quarta-feira, 6 de setembro de 2023

Vera Magalhães - A lógica é a do painel

O Globo

Números do PP e do Republicanos justifica mudança que vai deixando descontentes aliados históricos menos expressivos

Feita de forma confusa e demorada, a primeira reforma ministerial de Lula vai deixando descontentes, mortos e feridos pelo caminho, sobretudo nas hostes que foram mais leais ao petista na campanha e na “travessia do deserto” do PT fora do poder.

Talvez não precisasse ser tão doloroso se o presidente, ainda muito beneficiado pela condescendência dos setores mais progressistas, como venho apontando, tivesse dito no primeiro momento, aos aliados que agora desalojará, que precisava dos cargos para construir uma governabilidade necessária ao avanço justamente das pautas sociais com que se elegeu para o terceiro mandato. Mas não foi assim que ele conduziu as conversas.

Basta dizer que ainda ontem, com o prazo da reforma mais que estourado, Lula não disse com todas as letras a Ana Moser que precisará do Ministério do Esporte, devidamente turbinado pelas apostas esportivas, para contemplar o PP de Arthur Lira. Praticamente disse à ex-atleta que o gato dela subiu no telhado, mas não foi taxativo. E presidentes podem e devem ser claros quando estão operando mudanças na equipe de primeiro escalão, até para mitigar os desgastes.

Elio Gaspari - Tarcísio deve varrer a estupidez

O Globo

O que parecia ser um debate sério era coisa muito feia

No início de agosto, o secretário de Educação de São Paulo, Renato Feder, anunciou que as escolas públicas do estado abririam mão dos livros didáticos impressos do programa federal, entrando na modernidade do material eletrônico.

O doutor deu-se ao luxo de criticar os livros do Ministério da Educação, chamando-os de “rasos e superficiais”. Faltava dizer quem analisou as obras. Faltava dizer também:

1) Que a empresa da qual Feder é acionista tinha negócios com a secretaria.

2) Que dezenas de milhares de alunos não têm dispositivos capazes de acessar a internet.

3) Que mais da metade das escolas da rede pública não tem equipamento para imprimir as apostilas eletrônicas.

Parecia que Feder abria de forma truculenta e inepta um debate que algum dia haverá de chegar: o uso de livros eletrônicos na rede pública. Parecia, mas era ilusão. A modernidade de Feder, endossada por Tarcísio, era apenas uma cobertura para a estupidez.

O repórter Gabriel Mansur revelou que um slide de aulas para alunos do 9º ano informava que Dom Pedro II assinou a Lei Áurea e que “em 1961, quando ele era prefeito de São Paulo”, Jânio Quadros assinou “um decreto vetando o uso de biquínis nas praias da cidade”.

Em 1961 Jânio era presidente, ele nunca proibiu o biquíni, e São Paulo não tem praia.

Quem assinou a Lei Áurea foi a Princesa Isabel. Em maio de 1888, Dom Pedro II estava em Milão, entre a vida e a morte.

Erros desse tipo não deveriam ser cometidos pelos autores patrocinados pela Secretaria de Educação. Admita-se que um autor jejuno enganou-se, o que não é pouca coisa. Ninguém leu os textos errados, coisa que não acontece com os livros do MEC. Rasa e superficial é a gestão de Feder.

Bernardo Mello Franco – Bola fora no Esporte

O Globo

Barganha com Ministério do Esporte decepciona atletas e contradiz discurso do presidente

Na campanha de 2022, Lula anunciou um plano imodesto para o esporte brasileiro. “O que nós precisamos fazer é uma revolução”, declarou. A cinco dias do primeiro turno, o petista disse que o setor ganharia destaque inédito se ele voltasse ao poder. “Vocês nunca tiveram na história deste país um presidente comprometido com o esporte como eu vou ser daqui para a frente”, prometeu.

O discurso empolgou celebridades que participavam do ato público, como o ex-jogador Casagrande, o técnico Vanderlei Luxemburgo e a ex-craque do vôlei Isabel Salgado. Eleito, Lula colheu novos aplausos ao anunciar a recriação do Ministério do Esporte, extinto por Jair Bolsonaro. Confiou a nova pasta a Ana Moser, medalhista nas Olimpíadas de Atlanta.

