sábado, 20 de dezembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Bolsonarismo sofre baque com operação da PF

Por O Globo

Depois da cassação de três deputados, outros dois são alvo de acusações de corrupção com verba parlamentar

Depois da hesitação incompreensível na cassação da então deputada foragida Carla Zambelli (PL-SP), o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), soube corrigir o rumo no caso dos também fugitivos Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Alexandre Ramagem (PL-RJ), cujos mandatos foram cassados pela Mesa da Casa. Espera-se que atue também com rigor perante as acusações que agora pesam contra outros dois deputados do PL fluminense, Carlos Jordy e Sóstenes Cavalcante, líder do partido na Câmara. Ambos foram alvo de operação da Polícia Federal (PF) para coibir desvios de recursos da cota parlamentar.

Um golpe, um agrado. Por Flávia Oliveira

O Globo

Excelências só se preocupam em saciar os próprios desejos

Na mesma semana, a Câmara dos Deputados adiou para 2026 a apreciação do PL Antifacção e da PEC da Segurança Pública, em nova evidência de desprezo pela agenda prioritária da população. Pesquisa Datafolha, apurada nos primeiros dias de dezembro em 113 cidades brasileiras, mostrou que a violência é o maior problema do país para 16% da população, atrás apenas da saúde, citada por um quinto. Mais importante para Hugo Motta e seus pares, Senado incluído, é atenuar a pena de quem atentou contra a democracia, cláusula pétrea da Constituição. Promulgado o projeto da dosimetria (em letra minúscula, por favor), que passou como um raio pela Casa revisora, golpismo será crime menor, beneficiado com semiaberto após cumprimento de um sexto da pena em regime fechado; troca de dias de prisão por leitura, mesmo em custódia domiciliar; imposição ao Judiciário de fundir dois ataques distintos, abolição violenta do Estado Democrático e golpe.

A opção de Flávio pelo establishment. Por Thaís Oyama

O Globo

O senador não pretende tentar conciliar a retórica do candidato pragmático com o bolsonarismo

O senador Flávio Bolsonaro deu a largada em sua campanha à Presidência anunciando ser “o Bolsonaro que todo mundo quer”. Em encontros com empresários, tratou de listar seus pretensos atributos: “moderado”, “equilibrado” e, como disse num vídeo, alguém que até tomou vacina — sugerindo, assim, ter em comum com o pai só o sobrenome. Suas falas iniciais deixam claro que ele não pretende tentar conciliar a retórica do candidato pragmático com o bolsonarismo antissistema — investirá na primeira e desprezará a segunda. Isso porque, para Flávio e aliados, os eleitores de Jair estarão com ele haja o que houver e diga ele o que disser.

Chavão abre porta grande. Por Eduardo Affonso

O Globo

Clichês são uma faca de dois gumes. Se os repetimos tanto é porque tiveram poder de fogo e, em algum momento, foram um gol de placa

O clichê é um divisor de águas na vida de quem escreve. É a tábua de salvação quando o cérebro aciona o piloto automático, incapaz de qualquer esforço intelectual — e a dificuldade de pensar e elaborar simbolicamente nos faz tirar da cartola, ou do bolso do colete, uma imagem que valha mais que mil palavras.

Via de regra, é só a gente baixar a guarda e... lá está ele, dando o ar da sua graça e apontando a luz no fim do túnel do que parecia um beco sem saída ou o fundo do poço. Chega como uma bala de prata para que não seja preciso ficar dando murro em ponta de faca, enxugando gelo ou chorando sobre o leite derramado.

Subdesenvolvimento em marcha. Por André Gustavo Stumpf

Correio Braziliense

O governo do Brasil está olhando os foguetes passarem sobre nossas cabeças. O país não tem sequer capacidade de colocar um satélite em órbita. Mas o Parlamento continua discutindo temas tão relevantes quanto a dosimetria

Mesmo após 26 anos de negociações, os líderes europeus pediram ainda mais um mês com objetivo de discutir, entre si, as condições finais para referendar o acordo com os países do Mercosul, o famoso e discutido tratado de livre comércio que seria assinado, com grande pompa, neste final de semana, em Foz do Iguaçu. Franceses e italianos se declararam contra o tratado, enquanto a maioria dos europeus pretende assinar o documento. Os alemães querem o acordo para abrir uma janela de oportunidades comerciais para o bloco europeu constrangido pelos russos, de um lado, e pelos norte-americanos, de outro. E os chineses olhando para avançar no momento certo. 

Reflexões do tipo a quem interessar possa. Por Bolívar Lamounier

O Estado de S. Paulo

Tudo isso somado deveria abrir nossos olhos para o fato de que somos um país teoricamente robusto, mas vulnerável a graves retrocessos

Peço vênia para repetir o que há tempos tenho feito: uma tentativa de diálogo com quem queira olhar o Brasil com os olhos abertos. Parto do que enxergo sem grande esforço, baseando-me apenas no que me chega pelos jornais.

