segunda-feira, 10 de novembro de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Desequilíbrio fiscal esvazia Bolsa de Valores

Por O Globo

Com necessidade de manter juros altos, renda fixa é mais atraente que ações, e mais empresas fecham capital

A falta de compromisso firme do governo com o equilíbrio fiscal tem consequências negativas em toda a economia. A mais imediata é a inflação, resultado da falta de confiança que se dissemina pelo mercado. O Banco Central (BC) é então forçado a subir os juros, com isso impõe um freio ao crescimento econômico e à geração de empregos. Quando os juros ficam altos por muito tempo, os efeitos são perniciosos. Na semana passada, mais uma vez a taxa básica de juros, a Selic, foi mantida em 15% anuais. Descontada a inflação — em torno de 5,2% ao ano —, o juro real se aproxima de 10%, desempenho que tem garantido ao Brasil há um bom tempo lugar no pódio dos juros mais altos do mundo.

Guerra sem vencedores, por Preto Zezé

O Globo

Quantas creches, escolas técnicas, universidades, centros culturais, oportunidades de trabalho surgiram onde o Estado só aparece fardado?

Já passaram 18 anos desde a primeira grande invasão ao Complexo do Alemão. Quase duas décadas depois, seguimos repetindo o mesmo roteiro: o Estado entra atirando, a imprensa transmite ao vivo, as autoridades prometem “recuperar o território” — e logo a vida volta ao normal de sempre: escolas precárias, oportunidades escassas e a torneira da violência aberta.

O outro lado do normal em algumas cidades é este: tiros, bombas e corpos. Infelizmente. A manchete já não comove. É preciso mais corpos empilhados, mais câmeras, mais espetáculo.

Belém não acredita em gráficos, por Demétrio Magnoli

O Globo

As nações reunidas em Belém desviam seus olhares dos gráficos que contam a dura verdade

A COP30 realiza-se sob o signo do autoengano. Aprovará um documento sobre o fundo para florestas tropicais, impulsionado pelo Brasil, cujas fontes de financiamento permanecem incertas. Aprovará uma declaração que vincula a ação climática ao combate à pobreza. Passará, por consenso vazio, um texto demagógico sobre “racismo ambiental” que Lula ofertará a seu cortejo identitário. Algo muito menos provável é a publicação de uma declaração final da cúpula que encare o fracasso dos objetivos do Acordo de Paris (2015).

Base jurídica das COPs, o Acordo de Paris estabeleceu o objetivo de impedir a elevação da temperatura média global para além de 2oC em relação aos níveis pré-industriais e, idealmente, evitar a ultrapassagem da marca de 1,5oC. Segundo os indícios disponíveis, a declaração final escolherá o método de dissimular a constatação de que não se obterá nem mesmo o objetivo mais modesto. As nações reunidas em Belém desviam seus olhares dos gráficos que contam a dura verdade.

Não é culpa do Banco Central, por Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

E então, nenhuma carta nesta mão, nada na outra, e um déficit de R$ 80 bilhões vira R$ 31 bilhões, que é igual a zero — uma proeza

Não, o Banco Central não é o culpado pelos juros altos. A culpa está no Ministério da Fazenda, responsável pelo descontrole das contas públicas, que resultam numa expansão insustentável da dívida. Mas o ministro Fernando Haddad segue os projetos do presidente Lula.

Sobram números para demonstrar esse desequilíbrio. Mas nada é mais eloquente que esta situação: o governo terá déficit expressivo neste ano, algo em torno de R$ 80 bilhões. E poderá declarar de peito aberto que cumpriu a meta legal de déficit zero.

O truque começa na flexibilização da meta. É zero, mas, sabem como é, isso de orçamento é coisa complicada de acertar, de modo que o arcabouço aceita uma margem de tolerância. O resultado pode ser um déficit equivalente a 0,25% do PIB (algo como R$ 31 bilhões) ou um superávit de mesmo tamanho. No governo, ninguém jamais pensou em buscar a meta de superávit. Seria, dizem, deixar o dinheiro sobrar quando há tantos gastos importantes a fazer.