Luiz Carlos Azedo - A antropologia explica a resiliência de Bolsonaro

Correio Braziliense

Bolsonaro capturou o apoio dos evangélicos ao se opor às pautas identitárias da esquerda, que são vistas como uma ameaça à preservação da família unicelular patriarcal

Teólogo católico maldito, Leonardo Boff é um crítico dos fundamentalismos. Segundo ele, todos os sistemas culturais, científicos, políticos, econômicos e artísticos que se apresentam como portadores exclusivos da verdade e da solução única para os problemas são fundamentalistas. Ex-frade franciscano, considerado um dos fundadores da chamada Teologia da Libertação, suas críticas aos dogmas religiosos o levaram ao confronto com Roma. Nascido em Santa Catarina, seu nome de batismo é Genézio Darci Boff.

Os conceitos de Boff no livro Igreja, Carisma e Poder provocaram forte reação da Congregação para a Doutrina da Fé, então dirigida por Joseph Ratzinger, que viria a ser o Papa Bento XVI. Condenado ao “silêncio obsequioso”, Boff foi proibido de difundir suas ideias renovadoras sobre a relação da Igreja Católica com o povo, por colocar “em perigo a sã doutrina da fé”.

Fernando Exman - O dilema do prisioneiro aplicado no caso das joias

Valor Econômico

Segundo os estudiosos, o pior resultado individual ocorre quando um jogador torna-se cooperativo enquanto outro trai

Formulado na década de 1950 em meio à busca de modelos para entender o comportamento humano, o “dilema do prisioneiro” deixou as páginas dos livros na semana passada e pode alterar o rumo das investigações sobre as joias recebidas pelo Brasil durante o governo Jair Bolsonaro (PL).

Raridade vê-lo aplicado na prática. É justo, portanto, o apelido de “Superquinta” dado ao dia 31 de agosto.

Foi quando a Polícia Federal coletou, simultaneamente, os depoimentos do ex-presidente e de outras sete pessoas, entre elas a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro e assessores do casal. Alguns deles optaram por ficar em silêncio, mas já surgem rumores, aqui e ali, de que podem mudar de comportamento quando tiverem a oportunidade de retornar à PF.

Zeina Latif - Testando os limites da irresponsabilidade

O Globo

Efeitos colaterais de excessos fiscais geram sensação de bem-estar no início, mas depois vem o gosto amargo, até pela baixa qualidade do gasto público

Um padrão recorrente no Brasil é o descuido com a política econômica em tempos de bonança, como se as boas condições fossem permanentes e permitissem atender às muitas demandas por mais gastos e benesses. Pior, muitas vezes as medidas têm efeito duradouro ou permanente, constrangendo os orçamentos futuros.

O sistema político não ajuda, pois não há praticamente incentivos para o Congresso frear a gastança. O custo político de fazê-lo pode ser alto, enquanto o custo do erro, pela inflação teimosa e pelos juros mais altos, cai no colo do presidente de plantão.

Em meio aos bons ventos na economia, no PIB e na inflação, caímos novamente em uma armadilha de leniência fiscal.

Simon Johnson* - A competição das grandes potências

Valor Econômico

A fase mais recente da competição tem muito mais a ver com tecnologia do que com comércio

A cúpula recente do Brics na África do Sul marca o início de uma nova fase da competição de grandes potências. Aparentemente a pedido da China, o grupo Brics (que também inclui Brasil, Rússia, Índia e África do Sul) convidou seis outros países a se juntarem ao bloco: Argentina, Egito, Etiópia, Irã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos. Dependendo do critério usado, a produção econômica desse grupo ampliado rivalizará com a do G-7 (os principais países desenvolvidos: Estados Unidos, Canadá, Japão, Reino Unido, França, Alemanha e Itália).

Segundo declarações públicas do presidente russo, Vladimir Putin, e, mais importante, do presidente chinês, Xi Jinping, o objetivo é construir um grupo que possa fazer frente à influência ocidental e criar os pilares de uma ordem mundial alternativa, com menos dependência do dólar americano.

Sem dúvida, esse esforço chamará mais atenção no ano que vem, especialmente quando o bloco expandido se encontrar pela primeira vez em outubro de 2024 (em Cazã, na Rússia). Contudo, é improvável que o Brics+ redefina o mundo, por três motivos.