Tenho para mim que o Brasil não é um país difícil de governar. Somos naturalmente protegidos pela extensão de nosso território e pelas enormes distâncias que nos separam das potências que nos varreriam do mapa se nos encrencássemos com elas no terreno bélico. Sublinhemos também que, pelo menos no setor externo, já não estamos ameaçados por vulnerabilidades como as de meio século atrás, quando a escassez de insumos essenciais nos estrangulava e endividamentos mastodônticos como o da era Geisel eram um tormento constante. Ao contrário, nosso pujante agronegócio e a mineração nos dão certa tranquilidade, sem embargo de serem poucos os produtos que somos capazes de exportar e poucos, também, os países compradores.

O PT aderiu ao acordão. Por Carlos Andreazza

O Estado de S. Paulo

Davi Alcolumbre entregou a sua parte no trato. Não fez favor, como se verá. Faltava o governo Lula no acordão, que costurou bolsonarismo, Centrão, os comandos do Congresso e aquela porção do Supremo composta por senadores-consultores togados. Não falta mais. O governo aderiu. Aos 45 do segundo tempo, no Senado. Não sem cálculo. Certamente sem favor, como se verá.

Aderiu ao acordo pela aprovação do projeto de redução de penas, chamado de PL da Dosimetria. Projeto que tem Jair Bolsonaro como objeto beneficiado. O líder do governo, Jaques Wagner, admitiu. Argumentou que o trem seria aprovado de qualquer maneira, cedo ou tarde. Subentendido que via vantagem em acelerá-lo, em troca da aprovação de pauta fiscal decisiva para o Planalto. Subentendido no subentendimento de que Lula vetaria o texto adiante... Há um teatro. Lula o vetará. O Congresso derrubará o veto e ficará com o ônus, explorado pelos governistas, de “defensor de golpista”.

STF e Parlamento: o conflito inevitável. Por Juliana Diniz

O Povo (CE)

As cenas impressionantes do volume de dinheiro vivo encontrado nos apartamentos vistoriados pela Polícia expõem um resultado previsível do novo modelo de alocação orçamentária que teve lugar com o chamado orçamento secreto

As operações policiais que cumpriram medidas judiciais de busca e apreensão em apartamentos ligados aos deputados Sóstenes Cavalcante e Carlos Jordy, ambos do PL, apimentaram ainda mais as queixas de parlamentares sobre os supostos excessos do Supremo Tribunal Federal. As operações estão relacionadas a apurações de possíveis desvios de recursos públicos oriundos de emendas parlamentares. Muito queixosos, os políticos se dizem perseguidos, alvo deliberado de uma campanha do Executivo, do Judiciário e da Polícia Federal, contra a oposição.

A blindagem do Supremo. Por Ana Luiza Albuquerque

Folha de S. Paulo

Eventuais excessos durante o governo Bolsonaro poderiam se justificar diante de um momento agudo de ascensão autoritária, mas o cenário hoje é outro

Tentativas de blindagem da corte podem agravar a crise de confiança nas instituições e, por consequência, colocar em risco a própria democracia

O Poder Judiciário é um bastião fundamental contra avanços autoritários.

Por vezes, porém, como no Brasil, a missão foi exercida com atos que extrapolaram as prerrogativas ou que fugiram do rito processual. Está longe do ideal que um magistrado julgue fatos em que figura como personagem, como foi com o ministro do STF Alexandre de Moraes e o plano Punhal Verde e Amarelo.

Ainda assim, pode-se argumentar que o país passava por um momento de crise democrática aguda e que, fazendo valer o sistema de freios e contrapesos, a Suprema Corte respondeu aos excessos do Executivo diante de um Procurador-Geral da República omisso.

Facilitar o impeachment. Por Hélio Schwartsman

Folha de Paulo

Legislativo estuda alterações na lei de 1950 que estabelece regras para destituir autoridades

Lógica de freios e contrapesos, que compartimentaliza e divide o poder, precisa prevalecer

Sistemas de freios e contrapesos precisam ter roldanas grandes e pequenas. Sempre que se dá poder a uma autoridade, é necessário também criar um mecanismo para evitar que ela abuse desse poder. É nesse contexto que se inscreve o impeachment. Ele surgiu na Inglaterra do século 14 como um procedimento puramente penal, ganhou feições políticas na Constituição americana de 1787 e dali saltou para integrar a paisagem institucional de várias nações presidencialistas.

Mimimi de Flávio Bolsonaro esbarra na rejeição espetacular. Por Alvaro Costa e Silva

Folha de S. Paulo

Jair sentou definitivamente em cima de seus votos

Flávio virou pesadelo para articuladores da candidatura Tarcísio

No início do mês, logo após lançar sua pré-candidatura à Presidência, seguindo as ordens dadas pelo pai de dentro da prisão, Flávio Bolsonaro provocou os descontentes: "Eu tenho um preço. Quem dá mais?".

