sábado, 6 de agosto de 2016

Opinião do dia - Zygmunt Bauman

Trata-se de uma perspectiva sombria e perturbadora, mas atenção: a situação de sociedades dominadas pelo medo não é de modo algum um destino predeterminado, nem inevitável. As promessas dos demagogos podem se afirmar, mas também têm, por sorte, vida breve. Uma vez que novos muros vierem a ser erguidos e mais forças armadas forem dispostas nos aeroportos e nos espaços públicos; uma vez que se recusem os pedidos de asilo de quem procura fugir de guerras e destruições e que mais migrantes sejam repatriados, ficará evidente que tudo isso é irrelevante para resolver as causas reais da incerteza. Os demônios que nos perseguem – o medo de perder nossa posição na sociedade, a fragilidade das metas que definimos – não irão evaporar, não desaparecerão. Nesse ponto, poderemos despertar e desenvolver os anticorpos contra as sereias dos demagogos e dos bufões agitadores que tentam conquistar capital político com o medo, jogando-nos fora da estrada. O temor é que, antes que esses anticorpos sejam desenvolvidos, muitos vejam as próprias vidas serem destruídas.

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Zygmunt Bauman (1925) é um sociólogo polonês. Serviu na Segunda Guerra Mundial pelo exército da União Soviética e conheceu sua esposa, Janine Bauman, nos acampamentos de refugiados polacos. Entrevista ao Jornal italiano Corriere dela Sera, 27/7/2016.

MP vê Lula em esquema criminoso

‘Lula participou ativamente do esquema criminoso na Petrobrás’, diz Procuradoria

• Em manifestação de 70 páginas, Ministério Público Federal defende competência do juiz Sérgio Moro para julgar o ex-presidente e afirma que o petista 'tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou'

Ricardo Brandt, Julia Affonso, Fausto Macedo e Mateus Coutinho – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Em manifestação de 70 páginas, o Ministério Público Federal defende a competência do juiz federal Sérgio Moro para julgar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e afirma que o petista ‘participou ativamente do esquema criminoso’ na Petrobrás. O documento, de 3 de agosto, é subscrito por quatro procuradores da República que compõem a força-tarefa da Operação Lava Jato.

É o mais contundente parecer já elaborado pelo Ministério Público Federal contra Lula.

“Considerando os dados colhidos no âmbito da Operação Lava Jato, há elementos de prova de que Lula participou ativamente do esquema criminoso engendrado em desfavor da Petrobrás, e também de que recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas decorrentes dessa estrutura delituosa”, acusam os procuradores.

A manifestação é uma resposta à ofensiva da defesa de Lula que, em exceção de incompetência, alega parcialidade do juiz Moro para conduzir as investigações contra o ex-presidente. A Lava Jato suspeita que Lula é o verdadeiro proprietário do sítio Santa Bárbara, em Atibaia (SP), e do tríplex 164-A no Guarujá – os advogados de Lula negam taxativamente que ele possua tais propriedades. A investigação também mira a LILS, empresa de palestras do ex-presidente.

A defesa de Lula alega que inexistem motivos para que Moro ‘seja competente para processar e julgar os feitos que o envolvem, em razão de os fatos supostamente delituosos – aquisição e reforma de imóveis nos municípios de Atibaia e Guarujá e realização de palestras contratadas – consumaram-se no Estado de São Paulo, não apresentando conexão com os fatos investigados no âmbito da Operação Lava Jato’.

Os procuradores Julio Carlos Motta Noronha, Roberson Henrique Pozzobon, Jerusa Burmann Viecili e Athayde Ribeiro Costa afirmam que há ‘fortes indícios’ de envolvimento de Lula no esquema Petrobrás.

“Contextualizando os fortes indícios, diversos fatos vinculados ao esquema que fraudou as licitações da Petrobrás apontam que o ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (Lula) tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”, acusam os procuradores.

A peça é um verdadeiro libelo e remonta ao episódio do Mensalão, onze anos atrás, primeiro escândalo da era Lula.

“Considerando que uma das formas de repasse de propina dentro do arranjo montado no seio da Petrobrás era a realização de doações eleitorais, impende destacar que, ainda em 2005, Lula admitiu ter conhecimento sobre a prática de “caixa dois” no financiamento de campanhas políticas”, destacam.

Os procuradores observam que Lula, em recente depoimento à Polícia Federal, ‘reconheceu que, quanto à indicação de Diretores para a Petrobrás “recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados”’.

“Ou seja, Lula sabia que empresas realizavam doações eleitorais “por fora” e que havia um ávido loteamento de cargos públicos. Não é crível, assim, que Lula desconhecesse a motivação dos pagamentos de “caixa 2” nas campanhas eleitorais, o porquê da voracidade em assumir elevados postos na Administração Pública federal, e a existência de vinculação entre um fato e outro”, acusam.

Segundo os procuradores, ‘a estrutura criminosa perdurou por, pelo menos, uma década’. A Lava Jato investiga o esquema de corrupção, cartel e propinas instalado na Petrobrás entre 2004 e 2014.

A peça lista quadros importantes do PT, antigos aliados de Lula, muitos deles acabaram na prisão da Lava Jato.

“Nesse arranjo, os partidos e as pessoas que estavam no Governo Federal, dentre elas Lula, ocuparam posição central em relação a entidades e indivíduos que diretamente se beneficiaram do esquema: José Dirceu, primeiro ministro da Casa Civil do Governo de Lula, pessoa de sua confiança, foi um dos beneficiados com o esquema; André Vargas, líder do Partido dos Trabalhadores na Câmara dos Deputados durante o mandato de Lula, foi um dos beneficiados com o esquema; João Vaccari, tesoureiro do Partido dos Trabalhadores, legenda pela qual Lula se elegeu, foi um dos beneficiados com o esquema; José de Filippi Júnior, tesoureiro de campanha presidencial de Lula em 2006, recebeu dinheiro oriundo do esquema; João Santana, publicitário responsável pela campanha presidencial de Lula em 2006, recebeu dinheiro oriundo do esquema.”

Os procuradores se reportam também a inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal e relatam que ‘partidos políticos da base aliada do Governo Federal de Lula e seus filiados receberam recursos oriundos do esquema’.

“Executivos das maiores empreiteiras do País, que se reuniam e viajavam com Lula, participaram do esquema criminoso, fraudando as licitações da Petrobrás, e pagando propina. Considerando que todas essas figuras, diretamente envolvidas no estratagema criminoso, orbitavam em volta de Lula e do Partido dos Trabalhadores, não é crível que ele desconhecesse a existência dos ilícitos”, destaca o documento.

A Procuradoria afirma que ‘mesmo após o término de seu mandato presidencial, Lula foi beneficiado direta e indiretamente por repasses financeiros de empreiteiras envolvidas na Operação Lava Jato’.

“Rememore-se que, no âmbito desta operação, diversos agentes públicos foram denunciados por receber vantagem indevida mesmo após saírem de seus cargos. Além disso, é inegável a influência política que Lula continuou a exercer no Governo Federal, mesmo após o término de seu mandato (encontrando-se até hoje, mais de cinco anos após o fim do seu mandato com a atual Presidente da República).

E, por fim, não se esqueça que diversos funcionários públicos diretamente vinculados ao esquema criminoso, como os Diretores da Petrobrás Paulo Roberto Costa e Renato Duque, foram indicados por Lula e permaneceram nos cargos mesmo após a saída deste da Presidência da República.”

Leia o documento

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Lula participou ativamente e se beneficiou das fraudes na Petrobras, diz MPF

‘Participação ativa’ no crime

• MPF diz que Lula e os petistas formavam uma só organização para desviar recursos na Petrobras

Cleide Carvalho e Renato Onofre - O Globo

-SÃO PAULO- O Ministério Público Federal (MPF) informou ontem ter elementos suficientes para provar que o ex-presidente Lula “participou ativamente” do esquema criminoso na Petrobras, e também recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas. Em documento no qual defendeu a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba, sob o comando do juiz Sérgio Moro, para julgar os processos envolvendo o ex-presidente, os procuradores da Lava-Jato disseram que Lula “tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”, e afastaram a hipóteses de que “ele desconhecesse a existência dos ilícitos”.

“Considerando os dados colhidos no âmbito da Operação Lava-Jato, há elementos de prova de que Lula participou ativamente do esquema criminoso engendrado em desfavor da Petrobras, e também de que recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas decorrentes dessa estrutura delituosa”, escreveram os procuradores, em ofício encaminhado ao juiz.

O parecer do MPF foi incluído em processo de “exceção de incompetência” movido pelos advogados de Lula na Justiça Federal, em Curitiba, contra Moro. A defesa do ex-presidente afirma que o juiz demonstrou em três momentos perda de imparcialidade para conduzir os processos contra o líder do PT. O primeiro deles ao autorizar as ações do dia 4 de março, como a condução coercitiva do ex-presidente e as buscas e apreensões em imóveis a ele relacionados. O segundo, quando levantou o sigilo das interceptações telefônicas. O terceiro, quando o juiz supostamente acusou Lula — 12 vezes, segundo a defesa — em petição encaminhada ao Supremo Tribunal Federal, em abril.

