sábado, 14 de abril de 2018

Ruy Altenfelder*: Partidos políticos, base da democracia

- O Estado de S.Paulo

As 35 legendas registradas no TSE têm princípios pragmáticos e os cumprem?

Partido político, na definição de Max Weber, é “uma associação que visa a um fim deliberado, seja ele objetivo, como a realização de um plano com intuitos materiais ou ideais, seja pessoal, destinado a obter benefícios, poder e, consequentemente, glória para os chefes e sequazes, ou então voltado para todos esses objetivos conjuntamente”. (cf. Dicionário de Política, pág. 859). O caráter associativo do partido, a natureza da sua ação orientada para a conquista do poder político, decorre da definição de Weber.

No Brasil, a Lei 9.096, de 19 de setembro de 1995, dispõe sobre partidos políticos, definindo-os como pessoas jurídicas de direito privado, destinadas a assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição federal. A lei torna livre a criação, fusão, incorporação e extinção de partidos políticos cujos programas respeitem a soberania nacional, o regime democrático, o pluripartidarismo e os direitos fundamentais da pessoa humana.

Ao partido é assegurada autonomia para definir sua estrutura interna, sua organização e seu funcionamento.

O professor José Murilo de Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em seu excelente livro Cidadania no Brasil – o Longo Caminho, diz que o esforço da construção da democracia no País ganhou ímpeto após o movimento de 1964. E uma das marcas desse esforço é a voga que assumiu a palavra cidadania. Não se diz mais “o povo quer isso ou aquilo”, diz-se “a cidadania quer”. A cidadania virou gente!

Cristovam Buarque: A locomotiva e o trilho

- O Globo

Esquerda perde sintonia com o espírito do tempo

A autodenominada esquerda continuou amarrada a ideias superadas pela realidade e ficou defensora de interesses arraigados em setores privilegiados, tanto de capitalistas quanto de trabalhadores. As surpreendentes e imprevisíveis transformações na realidade construíram um mundo diferente daquele que servia de base às formulações da esquerda tradicional. A globalização desestruturou a lógica do nacionalismo; a automatização e a inteligência artificial retiraram o protagonismo revolucionário da classe de trabalhadores; o esgotamento de recursos naturais eliminou a utopia do consumismo para todos.

A crise consequente, de entendimentos e de propostas, deixou de ser apenas do capitalismo e passou a ser da civilização industrial por inteiro. Essa nova realidade exige uma nova percepção e postura no papel do Estado na economia. Ao perder a sintonia com o avanço das ideias e compromissos com as reformas necessárias, a esquerda ficou reacionária.

A partir de agora, os que defendem o progresso social e econômico deverão entender que ao Estado cabe definir e construir o trilho para o futuro, mas a locomotiva deve estar nas mãos da sociedade: seus trabalhadores, empresários, organizações sociais. Ao Estado cabe estabelecer regras e fazer investimentos que permitam a estabilidade política e jurídica; a construção de um sistema educacional que ofereça o máximo aproveitamento de todos os cérebros da população e garanta a mesma chance para cada indivíduo desenvolver seu talento pessoal e, com isso, construir uma sociedade eficiente, rica e justa, com a renda bem distribuída.

Fernando Gabeira: Para onde, Brasil?

- O Globo

Ao contrário de um debate sobre uma eleição que se aproxima, as emoções dominam, estamos às voltas com ídolos

Como diz o coelho branco em Alice no País das Maravilhas: “Ai, ai! Vou chegar atrasado.” No país real, estamos atrasados em relação aos rumos do país. As eleições estão próximas. Normalmente, começam mesmo depois da Copa. Mas, antes, deveria ser iniciada uma temporada de debates não só entre os candidatos.

Num contexto mais favorável, a discussão em torno dos rumos do país deveria ser feita com o máximo de cordialidade possível.

