quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

(...) A presidente Dilma não pode desconhecer tudo o que nós sabemos: que a situação econômica é desesperadora, que na situação política, ela está sofrendo as conseqüências. A dívida pública, hoje saiu, é de R$ 2,7 trilhões. A taxa de juros está em 14,5%. Isso é dramático. O Brasil vai mal porque está sem rumo”, considerou.

(...) A presidente Dilma tinha a faca e o queijo na mão. Acabou de fazer uma coisa inacreditável. Parece que seguindo o conselho do presidente Lula, ela foi fazer acordo com o baixo clero. Tem que fazer um acordo com o país. Tem que dizer ao país em que situação nós estamos, que é péssima. A taxa de juros está 14,5% e isso vai dar mais ou menos R$ 400 bilhões de juros. E vai fazer um acordo fiscal para economizar R$ 50 bilhões e nem consegue isso.

(...) Ninguém sabe onde que vai parar a Lava-Jato, ninguém sabe a até que ponto vai.a crise econômica. Falar de golpe, a presidente Dilma falou, e não devia ter falado. Ninguém está cogitando um golpe. Impeachment não é golpe. Precisa ter condições, mas não é golpe.
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Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente da República, na entrevista no programa Roda Viva / TV Cultura, 26 de outubro de 2015.,

Cunha tem parecer técnico favorável para abrir processo de impeachment

• Área jurídica da Câmara dá sinal verde para a abertura de uma ação de impedimento de Dilma com base na acusação de que ela repetiu neste ano as pedaladas fiscais; presidente da Casa condiciona aceitação do pedido às decisões do procurador-geral contra ele

Daniel Carvalho, Daiene Cardoso, Erich Decat e Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), recebeu da assessoria da Casa um parecer pela admissibilidade de um pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff. O sinal verde da área jurídica reforça a possibilidade de o peemedebista decidir, de maneira monocrática, pelo início da ação.

O parecer está fundamentado em ao menos dois pedidos de impeachment que acusam a gestão da presidente Dilma de ter repetido, neste ano, a prática das pedaladas fiscais – manobras contábeis reprovadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em relação ao ano passado.
Conforme o entendimento da assessoria jurídica, o chefe do Executivo pode ser responsabilizado por irregularidades cometidas no mandato em curso. Nesse caso, se o Congresso entender que Dilma repetiu as pedaladas neste ano, ela poderia ser alvo de um processo de impeachment.

Até o momento, Cunha já rejeitou 11 pedidos de impeachment apresentados na Casa e sustentava publicamente que não via crime de responsabilidade nas pedaladas e outras irregularidades das quais Dilma é acusada porque haviam sido praticadas no mandato anterior da petista.

O Estado apurou que Cunha admitiu a aliados a possibilidade aceitar o impeachment caso o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresente o pedido de afastamento dele da presidência da Câmara. O deputado disse negar “veementemente” essa informação que, para ele, “cheira a molecagem”.

Segundo um aliado do peemedebista, Cunha não aceita a hipótese de Janot pedir seu afastamento sem que, para isso, o procurador-geral tenha recebido o aval do Palácio do Planalto. Nesse caso, a abertura do processo de impeachment seria um resposta dele a Janot e a Dilma.

Esse mesmo aliado disse que um dos pareceres favoráveis está fundamentado no pedido de impeachment apresentado pelo advogado Luis Carlos Crema. O embasamento jurídico é o mesmo do requerimento assinado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal: a repetição das pedaladas neste ano.

De acordo com o Ministério Público, que atua junto ao Tribunal de Contas da União, o governo Dilma repetiu as pedaladas fiscais em 2015. As manobras, que consistem em atrasar o repasse de recursos do Tesouro Nacional a bancos públicos, foram a principal “distorção” a embasar a rejeição das contas presidenciais de 2014 pelos ministros da corte.

O presidente nacional do PT, Rui Falcão, afirmou que o parecer pró-impeachment não preocupa o partido. “É apenas uma análise para ver se esse pedido tem condições de ser aceito”, afirmou o petista.

Cassação. Alvo de uma ofensiva de um grupo de parlamentares que protocolou uma ação pela cassação de seu mandato, Cunha busca apoio do governo e a oposição para permanecer no cargo e, no limite, na Câmara dos Deputados. Segundo seus aliados, o peemedebista pretende utilizar a possibilidade constitucional de aceitar ou não um pedido de impeachment contra Dilma para negociar com os dois lados da luta partidária.

O presidente da Câmara é acusado por corrupção e lavagem de dinheiro em denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral ao Supremo Tribunal Federal no âmbito da Operação Lava Jato. Ele também é alvo de inquérito na Corte pela suspeita de manter contas secretas no exterior.

Cunha disse ontem que os pedidos de impeachment ainda estão sob análise. Em nota, enfatizou que, independentemente da orientação jurídica, a palavra final sobre a abertura de processo de afastamento da presidente da República é dele.

“O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, afirma que não recebeu qualquer parecer da área técnica da Casa sobre os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff que ainda estão sob análise. Cunha reitera ainda que cabe a ele a decisão sobre o andamento dos processos independentemente da orientação jurídica.”

Um aliado de Cunha disse que o parecer a ser divulgado pode ser tanto a favor quanto contra, a depender da vontade do presidente da Câmara.

Ao Estado, Cunha afirmou que não recebeu ainda a manifestação do corpo jurídico. “Não recebi nada. E, mesmo, que tenha recebido, a última palavra será minha. Eu posso concordar ou não com pareceres.”

No início deste mês, deputados governistas recorreram ao Supremo e conseguiram decisões liminares que suspenderam o rito do impeachment estabelecido por Cunha e defendido pela oposição ao Planalto.

As decisões do STF vetaram a possibilidade de a oposição recorrer para reverter uma eventual decisão contrária do presidente da Casa à abertura do impeachment. Conforme o rito de Cunha, esse recurso seria submetido ao plenário da Câmara e poderia ser derrubado por maioria simples.
Porém, as decisões liminares não tiraram de Cunha o poder de decidir pelo deferimento (aceitação) dos pedidos. Ele mantém o poder monocrático, conforme a lei, de aceitar ou não a abertura da ação.

A oposição pressiona para que ele se manifeste até o dia 15 de novembro sobre os novos pedidos que estão na Casa.

Cunha reitera que palavra final do impeachment cabe a ele

• Em meio às expectativas DE um parecer favorável da área técnica da Câmara ao pedido de afastamento da presidente, peemedebista reafirma que decisão cabe a ele, independente da orientação jurídica

Daiene Cardoso e Daniel Carvalho - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), disse nesta tarde que os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff ainda estão sob análise. Em nota divulgada nesta tarde, ele enfatizou que, independentemente da orientação jurídica, a palavra final sobre a abertura de processo de afastamento da presidente da República é dele.

"O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, afirma que não recebeu qualquer parecer da área técnica da Casa sobre os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff que ainda estão sob análise. Cunha reitera ainda que cabe a ele a decisão sobre o andamento dos processos independentemente da orientação jurídica", diz a mensagem.

O jornal "Folha de S.Paulo" divulgou nesta tarde a informação de que a área técnica da Casa está finalizando um parecer em que recomenda ao presidente que dê prosseguimento ao pedido de impeachment protocolado pela oposição.

Ao Broadcast Político, Cunha disse que não recebeu ainda a manifestação do corpo jurídico. "Não recebi nada. E mesmo que tenha, a última palavra será minha. Eu posso concordar ou não com pareceres", declarou. A Secretaria Geral da Mesa negou a existência de um parecer prévio.

Um aliado do peemedebista disse que a área técnica já havia apresentado um parecer favorável ao pedido de impeachment do advogado Luis Carlos Crema. Esse documento é baseado em decretos presidenciais de 2015 e nas chamadas pedaladas fiscais praticadas neste ano. O embasamento jurídico é o mesmo do requerimento apresentado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal.

Protesto. Mais cedo, membros do Movimento Brasil Livre (MBL) ocupavam parte da galeria da Câmara, onde estenderam uma faixa em verde e amarelo com os dizeres "Fora Dilma". O grupo é o mesmo que ocupa o gramado do Congresso desde a semana passada. Cunha pediu que a segurança da Câmara retirasse a faixa.

O plenário vota agora a Medida Provisória 687/15, que autoriza o Executivo a reajustar taxas cobradas pela Agência Nacional do Cinema (Ancine), pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).

Impeachment deve ter aval técnico

Sob o comando do presidente Eduardo Cunha, a área técnica da Câmara tende a ser favorável a pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff, em fase final de análise.

Área técnica da Câmara tende a aprovar pedido de impeachment

• A aliados, Cunha teria dito que decisão dependerá das ações contra ele

Júnia Gama e Chico de Gois - O Globo

-BRASÍLIA- A área técnica da Mesa Diretora da Câmara está concluindo um parecer que tende a ser favorável ao pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff elaborado pelos juristas Hélio Bicudo, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal. Segundo aliados do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o pedido foi considerado “perfeito juridicamente” por técnicos que cuidam desses documentos e daria solidez ao eventual acatamento de Cunha ao pedido de impeachment.

Líderes partidários afirmaram que a área técnica concordará com o argumento do trio de juristas de que Dilma aumentou as despesas em 2015 em R$ 800 milhões por meio de decretos, sem autorização do Congresso, o que poderia ensejar crime de responsabilidade.