“Enriquecimento ilícito”
No documento encaminhado à Justiça, os procuradores afirmam que o esquema envolveu pessoas importantes e próximas a Lula, como o ex-ministro José Dirceu; os ex-tesoureiros do PT João Vaccari Neto e José di Filippi Júnior, e o publicitário João Santana. Dizem ainda que os envolvidos formavam uma só organização, com o mesmo modus operandi, integrada pelos mesmos agentes, ainda que os contextos sejam “parcialmente diferentes”. O fim, ressaltam, era o mesmo em todos os casos: “Enriquecimento ilícito dos seus integrantes e manutenção do poder político”.

O MPF frisa que, em 2005, o ex-presidente admitiu ter conhecimento sobre a prática de caixa dois no financiamento de campanhas políticas e, em recente depoimento prestado à Polícia Federal, reconheceu que, no caso da Petrobras, “recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados”.

“Ou seja, Lula sabia que empresas realizavam doações eleitorais ‘por fora’ e que havia um ávido loteamento de cargos públicos. Não é crível, assim, que Lula desconhecesse a motivação dos pagamentos de caixa 2 nas campanhas eleitorais, o porquê da voracidade em assumir elevados postos na administração pública federal”, escreveram os procuradores.

Os investigadores não trazem novas provas da participação do ex-presidente no esquema criminoso que atuou na Petrobras. Na petição, o MPF lembra que, embora não exista ainda denúncia ou ação penal contra o ex-presidente na 13ª Vara Federal de Curitiba, as evidências colhidas até agora indicam que ele foi beneficiado com o tríplex do Guarujá, que era mantido no nome da OAS. “Evidências colhidas até o momento indicam que o imóvel é utilizado por Lula e sua família”, diz o texto.

Na avaliação do MPF, a manutenção do tríplex em nome da construtora no Cartório de Registro de Imóveis é somente uma “dissimulação”.

Os procuradores argumentam ainda que, mesmo depois de ter deixado a Presidência da República, Lula foi beneficiado por repasses de empreiteiras, responsáveis por 47% dos pagamentos feitos à sua empresa de palestras, e que é inegável que ele manteve influência política sobre o governo federal. Os procuradores lembraram que foi Lula quem indicou Paulo Roberto Costa e Renato Duque para a diretoria da Petrobras.

“Diversos fatos vinculados ao esquema que fraudou licitações da Petrobras apontam que o ex-presidente da República tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”, diz o texto.

“Apenas ilações”, diz Instituto Lula
A peça jurídica traz ainda um histórico da Operação Lava-Jato, do esquema de corrupção e de como os indícios contra Lula surgiram na investigação. O argumento da Procuradoria é que, por se tratar de uma mesma organização criminosa que atuou, segundo os investigadores, desde 2004 na Petrobras, a competência do caso pertence à Justiça Federal do Paraná, que iniciou a apuração com a descoberta da ligação entre o doleiro Alberto Youssef e o ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa.

Em nota, a defesa do ex-presidente afirma que a posição do MPF foi elaborada “para servir de manchete para a imprensa” e não discute a exceção de competência do juiz no caso. Os advogados Cristiano Martins e Roberto Teixeira afirmam que as acusações ao expresidente têm por objetivo “encobrir a falta de argumentos do MPF” sobre o caso: “Desde março, membros do MPF fazem afirmações difamatórias contra o ex-presidente Lula”.

“A verdade é que o Ministério Público Federal submeteu Lula e seus familiares a uma indevida devassa e verificou que o ex-presidente não cometeu qualquer crime. Mas, ao invés de seus membros reconhecerem inocência de Lula, querem condená-lo por meio de manchetes dos jornais e revistas”, afirma a nota.

O Instituto Lula, em nota, afirmou que os procuradores da Lava-Jato “iludem” ao afirmar que têm provas:

“Uma afirmação dessa gravidade só poderia ser feita com base em provas concretas. Como não há fatos, apenas ilações, pois Lula sempre agiu dentro da lei, os procuradores da Lava-Jato mantiveram hoje sua campanha de difamação e perseguição ao maior líder político do país”. Segundo o instituto, a ação “configura uma caçada judicial, com apelo à propaganda ofensiva para sustentar um julgamento pela mídia”: “O que se deseja fazer com ele é um linchamento”. A nota diz ainda que Lula “reafirma sempre ter agido dentro da lei antes, durante e depois da presidência da República”.

Lula 'participou ativamente' de petrolão, acusam procuradores

Estelita Hass Carazzai – Folha de Paulo

CURITIBA - Em parecer à Justiça nesta semana, procuradores da Operação Lava Jato acusam o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de ter "participado ativamente" do esquema de corrupção na Petrobras e de ser um de seus beneficiários.

"Há elementos de prova de que Lula participou ativamente do esquema criminoso engendrado em desfavor da Petrobras, e também de que recebeu, direta e indiretamente, vantagens indevidas decorrentes dessa estrutura delituosa", escrevem os procuradores.

O documento, de 70 páginas, é um dos mais incisivos posicionamentos do Ministério Público em relação ao ex-presidente, alvo de inquéritos na Lava Jato.

Para os procuradores, não é "crível" que Lula não soubesse da existência do esquema, tendo em vista que admitiu, ainda em 2005, a existência de caixa dois no PT e também afirmou à Polícia Federal, em março, que nomeava os diretores da Petrobras de acordo com as indicações de aliados políticos.

"Diversos fatos vinculados ao esquema que fraudou as licitações da Petrobras apontam que o ex-Presidente da República tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou", escrevem.

A força-tarefa ainda acusa o PT de atuar "de forma constante e própria" para obter dinheiro para a legenda.

O documento lista diversos acusados na Lava Jato que tinham ascendência no partido e íntima relação política com Lula, tais como o ex-ministro José Dirceu, o ex-tesoureiro João Vaccari Neto e o ex-deputado André Vargas -todos presos pela operação.

"Considerando que todas essas figuras, diretamente envolvidas no estratagema criminoso, orbitavam em volta de Lula e do PT, não é crível que ele desconhecesse a existência dos ilícitos", dizem os procuradores.

Argumentos da defesa
O parecer do Ministério Público Federal, apresentado ao juiz federal Sergio Moro nesta quarta (3), é uma resposta a um pedido de exceção de incompetência feito pela defesa de Lula, no início de julho.

Ele é investigado pela Lava Jato sob suspeita de ocultar a propriedade de um tríplex no Guarujá, um sítio em Atibaia (SP) e se beneficiar de dinheiro de origem ilícita ao dar palestras pagas por empreiteiras.

Os advogados do ex-presidente argumentam que os fatos investigados pelos procuradores ocorreram no Estado de São Paulo e não têm qualquer relação com a Lava Jato. Lula nega as acusações e diz ser alvo de perseguição política pelo Ministério Público.

A defesa de Lula, que recorreu à ONU acusando Moro de violar direitos, argumenta que o juiz perdeu a imparcialidade para cuidar dos inquéritos contra o petista e já indicou um juízo de valor desfavorável ao ex-presidente.

Em petição à ONU, os advogados questionam a "privação de liberdade" durante a medida de condução coercitiva, em março, e o "vazamento de materiais confidenciais", em referência às conversas telefônicas entre Lula e a presidente afastada Dilma Rousseff (PT), também em março.

Os advogados sustentam que o Brasil assinou um protocolo de adesão a um pacto internacional de proteção aos direitos humanos em 2009, que está sendo desrespeitado com as atitudes do juiz.

O pedido de exceção de incompetência, que será avaliado pelo próprio Moro, ainda não foi julgado.

Lula participou de crimes na Petrobras, diz MPF em manifestação a Moro

André Guilherme Vieira- Valor Econômico

SÃO PAULO - Ao defender a competência do juiz federal Sergio Moro para julgar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Operação Lava-Jato, o Ministério Público Federal (MPF) afirmou que o petista “participou ativamente do esquema criminoso na Petrobras” e que foi beneficiado pela estrutura de corrupção instalada na estatal.

O documento de 70 páginas assinado por quatro procuradores da força-tarefa de Curitiba é uma resposta às exceções de competência ajuizadas pela defesa de Lula contra o juiz Moro. Os criminalistas que defendem o ex-presidente argumentam que o magistrado não teria isenção para julgar Lula.

“Diversos fatos vinculados ao esquema que fraudou licitações da Petrobras apontam que o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”, sustentam os procuradores da República.

Lula é réu em processo que tramita na Justiça Federal em Brasília e que decorre da acusação de que ele atuou para obstruir o avanço da Operação Lava-Jato ao participar de uma suposta trama engendrada com a participação do senador cassado Delcídio do Amaral para evitar que o ex-diretor de Internacional da Petrobras, Nestor Cerveró, firmasse acordo de delação premiada com a Procuradoria Geral da República (PGR).