Como se nesse campo pudéssemos adotar a visão de Diderot. Segundo ele, cada um tem a sua verdade, mas não importa quem vença ou ganhe, mas sim que após a discussão reine a paz entre os interlocutores. Traduzindo para a linguagem mineira: um debate onde as ideias briguem, mas as pessoas não.

O episódio da prisão de Lula foi muito dramático. Um amigo lembra que, na mesma semana, foi presa a ex-presidente da Coreia do Sul Park Geun-hye. Houve manifestações, mas ela não fez discurso, dispensou visitas e falou apenas com os advogados.

Sérgio C. Buarque: O populismo e nova seita no Brasil

- Revista Será? – Penso, logo duvido (PE)

No palanque armado no pátio do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, uma nova seita emergiu no sábado, através da fala do profeta Luís Inácio Lula da Silva, com seu carisma e gestual sedutor e mobilizador da militância. O excepcional orador, tanto pelo jogo de palavras do seu discurso quanto, principalmente, pela encenação, produziu um grande espetáculo teatral, com movimento no palco, alteração do tom de voz e dos gestos, dramatização que emociona as massas.

Lula abusou da encenação, caminhava, virava para os lados, abaixava-se para enfatizar a afirmação, complementada pelo movimento das mãos e destaque dos dedos. Um artista que domina o palco e mobiliza as emoções e impulsos dos seus liderados, despertando ódio aos que ameaçam com a prisão do grande líder.

A história mundial tem exemplos notáveis de líderes com o carisma e a encenação populista de Lula, que, combinando o espetáculo com o ataque às instituições, provocaram grandes desastres políticos e sociais.

O populismo sempre encontra terreno fértil para se desenvolver em situações de crise social e política, descrédito da sociedade e desmoralização das instituições, precisamente o que experimentamos atualmente no Brasil. Nestas condições, mais valem a retórica e a identificação com o líder carismático que as ideologias, as propostas políticas e as análises e escolhas racionais.

João Domingos: Guerra sem sentido

- O Estado de S.Paulo

O que o País mais precisa é de diálogo para um projeto de salvação nacional

A pressão que o PT e o Palácio do Planalto fazem para que o Supremo Tribunal Federal (STF) reexamine e revogue a jurisprudência que permite a prisão depois da condenação em segunda instância pode levar a uma guerra entre os poderes que não será benéfica para ninguém. Porque armas todo mundo tem. O risco maior é de que, em vez de se ferirem na batalha, venham os contendores ferir o estado democrático de direito e os pilares de sustentação da democracia.

Num momento em que todos parecem desnorteados pelo agravamento da crise política, o que o País mais precisa é de diálogo para um projeto de salvação nacional. Um diálogo que ninguém até agora parece querer iniciar.

Veja-se o exemplo dado pelo deputado Wadih Damous (RJ), do PT. Ex-presidente da OAB do Rio, mestre em Direito Constitucional, Damous tem qualificações e conhecimentos para sugerir conversações que tentem tirar o País da crise. Mas o que ele fez, ontem, foi aumentar a tensão. Num vídeo divulgado nas redes sociais, ele atacou o ministro Luís Roberto Barroso: “Seguramente é o pior ministro do Supremo Tribunal Federal dos últimos tempos. É um mal para a democracia, é um mal para o Direito, é um mal para o Supremo, é um mal para o povo brasileiro”.

Merval Pereira: Uma disputa infindável

- O Globo

A disputa que está em processo dentro do Supremo Tribunal Federal terá mais um capítulo na próxima semana quando o plenário analisará o habeas corpus ao deputado Paulo Maluf. Esse caso tem importância crucial no desenrolar dos acontecimentos em curso porque discute dois pontos que podem interferir em outras ações.

O primeiro é a possibilidade de um ministro do Supremo desautorizar uma decisão de outro ministro, o que é proibido por uma súmula e nunca havia acontecido antes. Foi o que fez o ministro Dias Toffoli ao receber um recurso da defesa do deputado paulista e conceder o habeas corpus que havia sido negado monocraticamente pelo ministro Edson Fachin. Como se trata de matéria controvertida, o próprio Toffoli pediu que o caso fosse levado ao plenário. Ele alega que tomou essa decisão pelo estado de saúde do preso, que se deteriorava a cada dia. Uma gesto humanitário, justifica.