Cunha nega ter recebido parecer
Ontem, deputados da base que estiveram com Cunha durante almoço em sua residência oficial relataram ter ouvido do peemedebista que já há um parecer favorável ao impeachment pronto e que sua decisão dependerá de um fator externo, que conteria uma ameaça implícita: se o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhar um pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo seu afastamento da presidência da Câmara, Cunha então decidirá monocraticamente, como lhe garante a lei, pelo encaminhamento favorável à abertura do processo de impeachment de Dilma.

Segundo esses deputados, Cunha teria dito que um eventual pedido de afastamento por parte de Janot demonstraria que o procurador está agindo “combinado” com o Palácio do Planalto, o que justificaria a admissão do pedido de impeachment.

Procurado, Cunha negou que tenha feito qualquer comentário a respeito do tema ontem. Em nota, o presidente da Câmara afirmou que não recebeu qualquer parecer da área técnica da Casa sobre os pedidos de impeachment contra a presidente Dilma, que ainda estão sob análise. Ele reiterou, no entanto, que cabe a ele a decisão sobre o andamento dos processos, independentemente da orientação jurídica. A Mesa da Câmara também informou não haver decisão a respeito desse pedido de impeachment e destacou que as recomendações da área técnica são apenas para basear a decisão do presidente da Câmara, mas que ele tem total autonomia para deliberar.

Outros deputados próximos a Cunha, de partidos da oposição, presentes no almoço, disseram não terem presenciado a fala sobre Janot. Afirmaram, no entanto, que o presidente da Câmara tem em suas mãos dois pareceres da área técnica da Casa sobre o pedido de impeachment contra a presidente Dilma: um favorável e outro contrário. Caberá a ele decidir, no momento que considerar mais oportuno, a qual deles dará encaminhamento.

Com essa manobra, Cunha se sustenta na presidência e tem como pressionar o governo para que não use os votos que tem no Conselho de Ética contra ele. Os oposicionistas voltaram a pressioná-lo para que dê uma resposta nas próximas semanas sobre o pedido.

Mais cedo, em entrevista coletiva, Cunha voltou a dizer que baixa popularidade não justifica processo de impeachment contra a presidente.

— Aumenta a pressão política. Eu sempre disse que impeachment não pode ser tratado como recurso eleitoral ou por causa de popularidade. Tem que ser tratado dentro dos objetivos previstos na Constituição e na Lei. Se não for assim, aí fica uma coisa complicada. Popularidade pode ser momentânea — declarou.

Ele já rejeitou 20 outras proposições no mesmo sentido. Há ainda mais 11 pedidos semelhantes. A oposição, no entanto, não está disposta a esperar o tempo de Cunha. Parlamentares do PSDB, DEM e PPS já o avisaram de que vão aguardar até meados de novembro para saber se ele dará ou não encaminhamento favorável ao impeachment.

Caso a resposta seja negativa, oposicionistas prometem pressioná-lo — embora ainda não saibam exatamente como, uma vez que compete apenas ao presidente da Câmara decidir sobre pedidos de impedimento do presidente da República.

Impeachment recebe aval da área técnica da Câmara

• Cabe a Eduardo Cunha, chefe da Casa, decidir se aceita pedido

Câmara recomenda a Cunha dar aval ao impeachment

• Parecer vê indícios de participação de Dilma em crimes de responsabilidade

Ranier Bragon - Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A área técnica da Câmara dos Deputados está finalizando parecer em que recomenda ao presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que dê seguimento ao principal pedido de impeachment contra Dilma Rousseff.

A informação apurada pela Folha com aliados de Cunha diz respeito aopedido assinado pelos advogados Hélio Bicudo (ex-petista), Miguel Reale Júnior (ex-ministro da Justiça de Fernando Henrique Cardoso) e Janaína Paschoal, documento que é chancelado pelos principais partidos de oposição e por movimentos de rua anti-Dilma.

Segundo aliados, Cunha manifestou em almoço nesta terça (27) a inclinação de deferir o pedido de impeachment contra Dilma.

Ainda de acordo com esses relatos, o peemedebista reiterou as críticas contra o procurador-geral da República, Rodrigo Janot. À tarde, circulou no plenário da Câmara, entre deputados, a informação de que Cunha ameaça deflagrar o processo contra Dilma caso Janot peça o seu afastamento do cargo.

Segundo a Folha apurou, a recomendação técnica, que é sigilosa, será entregue a Cunha ainda nesta semana. E será sucinta: afirmará apenas que o pedido se enquadra nos requisitos da lei 1.079/50 (que trata do impeachment), no regimento interno da Câmara, e que traz em seu escopo elementos que apontam a indícios de participação da presidente em supostos crimes de responsabilidade.

O embasamento são decretos assinados por Dilma em 2015 que aumentaram em R$ 800 milhões as despesas do Executivo sem autorização do Congresso, além da reprovação das contas da petista de 2014 pelo Tribunal de Contas da União.

Decisão
Pela lei, cabe ao presidente da Câmara decidir monocraticamente se dá ou não seguimento aos pedidos de impeachment contra a presidente da República. Ele pode ou não seguir a recomendação da área técnica. Até agora, já mandou para o arquivo 20 pedidos de impeachment, sempre seguindo a recomendação técnica, mas resta a análise de outros 11, entre eles o do trio de advogados.

Um dos principais alvos das investigações sobre o esquema de corrupção da Petrobras, Cunha tem usado esse poder para negociar nos bastidores, com oposição e governo, formas de evitar sua destituição do cargo e a cassação de seu mandato.

Por isso, tem dado sinais ora pró-impeachment, ora contrários. Caso determine a sequência do pedido, é aberta uma comissão especial que dará parecer ao plenário. Dilma é afastada do cargo caso pelo menos 342 dos 512 colegas de Cunha –ele não vota nesse caso– decidam pela abertura do processo de impedimento da petista.

O presidente da Câmara já afirmou que pretende anunciar sua decisão em novembro. Ele aguarda ainda decisão sobre recurso que fez ao Supremo Tribunal Federal contra liminares que suspenderam rito anunciado por ele para eventual processo de impedimento.

Conselho
Desde 1992, quando deu parecer favorável a pedido de impeachment contra Fernando Collor de Mello –que acabou perdendo o cargo ainda naquele ano–, a área técnica da Câmara opinou pelo arquivamento de todos os pedidos de impeachment contra os presidentes subsequentes.

A Folha também ouviu de deputados aliados ao peemedebista a afirmação de que ele orientou a oposição a, antes de apresentar o recente documento assinado por Bicudo-Reale-Paschoal, analisar um pedido feito por um advogado de Brasília, Luís Carlos Crema, considerado por ele bem consistente e bem formatado juridicamente.

A Folha confirmou a informação com oposicionistas, que em caráter reservado disseram que suas assessorias jurídicas leram previamente o material formulado por Crema. A Câmara não fornece cópia dos pedidos de impeachment até que haja decisão sobre eles sob o argumento de que a Lei de Acesso permite o sigilo a papeis sob os quais ainda não houve deliberação.

Cunha ainda não decidiu sobre o pedido de Crema, mas a tendência é que o rejeite, já que se o acatasse ele teria, por ter entrado primeiro, de encabeçar eventual processo contra Dilma –e isso não é considerado politicamente adequado por integrantes da oposição. Por meio de sua assessoria, o peemedebista negou que tenha orientado a oposição a ler o pedido de Crema.

Políticos que frequentam o gabinete do presidente da Câmara afirmaram ainda que ele tem recorrido frequentemente, para consultas e assessorias jurídicas e legislativas, ao ex-advogado do PMDB Gustavo do Vale Rocha, integrante do Conselho Nacional do Ministério Público –órgão de controle externo de procuradores e promotores.

Rocha, que já advogou para Cunha, ingressou no conselho após ter a indicação patrocinada pelo presidente da Câmara e aprovada pelo plenário da Casa em abril.

Por meio da assessoria, Rocha negou dar conselhos ou assessoria jurídica ou legislativa a Cunha, afirmando que continua a ir frequentemente à Câmara apenas para exercer a advocacia na área eleitoral.

Já Cunha afirmou, também por meio da assessoria, que eventualmente pede opiniões a Rocha sobre assuntos relativos à Câmara.

Cardozo defende Lula e ação da PF

Por Andrea Jubé - Valor Econômico

BRASÍLIA - Durante almoço frugal em que concedeu entrevista aoValor - o ministro da Justiça segue fiel à dieta Ravenna que o fez perder 20 kg -, José Eduardo Cardozo disse que tem a "consciência tranquila" à frente da Pasta que comanda a Polícia Federal, apesar das críticas de setores da base aliada, do PT e da oposição. "Não esperem de mim que eu diga não investiguem A, B C ou D", afirmou.

Um dos auxiliares mais próximos da presidente Dilma, Cardozo disse que nunca temeu o impeachment e que continua no cargo "enquanto a presidente quiser e eu achar que não estou atrapalhando".

O bombardeio contra ele aumentou após a PF cumprir mandado de busca na empresa LFT Marketing Esportivo, do filho do ex-presidente Lula, Luís Cláudio Lula da Silva, no âmbito da Operação Zelotes. "Conheço Lula há muitos anos e tenho total confiança de que ele não se envolveu nem permitiria que alguém próximo dele se envolvesse em desmandos".

Cardozo diz ter "total confiança" em honestidade de Lula
Em defesa de sua gestão no comando da Polícia Federal, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse ao Valor que tem a "consciência tranquila" de que atua com isenção. Sob críticas do PT, da oposição e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mas com o aval absoluto da presidente Dilma Rousseff, ele avisa: "não esperem de mim que eu diga não investiguem A, B C ou D, um ministro da Justiça não pode conduzir investigações, seja para punir amigos ou inimigos". Ele diz que nunca temeu o impeachment, que a crise política "é página virada" e que continua no cargo. "Enquanto a presidente quiser e eu achar que não atrapalho, eu fico".