Ainda segundo o MPF, restou demonstrado que Lula sabia que as empreiteiras investigadas por crimes na Petrobras realizavam caixa dois eleitoral.

“Conforme recente depoimento prestado à Polícia Federal, [Lula] reconheceu que, quanto à indicação dos diretores para a Petrobras ‘recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados’. Ou seja, Lula sabia que empresas realizavam doações eleitorais ‘por fora’ e que havia um ávido loteamento de cargos públicos. Não é crível, assim, que Lula desconhecesse a motivação dos pagamentos de ‘caixa dois’ nas campanhas eleitorais, o porquê da voracidade em assumir elevados postos na administração pública federal e a existência de vinculação entre um fato e outro”.

Os procuradores da força-tarefa também relatam o que consideram indícios de crimes de lavagem de dinheiro e corrupção que atribuem a Lula, envolvendo o sítio de Atibaia (do qual seria dono oculto) e do flat no Guarujá (SP), que se trataria de ocultação patrimonial, além da realização de palestras contratadas e colocadas sob suspeita pelos investigadores.

Na manifestação, os procuradores destacam que, em 2005, Lula “admitiu ter conhecimento sobre a prática de ‘caixa dois’ no financiamento de campanhas políticas”.

O MPF também argumenta que todos os fatos investigados têm conexão direta com as apurações conduzidas pela Operação Lava-Jato e elenca as ações penais em curso e as condenações de empreiteiros, agentes políticos e servidores ocorridas até agora como resultado da investigação.

Juízes e procuradores cobram do STF decisão sobre 2ª instância

• Entidades veem prejuízo ao sistema jurídico; debate deve ficar para setembro

Carolina Brígido - O Globo

-BRASÍLIA- Diante do vaivém no Supremo Tribunal Federal (STF) em decisões recentes sobre a prisão de condenados em segunda instância, entidades de juízes e do Ministério Público cobram da Corte celeridade na fixação de uma regra definitiva sobre o assunto. Em fevereiro, o STF afirmou que um condenado em segunda instância deve começar a cumprir a pena de prisão. Mas a decisão valeu apenas para o réu que teve o recurso julgado. Duas ações de constitucionalidade aguardam a análise do STF. Se o entendimento for confirmado, a tese será aplicada em todo o país.

Mas o Supremo não parece ter pressa: a previsão é a de que a questão continue indefinida no país pelo menos até meados de setembro. 7 VOTOS A 4 A decisão de fevereiro foi tomada no plenário do STF por sete votos a quatro. Em junho, o mais antigo integrante do STF, o ministro Celso de Mello, que ficou no grupo vencido, deu habeas corpus libertando um réu que tinha sido preso depois de condenado em segunda instância. Argumentou que o princípio constitucional da presunção de inocência dava ao condenado o direito de recorrer em liberdade até a última instância.

Em julho, durante o recesso do tribunal, o presidente, Ricardo Lewandowski, mandou soltar outro réu na mesma situação. Na última quarta-feira, com o fim do recesso, o relator do caso, Edson Fachin, revogou a decisão e determinou a volta do réu para a prisão.

O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcanti, elogiou a decisão de fevereiro. Ele criticou a atitude dos ministros que contrariaram a posição do plenário, e cobrou definição rápida do STF sobre o assunto, para dar um ponto final às polêmicas.

— A decisão do STF devolveu a racionalidade do nosso sistema criminal. Por que em todo lugar do mundo existe a presunção de inocência e só no Brasil é necessário esperar julgar todos os recursos antes de executar a pena? Os ministros têm o direito de dar decisões segundo suas opiniões, já que não foi dada repercussão geral à decisão de fevereiro, mas não acho positivo. Esse inconformismo da minoria não faz sentido: desrespeita a segurança jurídica e a posição clara da maioria. É preciso discutir isso em plenário o mais rapidamente possível — disse Robalinho.

Ele considerou inadequada a atitude de Lewandowski de desautorizar a posição da maioria dos colegas ao conceder a liminar no plantão do recesso.

O presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), João Ricardo dos Santos Costa, apoia as prisões em segunda instância, e também quer definição breve da Corte, para acabar com a incerteza.

— Nós apoiamos a decisão do Supremo. Ela colabora bastante com a celeridade dos processos. Hoje existe a possibilidade de muitos recursos antes da prisão, e isso tem impedido a ação efetiva do Judiciário. Um mesmo processo tem 80, 90 recursos, o que inviabiliza a jurisdição — declarou Costa.

Sem caráter vinculante
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Roberto Carvalho Veloso, ponderou que os ministros do STF têm o direito de conceder habeas corpus a presos em segunda instância, já que o julgamento de fevereiro não teve caráter vinculante.

— Para resolver essa questão, basta o STF firmar o entendimento de que os fatos e provas transitam em julgado na segunda instância. A partir daí, o acusado não é mais presumivelmente inocente, devendo iniciar o cumprimento efetivo da pena — explicou Veloso.

Lewandowski não tem previsão de quando vai pautar as ações sobre o assunto. O mais provável é que o caso fique para a gestão da ministra Cármen Lúcia, que assumirá a presidência do STF em meados de setembro, para mandato de dois anos. As ações foram apresentadas pelo Partido Ecológico Nacional (PEN) e pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Presidente do PT procura Dilma para desfazer mal-estar

• Presidente afastada ficou contrariada com declaração de dirigente petista sobre nova eleição; Lula e Berzoini tentam acalmar os ânimos

Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Vinte e quatro horas após ter classificado como“inviável” a proposta de um plebiscito sobre a antecipação das eleições, como defende Dilma Rousseff, o presidente do PT, Rui Falcão, telefonou para o ex-ministro da Secretaria de Governo Ricardo Berzoini. Queria desfazer o mal-estar provocado por suas declarações da véspera, já que a presidente afastada decidiu incluir a consulta popular na carta a ser enviada aos senadores, na próxima semana.

O presidente do PT não falou com Dilma, que ficou contrariada com a sua declaração. Berzoini, que hoje chefia a equipe da “pronta resposta” de Dilma, fez o meio de campo para tentar apaziguar os ânimos. Até o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou na operação para jogar água na fervura.

Quando Falcão ligou para Brasília, ontem, Dilma estava no Palácio da Alvorada com o assessor Giles Azevedo e o ex-titular da Previdência Carlos Gabas. A presidente afastada foi informada do telefonema por Berzoini.

Falcão também foi cobrado por dirigentes do PT logo após dizer a jornalistas, na quinta-feira, que descartava a ideia de antecipar as eleições de 2018, entrando em rota de colisão com Dilma. A proposta constará da Carta aos Brasileiros que ela deve divulgar no próximo dia 10, depois da primeira etapa da votação do impeachment, no plenário do Senado, marcada para terça-feira.

“Estou defendendo um plebiscito porque quem pode falar o que eu devo fazer não é nem o Congresso, nem uma pesquisa, ou qualquer coisa. Quem pode falar é o conjunto da população, que me deu 54 milhões e meio de votos”, afirmou Dilma, em recente entrevista à BBC Brasil. “Ela tem toda a razão. O PT não pode se acomodar e aceitar esse golpe. É isso que vai dividir o partido”, protestou o secretário de Formação Política, Carlos Árabe.

A estratégia da presidente afastada tem o objetivo de marcar posição no momento em que, no diagnóstico dos próprios petistas, o impeachment já é irreversível. Dilma, porém, ainda tenta transmitir a imagem de que pode conquistar apoio. Um projeto de plebiscito precisa passar pelo Congresso, onde o presidente em exercício Michel Temer tem hoje maioria de votos.

Relação tensa. Foi para dizer que manifestara opinião pessoal, pois o polêmico debate sobre antecipação de eleições só entrará na pauta do PT daqui a dez dias, que Falcão ligou ontem para Brasília. É no Alvorada que Dilma despacha desde 12 de maio, quando o Senado autorizou a abertura do impeachment. Ela soube da justificativa dada por Falcão, mas não se convenceu.

A tensão entre Dilma e a cúpula do PT aumentou nos últimos dias. Na terça-feira, ela disse que o partido precisa admitir erros, do ponto de vista ético, e passar por “uma grande transformação”. Antes, havia apontado o dedo para o PT ao afirmar que nunca autorizou caixa 2 em sua campanha. Após a delação do marqueteiro João Santana, Dilma destacou que a responsabilidade sobre os pagamentos para ele era da “tesouraria do partido”.

Apesar do discurso da resistência, a presidente afastada já começou a transportar algumas coisas para Porto Alegre, onde mora sua família. Mas ainda não mexeu nos livros.