O plenário vai ter que decidir se esta prática passará a ser corrente no Supremo, ou se foi um caso especial que não dá margem a outros. Ou mesmo se Maluf deve voltar para a cadeia. Esta anomalia já está produzindo frutos, pois vários advogados já entraram com ações no STF pedindo para que a decisão de Fachin de negar o habeas corpus a Lula seja revista por outro ministro.

Demétrio Magnoli: Lula não é um preso político

- Folha de S. Paulo

PT e PSOL não se opõem à subordinação da Justiça ao governo, com a condição de que seja o seu governo

11 de julho de 2017. Na entrada do teatro Bolshoi, os espectadores foram informados do cancelamento da estreia do balé Nureyev, substituído de última hora pela peça de repertório “Dom Quixote”. Segundo a justificativa oficial, os ensaios tinham sido insatisfatórios.

No mês seguinte, o premiado diretor da peça, Kirill Serebrennikov, um crítico contumaz de Putin, compareceu a um tribunal de Moscou, que o sentenciou a um ano de prisão por corrupção.

Nureyev não estreou porque o Kremlin vetou a celebração de um gay —e, ainda por cima, emigrado– pela icônica companhia teatral. Serebrennikov foi condenado por razões políticas, não por corrupção. Lula não é um preso político, independentemente do que se pense sobre a sentença de Moro.

Na Espanha, autoridades do antigo governo da Catalunha respondem, em prisão cautelar, a acusações de rebelião. Os partidos nacionalistas catalães e o esquerdista Podemos classificam os encarcerados como presos políticos.

Os processos, porém, não mencionam ideias, mas ações: a convocação, em outubro passado, de concentrações populares para impedir que agentes policiais fechassem os locais de votação do plebiscito separatista, declarado ilegal pelo Tribunal Supremo. Discute-se, nos processos, se o grau de violência usado contra os policiais é suficiente para caracterizar rebelião contra a unidade espanhola.

Todo o contexto é político, mas os réus não são presos políticos. A Espanha distingue-se da Rússia pela independência do Judiciário. O Brasil figura ao lado da Espanha —e, por isso, Lula não é um preso político.

Dora Kramer: Um só coração


- Revista Veja

Amigos e inimigos do PT se unem no fundo do poço das contradições

Cobra-se por toda parte a prisão de “todo mundo” depois do encarceramento de Luiz Inácio da Silva. O raciocínio, como toda simplificação, é linear e aparentemente lógico: rigorosa com Lula, a Justiça deve aplicar igual rigor aos demais suspeitos, investigados, denunciados, processados ou condenados pelo crime que aqui chamarei genericamente de corrupção.

A cobrança faria total sentido se não ignorasse o fato de que o ex-presidente foi o último e o maior peixe da cadeia alimentar petista pego na rede da Operação Lava-Jato. Antes dele, no PT, caíram bagres e tubarões. No MDB e demais denominações dessa área de influência “rodaram” outros tantos.

Ao campo político/eleitoral oposto, onde residem revoadas (o dicionário também registra “bando” como coletivo de pássaros) de tucanos, a ação da Justiça está chegando. Não houve o tempo, demorado, segundo alguns autores, do Lula? Inexorável será o destino dos outros: Aécio Neves, Eduardo Azeredo e que tais, entre os quais se inclui o presidente Michel Temer, cada um dependendo das circunstâncias legais a ser respeitadas, justamente por não estarmos sob a égide do arbítrio.

Juízes não têm a prerrogativa de atropelar ritos nem de aplicar sanções ao modo de justiceiros movidos pelo voluntarismo das boas intenções. Tal seria se Sergio Moro e companhia fizessem e acontecessem dentro e fora das respectivas jurisdições. Os defensores da “democracia” e do “estado de direito” quando se trata de Lula teriam toda a razão de reclamar caso isso acontecesse.