Lu Aiko Otta - Novidades no Orçamento de 2024

Valor Econômico

Mudanças que pretendem dar mais elementos para se discutir como, e com quais resultados, é gasto o dinheiro do contribuinte

Independentemente da pancadaria que o aguarda no Congresso Nacional e das dúvidas que especialistas levantam sobre sua factibilidade, o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2024 traz novidades que o colocam no estado da arte do que se discute no mundo sobre governança de recursos públicos. São mudanças que pretendem dar mais elementos para se discutir como, e com quais resultados, é gasto o dinheiro do contribuinte brasileiro.

O Brasil está atrasado uns 15 anos nesse debate, comentou o secretário de Orçamento Federal, Paulo Roberto Simão Bijos, em entrevista a este jornal. As principais economias do mundo implementaram mudanças após a crise de 2008.

Vinicius Torres Freire - Brasil, país petroleiro

Folha de S. Paulo

Receita de exportação de petróleo e derivados é recorde; alta do barril pode bater em combustíveis

O Brasil nunca exportou tanto petróleo quanto neste 2023. De janeiro até julho, dado mais recente, o país vendeu para o exterior 1,526 milhão de barris por dia, em média. O saldo, diferença entre exportações e importações, até agora foi de 1,216 milhão de barris —menor que o recorde anterior, de 2020, 1,332 milhão de barris. No entanto, o saldo do valor de vendas e compras externas de petróleo, derivados e gás é neste ano a maior da história, cerca de US$ 12 bilhões até julho, ante os US$ 9,8 bilhões do mesmo período do ano passado.

Até o início do mês, não havia perspectiva de que o preço do barril do tipo Brent fosse além de uns US$ 85. Nesta terça-feira (5), porém, Arábia Saudita e Rússia disseram que vão prorrogar seus cortes de produção até dezembro. Os cortes de produção mais recentes dos dois países somam 1,3 milhão de barris por dia.

Wilson Gomes* - A batalha pelo STF

Folha de S. Paulo

Não fosse a Corte, não se teria avançado nada na agenda de direitos na última década

Parece estranho, mas o brasileiro agora se preocupa mais com a escalação do Supremo Tribunal Federal do que com a composição da seleção de futebol. Exagero, claro, pois a massa está mais preocupada com coisas menos sublimes, tais como sobreviver todo dia à pandemia de homicídios que infesta o país ou como fazer caber em um salário infame um longo mês de despesas e aflições.

Mas as redações, os setores intelectuais médios, os hiperpolitizados que junho de 2013 nos deixou como legado, a classe política, o governo, os neoconservadores, a chamada "opinião pública", enfim, não pensa em outra coisa a não ser em quem Lula indicará para a próxima vaga no STF. E o efeito Zanin certamente tornou a coisa ainda mais candente.

Hélio Schwartsman - Cheque em branco

Folha de S. Paulo

Ex-presidente pode ficar impune em sua falta mais grave

As investigações sobre Jair Bolsonaro e seu entorno estão avançando. A mais adiantada delas é a relativa às joias das Arábias, que foram indevidamente surrupiadas ao patrimônio público ao qual deveriam ter sido incorporadas e submetidas a descaminhos variados. O ex-presidente já foi até chamado a depor nesse inquérito e, por orientação de seus advogados, manteve-se num embaraçoso silêncio.

E o caso das joias está longe de ser a única encrenca judicial de Bolsonaro. Consideradas todas as instâncias, ele está metido em cerca de duas dezenas de inquéritos. Dos que estão sob o tacão do STF, destacam-se o inquérito das fake news, da interferência na PF, do vazamento de documentos sigilosos e dos atos de 8 de janeiro. Há ainda investigações no âmbito da Justiça Eleitoral, da Justiça Federal e de Justiças estaduais.

Bruno Boghossian - ‘Ninguém precisa saber’

Folha de S. Paulo

Voto sigiloso removeria tribunal de Fla-Flu raivoso para atirá-lo na suspeição de uma sala secreta

Lula acredita que os ministros do STF deveriam se esconder um pouco. Para reduzir a animosidade contra os magistrados, o presidente defendeu que os votos de cada integrante da corte sejam sigilosos. Bastaria divulgar o placar final dos julgamentos. "Eu acho que o cara tem que votar, e ninguém precisa saber", disse.