Lava Jato prevê em dois meses denúncia à Justiça contra Lula por corrupção

• Acusação deverá apontar supostas vantagens ao ex-presidente na compra do sítio de Atibaia e do tríplex no Guarujá

Fábio Fabrini – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba pretende concluir em dois meses as investigações sobre o pagamento, por empreiteiras beneficiadas por desvios na Petrobrás, de supostas vantagens ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em de obras no sítio de Atibaia e no tríplex do Guarujá.

A previsão dos investigadores é de que esses dois casos embasem a primeira denúncia por corrupção oferecida contra Lula no âmbito da Lava Jato. No fim de julho, a 10ª Vara Federal em Brasília aceitou acusação da Procuradoria da República no DF contra o petista por “obstrução” de Justiça ao, supostamente, tentar evitar a delação premiada do ex-diretor Internacional da estatal Nestor Cerveró.

“O sítio e o tríplex são os fatos mais adiantados. Com certeza, isso vai se resolver nos próximos dois meses. Uma boa parte disso, porque existem diversas investigações contra Lula”, afirmou um dos investigadores ao Estado, sem detalhar os casos.

A Lava Jato também apura suposto tráfico de influência praticado pelo ex-presidente para que grandes empreiteiras obtivessem obras no exterior. A tese dos procuradores é de que, em troca, elas fizeram pagamentos vultosos à empresa de palestras do petista, a LILS, e ao Instituto Lula.

Lula nega que os pagamentos das empreiteiras estejam relacionados a contratos obtidos por elas tanto no governo federal quanto no exterior. O ex-presidente, por meio de sua defesa, também nega ser o proprietário do sítio de Atibaia e do tríplex no Guarujá.

Olimpíada. A força-tarefa pretende dedicar as próximas três semanas para as análises sobre as reformas nos imóveis pagas pelas empresas. “O período olímpico não é um período de grandes movimentações. Nem operações nem novidades mais ‘dramáticas’. Temos uma agenda interna”, disse o investigador.

Lula e a mulher, dona Marisa, são suspeitos de ganhar da OAS uma reforma avaliada em mais de R$ 700 mil num tríplex reservado para a família do ex-presidente no Guarujá. A empreiteira também pagou, por vários anos, o aluguel de contêineres para armazenar os pertences do ex-presidente quando deixou o Palácio do Planalto, em 2010.

Conforme as investigações, a OAS e a Odebrecht também bancaram melhorias no sítio de Atibaia usado pela família de Lula e registrado em nome de amigos do ex-presidente. A suspeita dos investigadores é de que o ex-presidente tenha ocultado a propriedade do imóvel.

Num relatório recente, a Polícia Federal sustenta que só a “cozinha gourmet” do sítio, cujos equipamentos foram instalados em 2014, custou R$ 252 mil. A execução da obra teria sido orientada pelo petista e a esposa.

Nova lei cria piso de votos para vereadores serem eleitos

Carolina Linhares, Paula Reverbel – Folha de S. Paulo

SÃO PAULO - Os aspirantes a vereador que pegam carona com os candidatos "puxadores de voto" terão, pela primeira vez, uma meta a cumprir: para chegar à Câmara municipal, seu resultado nas urnas precisa ser, no mínimo, 10% do quociente eleitoral.

O quociente é formado pelo total de votos válidos dividido pela quantidade de cadeiras na Câmara. Em 2012, o quociente em São Paulo foi 103.843 –a nota de corte, portanto, teria sido 10.384 votos.

A regra visa evitar a eleição de candidatos pouco votados. Caso o candidato não alcance o mínimo, a vaga será redistribuída a outros partidos ou coligações.

"Isso é inconstitucional, é cláusula de barreira disfarçada", diz à Folha Aildo Ferreira, presidente do PRB em São Paulo. A Rede, outro partido que pode ser afetado, vê a medida como uma manobra para manter o poder com as siglas tradicionais.

Se a lei valesse em 2012, o único dos 55 vereadores paulistanos a perder sua vaga seria Toninho Vespoli (PSOL), que teve 8.722 votos.

O vereador, que se elegeu com os 117.475 votos do PSOL (41.248 à legenda e 76.227 a candidatos), diz concordar com a regra, mas considera o percentual elevado.

"É uma distorção eleger candidatos com poucos votos, mas também é uma distorção as pessoas votarem em um partido porque acreditam naquela linha e o partido não eleger ninguém", diz.

Para o vereador Claudinho de Souza (PSDB), a regra garante "um mínimo de representatividade", opinião partilhada pelo vereador George Hato (PMDB).

Outras regras
Algumas siglas se opõem a outras restrições da nova legislação eleitoral, como o veto a doações de empresas e a redução da campanha, que passou de 90 para 45 dias.

"Todos os partidos devem estar sofrendo. Vai ser uma campanha muito humilde", resume Ferreira.

"Essa eleição será única, dificilmente essas regras se repetirão para as próximas", diz o vereador Paulo Fiorilo (PT).

Hato aposta no contrário: "estamos sendo cobaias para 2018".

Rede e PSOL, que já defendiam o fim de doações de empresas, comemoraram. "Talvez tenha sido o único fato positivo", diz Vespoli.

Para Souza (PSDB), a restrição afeta mais os prefeitos. "É difícil vereador ter doação que não seja de amigos. Eu nunca consegui de empresas".

Houve ainda quem comemorou a redução da campanha: "É muito desgastante, faz mal para saúde, tem gente que perde até casamento na campanha", brinca Hato.

As novas regras são apontadas como motivo da queda do número de candidatos a vereador, que deve ficar próximo de 700 em São Paulo, contra mais de 1.200 em 2012.

"Os partidos financiavam candidatos menores, faziam material. Com menos recursos, as pessoas evitam aventuras", diz Antônio Donato (PT), presidente da Câmara.

Televisão
Com menos tempo para vender propostas e percorrer a cidade, a campanha dos vereadores terá que aproveitar o tempo na TV –que também encurtou.

Eles perderam espaço no programa eleitoral, que passa a ter seus 20 minutos diários dedicados aos candidatos a prefeito.

Os postulantes ao Legislativo terão reservados 40% dos 70 minutos de inserções de propagandas.

No PRB, DEM e PMDB, os candidatos mais conhecidos devem ter preferência. Já a Rede vai dividir o tempo igualmente. O nanico PHS terá somente dirigentes pedindo voto na legenda, segundo o vereador Laércio Benko.

PSOL, PSDB e PT ainda não definiram estratégia. Entre os candidatos petistas, o destaque é o ex-senador Eduardo Suplicy. "Nós sabemos da importância do Suplicy, como sabemos da importância de outros parlamentares que já estão no PT há muito tempo", afirmou Fiorilo ao ser questionado sobre a distribuição do tempo de TV entre os candidatos a vereador.

Os vereadores dizem ainda que o teto de arrecadação estabelecido pela nova lei não altera a campanha em São Paulo. Eles consideram o limite de R$ 3,2 milhões muito alto e, dificilmente, seria ultrapassado.

De fato, em 2012, a média de gastos dos candidatos foi de R$ 840 mil. Só dois extrapolaram o atual teto –o candidato a vice-prefeito Andrea Matarazzo e Milton Leite, que, em busca do 6° mandato, minimizou os efeitos das restrições em sua campanha.

PSB declara apoio a Indio para prefeito do Rio

• Após negociar com 5 partidos, legenda define Hugo Leal como vice

Bruno Góes - O Globo

Depois de negociar com PSDB, PRB, PMDB e Rede, o PSB decidiu, no último dia do prazo eleitoral para formalizar chapas, apoiar Indio da Costa, do PSD, para a prefeitura do Rio. Na tarde de ontem, o anúncio foi feito na sede do partido no Rio, no Flamengo. O deputado federal Hugo Leal (PSB) será o vice de Indio, em coligação que conta ainda com o Partido da Mulher Brasileira (PMB), presidido por Suêd Haidar, também presente no evento.

As negociações entre PSB e PSD vararam a madrugada de ontem. Às 21h de quinta-feira, a direção nacional do PSB havia fechado acordo com o PMDB para apoiar Pedro Paulo, mas, por volta das 5h de ontem, Indio reverteu o quadro e retomou o apoio dos socialistas.

Mesmo com a pressão do prefeito do Rio, Eduardo Paes, e do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para esvaziar a campanha de Indio, o partido de Gilberto Kassab venceu a disputa. Agora, o PSB terá o terceiro maior tempo da campanha, atrás apenas de Jandira Feghali (PCdoB) — que tem o apoio do PT — e de Pedro Paulo, maior tempo de TV na campanha eleitoral.

— O eleitor está na busca de um candidato de centro. E o eleitor quer um bom gestor. Nós tínhamos pouco tempo de televisão. Agora, com a vinda do Hugo para cá, temos duas coisas que são fundamentais. A primeira: a gente vai ter dois gestores na prefeitura. Dois prefeitos trabalhando pelo Rio. E uma experiência política muito grande — disse Indio.