Ocorre que não acontece. A realidade é outra coisa.

Na verdade, Lula está preso e não será candidato a coisa alguma, exceto no universo paralelo da esquerda, onde só acontece o que ela quer.

Ricardo Noblat: Falta combinar com os russos

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- Blog do Noblat | Veja

Sem essa de democracia suspensa

Na Síria, ontem à noite, o ataque americano a bases militares do regime do ditador Bashar Assad foi combinado com os russos, que acabaram testando com sucesso suas armas antimísseis.

Por aqui, falta o PT combinar com outros russos – no caso, os distintos milhões de eleitores que irão às urnas em outubro próximo eleger seus representantes.

Sem a concordância deles, que por ora parece faltar, irá para o espaço o discurso ainda em voga do PT de que eleição sem Lula é fraude, de que a democracia está suspensa, e outras baboseiras.

Hoje, completa uma semana da prisão de Lula em São Bernardo do Campo. Fora a choradeira de líderes do partido, as declarações iradas e inconsequentes dos mais radicais, o que aconteceu?

Nada. O país não pegou fogo como tanto temia o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal. As estradas continuam transitáveis apesar da ameaça do MST de fechá-las.

Vida que segue dura como sempre para aqueles que mais sofreram com o legado do governo Dilma – a brutal recessão que custou milhões de empregos e devolveu à miséria quem dela havia saído.

Se a democracia foi suspensa com a prisão de Lula, o PT deveria recursar-se a disputar eleições. E dedicar toda sua energia a denunciar crime tão estúpido mundo a fora.

Mas, não. Lá fora ainda encontra eco a história do golpe que derrubou Dilma e impediu Lula de ser candidato. A história da democracia suspensa é só para enganar os russos locais.

Quando julho chegar, o PT pedirá o registro da candidatura de Lula a presidente. Sabe que ele será negado, não importa. É só para manter a lenda viva, e Lula poder influir no resultado das eleições.

Até lá – ou mesmo antes – o PT já terá se entendido em torno de um nome próprio para substituir Lula na cédula eleitoral. O de Fernando Haddad, possivelmente. Ciro? Esqueça!

A candidatura de Lula, por impossível, deverá ganhar algum alento com a divulgação amanhã da nova pesquisa de intenção de votos do Datafolha. Natural. Sua prisão é recente. A eleição ainda está longe.

O jogo principal começou, mas nenhum dos jogadores em campo fez nada para se destacar – salvo um lateral direito que levou um tranco da Justiça e foi parar no hospital.

Ana Maria Machado: Seguir em frente

- O Globo

Garantismo de fachada confunde direitos individuais com retórica que ignora direito à justiça que têm as vítimas

Estamos vivendo dias tensos e dramáticos. Todos nós. Os que sempre acreditaram no ex-presidente Lula e continuam acreditando. Os que nunca acreditaram. E os que já acreditaram e votaram nele, mas depois foram aos poucos desconfiando, ressabiados, até que finalmente mudaram de ideia — fosse a partir das revelações do mensalão ou mais tarde, em dolorosa queda na realidade após muito tempo de obstinada negação e teimosa esperança.

Para todos, estes dias têm sido pesados e marcados por um certo desconsolo. Como brasileiros, sabemos que é desolador estarmos passando por esses fatos lamentáveis, parte desta realidade deplorável. Ninguém pode gostar de ter um ex-presidente preso por corrupção, uma ex-presidente impedida por irresponsável, um presidente que provavelmente terá em breve um destino semelhante, um STF hesitante e trapalhão, um Congresso que dá vergonha, e mais uma porção de políticos na fila, esperando a vez de enfrentar a Justiça e manobrando para evitar isso. Como se não bastasse, ainda temos de viver um cotidiano em que se rouba por todo lado, em cada repartição pública, e em que se assalta, agride e mata por todo canto, em cada esquina.