Um dia após a Polícia Federal praticamente bater na porta de Lula, em ação que mirou a empresa de um de seus filhos, Cardozo o defendeu, embora, reservadamente, o ex-presidente articule para afastá-lo do cargo. "Conheço Lula há muitos anos e tenho a total confiança de que ele não se envolveu nem permitiria que alguém próximo dele se envolvesse em desmandos", assegura. "Acho muito ruim que investigações em curso sejam utilizadas retoricamente pela oposição para atingi-lo na sua honra e na sua imagem política", reforça.

A ação da PF contra o filho de Lula estremeceu os pilares de sua relação com Dilma. Mais de uma vez, ele sugeriu a ela que substituísse Cardozo, alegando que o ministro não teria controle sobre a instituição. Para desfazer o mal estar, a presidente hesitou, mas foi convencida a embarcar ontem à noite para São Paulo a fim de cumprimentar Lula pessoalmente pelo aniversário de 70 anos. Foi acompanhada do chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, um dos poucos nomes aptos a reconciliá-los.

Dilma ficou por pouco mais de uma hora no Instituto Lula, onde seu antecessor foi anfitrião de um churrasco para apenas 30 pessoas. Entre elas, o presidente nacional do PT, Rui Falcão, que afirmou não existir atritos entre Dilma e Lula. Também estava o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad.

Luís Cláudio Lula da Silva é investigado na Operação Zelotes, que apura um esquema de corrupção no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Na segunda-feira, agentes cumpriram mandados em sua empresa. Mas as críticas a Cardozo recrudesceram em meio aos desdobramentos da Operação Lava-Jato, que ensejou inquéritos e denúncias contra ministros do núcleo palaciano, lideranças do PT, de siglas da base aliada e da oposição. Cardozo responde com ironia: "sempre que investigações atingem o mundo da política, o ministro da Justiça é alvo de bombardeio, de setores da base governista e também de oposicionistas, vamos ser isonômicos".

Ele ressalta que tem de agir com isenção. "Um ministro da Justiça não pode conduzir investigações para punir amigos ou inimigos. Republicanamente, legalmente, não pode fazer isso", afirma. "Não esperem de mim que eu diga não investiguem A, B C ou D, que enquanto estiver aqui, isso não acontecerá", avisa.

Questionado sobre reclamações de aliados de Lula de que a ação contra um de seus filhos teria irregularidades, Cardozo rebate que mandou abrir sindicâncias sempre que informado de excessos da PF. "Apontar abusos em tese não basta, mostrem os fatos abusivos que a investigação será determinada com o máximo rigor", devolveu. Pontua que é duro do ponto de vista disciplinar e, até agora, foi o que mais demitiu agentes da PF e da Polícia Rodoviária Federal.

De correntes distintas no PT - Cardozo é um dos expoentes da Mensagem, segunda maior tendência da sigla - ele não integra o núcleo mais ligado a Lula. Na formação do ministério para o segundo mandato, em dezembro, Lula fez gestões para que Dilma o substituísse por Jaques Wagner. Nos últimos dias, voltaram rumores de que Lula recomendara para sua cadeira o deputado Wadih Damous (PT-RJ), ex-presidente da Ordem dos Advogados, no Rio de Janeiro. Damous foi autor de uma das liminares obtidas no Supremo para suspender o rito do impeachment na Câmara dos Deputados.

Após um período de distanciamento, Lula e Cardozo se encontraram em agosto, na sede do Instituto Lula em São Paulo. Era um sábado e a temperatura da Lava-Jato estava nas alturas, cinco dias após a prisão do ex-ministro José Dirceu pela Polícia Federal.

Cardozo relata que, no fim do ano passado, recomendou à presidente que o substituísse, porque acredita que o cargo de ministro da Justiça "tem uma fadiga de material inevitável". Mas ela não concordou e seguiu confiando-lhe missões especiais. No estertor da crise, quando Dilma escalou os ministros mais próximos de si para desconstruírem a mobilização pelo impeachment, Cardozo reuniu-se com lideranças da oposição. Fora da agenda oficial, esteve com o senador José Serra (PSDB-SP) e com o presidente do PSB, Carlos Siqueira.

Ele afirma que nunca teve receio real do impeachment. "Confio no Judiciário, no Legislativo, não acredito que o Brasil vá ter uma trajetória de interrupção da consolidação democrática, não acredito em posturas que prevaleçam acima da democracia", justifica.

Muito além do ministério, Cardozo e Dilma desenvolveram uma relação de amizade e confiança, que remonta à campanha de 2010, da qual ele foi coordenador jurídico. Foi a presidente quem o obrigou a fazer um check up no início do ano, que revelou o câncer na tireoide, que ele extraiu em abril. Há dez dias, ele completou o tratamento auxiliar, com radioterapia à base de iodo.

Políticos que torcem pela saída de Cardozo tentam decifrar a afinidade entre ele e a presidente, que sela sua longevidade no governo. Eles conversam sobre literatura, música e artes em geral. Ela lhe empresta livros - entre os recentes, o original em espanhol de "O homem que amava os cachorros", de Leonardo Padura. Ele já tocou piano para ela em jantares no Palácio da Alvorada. O mau humor de alguns políticos com Cardozo é tão grande que o criticam por torcer para o São Paulo. "É time de coxinhas", diz um petista. A maioria na sigla é de corinthianos, como Lula.

Pela segunda vez em sua biografia, Cardozo encontra-se no epicentro de uma grave crise política. Como secretário de Governo, também era braço direito de Luiza Erundina na Prefeitura de São Paulo. "Sempre fui comandado por mulheres", entrega.

Assim como Dilma, Erundina sofreu revezes no primeiro ano como perda de maioria no Legislativo, baixa popularidade, rejeição das contas de governo. Ela comparava a crise a uma "criança nordestina". Dizia que "se virar o primeiro ano, ela se cria". Mas Cardozo rebate que a comparação não se aplica a Dilma. "Do ponto de vista político, já viramos esse ano, as turbulências são página virada", desafia. (Colaborou Fernando Taquari, de São Paulo)

Filho de Lula será chamado a depor

A PF quer explicações de Luís Claudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, sobre os repasses de lobistas acusados de “comprar” leis.

Filho de Lula terá de explicar à PF dinheiro que recebeu de lobista

• Policiais investigam pagamento de propina a parlamentares para aprovar MP

Jailton de Carvalho e Eduardo Bresciani - O Globo

BRASÍLIA - A PF quer explicações de Luís Claudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Lula, sobre os repasses de lobistas acusados de “comprar” leis. -BRASÍLIA- A Polícia Federal vai intimar o empresário Luis Claudio Lula da Silva, um dos filhos do ex-presidente Lula, para prestar depoimento no inquérito sobre a compra de medidas provisórias favoráveis a montadoras de veículos, entre elas a Mitsubishi Motors e a Caoa, que representa a Hyundai no Brasil. Luis Claudio será chamado para se explicar sobre um pagamento de R$ 1,5 milhão que uma de suas empresas, a LFT Marketing Esportivo, recebeu da empresa de lobby Marcondes & Mautoni, no ano passado. A PF também vai tentar descobrir quais políticos teriam contribuído com o esquema, uma vez que foram descobertos e-mails entre lobistas relatando a necessidade de fazer “acertos” com parlamentares.

A PF ainda não definiu a data do depoimento de Luis Claudio, que deve acontecer após a análise do material apreendido na mais recente etapa da Operação Zelotes, investigação que teve início com a apuração de fraudes no Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais), do Ministério da Fazenda, e agora avança sobre a suposta compra de medidas provisórias relacionadas à renúncia fiscal para montadoras.

Procurador acha negócio “muito suspeito”
Segundo a investigação, a Marcondes & Mautoni é uma empresa de fachada, suspeita de intermediar negócios ilegais entre empresas privadas e o setor público. Em pedido que deu origens às buscas na LFT, o procurador José Alfredo de Paula Silva considerou estranho uma empresa de marketing esportivo ter recebido dinheiro de lobistas. Também foram apreendidos documentos da Touchdown Promoção de Eventos Esportivos e da Silva e Cassaro Corretora de Seguros, que também pertencem ao filho de Lula.

“É muito suspeito que uma empresa de marketing esportivo receba valor tão expressivo de uma empresa especializada em manter contatos com a administração pública (a Marcondes & Mautoni)”, afirmou o procurador.

Pelas investigações, a MMC (Mitsubishi Motors Company) e a Caoa pagaram à Marcondes & Mautoni R$ 16,8 milhões em troca de alterações na Medida Provisória 627, de 2013. Uma emenda aprovada no Congresso prorrogou benefícios fiscais para as montadoras. Em 2014, a Marcondes & Mautoni repassou R$ 1,5 milhão à LFT Marketing. Os sócios da empresa de lobby, Mauro Marcondes Machado e Cristina Mautoni, foram presos anteontem.

Em nota divulgada anteontem, o advogado de Luis Claudio, Cristiano Martins, afirmou que a LFT fez contrato de prestação de serviços com a Marcondes & Mautoni entre 2014 e 2015. O contrato resultou em quatro projetos e relatórios relacionados ao marketing esportivo. O advogado disse ainda que os valores foram devidamente declarados à Receita Federal. Ele não explicou, no entanto, o conteúdo dos projetos.