Na quinta-feira, Indio foi à convenção do PSB, mas o partido não anunciou o apoio a qualquer candidatura à prefeitura do Rio. No plenário da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no Centro do Rio, Indio pediu o apoio dos filiados e lançou Hugo Leal para ser vice em sua chapa. Entretanto, nada foi decidido.

Enquanto o presidente nacional do partido, Carlos Siqueira, negociava o apoio a Pedro Paulo, o presidente estadual, Hugo Leal, preferia Indio.

Mesmo com o apoio do PSB a Indio, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, costura um apoio independente de Romário à candidatura do PMDB. O ex-jogador, inclusive, não esteve presente na convenção e nem na formalização da chapa. Romário desistiu da candidatura no mês passado, depois de não conseguir arrecadar fundos para a campanha. Ele chegou bem perto de apoiar Marcelo Crivella (PRB) antes de ser retirado do comando estadual do PSB, que passou para as mãos de Hugo Leal.

Zigmunt Bauman: “Os demônios que nos perseguem não irão evaporar”

• Entrevista concedida ao jornalista italiano Davide Casati, em Bruxelas,e publicada no jornal Corriere della Sera (http://goo.gl/7kGoam) e no portal Social Europe (https://goo.gl/CDF6if) em 25 e 27 de julho de 2016.

Tradução de Marco Aurélio Nogueira.

Estamos assistindo, com força expressiva nas últimas semanas, ao desenrolar de uma época marcada pelo medo e pela incerteza. A tese, que tem sido sistematicamente reiterada pelo sociólogo polonês Zigmunt Bauman, faz com que ele não alimente fáceis ilusões: “os demônios que nos perseguem não irão evaporar”, pois eles nascem e se alimentam dos próprios elementos que constituem nosso modo de vida e nossas sociedades.

Nessa entrevista, o pensador polonês explora sua visão do mundo e suas teses. Ele fala pensando sobretudo na Europa, mas as considerações que faz abarcam o conjunto do mundo contemporâneo.

• Diante da cadeia de ataques que atingiram a Europa nas últimas semanas, o continente está tentando fazer as contas com um abismo de medo e insegurança. Que respostas podem ser alcançadas?

As raízes da insegurança são muito profundas. São existenciais: penetram fundo em nosso modo de viver, nascem e renascem diariamente da substituição em curso da solidariedade humana pela desconfiança mútua e pela concorrência desenfreada, são impulsionadas pelo enfraquecimento dos laços interpessoais, da dissolução das comunidades, da tendência de confiar a indivíduos providenciais a resolução de problemas de relevância mais ampla, social. O medo gerado por essa situação, em um mundo submetido aos caprichos de poderes econômicos desregulamentados e fora de controles políticos, aumenta e se difunde sobre todos os aspectos de nossas vidas. E faz com que se passe a buscar em vão um alvo, um objetivo sobre o qual se concentrar – um alvo palpável, visível e ao alcance das mãos.

• Um objetivo que muitos visualizam no fluxo de refugiados e migrantes.

Muitos desses provêm de uma situação em que estavam seguros da própria posição na sociedade, do seu trabalho, da sua educação. De repente, tornam-se refugiados, perderam tudo. No momento da chegada, entram em contato com a parte mais precária das nossas sociedades, que neles veem a realizações de seus pesadelos mais profundos.

• Diante desse desafio, crescem os pedidos de certas forças políticas para que se construam novos muros. Trata-se de uma resposta sensata?

Creio que se deve estudar, memorizar e aplicar a análise que papa Francisco, em seu discurso de agradecimento pelo prêmio Carlos Magno, dedicou aos perigos mortais do “aparecimento de novos muros na Europa”. Muros erguidos – de modo paradoxal e com má-fé – com a intenção e a esperança de que se possa ficar ao abrigo do tumulto de um mundo pleno de riscos, armadilhas e ameaças. O Pontífice observa, com profunda preocupação, que se os pais fundadores da Europa, “mensageiros de paz e profetas do futuro”, nos inspiraram “a criar pontes e a derrubar muros”, agora a família de nações que foram por eles impulsionadas parecem estar “sempre menos à vontade na casa comum. O desejo novo e celebrado de criar unidade parece esvaziar; nós, herdeiros daquele sonho, estamos tentando nos basear somente em nossos interesses egoístas, criando barreiras”.

• Em seus estudos, o senhor indicou como valores fundadores das nossas sociedades a liberdade e a segurança: depois de uma época em que, para fazer com que a primeira crescesse, renunciamos gradativamente à segunda, agora o pêndulo se inverteu. Que reflexos políticos derivam disso?

Temos diante de nós desafios de uma complexidade que parece insuportável. E por isso aumenta o desejo de que se consiga reduzir essa complexidade a medidas simples, instantâneas. Com isso, expandiu-se o fascínio de “homens fortes”, que prometem – de modo irresponsável, enganoso e bombástico – encontrar aquelas medidas e resolver a complexidade. “Deixem comigo, confiem em mim”, dizem, e “resolverei tudo”. Em troca, pedem uma obediência incondicional.

• Isso parece ser o que está propondo o candidato republicano às eleições norte-americanas, Donald Trump, cujas posições sobre segurança e imigração foram recentemente indicadas pelo presidente húngaro Viktor Orban como modelos até mesmo para a Europa…

Estamos assistindo a uma tendência preocupante: instâncias de tipo social, como precisamente a integração e o acolhimento, são apontadas como problemas a serem transferidos para órgãos de polícia e segurança. Isso significa que o espírito fundador da União Europeia não está em boas condições de saúde, porque a característica decisiva da inspiração que está na base da EU é a visão de uma Europa em que as medidas militares e de segurança deveriam ir se convertendo – gradual, mas constantemente – em coisas supérfluas.

• O Islã é apontado por algumas forças políticas – por exemplo, a alemã Pegida (Europeus Patriotas contra a Islamização do Ocidente) – como uma fé intrinsecamente violenta, incompatível com os valores ocidentais. O que o senhor pensa a respeito?

É preciso evitar categoricamente o erro, perigoso, de tirar conclusões para o longo curso a partir da fixação de algumas coisas. Como disse o grande sociólogo alemão Ulrich Beck (1944-2015), no fundo da nossa atual confusão está o fato de já estarmos vivendo em uma situação “cosmopolita”, que nos obrigará a coabitar de modo permanente com culturas, modos de vida e fés diversas, sem que tenhamos desenvolvido de forma plena a capacidade de compreender suas lógicas e seus requisitos: sem termos, portanto, uma “consciência cosmopolita”. E é verdade que o preenchimento da distância entre a realidade em que vivemos e as nossas capacidades de compreensão não é um objetivo que se possa alcançar rapidamente. O choque está somente no início.

• Estamos portanto destinados a viver em sociedades na quais o sentimento dominante será o do medo?

Trata-se de uma perspectiva sombria e perturbadora, mas atenção: a situação de sociedades dominadas pelo medo não é de modo algum um destino predeterminado, nem inevitável. As promessas dos demagogos podem se afirmar, mas também têm, por sorte, vida breve. Uma vez que novos muros vierem a ser erguidos e mais forças armadas forem dispostas nos aeroportos e nos espaços públicos; uma vez que se recusem os pedidos de asilo de quem procura fugir de guerras e destruições e que mais migrantes sejam repatriados, ficará evidente que tudo isso é irrelevante para resolver as causas reais da incerteza. Os demônios que nos perseguem – o medo de perder nossa posição na sociedade, a fragilidade das metas que definimos – não irão evaporar, não desaparecerão. Nesse ponto, poderemos despertar e desenvolver os anticorpos contra as sereias dos demagogos e dos bufões agitadores que tentam conquistar capital político com o medo, jogando-nos fora da estrada. O temor é que, antes que esses anticorpos sejam desenvolvidos, muitos vejam as próprias vidas serem destruídas.

• O senhor tem defendido que as possibilidades de hospitalidade não são ilimitadas, mas que também não o é nem sequer a capacidade humana de suportar sofrimento e rejeição. Diálogo, integração e empatia, porém, exigem tempos longos…

Respondo citando mais uma vez papa Francisco: “sonho com uma Europa em que ser um migrante não seja um crime, uma Europa que promova e proteja os direitos de todos sem esquecer os deveres perante todos. O que se passou com você, Europa, local destacado de direitos humanos, democracia, liberdade, terra mãe de homens e mulheres que arriscaram e perderam a própria vida para defender a dignidade dos próprios irmãos?”. Tais perguntas se dirigem a todos nós; a nós que, enquanto seres humanos, somos plasmados pela história que contribuímos a plasmar, conscientemente ou não. Cabe a nós encontrarmos respostas a essas perguntas e as exprimirmos em fatos e palavras. O maior obstáculo para que encontremos essas respostas é a nossa lentidão em procurá-las.

Acusação comprovada - Miguel Reale Júnior*

• O afastamento da presidente Dilma é uma medida absolutamente justa

- O Estado de S. Paulo

Aprovado na comissão processante do impeachment, o relatório do senador Anastasia deverá, na próxima terça-feira, ser apreciado pelo plenário do Senado Federal, ao qual caberá, por maioria simples, receber a acusação.