Pior para quem mais sofre: Editorial | O Estado de S. Paulo

A profunda crise econômica que o lulopetismo legou ao País está sendo duplamente mais penosa para a faixa da população que vive em piores condições. O partido afastado do poder com o impeachment de sua presidente dizia que este era o segmento social para o qual se voltavam preferencialmente suas políticas ditas sociais, mas essa se tornou a parcela da sociedade mais prejudicada pelas aventuras e irresponsabilidades do PT. Na crise, as faixas de menor renda perderam proporcionalmente mais do que as demais e, enquanto outros segmentos da população passaram a sentir os efeitos dos primeiros sinais de retomada da economia, os que menos ganham continuaram a ficar mais pobres. No ano passado, embora o ritmo da atividade econômica tenha começado a se intensificar de maneira ainda tímida, o rendimento real de todas as fontes continuou a cair, mas caiu mais para quem ganha menos.

De acordo com o relatório Rendimento de Todas as Fontes 2017, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua, 124,6 milhões de pessoas que tinham algum rendimento em 2017 – salários e fontes como aposentadoria, pensões, programas sociais e aluguéis – recebiam em média R$ 2.112. Esse valor é 0,6% menor do que a renda mensal média de R$ 2.124 recebida em 2016.

A redução da renda média foi maior entre os que ganham menos. Os 43,4 milhões de trabalhadores que representam os 50% mais pobres da população com alguma forma de rendimento tiveram perda média de 2,46%. No ano passado, a renda dessa faixa da população era de R$ 754 (contra R$ 773 em 2016), quase 20% menos do que o salário mínimo.

Miséria brasileira: Editorial | Folha de S. Paulo

Tímida retomada econômica não evita aumento da pobreza extrema e queda da renda do trabalho

O aspecto mais perverso da brutal recessão de 2014-16 —e da lenta recuperação que a sucedeu até agora— é o custo desproporcional imposto aos mais pobres.

Como primeiro impacto, o fechamento de vagas no mercado de trabalho e a queda da renda reverteram uma trajetória de avanços sociais que já completava uma década. Durante o longo ciclo de retração, a taxa de desemprego subiu de 6,5% para 13,7%, ou, dito de outro modo, 5,9 milhões de pessoas perderam seus postos.

A retomada do crescimento econômico, iniciada no ano passado, tem se mostrado tímida, e a alta de apenas 1% do Produto Interno Bruto esteve longe de compensar as perdas acumuladas.

Embora a desocupação tenha caído um pouco, para 12,6% em fevereiro, a qualidade das vagas geradas deixa a desejar.

Não surpreende, pois, que os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do IBGE mostrem um quadro deteriorado.

Nova derrota da impunidade no Supremo: Editorial | O Globo

A negação de habeas corpus para Palocci faz com que ele e Lula passem o fim de semana presos em Curitiba, fato emblemático que leva otimismo ao combate à corrupção

A negação, por maioria de votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal, de habeas corpus ao ex-ministro Antonio Palocci é uma decisão da mais alta Corte do Judiciário que reforça a esperança no êxito do enfrentamento histórico da corrupção infiltrada na máquina do Estado, em que atuam uma bancada multipartidária de políticos, grandes empresas e altos funcionários de estatais.

É emblemático que estejam presos em Curitiba, sede da Lava-Jato, Lula e Palocci, um dos braços direitos do ex-presidente. Este, condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro, e Palocci, encarcerado em prisão provisória desde 2016 e condenado, em junho do ano passado, a 12 anos, 2 meses e 20 dias de reclusão pelos mesmo crimes cometidos por Lula.

Palocci, como o ex-presidente, é personagem de delações da Odebrecht, em cujas planilhas do seu departamento de propinas (“operações estruturadas”) aparece sob o codinome de “Italiano”, enquanto o código de Lula é “Amigo”.

