interlocutores. Já havia retomado também a militância no PT, participando de reuniões e conversas informais, com a mesma discrição. Agora, livre das condenações, deve intensificar sua atuação, mas não decidiu ainda se pretende voltar à cúpula do PT e/ou disputar eleições. Oráculo dos principais dirigentes petistas nunca deixou de ser.

Poesia | Os fios e o desafio - Marcelo Mário de Melo

(Em memória do poeta Antônio Cícero) 

Pois o corredor da morte
é o corredor da vida 
um fio que se desenrola 
logo após vida nascida. 

Fio que se perde de vista 
ao se olhar da janela 
mas que pulsa à distância 
além da paisagem bela. 

São duas pontas de um fio 
que vão se aproximando 
até que o fio da nascença 
 vê o fio da morte chegando. 

É o mandato da velhice 
da doença terminal 
ante o mandato da vida 
impondo o ponto final. 

Entre os fios o desafio 
 de uma consciência clara. 
A consciência da morte 
natural comum não rara.