Por tramoia de Eduardo Cunha, que apenas ajudou Dilma, o processo instaurado limitou-se a fatos ocorridos em 2015, em especial às operações de crédito ilegais, as pedaladas havidas entre o Tesouro Nacional e o Banco do Brasil, bem como à edição de decretos de suplementação de verbas sem autorização legislativa.

Ao contrário do que tonitrua a defesa de Dilma, a prova produzida perante a comissão processante é absolutamente desfavorável à presidente afastada, seja a testemunhal, como a pericial e a documental.

O procurador de Contas, em seu depoimento, por exemplo, disse: “O Ministério Público de Contas e o Tribunal de Contas (da União) consideraram caracterizada uma operação de crédito (...) com base no resultado efetivo dessa operação, que é o governo se tornar devedor de bilhões acumuladamente, como cheque especial, no Banco do Brasil”. Em parecer preliminar sobre as contas de 2015, o TCU vem de se manifestar em voto do ministro José Múcio Monteiro, segundo o qual no ano de 2015 a União incorreu em novas operações de crédito aparentemente irregulares com instituições financeiras controladas, reproduzindo o padrão de 2014. Assim, o Tesouro Nacional deixou de repassar, tempestivamente, ao Banco do Brasil os valores relativos à equalização de taxa de juros nas operações do Plano Safra.

Quanto aos decretos de suplementação de verba em contraste com a meta fiscal estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), o TCU também se manifestou: “Essa ocorrência configurou, na prática, a abertura de créditos suplementares sem a devida autorização legislativa, vedada pelo art. 167, inciso V, da Constituição Federal”.

Técnico do TCU, ao ser indagado se a presidente sabidamente violou a lei orçamentária ao editar decretos com desrespeito à meta fiscal vigente, respondeu: “Sim, porque ela mesma enviou o Projeto de Lei n.º 5, para alterar a meta. E, na exposição de motivos, ela mesma disse que não teria mais condições de cumprir a meta vigente, portanto, pedia ao Congresso Nacional que alterasse a meta”.

A perícia não vai em outra direção, pois dizem os peritos: “Esta Junta reitera o entendimento de que os atrasos de pagamento, no âmbito do Plano Safra, constituem operação de crédito vedada pela Lei de Responsabilidade Fiscal”. E quanto aos decretos, diz a perícia não serem “compatíveis com a meta de resultado primário constante da LDO/2015”.

O relatório busca explicar as causas das afrontas à Constituição nestas duas formas de conduta, que se conjugam: o financiamento do Tesouro pelos bancos públicos e a suplementação de verbas sem autorização do Congresso.

Diz o senador Anastasia: “De 2004 a 2014, a renúncia de receitas subiu da casa dos R$ 60 bilhões para cerca de R$ 300 bilhões – chegando ao montante de R$ 379,8 bilhões em 2015, considerado recorde. Com a decisão política de tentar estimular o crescimento econômico por meio da desoneração tributária de alguns segmentos da economia, para dar resposta à crise econômica, gerou-se forte perda de receita. Ao mesmo tempo, contudo, o governo não tomou providências efetivas para conter a expansão dos gastos públicos de modo a equilibrar receitas mais baixas com gastos menores. É aqui que os dois fatos principais objeto deste processo – as ‘pedaladas fiscais’ e os decretos presidenciais – se conjugam”.

E continua: “Além de graves, os fatos narrados não são isolados, tampouco pontuais. Os quatro decretos e as operações de crédito com o BB por ocasião do Plano Safra, que foram objeto da instrução preliminar nesta Comissão, são peças em um tabuleiro de ação política muito maior; fazem parte de um conjunto de medidas que buscaram ocultar ou inflar o resultado primário e, assim, expandir o gasto público”.

Tratou-se, portanto, de um modo de ser, de uma política fiscal e financeira adotada pela presidente da República como gestora da alta administração: aumentar o gasto e financiar o Tesouro por via dos bancos públicos. A presidente da República, mesmo sabedora dos riscos decorrentes dessa política, pois deles alertada desde 2013 pelo TCU, efetivou-a, redundando nessas ações ilícitas.

A política do governo no plano fiscal foi decidida pela chefe do Executivo em conjunto com ministros e o secretário do Tesouro, no sentido do que fazer ou deixar de fazer. Responde a presidente, como dirigente da alta administração, pelos atos inseridos na linha da política fiscal adotada como diretriz governamental. Em declaração, técnico do Tesouro registra ter havido ordem superior para não se pagar ao Banco do Brasil. Havia ordem, mas, é óbvio, não escrita como é próprio nesse tipo de determinação decorrente de diretriz política.

Com seu temperamento controlador, a presidente comandava de perto a economia, tendo participação direta ou por meio dos ministros, com quem se reunia, na execução da política fiscal e financeira. Havia, portanto, consciente adesão aos atos e assunção do conjunto das medidas tomadas. Com conhecimento de causa comprometeu as finanças públicas.

Por isso o relatório do senador Anastasia finaliza: “O que se constata, portanto, é que a acusada foi irresponsável não apenas na omissão quanto ao seu dever de coibir essas graves irregularidades, mas também na adoção de providências de sua competência exclusiva e na direção superior da Administração Federal. A Presidente da República era a pessoa em toda a cadeia administrativa que detinha o poder definitivo de mudar a rota da ação lesiva, mas não o fez”.

Conclusão evidente: o seu afastamento é uma medida absolutamente justa.
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* Miguel Reale Júnior é advogado, professor titular Sênior da Faculdade de Direito da USP, membro da Academia Paulista de Letras, foi ministro da Justiça

Politização da Justiça - Merval Pereira

- O Globo

A tentativa do ex-presidente Lula de criar um clima de suspeição sobre o juiz Sérgio Moro, na expectativa de que uma eventual condenação seja considerada uma perseguição política, não uma punição por crimes de que é acusado, pode acabar apressando denúncias contra ele.

Como se faz nos casos em que a suspeição é alegada pela defesa para que um caso não fique em sua jurisdição, o juiz, além de defender sua posição, o que Moro já fez, pede a opinião do Ministério Público Federal. E ela veio de maneira nua e crua, corroborando o que o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, já havia dito espaçadamente em diversos pronunciamentos: Lula sempre soube de tudo o que acontecia na Petrobras e recebeu favores, diretos e indiretos, do esquema de corrupção montado com as empreiteiras.

O ex-presidente Lula “participou ativamente do esquema criminoso”, afirmam os procuradores, e defendem a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para cuidar dos casos do sítio de Atibaia e do tríplex de Guarujá, pois eles teriam sido pagamentos de favores envolvendo as transações das empreiteiras na Petrobras.

Lula “tinha ciência do estratagema criminoso e dele se beneficiou”. Os procuradores adiantam que os dados colhidos na Operação Lava-Jato levam a “elementos de prova” quanto a participação de Lula no esquema criminoso. No documento, os procuradores já adiantam pontos que basearão uma futura denúncia contra Lula, ressaltando que o esquema envolveu pessoas próximas a ele, como o ex-ministro José Dirceu; os ex-tesoureiros do PT João Vaccari Neto e José di Filippi Júnior e o publicitário João Santana, que formavam “uma só organização, com o mesmo modus operandi”, integrada pelos mesmos agentes, com o fim de “enriquecimento ilícito dos seus integrantes e manutenção do poder político”.

Os procuradores fazem uma ligação entre o escândalo do mensalão, descoberto em 2005, e o petrolão, que veio a público agora, lembrando que Lula admitiu que o PT fazia caixa 2 em suas campanhas eleitorais para financiamento de campanhas políticas e, em recente depoimento prestado à Polícia Federal, reconheceu que, no caso da Petrobras, “recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados”.

Não é crível, assim, dizem os procuradores, que Lula desconhecesse a motivação dos pagamentos de “caixa 2” nas campanhas eleitorais, e a voracidade em assumir elevados postos na Administração Pública federal, escreveram os procuradores. O próprio Juiz Sérgio Moro, falando no Congresso dias atrás, disse que o caixa 2 deveria ser criminalizado por ser “uma trapaça na disputa eleitoral”.

No documento do Ministério Público Federal há ainda referências às palestras de Lula, que são tratadas como pagamentos indiretos de acordos políticos firmados pelas empreiteiras com os governos petistas, mesmo depois que Lula deixou a presidência da República: (...) “é inegável que ele manteve influência política sobre o governo federal”.

A escalada da defesa do ex-presidente no sentido de pintar um quadro de perseguição política, incluindo queixa ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, leva a que se vislumbre como um próximo passo um pedido de asilo político, ou refúgio.

Também do lado do Ministério Público Federal o tom das acusações subiu após esse ato de arguir a incompetência do Juiz Sérgio Moro para julgar o caso do sítio de Atibaia e do tríplex de Guarujá, pois a jurisdição seria São Paulo, e não Curitiba.