Aberto o leilão, veio o primeiro lance. A proposta que reduz a pena de Bolsonaro e de outros condenados pelos ataques antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 foi aprovada na Câmara com rapidez e, para variar, na calada da madrugada.

Regras fiscais e sustentabilidade econômica. Por Marcus Pestana

O cenário macroeconômico para 2026 é de desaceleração, com a perspectiva de um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2,3%, em 2025, 1,7%, em 2026, e uma taxa média de crescimento, de 2027 a 2035, de 2,2% a.a. Já em relação à inflação, verificamos a entrada do Indice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) na órbita do intervalo de tolerância do sistema de metas inflacionárias, em resposta à política monetária implementada pelo Banco Central, com a estimativa de fecharmos 2025 no patamar de 4,3%, experimentarmos ligeira queda para 3,9% em 2026, e convergirmos, de maneira suave, para o centro da meta de inflação (3,0%), no período entre 2027 e 2035. Quanto ao setor externo, não se espera nenhum impulso econômico extraordinário em função da permanência de riscos e incertezas relevantes.  Todos estes elementos influenciam o cenário fiscal.

Motivos para brindar. Por Pedro Serrano

CartaCapital

O legado de 2025 é gigantesco. Foi dada uma lição fundamental às gerações atuais e às vindouras: a de que o País não admite mais, sob hipótese alguma, ataques à democracia

No esquadrinhamento dos fatos e feitos do ano, é inevitável elencar os julgamentos dos golpistas de 8 de janeiro de 2023 como um dos pontos altos de 2025, lembrando que seus efeitos benéficos devem perdurar por muito tempo. Ao todo, foram mais de cem dias de sessões, que resultaram na condenação de 29 réus, entre eles o ex-presidente Jair Bolsonaro. Diante de provas irrefutáveis, não apenas de planos – incluindo os de sequestro e assassinato de autoridades –, mas também de atos efetivamente praticados, o processo representou a vitória do Estado Democrático de Direito que os articuladores do golpe tentaram derrocar, felizmente sem sucesso.

À espera do ploc! Por Luiz Gonzaga Belluzzo

CartaCapital

A bolha da Inteligência Artificial está prestes a estourar, e outras não tardarão a se formar

Vamos iniciar a discussão com a advertência explicitada no Relatório Trimestral do Banco de Compensações Internacionais, o BIS. “O boom relacionado à Inteligência Artificial (IA) nos preços das ações continuou a moldar o comportamento dos mercados financeiros. As ações de grande capitalização da tecnologia continuaram a superar durante grande parte do período em análise, impulsionadas por lucros fortes. No entanto, eles mostraram sinais de retração no final do período, devido à maior cautela dos investidores em relação a avaliações mais longas”, afirma o texto.

Ruchir Sharma, presidente da ­Rockefeller International, soou mais um alarme no Financial Times. “Em meio à conversa sobre a mania da Inteligência Artificial, as pessoas começaram a brincar com a ideia de ‘uma bolha dentro da bolha’. As buscas no Google por IA associada à palavra ‘bolha’ dispararam, e o clima nos mercados parece exuberante. No entanto, além desses indicadores subjetivos, não existe uma métrica-padrão para definir uma bolha. Meu teste se concentra em quatro ‘Ss’: sobrevalorização, sobrepropriedade, sobreinvestimento e sobrealavancagem.”

Quando deixamos de ser franceses. Por Vladimir Safatle

CartaCapital

A recuperação do legado de Gérard Lebrun revela as aventuras da formação de um pensamento filosófico brasileiro

Há uma maneira de compreender a filosofia no Brasil através da história de sua profissionalização. Tal maneira consiste em afirmar que, antes da profissionalização universitária da filosofia, o que existia aqui não vale muito a pena ser recordado e integrado.

A experiência filosófica anterior seria composta de voos de fôlego curto, ecletismos os mais variados e de um ­ensaí­sm­o­ filosófico-literário ao qual faltaria certo “rigor”. Nenhum aluno de filosofia é levado atualmente a ler os textos de Sílvio Romero ou Tobias Barreto, para ficar em dois dos mais conhecidos representantes desse momento.

Mas eis que teria vindo a implantação universitária da filosofia entre nós e, com ela, a ideia de inaugurar um processo de formação que nos trouxesse o modo de funcionamento da formação que imperava nos países europeus. A criação da Universidade de São Paulo (USP), em 1934, sela esse “momento inaugural”.

O Velho Chico. Por Ivan Alves Filho*

Viajando pelo rio São Francisco, eu entendi que a natureza é um livro e, como tal, merece ser lido com cuidado. Plantas, insetos, pássaros, pântanos, peixes, árvores são suas páginas e bordas. Mais: há, no homem do sertão, uma inteireza que me faz pensar que não existe nele corte profundo entre Natureza e Cultura, de tal forma nos fascina a simbiose entre o homem e o meio. Presenciei situações quase alucinantes, pela beleza e estranheza, quando viajava para escrever o Velho Chico mineiro.