Se o plano de manter votos em segredo for um palpite descompromissado, o petista precisa pisar com mais cuidado na tribuna que ocupa. Se a proposta é para valer, o presidente encontrou um remédio errado e ainda ignorou os efeitos colaterais.

Mariliz Pereira Jorge - Lula, nós queremos saber

Folha de S. Paulo

Protagonistas na vitória da eleição, queremos ser ouvidos

Subir a rampa do Planalto com representantes de uma sociedade mais diversa é fácil. Difícil é transformar o discurso em ações para aumentar a participação dessas pessoas em setores variados do Estado. Pela segunda vez, Lula terá a chance de deixar o STF um pouquinho menos branco, menos masculino, menos hetero, mas principalmente, mais progressista.

O cenário deve permanecer o mesmo e Lula parece zero constrangido por garantir a presença de um conservador como Cristiano Zanin durante as três próximas décadas no Supremo. Agora defende a falta de transparência no Tribunal ao dizer que ninguém precisa saber como vota um ministro. O reaça do Bolsonaro não faria melhor.

Vera Rosa - Ministros em pé de guerra

O Estado de S. Paulo

Lula perguntou a um auxiliar quem tinha inventado o slogan ‘União e Reconstrução’

Enquanto todos os holofotes estão voltados para a dança das cadeiras no primeiro escalão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ministros de várias pastas até agora “imexíveis” dão cotoveladas entre si, nos bastidores. Sob o slogan “União e Reconstrução”, o governo tem, na prática, várias frentes de batalha.

A Advocacia-Geral da União (AGU), por exemplo, estuda acionar a Comissão de Ética Pública contra o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho. Motivo: há duas semanas, Agostinho fez comparação considerada desrespeitosa pela AGU ao usar de ironia para dizer que não existia “acordo” em licenciamento ambiental por se tratar de decisão técnica. “Não é Casas Bahia”, provocou ele.

Fábio Alves - O ministro decorativo

O Estado de S. Paulo

Haddad venceu a primeira disputa, mas as pressões para mudar a meta fiscal vão continuar

O divisor de águas na gestão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já assoma no horizonte: terá ele força suficiente para fazer o contingenciamento de despesas no Orçamento de 2024, assim que essa medida se torne absolutamente necessária, ou será forçado a mudar a meta de resultado primário do ano que vem, permitindo um déficit maior do que o originalmente fixado, mas enterrando a credibilidade do arcabouço fiscal no seu nascimento?

É praticamente unânime o sentimento do mercado de que o Congresso não irá entregar a Haddad, via medidas de cunho arrecadatório, o aumento necessário em receitas tributárias, de R$ 168 bilhões, para que a meta de déficit primário zero seja cumprida em 2024. Nesse caso, além de contingenciar despesas a nova regra fiscal prevê outros gatilhos, como a redução no ritmo de expansão de gastos de 70% para 50% das receitas registradas no ano anterior.

O que a mídia pensa: editoriais / opiniões

Transparência nas decisões do STF é inegociável

O Globo

Sugestão de sigilo feita por Lula é incompatível com o papel dos tribunais numa democracia

Recém-empossado no Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Cristiano Zanin se tornou alvo de críticas do PT e de setores da esquerda em razão de seus primeiros votos na Corte. Em pelo menos quatro casos, ele adotou posições contrárias à agenda tida como progressista. É curioso notar que, antes da sabatina no Senado, opositores do governo diziam que Zanin faria o que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva mandasse. Para o bem da Corte, nem uma coisa nem outra. Certo ou errado, ele agiu segundo o que as suas convicções apontavam como ditames da Constituição. Em vez de críticas, os votos de Zanin merecem no mínimo elogios pela independência.

Cobrado por aliados pela indicação de Zanin, Lula chegou a defender votos sigilosos no Supremo, como forma de deter a “animosidade” contra a Corte. “Se eu pudesse dar um conselho, é o seguinte: a sociedade não tem que saber como é que vota um ministro da Suprema Corte”, disse Lula. “Eu acho que o cara tem que votar, e ninguém precisa saber.”

Poesia | "El crimen fue en Granada" a Federico García Lorca - Antonio Machado

 

Música | El País que soñamos - Inti Illimani

 

Poesia | João Cabral de Melo Neto - O Rio