Essa disputa provavelmente perdurará na base da oratória enquanto a Olimpíada estiver em curso, mas pode ter consequências concretas após seu encerramento, que coincidirá também com o final do julgamento do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff.

Propinas e melancias - João Domingos

• Talvez nenhuma operação tenha sofrido tamanho combate quanto a Lava Jato

- O Estado de S. Paulo

Primeiro convidado a participar das audiências da comissão especial da Câmara que trata das medidas de combate à corrupção, o juiz Sérgio Moro abriu sua fala, anteontem, com uma constatação: até o momento, o Poder Judiciário “era uma voz sozinha no deserto” no enfrentamento a esse tipo de crime.

Com a instalação do colegiado que vai sistematizar as propostas entregues ao Congresso pelo Ministério Público, com o apoio de 2,2 milhões de pessoas, o Legislativo também começa a ser envolver, completou o juiz que conduz a Lava Jato.

“Nos perguntávamos: onde está o Congresso? Onde está o Executivo?”, continuou Moro.

Congresso e Executivo estavam onde sempre estiveram. Receosos de que a Lava Jato chegasse aonde chegou, começaram a urdir planos para impedi-la de avançar. Talvez nenhuma operação da Justiça, Ministério Público e Polícia Federal tenha ido tão longe quanto foi a Lava Jato. E talvez nenhuma operação tenha sofrido tamanho combate político quanto a Lava Jato.

Mesmo com todos os problemas, a Lava Jato chegou aonde chegou. O resultado é o que todo o Brasil e o mundo conhecem: boa parte dos grandes empresários, dirigentes partidários, ex-presidentes da República, senadores, deputados e governadores foi apanhada por envolvimento no maior esquema de corrupção e desvio de dinheiro de uma estatal já descoberto no País.

Moro declarou na audiência que o que mais o “perturbou” na condução da Lava Jato foi a “naturalidade” com que os envolvidos admitiam receber ou pagar propina. Tal naturalidade, acrescentou Moro, levou os condenados na operação a admitir que participavam do esquema de desvio de verbas porque fazia parte da “regra do jogo”.

Essa regra do jogo é difícil de mudar. Durante sua participação na audiência da comissão que trata dos projetos anticorrupção, Moro foi atacado pelo deputado Wadih Damous (PT-RJ), um dos mais ferozes críticos da Lava Jato. Para ele, o juiz defende projetos que cheiram a fascismo. A direção do PT acha que Sérgio Moro, juntamente com parte do Ministério Público, da Polícia Federal e dos meios de comunicação participam de um conluio para destruir o estado democrático de direito, desmoralizar o partido e criminalizar de tal forma o ex-presidente Lula que o impeça de ser candidato a presidente da República em 2018.

Do ponto de vista da luta política, trata-se de um argumento com força para animar a militância. Principalmente quando o PT está em vias de ver afundar seu projeto de poder com o impeachment de Dilma Rousseff.

Mas, no partido, há os que acham, sinceramente, que o juiz Sérgio Moro é um agente da CIA, a agência de inteligência norte-americana, e sua missão, depois de ajudar a destruir o PT, é entregar o petróleo do pré-sal aos Estados Unidos. Mesmo na mais aguda teoria da conspiração, impossível crer em tal bobagem.

Moro falou que a naturalidade com que os envolvidos admitiam receber ou pagar propina foi o que mais o assustou na Operação Lava Jato. Essa naturalidade às vezes assusta de fato quando revelada. Na Lava Jato, a naturalidade era a propina. Na política, é o patrimonialismo descarado.

Mesmo quem convive com o dia a dia da política não pode deixar de se surpreender com o que confessou o senador Hélio José (PMDB-DF), que se declarou “dono” da Secretaria do Patrimônio da União (SPU), um órgão do Ministério do Planejamento, conforme gravação que circula na internet e se tornou notícia: “Isso aqui é nosso. Isso aqui eu ponho quem eu quiser, a melancia que eu quiser aqui, eu vou colocar”. Outro trecho: “A partir de hoje, a SPU é responsabilidade minha, do senador Hélio José, gabinete 19 da (Ala) Teotônio Vilela”.

Do presidente em exercício Michel Temer, que, tudo indica, se tornará efetivo, espera-se que apoie as ações de combate à corrupção. E que demita a melancia.

Isolada e distante dos fatos – Leandro Colon

- Folha de S. Paulo

O último movimento de Dilma Rousseff reforça o quão desconectada dos fatos ela se encontra. Diante de uma derrota previsível no Senado, anunciou uma carta aos senadores em que apoia um plebiscito sobre a convocação de novas eleições. O gesto, além de não convencer os senadores, não tem a simpatia nem do seu partido, o PT.

O presidente da sigla, Rui Falcão, se posicionou contra a consulta popular. O comando petista não admite publicamente, mas quer virar logo a página do governo Dilma. A sintonia entre a presidente afastada e o seu partido se esvaiu há muito tempo — se é que um dia existiu.

Dilma fez um apelo no dia 12 de maio: "mantenham-se mobilizados". "Esta vitória depende de todos nós", disse a petista. Horas antes, o Senado aprovara, por 55 votos a 22, seu afastamento temporário do cargo.

Quase três meses se passaram e a mobilização revelou-se um fiasco. Os aliados de outrora, a quem Dilma talvez se referiu ao citar "todos nós", sumiram. Não deixa de ser previsível, tratando-se do histórico dela, mas o seu isolamento no Alvorada impressiona. Dilma ficou só.

O padrinho Lula, de quem se esperava um certo empenho contra o impeachment, está no banco dos réus sob a acusação de obstruir a Lava Jato. Há um mês, apenas seis senadores apareceram num jantar em Brasília com o ex-presidente para tratar de Dilma. Lula captou a mensagem.

O roteiro no Senado está pronto. Ela se torna ré no processo de impeachment na próxima semana. É o último ato do plenário antes do julgamento final, previsto para começar entre 25 e 26 de agosto.

Basta maioria simples (41 com quórum completo) para aprovar a "pronúncia do réu" na sessão de terça (9). Na prática, é um aval para que a petista seja julgada.

Os 41 votos estão consolidados. E é bem provável que o placar ultrapasse a marca de 54, patamar mínimo exigido para a condenação de Dilma na última etapa.

O golpe do golpe - Cristovam Buarque

• Por falta de general para apresentar como golpista, Erdogan culpou um filósofo

- O Globo

Nas últimas semanas, o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, suspendeu 15,2 mil professores e funcionários do Ministério da Educação, revogou licenças de mais de 20 mil professores de escolas particulares, demitiu 2,7 mil juízes e promotores, fechou cerca de mil instituições de ensino, suspendeu 8,7 mil oficiais, obrigou 7,9 mil policiais a entregar suas identidades e prendeu 10,9 mil oficiais e soldados. Tudo isto feito em nome de se opor a uma tentativa de golpe que parece uma narrativa operística.

Por falta de um general para apresentar como o comandante golpista, Erdogan responsabilizou um filósofo religioso, de 75 anos de idade, doente, morador dos EUA desde 1999, de nome Fethullah Gülen, que teria insuflado contra o governo os voluntários do Hizmet, movimento social inspirado por ele, décadas atrás.

Gülen defende um Islã democrático, aberto ao diálogo com outras religiões; aliado ao presidente Erdogan, afastou-se ao perceber o grau de corrupção que rodeava o governo, passando então a ser perseguido. O movimento Hizmet, iniciado pelo jovem Gülen, define a prestação de serviço à comunidade como o eixo central do Islã: “Servir às pessoas para servir a Deus”, é a frase que ele usa.

O Hizmet não tem organização formal, hierarquia ou organograma e se materializa sob a forma de movimento de pessoas independentes, que se unem pela mística da prestação de serviços à comunidade.

Até semanas atrás, em Istambul, havia uma “sala de situação” mantida por simpatizantes do Hizmet para acompanhar catástrofes no mundo inteiro, maremotos, terremotos, epidemias, contando, no subsolo, com equipamentos necessários e apropriados para atender às vítimas, onde ocorre a tragédia.

Graças ao “sentimento Hizmet”, a Turquia dispõe de dezenas de universidades criadas com doações feitas por empresários; centenas de escolas espalhadas por diversos países. Na fronteira entre Turquia e Síria, a poucos quilômetros de Aleppo, visitei um acampamento que recebe milhares de fugitivos da guerra, atendidos por voluntários do Hizmet, oferecendo-lhes comida, habitação e proteção.

Hoje, todos estes serviços estão fechados. O presidente Erdogan vinha reprimindo em pequenas doses estas ações, desde quando o líder intelectual e religioso Gülen se afastou de seu governo, e os jornais, cujos donos são simpatizantes da filosofia Hizmet, denunciaram corrupção por parte de pessoas do governo e de familiares do presidente.