Os investigadores também vão apurar o envolvimento de políticos. E-mail enviado pelo ex-conselheiro do Carf José Ricardo dos Santos, em 29 de dezembro de 2009, a Eduardo Valadão, sócio de empresa de lobby envolvida no esquema, tem como título “Atenção parlamentares” e relata a necessidade de “acerto” de contas com políticos. O e-mail é encaminhado também ao lobista Alexandre Paes dos Santos, o APS. José Ricardo ressalta que está partindo para uma viagem e não conseguiu falar com os parlamentares. Sugere que Valadão faça o contato, se achar preciso, para a prestação de contas.

José Ricardo prossegue pedindo que Valadão explique não ser conveniente fazer os repasses “de imediato” e que faça a conversa “de maneira tranquila” e “sem criar tensões nos sentimentos deles”. Afirma ainda que, para “segurança dos procedimentos”, era melhor deixar os pagamentos para 2010. No e-mail a APS, o ex-conselheiro afirma que “os nossos colaboradores estão com um conceito muito imediatista”, mas que “é só esclarecer bem a situação e tudo vai dar certo”.

A PF diz não ter identificado os políticos, mas vê no e-mail sinal de que havia “sanha de cobrança” dos parlamentares aos lobistas envolvidos.

Sérgio Moro elogia atuação de juíza da Operação Zelotes

• Para ele, foram ‘importantes’ as prisões e os mandados de busca e apreensão executados pela PF

Renato Onofre - O Globo

-SÃO PAULO- O juiz federal Sérgio Moro elogiou ontem a atuação da juíza Célia Regina Bernardes, que autorizou na segunda-feira a busca e apreensão em empresas de um dos filhos do ex-presidente Lula, Luis Claudio Lula da Silva, durante nova fase da Operação Zelotes. Em evento realizado pela revista “The Economist” em São Paulo, Moro disse que a decisão da juíza foi “importante”, sem citar Luis Claudio.

Para Moro, a Lava-Jato sozinha não pode ser considerada o agente influenciador de mudanças no país. Ele defendeu o fortalecimento das instituições como “primordial para aumentar a eficácia ao combate à corrupção”. E disse que a Lava-Jato não é uma exceção. Para exemplificar seu ponto de vista, elogiou a decisão da magistrada, que autorizou a prisão de seis envolvidos no esquema descoberto no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf ).

— Esses casos (Lava-Jato e Zelotes) influenciam positivamente. Ontem mesmo teve a decisão de uma colega juíza que me pareceu importante — disse Moro. — Acredito que o caso (Zelotes) está nas mãos de uma colega juíza muito competente.

Moro disse que as instituições no Brasil não são frágeis: a manutenção de investigações como a Lava-Jato e a Zelotes são frutos da força dessas instituições.

— Não se varreu nenhum desses casos criminais para debaixo do tapete.

Muitos peixes grandes
O juiz foi um dos convidados no seminário Brasil Summit. Ele participou de um debate sobre a corrupção no Brasil ao lado da jornalista da GloboNews Monica Waldvogel e do advogado Thiago Jabor. O encontro foi mediado pelo editor da revista Michael Reid, que abordou as críticas ao excesso de delações e prisões preventivas. Reid perguntou se a combinação não estaria contribuindo para “pescar” muitos acusados.

— Olha, acho que tem vindo bastante peixe. (Mas) Acho que existe uma crítica exagerada — disse o juiz.

O juiz defendeu ainda que o combate à corrupção não é um dever só das instituições, mas de toda a sociedade. E brincou dizendo que tem aceitado ir a eventos com empresários para “passar basicamente” um recado: — Não paguem propina. Ele foi questionado por um empresário presente na plateia se ele entraria na política. E refutou a possibilidade:

— As propensões políticas não estão no meu horizonte, e eu falo francamente sobre isso.

Moro disse que é difícil prever as consequências do escândalo no país. Ele defendeu a mobilização da sociedade para pressionar o Legislativo por aprimoramento do sistema penal. Citou como exemplo a decisão do Ministério Público Federal de propor dez medidas contra à corrupção e se posicionou favorável ao projeto de lei que reduz a morosidade da Justiça nos casos complexos, em tramitação no Senado.

Moro afirmou que, às vezes, falta vontade do poder público para aprimoramento do combate à corrupção.

— Não seria este o momento de se tomar as iniciativas? Mas de maneira efetiva, não apenas no discurso?

Perde-se um bom momento de mudança, o Congresso deveria ser pressionado pela opinião pública (para acelerar essas mudanças) — disse, completando: — Não se pode confiar só no poder público, mas este seria um bom momento para ele ser pressionado

Lobistas suspeitos de “comprar” MPs tinham elos no Planalto e em dois ministérios

• Relatório da PF lista 'contatos' de alvos da Operação Zelotes e aponta 'canal do lobby' de montadoras para aprovação de medidas provisórias benéficas ao setor automotivo

Por Fábio Fabrini e Andreza Matais, Julia Affonso e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Relatório da Polícia Federal diz que lobistas investigados por “comprar” medidas provisórias, entre elas a MP 471/2009, tinham contatos no Palácio do Planalto e ao menos dois ministérios para, supostamente, negociar benefícios fiscais de interesse de montadoras de veículos. A análise da MP 471 passou pelos ministérios do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, na época comandado pelo ministro Miguel Jorge; Fazenda (Guido Mantega), Ciência e Tecnologia (Sérgio Machado Rezende), além da Casa Civil da Presidência (Dilma Rousseff).

O relatório cita como possíveis contatos dos lobistas Erenice Guerra, secretária-executiva da Casa Civil entre 2005 e abril de 2010; e Dyogo Henrique de Oliveira, então secretário-adjunto da Secretaria de Política Econômica, ligada ao Ministério da Fazenda, e hoje secretário-executivo do Planejamento.

Além deles, como mostrou o Estado na terça-feira, os investigadores mencionam o ex-ministro Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do ex-presidente Lula entre 2003 e 2010 e titular da Secretaria-Geral da Presidência entre 2011 e 2014, na gestão Dilma; Nelson Machado, ex-secretário-executivo da Fazenda; e Lytha Battiston Spíndola, ex-secretária-executiva da Câmara de Comércio Exterior (Camex), ligada ao Desenvolvimento. Também é citado no relatório Helder Chaves, outro servidor que chefiou a Camex.

Na Casa Civil, de acordo com a investigação, “é certo” que os lobistas Alexandre Paes dos Santos, o APS, e José Ricardo da Silva tinham “acesso direto” a Erenice Guerra. “Erenice era frequentadora do escritório de José Ricardo, nas palavras de Hugo Rodrigues Borges (ex-funcionário de José Ricardo), o que nos parece ser verdade, tendo em vista que os mesmos, inclusive, possuem parceria de trabalho na defesa de interesse da empresa Huawei do Brasil Telecomunicações junto ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais)”, registra a PF.

Para a PF, outra pessoa que “possivelmente” manteve contato com os lobistas foi “Dyogo Henrique de Oliveira”, que na época estava no Ministério da Fazenda. Ele é citado numa agenda na qual APS registrava dados sobre a negociação das MPs. Num dos trechos, o lobista anotou “Diogo/José Ricardo”, seguido de “Secretaria de Política Econômica” e “SPE”.

No Ministério do Desenvolvimento, o relatório da PF indica ainda a participação de Lytha Spíndola nas prorrogações dos incentivos de 2010 a 2015 e de 2015 a 2020 como “o canal de lobby naquele órgão”. Auditora fiscal aposentada em 2012, ela é mãe de Vladimir Spíndola Silva, descrito como “parceiro de empreitada” de um dos sócios da SGR Consultoria, Edison Pereira Rodrigues.

Mãe e filho são suspeitos de receber dinheiro do esquema. Eles foram conduzidos pela PF a prestar depoimento na última segunda-feira. Também houve buscas nas residências e escritórios de ambos. “Importa ressaltar a existência de pagamentos pela Marcondes e Mautoni (empresa investigada) para as contas do escritório dos filhos de Lytha, Vladimir e Camilo, que recebeu R$ 506.790 mil líquidos em 2010, e da empresa de consultoria deles, a Green Century Consultoria Empresarial e Participações, que recebeu R$ 913.301,85 entre 2011 e 2012″, sustenta o documento.

Chope. A PF aponta ainda “outra pessoa que pode ter sido usada para influenciar o processo de elaboração da medida provisória”: Helder Chaves, servidor que chefiou a Camex em 2010. Em e-mails daquele ano, José Ricardo diz ter colaborado para que Helder fosse nomeado para o cargo. Num deles, os dois combinam um chope.

Ele chega a trocar mensagem com o servidor em maio daquele ano, consultando-o sobre a possível ampliação, por meio de “emendas parlamentares”, dos benefícios previstos na 471. “As emendas permitiriam que novos empreendimentos pudessem, também, se beneficiar dos incentivos. (…) Qual sua opinião técnica sobre isso?”, questiona o lobista. Novos incentivos foram concedidos em novembro pela MP 512, após passar pelo Desenvolvimento. A norma também está sob suspeita de ter sido encomendada.

“Amigo”. O ex-ministro Gilberto Carvalho prestou depoimento na segunda-feira sobre sua ligação com o empresário Mauro Marcondes Machado, da Marcondes e Mautoni. A PF vê suposto “conluio” do ex-ministro com o lobista na defesa de interesses do setor automobilístico. O relatório diz que os dois têm relação de intimidade.