Governo volta ao caminho fácil e ineficaz das críticas ao BC, por Sergio Lamucci

Valor Econômico

Ajudar a reduzir os juros deveria ser uma das principais metas do governo, mas por meio de uma política fiscal que controle o aumento das despesas obrigatórias

O coro de críticas de integrantes do governo ao nível da Selic recomeçou. As mais recentes reclamações partiram do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e da ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, deixando claro que o presidente do Banco Central (BC), Gabriel Galípolo, terá de conviver com pressões do Executivo por juros mais baixos. Em vez de criticar o BC, o governo deveria se empenhar em reduzir as incertezas sobre as contas públicas, o que ajudaria a criar condições para uma queda mais significativa da taxa. Essa, porém, não será a estratégia a ser seguida pela gestão do presidente Luiz Inácio Lula Silva, a menos de um ano das eleições presidenciais.

COP em Belém e bilhões para ar-condicionado em Manaus, por Bruno Carazza

Valor Econômico

Enquanto o mundo se reúne em Belém para salvar o planeta do aquecimento global, governo brasileiro dá bilhões para empresas fabricarem ar-condicionado em Manaus

Uma das metas do governo Lula na COP30 é arrecadar pelo menos US$ 10 bilhões junto a países e ao setor privado para o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, instrumento para financiar projetos que mantenham florestas em pé para combater o aquecimento global.

A iniciativa tem grandes méritos, não há dúvidas. Mas a verdade é que o próprio governo brasileiro, todos os anos, abre mão de um volume muito maior de recursos para que empresas mantenham, no coração da Amazônia, um modelo de negócios poluente e - o que é pior - que lucra com o aumento geral de temperatura.

A decisão de explorar petróleo na Margem Equatorial não é a única contradição na postura brasileira enquanto preside a COP30. A manutenção da Zona Franca de Manaus (ZFM), um pesado conjunto de incentivos tributários para a produção industrial na capital do Amazonas, não faz nenhum sentido do ponto de vista da sustentabilidade.

Como chegamos na COP30? Por Clarissa Lins

Valor Econômico

Os compromissos assumidos pelos países ainda estão muito distantes para limitar o aumento global da temperatura em 1,5°C

ACOP30 terá iniciado quando este artigo for publicado e proponho aqui uma reflexão sobre como estamos chegando na Conferência, no contexto da temática da energia.

Os compromissos assumidos anteriormente, na COP28 de Dubai, deram a direção da jornada: aumentar a escala e a competitividade das soluções energéticas de baixo carbono, à medida que os países se afastam de combustíveis fósseis, além de melhorar de forma significativa a eficiência energética. De maneira complementar, a indústria global de óleo e gás também assumiu compromissos de descarbonizar suas operações: por meio de iniciativa setorial, 55 empresas representando 45% da produção global estabeleceram metas de zerar as emissões de metano e encerrar flaring de rotina até 2030, além de zerar emissões operacionais até 2050.

O futuro já é agora, por Joaquin Gonzalez-Aleman

Correio Braziliense

Discursos bonitos em eventos internacionais não são suficientes para combater as mudanças climáticas nem salvar as pessoas que já estão sendo impactadas por elas. O que nós, adolescentes e jovens, queremos são compromissos verdadeiros

Hoje, tem início a 30ª edição da Conferência das Partes (COP30), e países de todo o mundo, incluindo o Brasil, têm uma responsabilidade que não podem mais adiar: ir além dos discursos e assumir ações concretas, efetivas, que realmente protejam a vida daqueles mais impactados pelas mudanças do clima.

Nós, adolescentes e jovens, sabemos bem o que significa sermos os mais impactados. Não somos os criadores desse sistema que gera poluição, desmatamento e consumo desenfreado de recursos naturais, mas somos nós e as crianças os que mais sentem na pele, de forma desproporcional, os efeitos desse cenário. Somos nós que não conseguimos nos concentrar na aula por conta do calor extremo, que vemos as áreas verdes ao nosso redor diminuírem, que precisamos recorrer a abrigos quando há enchentes ou deslizamentos, e que sofremos com doenças causadas pela poluição.