Foi preciso usar a narrativa de tentativa de golpe, para dar o golpe em grande escala contra seus opositores, especialmente aqueles que têm relações com o sentimento-movimento Hizmet e seu inspirador espiritual e intelectual. Prática usada por Hitler ao se aproveitar do incêndio do Parlamento alemão em 1933.

Esperemos que a ideia de criar uma narrativa de tentativa de golpe se limite à Turquia, tanto no que se refere à repressão política, quanto à intolerância contra dissidentes de opiniões oficiais.

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Cristovam Buarque é senador (PPS-DF)

Com apelo à ONU, Lula vira porta-bandeira dos políticos corruptos – Demétrio Magnoli

- Folha de S. Paulo

Um dia, no passado já distante, Lula clamou contra "300 picaretas" do Congresso. O gesto foi saudado por muitos, que nele enxergaram um grito de alerta sobre a corrupção e a impunidade. Em direção oposta, alguns raros dissidentes registraram que, na ausência de identificação nominal dos "picaretas", o então líder oposicionista apenas praticava demagogia. Hoje, oapelo do ex-presidente ao comitê de direitos humanos da ONU prova que os segundos tinham razão. Com seu novo gesto, Lula converte-se no porta-bandeira dos políticos corruptos: o chefe dos "300 picaretas".

O ex-metalúrgico tornou-se um dos homens mais poderosos da República. Ele presidiu o Brasil por oito anos, fez sua sucessora e, apesar de tudo, ostenta a condição de candidato presidencial viável em 2018. Já Sergio Moro, o alvo de sua denúncia à ONU, não é mais que um juiz de primeira instância: suas decisões, certas ou erradas, são manifestações tentativas, precárias e reversíveis, do Poder Judiciário. Por que Lula não arguiu a suspeição de Moro no Conselho Nacional de Justiça? Por que, alternativamente, não confia na reversão, pelas instâncias judiciais superiores, de uma futura sentença que imagina desfavorável?

Os advogados de Lula argumentam que o recurso à ONU amplia as garantias das liberdades civis vigentes no Brasil, conferindo materialidade a um direito de todos os cidadãos (Folha, 3/8). Eles mesmos admitem que rompem a regra básica do Pacto Internacional ao solicitarem a intervenção da ONU antes do esgotamento dos recursos internos, mas sustentam a exceção à regra pela suposta inexistência de "medida eficaz para paralisar a violação ao pacto". Num exercício radical de contorcionismo jurídico, pretendem convencer-nos de que a mera transformação de Lula em réu implica violência contra os direitos humanos. De fato, por esse atalho, veiculam a mensagem formulada por seu cliente: Lula está dizendo que o sistema de justiça brasileiro não merece confiança quando processa agentes políticos.

Na hora da execução das sentenças do mensalão, José Dirceu ergueu o punho fechado contra o STF, declarando-se um preso político e anunciando que recorreria a tribunais internacionais. O PT o acompanhou, mas Lula escolheu caminho diferente, prometendo que voltaria ao STF com as provas da inocência dos companheiros condenados. Passados três anos, agora é o próprio Lula quem segue o rumo indicado por Dirceu, colocando tacitamente sua assinatura nas resoluções petistas que acusam a Justiça de promover uma caça às bruxas politicamente motivada. Há, nisso, uma novidade relevante: em nome de seu interesse pessoal, o líder histórico do PT cruza a fronteira do respeito às instituições democráticas brasileiras. Ao fazê-lo, oferece um álibi a todos os políticos investigados por crimes de corrupção.

Afinal, se nosso sistema de Justiça persegue um ex-presidente, por que não perseguiria, e de modo ainda mais ignóbil, políticos de menor estatura como um Eduardo Cunha, um Fernando Collor ou um Paulo Maluf?

O ofício do advogado é defender seus clientes, não cultivar a lógica ou procurar a verdade factual. Os advogados de Lula mencionam 2.756 comunicações à ONU por violações de direitos em diferentes países, além de 12 condenações aplicadas à França e 39 à Austrália. Não nos dizem, porém, quantos ex-governantes de países democráticos solicitaram a intervenção de tribunais internacionais contra a simples abertura de um processo criminal na instância judicial inferior. O recurso de Lula à ONU é um gesto inédito, uma anomalia. Seu alvo real não é Moro, mas o Poder Judiciário. Sua finalidade é proteger o "direito à impunidade", um bem precioso da elite política brasileira posto em xeque desde o julgamento do mensalão.

A história descreve piruetas. Lula tem uma bandeira e os "300 picaretas" têm um líder.
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Demétrio Magnoli é sociólogo

Anos loucos - Míriam Leitão

- O Globo

Tudo aconteceu desde aquele dia em que o Rio ganhou a disputa com Tóquio, Chicago e Madri para ser a sede da Olimpíada de 2016. Poucas vezes na história houve uma reversão tão forte quanto a que vivemos em todas as áreas e sentidos. Por isso, chegar até aqui e fazer a festa é uma conquista ainda maior. O país teve que remar contra forte correnteza e superar desafios de dimensões olímpicas.

Enquanto preparava a Olimpíada, o Brasil teve em 2010 a maior taxa de crescimento do PIB em 25 anos, e teve, no ano passado, a maior queda em 25 anos. Somados os dois últimos anos, o Brasil está vivendo a pior recessão desde que o PIB é calculado. Na área política, houve uma reviravolta completa. O popular presidente da época da escolha do Rio como sede é investigado e réu em processos anticorrupção.

No dia 4 de dezembro do ano passado, o presidente do Comitê Olímpico, Thomas Bach, ligou para o prefeito Eduardo Paes e perguntou: “o que está acontecendo com Lula?” O prefeito, apesar do bom domínio que tem do idioma, ficou enrolado para falar “condução coercitiva” em inglês. Bach tomou vários sustos, por isso disse que não quer repetir a experiência. Foi demais para seu espírito germânico.

A Operação Lava-Jato elevou a tensão em todas as áreas e mudou o cenário político e corporativo do país. Das empreiteiras que ganharam a Parceria Público Privada para fazer o Parque Olímpico — Odebrecht, Andrade Gutierrez e Carvalho Hosken — duas tiveram seus presidentes presos no dia 19 de junho do ano passado. Marcelo Odebrecht permanece preso e já foi condenado em um dos processos.

A crise política foi se agravando na preparação final da Olimpíada, com o afastamento da presidente Dilma. Assim, os Jogos começaram em um governo provisório e com o julgamento da presidente chegando à sua reta final. As primeiras páginas dos jornais de ontem traziam duas notícias: a abertura da Olimpíada com 40 chefes de Estado no Rio e a aprovação do relatório que pede o impeachment da presidente afastada. Tudo tem sido ao mesmo tempo, no Brasil, desde aquele dois de outubro de 2009, em que o Brasil teve a vitória final na disputa pela Olimpíada de 2016. Um dos argumentos, principalmente na briga com as cidades de economias desenvolvidas, foi o que faltava fazer. O Comitê gosta de deixar legados. Em Chicago e Tóquio, havia pouco a fazer; no Rio, muito. O problema agora é lidar com as esperanças frustradas.

O país desmoronou do ponto de vista fiscal. Déficits crescentes assombram as contas federais e aceleram o crescimento da dívida pública, e o estado onde ocorrem os Jogos decretou calamidade fiscal. A falta de dinheiro não decorre da preparação da Olimpíada, mas tornou ainda mais difícil prepara-la. O governo estadual entregou uma linha de metrô pela qual se esperava há décadas, mas não entregou a sonhada limpeza da Baía de Guanabara.

Esse é um sonho tão antigo que parece eterno. E permanecerá arquivado. Em meados de 1800, a jornalista francesa Adèle Touissant-Samson veio ao Brasil e aqui viveu dez anos. Em seu livro-reportagem “Uma parisiense no Brasil”, contou que no desembarque no Rio ficou encantada com a beleza e chocada com a sujeira da Baía. Pois é, ainda damos essa mesma impressão mista aos visitantes.

Houve também na preparação da Olimpíada surto de doenças terríveis provocadas por um mosquito. E desta vez o desdobramento não podia ser mais trágico, porque a sequela é a atrofia do cérebro de crianças não nascidas. Como as crises se somaram, o combate à doença tentava ser feito enquanto o governo estava em crise fiscal e política.

Uma Olimpíada é sempre difícil de fazer. Há milhões de detalhes para que tudo esteja dentro do que exige o COI. Um pequeno exemplo: a temperatura da água da piscina onde os nadadores disputarão suas provas tem que estar sempre em 28 graus. Nada a mais, nada a menos. Se é sempre uma árdua tarefa, uma luta contra o tempo, um teste para a capacidade de planejamento e execução, imagina o que foi preparar uma olimpíada no meio de redemoinhos político, econômico, fiscal, policial? Mas aqui chegamos, a festa começou, resta torcer pelos enviados do Olimpo que estão entre nós.