Em 2007, ao pedir que o então chefe de gabinete entregasse um documento de grandes empresas ao então presidente Lula, o lobista escreveu: “Estou recorrendo mais uma vez ao amigo para cumprir mais uma vez esta incumbência daquela forma informal e low profile que só você consegue fazer, sem as formalidades e no momento oportuno”.

Na agenda de APS, além de citação a Gilberto Carvalho, é mencionado “Nelson Machado”. “Tudo indica ser o número 2 do Ministério da Fazenda”, registra a PF.

Erenice Guerra informou que não falaria a respeito. Dyogo não atendeu a telefonema do Estado. Ele foi procurado por meio da assessoria de imprensa do Ministério do Planejamento, mas não respondeu. O ex-ministro Gilberto Carvalho nega conluio ou participação em qualquer negociata com os lobistas.

Em nota, Lytha Spíndola afirmou ter sido surpreendida com a divulgação de graves acusações contra si. Ela sustentou que sempre exerceu cargos públicos com “empenho e retidão” e adiantou que prestará os devidos esclarecimentos à Justiça. “Não recebi pagamentos diretos ou indiretos e não tive qualquer participação na edição de medidas provisórias para o setor automotivo”, disse. Procurado, o filho de Lytha não ligou de volta.

O Estado não localizou Nelson Machado e Helder Chaves.

Receita recomenda quebra de sigilos de firma de Luís Cláudio

• Auditores sugerem mesma medida ao restaurante de Myriam Carvalho, filha do ex-ministro Gilberto Carvalho, ex-ministro

Andreza Matais e Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - A Receita Federal recomendou ao Ministério Público Federal que peça a quebra dos sigilos bancário e fiscal da LFT Marketing Esportivo, que tem como sócio Luís Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os auditores que trabalham nas investigações da Operação Zelotes também sugerem que as mesmas medidas sejam adotadas em relação ao restaurante Sanfelice Comércio de Massa Artesanal, que está em nome de Myriam Carvalho, filha de Gilberto Carvalho, ex-ministro e ex-chefe de gabinete de Lula.

Nos dois casos, a recomendação é que as quebras sejam feitas entre 2008 e 2015, abarcando todo o período de funcionamento das empresas. Ambas foram abertas em 2011.

As solicitações, da área de Inteligência da Receita, foram encaminhados aos procuradores da República que atuam na força-tarefa da Zelotes. Cabe a eles enviar os pedidos à Justiça Federal.

O Estado apurou que a autorização seria solicitada em pedido apartado dos que resultaram na nova fase da operação, deflagrada anteontem. Procurado, o Ministério Público Federal não se pronunciou a respeito ontem.

A empresa do filho de Lula entrou no foco das investigações após a descoberta de que recebeu repasses da Marcondes & Mautoni Empreendimentos, empresa de lobby contratada por montadoras de veículos para, supostamente, "comprar" medidas provisórias nos governos de Lula e da presidente Dilma Rousseff. A quebra de sigilo da Marcondes revelou a transferência de ao menos R$ 1,5 milhão para a LFT em 2014.

Os investigadores querem levantar outras eventuais fontes de receita da empresa de Luís Claudio, além do destino do dinheiro recebido da Marcondes & Mautoni. A suspeita é de que os repasses para a LFT tenham relação com a MP 627/2013, uma das três normas que teriam sido encomendadas pelo setor automotivo. Por causa dos indícios de irregularidade, a Justiça autorizou busca e apreensão na sede da empresa, em São Paulo. No escritório, também funcionam outras duas firmas de Luís Cláudio (Touchdown e Cassaro).

A defesa de Luís Cláudio nega irregularidades nos contratos.

Transferência. Foi a equipe da Receita que descobriu a transferência de dinheiro da Marcondes &; Mautoni para a LFT. Segundo relatório da investigação, a empresa não tem funcionários, não fez pagamento de salários ou recolheu contribuição previdenciária de empregados.

Questionado pelo Estado no início do mês, o filho de Lula confirmou ter recebido R$ 2,4 milhões da Mautoni por serviços prestados em sua área de atuação. Os recursos seriam referentes ao período de 2014 e 2015.

Em 2014, 97% do que a Mautoni faturou veio de contratos com montadoras. O dinheiro que saiu da empresa em 2014, segundo relatórios da Receita, foi para os sócios e o filho de Lula. Os advogados da LFT informaram que, "infelizmente", não poderiam comentar a recomendação de quebra de sigilos, pois se trata de algo que desconhecem.

Os pedidos sobre o restaurante Sanfelice, em nome da filha do ex-ministro Gilberto Carvalho, seguem a mesma lógica. Os investigadores querem saber se o petista usou a empresa em nome da filha para receber dinheiro da Marcondes & Mautoni.

Documentos apreendidos em fases anteriores da Zelotes mostram o nome do ex-chefe de gabinete de Lula associado a inscrições sobre a MP 471, de 2009, editada pelo então presidente. Para os investigadores, havia um "conluio" entre ele e a consultoria na defesa de "interesses do setor automobilístico".

Segundo dados públicos da Receita, o restaurante foi aberto em 25 de maio de 2011, em Brasília, com capital de R$ 20 mil, e tem como sócios Myriam e Gabriel de Albuquerque Carvalho. A cantina vende massas congeladas para preparo em casa e chegou a ter uma filial, funcionando como restaurante, fechada recentemente.

A reportagem não conseguiu contato nessa terça com Carvalho ou com os sócios do restaurante. O ex-ministro nega conluio com os investigados e sustenta nunca ter feito gestões a respeito no governo ou recebido valores do grupo.

Delator do escândalo do HSBC diz que vão surgir novos nomes na Lava Jato

• Em entrevista a jornalistas brasileiros, Hervé Falciani afirma que investigação de desvios na Petrobrás é 'oportunidade de colocar o dedo onde faz mal'

Jamil Chade - O Estado de S. Paulo

DIVONNE (FRANÇA) – Hervé Falciani, o homem que delatou mais de 100 mil contas sob suspeita do banco HSBC na Suíça, acredita que novos nomes ligados ao esquema de corrupção da Petrobrás ainda vão vir a público. “O certo é que o Brasil apenas começa a conhecer a dimensão desse assunto e, com a Petrobrás, é uma bela oportunidade de colocar o dedo onde faz mal”, disse.

Para Falciani, que passou a colaborar com a Justiça francesa e conheceu como poucos as relações entre o HSBC e dezenas de casos de corrupção, vê as investigações da Operação Lava Jato como um divisor de águas. Nas investigações conduzidas pelo Ministério Público da Suíça, uma série de contas no banco foram identificadas em nome de ex-diretores da Petrobrás e milhões de dólares foram bloqueados.

Sem poder entrar na Suíça, sob risco de ser detido por acusações de roubo qualificado e quebra de sigilo bancário, Falciani concedeu uma coletiva de imprensa nesta quarta-feira, 28, na pequena cidade francesa de Divonne, na fronteira com a Suíça e a poucos quilômetros do primeiro posto de polícia.

Questionado por jornalistas brasileiros se novos nomes relacionados à Lava Jato vão aparecer, o delator confirmou e foi além. “Mais que novos nomes, vamos entender os mecanismos usados e nos dará a oportunidade para entender e prevenir os futuros escândalos”, disse. Para Falciani, o cidadão comum está “longe de conhecer o que se passa no caso da Petrobrás e HSBC". "O Brasil só agora começa a ver o aspecto mais amplo das finanças”, disse. “Temos como agir. Graças ao contexto que existe no Brasil, temos muito a fazer.”

Colaboração. No Brasil, uma CPI foi instaurada para investigar o escândalo envolvendo o HSBC e correntistas brasileiros. Em agosto, o francês foi a última testemunha ouvida pelos senadores por meio de um teleconferência. Falciani disse aos parlamentares que o número de brasileiros com contas na filial do banco ultrapassa muito os 8,7 mil que se conhece até o momento. Na ocasião, ele se disse disposto a compartilhar seu banco de dados com os parlamentares e a colaborar nas investigações.

Ainda assim, os senadores não ficaram convencidos.

O vice-presidente da CPI, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), chegou a acusar parte dos membros da CPI de tentarem "enterrar" as investigações. “Existe uma pressão do poder econômico sobre os membros da CPI e existe um esvaziamento proposital da CPI”, disse o senador.

Apesar dos obstáculos, Falciani não abandona a colaboração com o Brasil. Ele ainda não repassou seus dados à Justiça brasileira e, na França, a colaboração com o Ministério Público do Brasil não vingou. “Todos os meios administrativos e judiciais estão sendo explorados e vamos ver como podemos ajudar. Se não pudermos colaborar por meio da França, faremos pela Espanha ou outro país”, disse. Segundo ele, seus advogados estão prontos para aceitar uma colaboração com o Ministério Público brasileiro.

Questionado se estava satisfeito ou não com a reação do Congresso brasileiro, Falciani desconversou.

“Não cabe a mim estar satisfeito ou não. Fazemos o que podemos e com o que temos”, disse, relatando que existem cerca de 20 pessoas trabalhando com o dossiê brasileiro. "As trocas com o Brasil continuam. O que foi iniciado ali na CPI estamos tentando fazer avançar por outras vias”, explicou.

O francês evita criticar investigadores ou mesmo as autoridades suíças, que o consideram um ladrão de dados sigilosos. “A dificuldade é política. Não existe vontade política para conversar com as autoridades fiscais”, disse. "Há coisas que podem ser melhores para todos, em detrimento dos interesses financeiros. Não é para fragilizar as finanças."