O papel das bibliotecas escolares para o incentivo à leitura e à formação, por Ana Paula Yazbek

Correio Braziliense

Ler e falar sobre livros deveria ser uma prática cotidiana nas escolas. No entanto, a leitura, por si só, não basta.

Vivemos um momento em que a leitura, embora reconhecida por seus inúmeros benefícios, ainda não ocupa o lugar que deveria na vida das pessoas, especialmente de crianças e jovens. Segundo a sexta edição da Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, grande parte da população tem um consumo de livros limitado, concentrado em temas religiosos, didáticos e best-sellers de impacto midiático. Nesse contexto, a escola surge como um ambiente fundamental para transformar essa realidade, promovendo o contato contínuo e prazeroso com a literatura.

Historicamente, a leitura foi instrumento de poder de instituições e grupos sociais. É essencial compreendê-la, assim como o acesso à arte, à informação e à educação, como direitos de todos, fundamentais para a democracia. Uma escola sem biblioteca comunica silenciosamente que a leitura não é importante. Mais do que um espaço físico, a biblioteca representa a oportunidade de revelar aos estudantes que a literatura é uma ferramenta vital para perceber o mundo, expressar emoções e refletir sobre si e o outro. Sua ausência priva os alunos de experiências humanas e universais, fundamentais à formação integral.

Cansaço coletivo, por Letícia Mouhamad.

Correio Braziliense

Até que ponto a construção de viadutos e alargamento de faixas beneficia aqueles que dependem exclusivamente de transporte público, inclusive, do metrô?

Sou moradora de Planaltina e, desde os 18 anos, faço, de segunda a sexta-feira, o trajeto em direção ao Plano Piloto. Somadas, ida e volta totalizam cerca de 90km, e o tempo de deslocamento para cada viagem pode variar de 40 minutos a duas horas a depender do congestionamento. São, em média, 10 horas por semana gastas somente no trânsito. 

Essa jornada —  só de vir à mente já me cansa — ganha um sabor especial quando feita de ônibus e em horário de pico. As tardes de calor são um tempero a mais nesse caldeirão de trabalhadores exaustos. E, acredite, não há gentileza que resista a um assento prestes a ficar vazio. Afinal, descansar ao menos as pernas é, nesse contexto, um privilégio. 

Fato é que, depois de tantos anos vivenciando essa rotina, passar mais estresse no trânsito me parecia algo distante, pois estava calejada. Ledo engano. Com as inúmeras intervenções na BR-020, quem acordava às 5h20 precisa, agora, programar-se para levantar ao menos meia hora antes. Além da pouca paciência e da poeira, os passageiros ficam à mercê da insegurança, com desvios sinuosos nas pistas e sinalização confusa. 

Direita busca alforria, por Carlos Pereira

O Estado de S. Paulo

O bolsonarismo se tornou um fardo. Romper com ele é o caminho para uma direita democrática

A iminente prisão do ex-presidente Bolsonaro impõe um teste crucial ao comportamento estratégico dos políticos. Quando o custo reputacional junto ao eleitorado se antecipa, é racional que os partidos desenvolvam relutância em se associar a nomes marcados por problemas com a Justiça. Em um ambiente eleitoral cada vez mais competitivo – em que, até a véspera da votação, ainda é difícil prever o vencedor –, é esperado que as legendas busquem candidatos substitutos distantes do perfil do político condenado.

Bancada Cristã promove tortura e feminicídio de Estado, por Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Compromisso de parlamentares 'cristãos' com projeto restingindo aborto nunca foi a diminuição de casos

Interrupção de gravidez é quinto maior causador de mortes maternas no Brasil

Tortura significa causar dor ou sofrimento intenso, físico ou mental, de forma intencional para obter informações, punir, intimidar ou por qualquer motivo baseado em discriminação, segundo convenção da ONU.

