O Banco Central (BC) acaba de revisar para cima a expansão do crédito neste ano. Agora espera aumento de 7,2%, acima dos 6% anteriormente estimados. A projeção parece bastante otimista. Depois de ter encolhido 3,5% em 2016 e mais 0,5% em 2017, o crédito mostrou alguma reação em 2018, crescendo 5% para R$ 3,257,7 trilhões. Pela primeira vez desde 2014, o saldo das operações de crédito superou a inflação, em 1,7%. Se for considerado que o estoque inclui a apropriação dos juros pagos pelos empréstimos, o desempenho não é tão positivo assim. Chamou a atenção o crescimento do crédito livre, com taxas de mercado, que cresceu 11,2% nas operações com empresas e 11,3%; nas pessoas físicas.
Mas a estirada não foi o suficiente para ocupar o espaço deixado pela retração dos bancos públicos, cuja alavancagem estava comprometida pela intensa atividade dos últimos anos do governo de Dilma Rousseff, e pela redução dos empréstimos direcionados, lastreados em fundos muitas vezes subsidiados, que se esgotaram com a crise fiscal. Houve impacto negativo também da retração da demanda das empresas, causada pelas incertezas por conta das eleições e pela elevada ociosidade, que reduziu os investimentos.
Neste ano, o crédito começou em queda, e só começou a crescer em fevereiro, módico 0,3%, para R$ 3,241 trilhões. O aumento acumulado em 12 meses ficou em 5,5%, puxado pelos bancos privados e pelas operações de crédito livre, que representam 54% do estoque total, e cresceram 0,5% no mês e 11,5% em 12 meses. Já as operações com recursos direcionados, que incluem empréstimos rurais, imobiliários e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), ficaram estagnadas, recuando 0,7% em 12 meses. Como proporção do PIB o estoque de operações ficou praticamente estável em 47% em fevereiro, frente a 47,1% em janeiro.
Em um dos boxes do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), o Banco Central explicou que a projeção de aumento de 7,2% do crédito neste ano baseia-se na perspectiva de crescimento maior do PIB, no ambiente de inflação baixa e estável, manutenção dos juros em patamares baixos, inadimplência contida e reduzido comprometimento da renda das famílias com dívidas junto ao sistema financeiro.
Essas expectativas são otimistas demais. Nas últimas semanas, instituições financeiras e de pesquisa reduziram as previsões para o PIB deste ano depois de um primeiro trimestre fraco. O próprio RTI cortou a expansão esperada de 2,4% para 2%. A pesquisa Focus desta semana trouxe projeção inferior a 2%, de 1,98%. Em relação ao comprometimento da renda das famílias, a taxa caiu de 19,9% para 19,8% em setembro; e a taxa de endividamento subiu dos 42,7% de novembro e dezembro para 42,9%. A inadimplência média está em 2,9% desde novembro.
Dos argumentos utilizados pelo BC, apenas a estabilidade da inflação e a manutenção dos juros básicos em patamares baixos são consistentes. Os cortes da taxa Selic a partir dos fins de 2016, quando estava no pico de 14,25% para os 6,5% atuais, baratearam o custo de captação dos bancos, mas não foram repassados integralmente para os tomadores de crédito, colaborando para inibir a demanda pelos empréstimos. Depois de uma queda de 6,6 pontos percentuais em 2017, os juros médios cobrados pelas instituições financeiras tiveram recuo quase imperceptível de 1,3 ponto percentual no ano passado, para 23,3% ao ano. Os bancos alegaram o de sempre, como a elevada inadimplência e impostos altos.
A turbulência criada agora pela desconfiança em relação à tramitação da reforma da Previdência por conta do desentendimento entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, dá uma ideia da fragilidade das previsões e da rapidez com que o cenário pode mudar. No mesmo dia em que o Ibovespa testou a barreira dos 100 mil pontos, em 18 de março, os juros futuros com vencimento em janeiro de 2020 caíram abaixo dos 7%, para 6,92%. Nem dez dias depois, em 27 de março, no auge da troca de farpas entre Bolsonaro e Maia, quando o dólar superou os R$ 4, o juro futuro chegou a 7,27%. A trégua estabelecida posteriormente fez a taxa diminuir, embora sem voltar ao patamar anterior, fechando o mês em 7,14%. Toda essa movimentação teve impacto negativo no custo do crédito. Apesar de as taxas terem recuado das máximas, a desconfiança acabou implantada, reforçando a cautela tanto de credores quando de tomadores de empréstimos e as dúvidas em relação às projeções do Banco Central.
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