Falciani afirmou que tenta tirar proveito da imagem negativa que bancos e governos tentam passar dele. “A má imagem é usada e eu não me reconheço nela. Mas faz parte do jogo. Vou utilizar essa má imagem. Será um comportamento oportunista e tenho o direito de ser oportunista. É um combate.”

Pesquisa mostra a presidente e seu antecessor em baixa

Por Fernando Exman e Bruno Peres - Valor Econômico

BRASÍLIA - A mais recente pesquisa do instituto MDA, divulgada ontem pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), apurou uma variação positiva na avaliação positiva do governo Dilma Rousseff dos 7,7% observados em julho para 8,8%. Também registrou um avanço dentro da margem de erro de 2,2 pontos na aprovação pessoal da presidente, de 15,3% para 15,9%. Mas contém outras notícias negativas para o governo e o PT.

Uma pode atrapalhar a estratégia do Palácio do Planalto de associar um eventual processo de impeachment a uma tentativa de golpe. A sondagem demonstrou também que a crise enfrentada pelo país e a Operação Lava-Jato continuam a atingir a imagem do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, principal aposta do partido para tentar manter-se no poder nas eleições de 2018.

Lula fica atrás de seus potenciais adversários na disputa. Nas intenções de voto espontâneas, aparece com 7,9% - atrás do presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), que perdeu a última eleição para Dilma e hoje já teria na largada pelo menos 13,7%.

Na pesquisa estimulada, em nenhum cenário Lula terminaria o primeiro turno na frente. Num segundo turno Lula perderia para Aécio por 45,9% a 28,3%. Contra o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), a derrota seria de 36,4% a 30,2%. E contra o senador José Serra (PSDB-SP) o resultado seria favorável ao tucano em 35,2% a 30,9%. Foram ouvidos 2.002 entrevistados em 136 municípios de 24 unidades da federação em todo país, entre os dias 20 e 24.

Além da insatisfação com a situação do país, outro fator pode explicar essa deterioração do potencial eleitoral do ex-presidente: 87,2% dos entrevistados acompanham ou ouviram falar do escândalo de corrupção na Petrobras e 68,4% consideram Lula culpado pelos malfeitos flagrados na estatal. Dilma é responsabilizada por 69,2%.

Por outro lado, se aparentemente a presidente parece ter conseguido estancar a queda de sua popularidade ainda que num nível baixíssimo, a pesquisa suscita dúvidas sobre a eficácia do discurso oficial contra o impeachment. Segundo a versão do Palácio do Planalto, a abertura de um processo por conta das chamadas "pedaladas fiscais" seria uma espécie de "golpe democrático".

De acordo com o levantamento CNT/MDA, no entanto, 52,6% dos entrevistados têm conhecimento sobre o julgamento das contas do governo no Tribunal de Contas da União (TCU). Desse total, 61,3% consideram a rejeição das contas um motivo para a realização do impeachment e 56,1% acreditam que o Congresso reprovará as contas de 2014 da gestão Dilma.

É verdade que esse percentual ainda representa uma parcela minoritária do universo de entrevistados. Mas Dilma não pode se dar o luxo de correr o risco de ver tal índice crescer, uma vez que essa discussão avançará no Congresso nas próximas semanas e o assunto deve ganhar mais destaque na imprensa. Principalmente porque a maioria dos entrevistados acha que a crise econômica é mais grave que a política, não está disposta a pagar mais impostos e acha que a presidente não está sabendo lidar com a situação econômica do país.

Meta fiscal de 2015 ainda é um número em aberto

Por Leandra Peres e Ribamar Oliveira – Valor Econômico

BRASÍLIA - O setor público brasileiro, incluindo União, Estados e municípios, terá um déficit primário que pode variar de R$ 48,9 bilhões a mais de R$ 100 bilhões em 2015. Em ofício encaminhado ontem ao Congresso, os ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, fixaram um déficit de R$ 48,9 bilhões, mas o valor poderá aumentar se o Tesouro for obrigado a pagar as chamadas "pedaladas fiscais" e se não ingressarem nos cofres públicos os recursos da relicitação das 29 usinas hidrelétricas que não renovaram suas concessões. Os leilões deverão ocorrer em novembro. Assim, a meta fiscal ficou em aberto.

O déficit primário deste ano será maior que o registrado em 2014 e também o pior da história. No ano passado, o déficit ficou em R$ 32,5 bilhões, equivalentes a 0,63% do Produto Interno Bruto (PIB). Os R$ 48,9 bilhões deste ano correspondem a algo em torno de 0,8% do PIB. Se todos os descontos previstos no ofício dos dois ministros forem aplicados e o resultado ultrapassar os R$ 100 bilhões, o setor público terá um déficit em torno de 1,7% do PIB. A meta inicial do governo era de um superávit de 1,2% do PIB para este ano.

O governo reduziu sua previsão para o crescimento da economia neste ano de uma queda de 2,44% para 2,80%. Apresentou uma frustração de receita de R$ 58 bilhões na comparação com a estimativa feita em setembro e manteve as despesas inalteradas.

O governo diz, no documento enviado ao Congresso, que "as sucessivas reduções nas expectativas de crescimento para 2015 e 2016 não podem ser imputadas primordialmente a um impulso negativo dado pelo ajuste fiscal".

O texto também alerta para as consequências de uma possível perda do grau de investimento conferido ao país pelas agências de "rating". Esses desdobramentos "não contribuiriam para aliviar a fraca dinâmica de crédito ora verificada, que já tem trazido constrangimento a expressivos segmentos econômicos".

Com 'pedalada', déficit pode ir a R$ 100 bi

Por Leandra Peres, Lucas Marchesini e Fábio Pupo – Valor Econômico

BRASÍLIA - O setor público brasileiro (União, Estados e municípios) terá um déficit primário de até R$ 60 bilhões em 2015. Se o Tesouro tiver que pagar neste ano as chamadas "pedaladas fiscais", estimadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em R$ 40,2 bilhões, o rombo nas contas públicas pode superar R$ 100 bilhões em 2015.

Não houve anúncio sobre as metas do ano que vem. A nova meta fiscal de 2015 foi divulgada sem a tradicional entrevista dos ministros da área econômica. O governo encaminhou ofício com os novos números ao relator da LDO, deputado Hugo Leal (Pros-RJ).

A proposta do governo ao Congresso é que o déficit primário do setor público consolidado seja de R$ 48,9 bilhões este ano. O número, no entanto, pode ser elevado em R$ 11,1 bilhões, caso o governo não consiga arrecadar esse valor com o leilão das hidrelétricas previsto para o fim de novembro. Dessa forma, a União fica autorizada, na prática, a fazer um déficit de R$ 60 bilhões.

As "pedaladas fiscais" também poderão ser abatidas da meta, ou seja, o déficit primário total do governo poderá subir muito. Mas como não há nenhuma estimativa feita pelo governo dos valores envolvidos, não há como fazer uma conta precisa do resultado fiscal de 2015.

Na lista de abatimentos dos subsídios em atraso, o governo incluiu as despesas deste ano que já foram pagas para regularizar a dívida do Tesouro com o FGTS, por causa do programa Minha Casa, Minha Vida, e o adicional de 10% da multa nas demissões sem justa causa. Esse valor não integra o cálculo que o TCU fez das manobras fiscais, o que é o mesmo que dizer que o valor de R$ 40,2 bilhões está subestimado. O documento do governo não estima o valor da despesa com o FGTS, assim como não trata do que será pago em subsídios atrasados ao BNDES, Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil.

"O momento econômico do Brasil tem se mostrado desafiador, com um aprofundamento da deterioração da atividade econômica em consequência do acúmulo de incerteza, [...] da queda do preço das commodities e da imperiosa necessidade de o setor público realizar uma desalavacagem, após substancial expansão da dívida", descreve o documento do governo em sua frase de abertura.

Os ministros Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento, rebatem a tese de que o ajuste fiscal é responsável pela queda no crescimento da economia. Segundo o documento, o impulso fiscal tem se mantido estável desde o fim de 2014. Em compensação, os ministros dizem que a piora nas expectativas de crescimento "tem sido contemporânea" ao aumento da chance de novos cortes na nota da dívida brasileira pelas agências de rating e falam no risco de um novo rebaixamento.

Para "refletir esse quadro", o governo reviu mais uma vez a estimativa de crescimento do PIB e avalia que a economia deve cair 2,8% em 2015, uma piora em relação aos 2,4% estimados em setembro. A frustração de receitas também foi significativa: R$ 61,4 bilhões em relação ao relatório de setembro, ou R$ 58 bilhões se já forem abatidos repasses a Estados e municípios. A explicação é que o governo perdeu R$ 30,9 bilhões em arrecadação prevista com projetos de lei não provados pelo Congresso, como a repatriação de recursos no exterior, além de uma piora no desempenho do Imposto de Renda. Houve também reduções em ganhos de concessões, dividendos, royalties e privatizações.

Boa parte do documento é dedicado a provar como o governo fez um profundo corte nas despesas e as dificuldades causadas pela rigidez do Orçamento. Há frases destacadas que ressaltam "o maior contingenciamento já implementado, cerca de 1,22% do PIB". A estimativa das despesas de 2015 não foi alterada em relação a setembro, e continuaram em R$ 1,1 trilhão.