José Márcio Camargo: A luta contra a democracia

- O Estado de S.Paulo

A herança mais danosa do governo Lula é o custo fiscal e parafiscal decorrentes da corrupção

Após a condenação em primeira instância pela Justiça Federal, a rejeição de recurso em segunda instância no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região, a negação de um habeas corpus (HC) no Superior Tribunal de Justiça e, finalmente, a rejeição de outro HC no Supremo Tribunal Federal, o juiz Sérgio Moro emitiu, na quinta-feira, dia 5/4, uma ordem de prisão contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em deferência ao fato de o réu ter ocupado a Presidência da República, foi dado a ele a prerrogativa de se apresentar voluntariamente à Polícia Federal até as 17:00 horas do dia 6/4.

Ao tomar conhecimento da ordem de prisão, o ex-presidente se dirigiu para o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, supostamente com o objetivo de resistir, repetindo um comportamento adotado quando comandou as greves por melhores salários e contra a ditadura no final dos anos 70 do século passado. A partir deste momento, a liderança política construída ao longo de quase 40 anos começou a desmoronar.

Ao longo das aproximadamente 48 horas que se seguiram, foi dado início a uma deliberada estratégia cujo objetivo era transformar uma prisão por crime de corrupção, com condenação em quatro instâncias da Justiça Federal, em uma prisão com conotação política. Enquanto os advogados do ex-presidente negociavam com a Polícia Federal como e onde ele iria se entregar, aumentava a radicalização fora do sindicato, incentivada por políticos e movimentos sociais (provavelmente estimulada pelo próprio ex-presidente), exigindo que ele resistisse à prisão.

Míriam Leitão: Rota sem rumo

- O Globo

A indústria automobilística no Brasil recebeu R$ 28 bilhões em subsídios do governo federal de 2006 a 2018, segundo estudo do economista Gabriel de Barros, da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado. Além de um regime tributário específico, o Inovar-Auto, houve forte redução de IPI, para estimular vendas, e ajuda indireta à instalação de plantas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Mesmo depois de iniciada a crise de penúria dos cofres públicos, os gastos com o setor aumentaram. De 2013 a 2017, o Inovar-Auto representou um custo de R$ 5,2 bilhões para o contribuinte, segundo o IFI. O programa foi condenado pela Organização Mundial do Comércio e não pôde continuar. Neste momento o governo se prepara para renovar a mesma ideia, com outro nome. Será o Rota 2030. Ele permitirá que empresas descontem o custo dos investimentos em pesquisa e tecnologia nos mais diversos impostos. A briga no governo é saber que impostos poderão ser abatidos. A Fazenda quer que seja só no Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. E o Ministério do Desenvolvimento quer que seja em todos os impostos federais para a alegria das montadoras. O custo pode ser de R$ 1,5 bi ao ano. E vai até 2030.

Julianna Sofia: Apagão

- Folha de S. Paulo

Risco de privatização da Eletrobras naufragar aumenta com nomeação de Moreira

A mensagem do novo ministro de Minas e Energia, Moreira Franco, não poderia ser mais lúcida e objetiva. “Se não capitalizarmos a Eletrobras, o apagão é inevitável”, disse à Folha em seu primeiro dia à frente da pasta. Sustenta o óbvio: a empresa perdeu capacidade de investir e haverá aumento da demanda por energia caso a retomada do crescimento econômico se materialize com algum vigor.

A insânia que se alojou no Palácio do Planalto com o cerco policial ao presidente e seus amigos não comporta o óbvio. A própria nomeação de Moreira Franco para o ministério e a consequente saída de técnicos que gestaram a privatização da Eletrobras são o suprassumo disso. O ministro ganhou foro especial mais sólido enquanto o governo perdeu voltas na corrida para vender a estatal.

Na Bolsa, as ações da empresa se desvalorizaram bem como analistas de mercado começaram a apostar que a operação não sai neste ano. No Congresso, a tramitação do projeto da desestatização se arrasta na comissão especial com a dispersão da base governista, e o mimo de Michel Temer a Moreira agastou os ânimos, travando ainda mais a articulação.