E agora é exatamente isso que pode ocorrer com meninas estupradas no Brasil: tortura promovida pelo Estado baseada em discriminação de gênero. Porque são mulheres, merecem sofrer. Tudo graças à crueldade da autodenominada "Bancada Cristã".

Congresso mina o direito de meninas estupradas, por Lygia Maria

Folha de S. Paulo

Ao derrubar resolução do Conanda, deputados perpetuam a dificuldade de acesso ao aborto legal e o sofrimento de crianças violentadas

No Senado também avançam propostas insensatas, como proibir o procedimento por telemedicina e após 22 semanas de gestação em caso de estupro e anencefalia

O congresso está numa cruzada contra o direito que crianças grávidas têm ao aborto legal. Nem o interesse eleitoreiro parece explicar tamanha crueldade. Afinal, segundo o Datafolha, 58% dos brasileiros acham que a lei sobre o tema deve continuar como está (34%), incluir mais permissões (17%) ou que o aborto deveria ser descriminalizado (7%).

O Código Penal autoriza o procedimento em casos de risco à vida da mulher, anencefalia fetal e estupro, e toda relação sexual com menor de 14 anos é estupro.

Como choques redefiniram o terceiro mandato de Lula, por Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Governo tem sido marcado por alterações nos parâmetros do jogo político que produzem efeito duradouro no mandato

Eventos como a invasão da praça dos Três Poderes, em janeiro de 2023, e a Guerra da Ucrânia são exemplos de acontecimentos que impactam gestão

Lula 3 tem sido marcado por choques de natureza singular. Ao historiador do futuro não escapará esta singularidade embora alguns desses choques sejam eventos de grande importância histórica per se. Penso em choques não como em referência a variações conjunturais ou à volatilidade inerente ao sistema político, mas a mudanças estruturais — alterações nos parâmetros do jogo político que produzem efeitos duradouros ao longo do mandato e não decorrem da ação direta do governo ou de suas lideranças. São, portanto, choques exógenos, cujo impacto, positivo ou negativo varia conforme o evento.

Velhas práticas, novos discursos, por Jorge Chaloub*

Folha de S. Paulo

Operação policial reproduziu velhas práticas do Estado em meio a novos discursos de teor fascista

Defesa da morte como política pública ganha destaque e mostra mudança brusca no Brasil

[RESUMO] Operação contra o Comando Vermelho nos complexos do Alemão e da Penha, a mais letal da história do país, com 121 mortos, expõe tanto continuidades (incursões violentas em favelas, desrespeito a direitos humanos) quanto mudanças no cenário brasileiro, como a centralidade que o culto à morte passou a ter na esfera pública, tornando desnecessárias as justificativas para matanças. Em meio a uma direita radicalizada e uma esquerda com dificuldade a assumir papel relevante neste debate, não há coalizão capaz de apoiar políticas alternativas de combate ao crime.

A chacina ocorrida no Complexo do Alemão expõe evidentes continuidades. Há, por um lado, a renitente violência com a qual o Estado brasileiro trata regularmente certos grupos sociais. Despontam ainda permanências mais recentes, como a política de guerra empreendida pelo estado do Rio de Janeiro, que ultrapassa os marcos históricos dos regimes políticos, sejam eles democráticos ou autoritários.

De Carlos Lacerda a Chagas Freitas, passando por Marcelo Alencar e Sérgio Cabral, as incursões violentas da polícia nas favelas são uma das principais formas de impor certa ideia de ordem, definida por um uso seletivo da lei, hábil em limitar os direitos dos moradores.

Por outro lado, em meio às mudanças no território, há a contínua dominação territorial do crime organizado, um problema grave não apenas para o Alemão ou a Penha, mas para a implantação de uma ordem democrática no Brasil.

A ênfase nas permanências ofusca, entretanto, aspectos centrais do evento e mudanças importantes no cenário político do Brasil. Se a ação policial segue um roteiro em vários aspectos semelhante, o discurso público a justificá-la tem elementos novos, ou ao menos relegados às margens nas últimas décadas, e aponta para um lugar diferente da segurança pública.