Para explicar a dificuldade em fazer novos cortes nas despesas discricionárias, o governo explica que teria que cortar 116,58% dessas verbas, se não alterasse a meta fiscal. Há exemplos do espaço para novos cortes. No Ministério do Desenvolvimento Social, seria possível cortar mais R$ 900 milhões, dinheiro que, no entanto, cobre os repasses federais para creches.

Governo prevê rombo de até R$ 60 bi este ano

O governo vai encaminhar ao Congresso proposta para alterar a meta fiscal deste ano, que hoje prevê superávit de R$ 8,7 bilhões nas contas públicas, para um déficit de R$ 48,9 bilhões. O rombo poderá ser ainda maior, de até R$ 60 bilhões, pois a meta prevê abatimento de até R$ 11,1 bilhões caso haja frustração na receita prevista com o leilão de hidrelétricas antigas. O déficit não inclui a regularização das pedaladas fiscais. O ministro Levy disse que o governo estuda usar recursos que o BNDES devolverá ao Tesouro para regularizar os repasses atrasados.

Governo prevê déficit fiscal de até R$ 60 bi

• Nova meta estima rombo em R$ 48,9 bi, mas permite abater R$ 11 bi se leilão de hidrelétricas fracassar

Martha Beck, Geralda Doca e João Sorima Neto - O Globo

-BRASÍLIA E SÃO PAULO- Depois de muitas idas e vindas, o governo informou ontem que encaminhará ao Congresso proposta que altera a meta fiscal de 2015 do setor público, de superávit primário de R$ 8,7 bilhões, ou 0,15% do Produto Interno Bruto (PIB), para déficit de R$ 48,9 bilhões, ou 0,85% do PIB. O rombo, no entanto, pode ser ainda maior. O texto tem uma cláusula pela qual a equipe econômica poderá abater uma frustração de receitas de R$ 11,1 bilhões caso o leilão de hidrelétricas antigas, previsto para novembro, não tenha o resultado esperado. Neste caso, o déficit subiria para R$ 60 bilhões, ou 1,04% do PIB. O projeto não prevê o pagamento das pedaladas fiscais (atrasos nos repasses de recursos do Tesouro Nacional para bancos públicos), que, no total, somam R$ 40 bilhões. Parte desses débitos já foi quitada, mas o acerto final só será feito após o Tribunal de Contas da União (TCU) se posicionar.

Em São Paulo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, disse que o governo estuda a possibilidade de o BNDES devolver ao Tesouro recursos destinados ao Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Esse dinheiro, afirmou o ministro, poderia ser usado para pagar dívidas que o governo tem com instituições financeiras. São esses débitos que ficaram conhecidos como pedaladas fiscais.

— Não são recursos do BNDES. São recursos públicos que o Tesouro repassou, e ficou evidente que havia espaço para se reduzir o que foi demandado no ano passado. E pode-se considerar a conveniência desses recursos eventualmente voltarem ao Tesouro, diminuindo a exposição à divida. Neste momento de fortalecimento fiscal, é uma coisa a ser considerada — afirmou Levy.

Governo central terá déficit de r$ 51.8 bilhões
No governo central (composto por Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central), a meta passou de um superávit de R$ 5,8 bilhões para um resultado negativo de R$ 51,8 bilhões, ou 0,90% do PIB. Já estados e municípios terão de fazer um superávit primário de R$ 2,9 bilhões, ou 0,05% do PIB. Essa será a terceira alteração feita na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2015, que, no início do ano, previa um superávit de R$ 66,3 bilhões, ou 1,2% do PIB.

Nenhum integrante da equipe econômica apareceu para anunciar que 2015 registrará o pior resultado fiscal primário da história. A informação foi divulgada pelo relator da proposta de alteração da meta, deputado Hugo Leal (PROS-RJ), depois de ser informado dos números pelo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa. Somente no fim da tarde, os dados foram disponibilizados pelo governo. Não houve entrevista ou explicação mais detalhada. Ao contrário da última alteração de meta, quando Barbosa e Levy concederam entrevista coletiva para explicar as razões da revisão, desta vez, ambos mantiveram o silêncio. Levy nem ficou em Brasília para dar a notícia.

A frustração nas receitas foi a responsável pela redução da meta. Com a economia em recessão, mercado financeiro turbulento e pouca margem de manobra no Congresso para aprovar medidas do ajuste fiscal, a arrecadação caiu drasticamente, e o governo foi obrigado a reduzir sua estimativa de receita líquida em R$ 57,7 bilhões, em relação ao último relatório bimestral de receitas e despesas. O total esperado passou de R$ 1,111 trilhão para R$ 1,053 trilhão. As estimativas de gastos, por outro lado, foram mantidas em R$ 1,105 trilhão. O governo também reduziu a previsão para o PIB deste ano. A retração esperada era de 2,4% e foi para 2,8%.

Além da redução na expectativa de arrecadação de tributos importantes como o Imposto de Renda (IR) e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), o governo também reviu estimativas de receitas extraordinárias. A equipe econômica já não conta mais com o Programa de Redução de Litígios Tributários (Prorelit), com o projeto de repatriação de ativos nem com a abertura de capital da Caixa Seguridade. Outro balde de água fria foram as concessões. A estimativa de receita com essas operações encolheu R$ 1,2 bilhão, na comparação com o relatório do quarto bimestre. Houve queda de R$ 1,08 bilhão na projeção da arrecadação com rodadas de leilões da ANP e de R$ 250 milhões com outorgas de telecomunicações.

No documento no qual revisou as metas de 2015, a equipe econômica destacou os esforços feitos ao longo do ano para reequilibrar as contas públicas, como um corte de despesas de quase R$ 80 bilhões, e explicou que para a manter a meta atual, seria preciso um contingenciamento adicional de R$ 107 bilhões. O texto ressalta ainda que a deterioração fiscal, as incertezas políticas e a retração econômica levaram a agência de classificação de risco Standard & Poor’s a retirar o grau de investimento (selo de bom pagador) do Brasil e lembra que a Fitch pode ser seguir o mesmo caminho.

Acerto com BNDES para regularizar pedaladas
Entretanto, o texto não faz referência ao impacto das pedaladas fiscais nas contas. A proposta que será encaminhada ao Legislativo apenas coloca na cláusula de abatimento que o pagamento dos repasses atrasados aos bancos públicos decorrente dessas manobras poderá ser abatido do resultado fiscal primário em 2015.

Enquanto espera um posicionamento do TCU, o governo se prepara para quitar as despesas. O Tesouro Nacional e o BNDES negociam uma engenharia financeira pela qual o banco pagará antecipadamente à União uma parte dos empréstimos que recebeu nos últimos anos por meio da emissão de títulos públicos. Esse dinheiro vai ingressar no Tesouro como uma receita financeira e depois será usado para quitar as dívidas pendentes com o próprio BNDES e outros bancos, como Banco do Brasil e Caixa, segundo técnicos. A dívida do Tesouro com o BNDES chega a R$ 24,5 bilhões.

O primeiro passo para viabilizar essa operação foi dado na última sexta-feira, quando o Conselho Monetário Nacional (CMN) reduziu em R$ 30 bilhões o limite do BNDES para empréstimos do PSI. Esse limite passou a ser uma sobra orçamentária do banco, que pode ser usada para fazer o pagamento ao Tesouro Nacional. A operação terá impacto no resultado primário, mas não na dívida bruta, pois o governo vai receber uma receita e depois pagar uma despesa no mesmo valor.

Questionado se os recursos seriam usados para pagar as “pedaladas”, Levy respondeu que não se tratava disso.

— Há atrasos em pagamentos do governo para algumas instituições financeiras que nós vamos regularizar dentro de um cronograma — afirmou, sem citar a palavra pedalada.

Em Brasília, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), defendeu que a nova meta seja votada rapidamente. No ano passado, a alteração na meta de 2014 foi aprovada em dezembro, no prazo limite.

— O que estiver à disposição do Legislativo, tem de ser rapidamente encaminhado. O que couber ao Legislativo fazer, é fundamental que o faça logo. O Orçamento, quanto mais real, melhor. A confiança que o brasileiro quer é exatamente essa: saber o que está acontecendo do ponto de vista do Orçamento. Com relação à previsão de receita, de despesa, quanto mais real, verdadeiro for, melhor. 

O Congresso, neste debate, vai, de todas as maneiras, dar contribuições, oferecer saídas e sugestões. 

É o nosso papel — disse Renan.

Colaboraram Bárbara Nascimento e Cristiane Jungblut

Repatriação de dinheiro pode anistiar até caixa dois

O projeto que permite a repatriação de dinheiro não declarado de brasileiros no exterior foi alterado para permitir a anistia de quem fizer caixa dois ou cometer os crimes de descaminho e associação criminosa, entre outros. A polêmica proposta pode ser votada hoje no plenário da Câmara.

Crime sem castigo

• Mudanças em projeto de repatriação de recursos anistiam associação criminosa e caixa 2

Martha Beck e Simone Iglesias - O Globo

-BRASÍLIA- No momento em que a Operação Lava-Jato revela a existência de dezenas de contas de políticos e dirigentes da Petrobras no exterior, pode ser votado hoje no plenário da Câmara dos Deputados o projeto de lei que permite a repatriação de ativos enviados para fora do país sem aviso à Receita Federal. A proposta vem cercada de polêmica. Seu relator, o deputado Manoel Júnior (PMDB-PB), fez uma série de alterações que podem abrir as portas para a legalização de dinheiro decorrente de crimes como descaminho, caixa dois e formação de quadrilha.