Bolsonaro é denunciado por racismo

A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, denunciou ao STF o deputado federal Jair Bolsonaro (PSLRJ) por prática de racismo. Se condenado, ele pode pegar até 3 anos de prisão.

Dodge denuncia Bolsonaro ao Supremo por racismo

Em palestra na Hebraica, no Rio, deputado disse que moradores de quilombo ‘nem para procriar servem mais’

Daniel Gullino | O Globo

BRASÍLIA - A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, apresentou ontem uma denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra o deputado federal e pré-candidato à Presidência da República Jair Bolsonaro (PSL-RJ) por racismo. Um dos filhos de Jair, o também deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), foi denunciado, em outro processo, por ameaçar uma jornalista.

A acusação contra Jair Bolsonaro foi baseada em uma palestra que ele deu no Clube Hebraica do Rio de Janeiro, em abril do ano passado. Para Dodge, o deputado demonstrou preconceito contra quilombolas, indígenas, refugiados, mulheres e LGBTs.

Uma das frases questionadas é a que ele diz que visitou um quilombo e que os moradores de lá “não fazem nada” e “nem para procriador servem mais”. A procuradora-geral considerou essa declaração “inaceitável”.

Pela mesma declaração, o deputado já foi condenado, pela Justiça Federal do Rio de Janeiro, a pagar R$ 50 mil como indenização.

Dodge classificou a conduta de Bolsonaro como “severamente reprovável” e afirmou que ele “atingiu valores e princípios fundamentais da República Federativa do Brasil”. A procuradora-geral pede que Jair Bolsonaro pague multa de R$ 400 mil, por danos morais. Caso condenado, ele pode pegar de um a três anos de prisão.

Já Eduardo Bolsonaro é acusado de ter afirmado que iria “acabar com a vida” da jornalista Patrícia Lélis, por meio de mensagens enviadas pelo aplicativo Telegram.

“Se você falar mais alguma coisa, eu acabo com a sua vida”, escreveu ele. Quando ela questionou se aquilo era uma ameaça, ele respondeu: “Entenda como quiser” . Depois, acrescentou: “Mais uma palavra e eu vou pessoalmente atrás de você”.

Deputado petista diz que "tem que fechar o Supremo Tribunal Federal"

Em vídeo divulgado nas redes sociais, Wadih Damous critica o ministro do STF Luís Roberto Barroso

Marianna Holanda | O Estado de S.Paulo

O deputado federal Wadih Damous (PT-RJ) afirmou, em vídeo publicado nas redes sociais nesta sexta-feira, 13, que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem que ser fechar. O parlamentar também defende que a Corte deve ser apenas constitucional e que, se não for “enquadrada”, vai “enterrar de vez a democracia”.

Intitulado “Barroso é o pior ministro do STF”, o vídeo critica o ministro declaração recente de Luís Roberto Barroso, que votou contra o habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, condenado e preso na Lava Jato. Nesta semana, Barroso disse ainda já estão separando “o joio do trigo” e que “o problema é a quantidade de gente que ainda prefere o joio”.

A declaração, chamada de “idiotice” pelo deputado, foi interpretada pelo parlamentar como de que seria “papel do Supremo corrigir as escolhas do povo”.

“Temos que redesenhar o poder Judiciário e o papel do STF. Tem que fechar o Supremo Tribunal Federal. Nós temos que criar uma Corte constitucional, de guarda exclusiva da Constituição, dos seus membros detentores de mandato. Temos que evitar que gente como o Roberto Barroso tenha o poder de ditar os rumos do processo eleitoral, da escolha popular, de ditar os rumos da democracia brasileira”, afirmou o deputado petista.

STF julgará foro privilegiado em maio

Votação será retomada dia 2, e há maioria formada a favor de diminuir abrangência da norma

Carolina Brígido | O Globo

BRASÍLIA A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, marcou para o dia 2 de maio o julgamento do processo que deve restringir o foro privilegiado. A Corte começou a julgar o processo no ano passado. Em novembro, quando já havia maioria para mudar a regra, o ministro Dias Toffoli pediu vista, adiando a conclusão do caso.