O parlamentar também ampliou prazos de adesão, reduziu o Imposto de Renda (IR) e a multa que serão cobrados. E ainda desvirtuou o principal objetivo da medida, que era ajudar a destravar a reforma do ICMS.

O projeto da repatriação que foi encaminhado pelo governo ao Legislativo permitia a legalização de dinheiro remetido para o exterior, desde que ele fosse decorrente de sonegação fiscal, evasão de divisas ou lavagem de dinheiro relacionado ao envio desses valores. O objetivo era arrecadar cerca de R$ 11 bilhões com o pagamento de Imposto de Renda e multar quem obteve o dinheiro legalmente no Brasil, mas tentou escondê-lo do Leão.

Proposta reduz multa para sonegadores
Manoel Júnior, no entanto, incluiu na proposta recursos decorrentes de qualquer lavagem de dinheiro, caixa dois, descaminho, falsidade ideológica e até formação de quadrilha relacionada diretamente a esses crimes. Acrescentou ainda a anistia aos envolvidos. Esse benefício só não valerá para pessoas que tenham uma condenação transitada em julgado (sem a possibilidade de recursos).

— Fizemos as alterações no limite do que é seguro juridicamente e tornando as alíquotas mais convidativas — afirmou o relator.

A proposta do Executivo fixava o valor do Imposto de Renda a ser pago pelos recursos repatriados em 17,5%, mais 17,5% de multa, num total de 35%. Uma parte da arrecadação obtida com esse pagamento seria destinada à criação de um fundo de compensação para os estados pela reforma do ICMS. No entanto, o relator acabou com essa vinculação e ainda reduziu os percentuais para 15% de Imposto de Renda e 15% de multa, chegando a um total de 30%.

Segundo técnicos da área econômica, não há objeção do governo à redução dos percentuais para 30%. No entanto, o governo é contrário ao fim da vinculação ao fundo do ICMS. Quando decidiu propor a repatriação, a equipe do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tinha como principal objetivo reforçar o caixa da União e destravar a reforma tributária. A vinculação de parte dos recursos para os estados era o atrativo para fazer a medida ser aprovada no Congresso.

Área econômica teme repercussão negativa
O Palácio do Planalto tentou convencer o relator a manter a vinculação ao fundo do ICMS, mas não obteve sucesso. O relatório de Manoel Júnior determina que os valores serão divididos de acordo com os critérios do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e do Fundo de Participação dos Municípios (FPM).

— O fundo não foi sequer criado, e acho que os critérios do FPE e do FPM são mais justos. Esses recursos são finitos, não há motivo para ficar num fundo específico. O governo pediu para eu rever, mas eu disse que não iria reconsiderar — afirmou Manoel Júnior.

A manutenção do texto do relator não é um problema para a área política do governo. Mesmo com as mudanças, é preferível ver a matéria aprovada. Um auxiliar presidencial afirmou que o Palácio do Planalto não vai interferir na redução da alíquota em 5%, nem na ampliação dos crimes anistiados.

Para a área econômica do governo, no entanto, há uma forte preocupação. Isso porque existe um temor de que o Brasil passe a ser visto internacionalmente como o país leniente com desvios que estão facilmente ligados a atividades como tráfico de drogas e armas, num momento em que o mundo caminha na direção contrária.

Outra preocupação dos técnicos é que, uma vez aprovada, a proposta possa interferir em investigações como as da Lava-Jato, que revelou um esquema de corrupção na Petrobras. Um ponto que não estava claro no texto do governo era a possibilidade de doleiros terem direito ao benefício (anistia).

No relatório isso não é permitido, a não ser que haja um vínculo formal de trabalho com a empresa que aderiu ao programa. O relatório dos deputados também fixou, para efeito de cálculo, a cotação do dólar em 31 de dezembro de 2014 (R$ 2,65) e não o do dia da adesão ao programa (ontem, por exemplo, a cotação no câmbio oficial era de R$ 3,91).

Líder do PT chama manifestantes pró-impeachment de 'vagabundos'

• Ao ouvir palavras contra o PT, a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, Sibá Machado usou microfone do plenário para disparar contra os manifestantes

Igor Gadelha - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O líder do PT na Câmara dos Deputados, Sibá Machado (AC), chamou de "vagabundos" manifestantes do Movimento Brasil Livre (MBL) que protestavam nas galerias da Casa durante a sessão plenária desta terça-feira, 27. O protesto pedia o impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Ao ouvir palavras contra o PT, a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, Machado usou microfone do plenário para disparar contra os manifestantes. "Vou botar vocês para correr daqui da frente do Congresso, bando de vagabundos", afirmou. "Vamos para o pau na frente do Congresso", emendou o petista.

Durante o ato, os manifestantes chegaram a erguer uma grande faixa pedindo o afastamento da petista. Após atrapalharem a sessão com gritos, contudo, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pediu a retirada deles das galerias. Revoltados, ele deixaram o local com gritos de "Fora, Cunha".

Como mostrou o Brodadcast na semana passada, manifestantes do MBL estão acampados no gramado em frente à Câmara desde a última quarta-feira, 21, com a autorização de Cunha. O peemedebista autorizou o acampamento contrariando ato do Congresso Nacional de agosto de 2001, que proíbe montagem de tendas ou similares no gramado em frente ao Congresso.

Por meio de sua assessoria, o presidente da Câmara disse que autorizou o protesto no gramado como faria com "qualquer outro movimento que não esteja sob riscos de segurança nem coloquem em risco as pessoas que circulam pelo local, respeite o patrimônio público, as normas de trânsito e não tenha natureza hostil".

Eliane Cantanhêde - Fim de festa

• Lula, que já foi o homem popular do País, não pode mais nem comemorar aniversário

- O Estado de S. Paulo

Luiz Inácio Lula da Silva completou 70 anos ontem sem festa, sem choro nem vela, vendo seu legado ir para o ralo pela enxurrada da Lava Jato e pelo desastre do governo Dilma Rousseff e, não bastasse, esperneando e se rebelando contra a primeira batida policial nas empresas de um dos filhos. Podem vir outras. E podem atingir outros filhos. Não haveria um presente mais amargo de aniversário.
Quanto mais Lula afunda nos próprios erros, mais o antecessor Fernando Henrique Cardoso emerge e se livra do carimbo da "herança maldita", sem esconder a mágoa nem demonstrar clemência contra o antigo algoz.

Em entrevista ao Roda Viva, da TV Cultura, justamente no dia da busca e apreensão na empresa de Luís Cláudio Lula da Silva, FHC voltou a dizer que considera Dilma "pessoalmente honrada", mas fez uma ressalva em relação a ela e lançou uma rede de suspeição em direção a Lula. Segundo ele, Dilma tem "responsabilidade política" por tudo isso. E ele negou-se a defender Lula: "Tenho de esperar para ver. Tem saído muita coisa que tem de ser passada a limpo".

A entrevista foi a propósito do primeiro volume de Diários da Presidência, que reproduz o relato oral de Fernando Henrique sobre o seu dia a dia nos dois primeiros anos de governo, 1995 e 1996. Na página 502, de março de 1996, ele fala algo que continua extraordinariamente atual, quase vinte anos depois. Algo que tanto Dilma quanto o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, poderiam repetir quando "acusados" de lavar as mãos diante da pressão da PF sobre o filho (ou os filhos) de Lula.

Abordado pelos senadores aliados José Sarney, Gilberto Miranda e Jader Barbalho, incomodados por multas aplicadas a suas empresas por órgãos do governo, FHC dava de ombros: "Sei lá como foi..." E argumentava, como cabe hoje a Dilma e a Cardozo fazer, em defesa própria junto a Lula e ao PT: "O problema é que eles (parêntesis meus: os de ontem e os de hoje) não estão entendendo que o Brasil mudou mesmo e que, ainda que eu quisesse abafar esses casos, não conseguiria. E não quero. Não quero perseguir, mas também não quero encobrir".

Sem defesa para esse monte de empresas e de histórias de seus filhos, Lula parte para o ataque. Não só contra a imprensa, também contra Dilma e contra Cardozo, que "não controlam a PF". Como se fosse simples. E como se fosse certo.

Em entrevista ao Estado, depois de depor na PF sobre eventuais relações com lobistas, o ex-ministro e fiel lulista Gilberto Carvalho disse, em outras palavras, que "quem não deve não teme": "Estou muito sereno. Deixei o governo com o mesmo patrimônio que tinha quando entrei". Será que Lula está sereno? E será que seus filhos saíram do governo dele com o mesmo patrimônio que tinham quando o pai entrou?

Quem vai à minha casa encontra logo na sala um livro quadrado, com a foto de um garoto de olhar vivo, esperto. Trata-se de O menino Lula, escrito pelo jornalista Audálio Dantas, um dos mais respeitados do País, contando a história da criança pobre, nascida nos rincões do Nordeste, que cruzou o País num pau de arara, comeu o pão que o diabo amassou e virou tudo o que virou.

O livro está ali, à mão, para tentar um equilíbrio entre o homem público e a pessoa, o presidente endeusado e o ex-presidente demonizado. Talvez esteja em cada linha, em cada momento, em cada desgraça, uma explicação para tudo o que Lula fez, permitiu fazer e induziu os filhos a fazerem no usufruto do poder. Obviamente, explica, mas não justifica. Nada justifica que Lula tenha cedido a todas as tentações e arriscado o próprio legado (da inclusão social) pelo descaramento, megalomania, ambição. O menino Lula e o grande líder sindical Lula não mereciam que o presidente Lula fizesse isso com eles.