Até agora, sete dos 11 ministros defenderam que fiquem no STF apenas processos sobre crimes cometidos por parlamentares no exercício do mandato, por fatos diretamente relacionados à função pública. A intenção é diminuir a quantidade de processos da Corte, dando mais celeridade às investigações remanescentes.

ALEXANDRE MORAES DIVERGE
De acordo com a proposta, ao fim do mandato, uma investigação aberta no STF seria transferida para a primeira instância do Judiciário. Isso só não aconteceria se a ação penal já estiver totalmente instruída — ou seja, concluídas as fases de produção de provas e tomada de depoimentos —, pronta para ser julgada. A medida serviria para evitar adiar a conclusão do processo.

Ainda segundo a proposta, os crimes praticados antes da pessoa ser eleita para o Congresso Nacional não seriam processados no STF, mas na primeira instância. E os crimes comuns praticados por parlamentares também ficariam fora do STF. Se, por exemplo, um senador fosse acusado de violência doméstica, o processo também seria conduzido na primeira instância, ainda que o ato tenha sido praticado ao longo do mandato.

Atualmente, qualquer crime cometido por deputados federais e senadores, antes ou durante o mandato, é julgado apenas no STF. Quando o político se elege para esses cargos, eventuais processos já abertos contra ele em outras instâncias são transferidos para a Corte. De acordo com a proposta que será votada no STF, isso não aconteceria mais.

Maria Creuza - Você abusou

Vinicius de Moraes: Carta aos puros

Ó vós, homens sem sol, que vos dizeis os Puros
E em cujos olhos queima um lento fogo frio
Vós de nervos de nylon e de músculos duros
Capazes de não rir durante anos a fio.

Ó vós, homens sem sal, em cujos corpos tensos
Corre um sangue incolor, da cor alva dos lírios
Vós que almejais na carne o estigma dos martírios
E desejais ser fuzilados sem o lenço.

Ó vós, homens iluminados a néon
Seres extraordinariamente rarefeitos
Vós que vos bem-amais e vos julgais perfeitos
E vos ciliciais à ideia do que é bom.

Ó vós, a quem os bons amam chamar de os Puros
E vos julgais os portadores da verdade
Quando nada mais sois, à luz da realidade,
Que os súcubos dos sentimentos mais escuros.

Ó vós que só viveis nos vórtices da morte
E vos enclausurais no instinto que vos ceva
Vós que vedes na luz o antônimo da treva
E acreditais que o amor é o túmulo do forte.

Ó vós que pedis pouco à vida que dá muito
E erigis a esperança em bandeira aguerrida
Sem saber que a esperança é um simples dom da vida
E tanto mais porque é um dom público e gratuito.

Ó vós que vos negais à escuridão dos bares
Onde o homem que ama oculta o seu segredo
Vós que viveis a mastigar os maxilares
E temeis a mulher e a noite, e dormis cedo.

Ó vós, os curiais; ó vós, os ressentidos
Que tudo equacionais em termos de conflito
E não sabeis pedir sem ter recurso ao grito
E não sabeis vencer se não houver vencidos.

Ó vós que vos comprais com a esmola feita aos pobres
Que vos dão Deus de graça em troca de alguns restos
E maiusculizais os sentimentos nobres
E gostais de dizer que sois homens honestos.

Ó vós, falsos Catões, chichisbéus de mulheres
Que só articulais para emitir conceitos
E pensais que o credor tem todos os direitos
E o pobre devedor tem todos os deveres.

Ó vós que desprezais a mulher e o poeta
Em nome de vossa vã sabedoria
Vós que tudo comeis mas viveis de dieta
E achais que o bem do alheio é a melhor iguaria.

Ó vós, homens da sigla; ó vós, homens da cifra
Falsos chimangos, calabares, sinecuros
Tende cuidado porque a Esfinge vos decifra...
E eis que é chegada a vez dos verdadeiros puros.