sexta-feira, 5 de julho de 2019

Opinião do dia: Roberto Freire*

Hoje o Congresso [Nacional] é uma instituição que nos ajuda muito a imaginar que iremos sobreviver do ponto de vista das liberdades e de um governo tão desmantelado como esse, e sem compromisso com a democracia como tem se revelado Bolsonaro e seus seguidores. A conjuntura política está muito vinculada a essa compreensão e papel do Congresso Nacional.


*Roberto Freire, presidente nacional do Cidadania, na abertura da reunião da Executiva Nacional do partido, terça-feira (3), em Brasília.

*José de Souza Martins: Julho tempo de revolução

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Em 1842, 1924 e 1932, São Paulo teve confrontos decisivos no sétimo mês, em que personagens adotaram outros nomes e outras caras, mas mantiveram elos da política brasileira 

Vivemos nestes dias algumas expressões do que tem sido a história dos elos ocultos da continuidade nas descontinuidades da política brasileira. Com outros nomes e outras caras, as mesmas personagens, de trajes rotos pelo tempo.

Três decisivas revoluções ocorreram no mês de julho, em São Paulo. Uma, a Revolução Liberal de 1842. Dois combates a marcaram, com sete mortos, no que é hoje a entrada da Cidade Universitária da USP, no Butantã. Foi um confronto entre as tropas do barão de Caxias, depois duque e patrono do Exército, e os cavalarianos vindos de Sorocaba e de Itu, comandados pelo futuro brigadeiro Rafael Tobias de Aguiar, mais tarde patrono da Polícia Militar de São Paulo, e pelo padre Diogo Antônio Feijó, ex-regente do Império.

A revolução era para depor o presidente da província, marquês de Monte Alegre, baiano do Partido Conservador. Partido que estabelecera um cerco político em torno do jovem imperador adolescente, dom Pedro II. Caxias representava a unidade nacional, a ordem e o conservadorismo nela implícito. Nesse cerco, teimava invisível a nostalgia do vínculo com Portugal.

No lado oposto, em 1842, o Partido Liberal, com gente relativamente progressista como o padre Feijó, que está sepultado na catedral de São Paulo. Suas tropas acamparam no morro do Jaguaré, onde hoje se situa a favela. Desse liberalismo de província nascia o oligarquismo brasileiro. Liberal na forma, fisiológico no conteúdo.

Outra revolução é a de 5 de julho de 1924, um sábado, a cidade de São Paulo ocupada de madrugada por tropas insurgentes do Exército, do movimento que veio a ser o tenentismo. O comando provisório era do capitão Joaquim Távora e do major Miguel Costa, da Força Pública, à espera do general Isidoro Dias Lopes, cujo descabido atraso trouxe os combates para dentro da cidade.

Aquela não era uma revolução paulista. No inquérito policial-militar, soldados de outras regiões do país disseram ter vindo combater greves operárias na capital paulista, de intuito separatista. Era falso.

*César Felício: Sinais trocados

- Valor Econômico

Maia quer reforma dura; Bolsonaro mais concessões

Quem representa o governo na negociação da reforma da Previdência? A pergunta é legítima. Os acontecimentos dos últimos dois dias sugerem que o governo federal é uma coisa e o presidente Jair Bolsonaro é outra. O presidente é o coordenador mais importante do grupo de pressão que tenta arrancar concessões para a classe policial. Está no Palácio do Planalto, mas parece não se misturar com a equipe que faz o meio de campo entre o Ministério da Economia e o Congresso. Da maneira como comentou no começo da tarde de ontem o secretário especial da Previdência, Rogério Marinho, ao falar com jornalistas sobre a aprovação do texto-base da reforma da Previdência na Comissão Especial, o presidente parece estar em uma outra dimensão. "O presidente tem nos ajudado e tem o direito de ter sua opinião", afirmou, segundo registrou o Valor PRO. É uma frase que precisa ser lida mais de uma vez, uma frase simbólica. O presidente tem ajudado. Ele tem o direito de ter sua opinião, que não necessariamente coincide com a da equipe econômica. Está no direito dele.

Os privilégios aos policiais foram derrubados ontem na Comissão Especial, com a derrota do destaque apresentado pelo PSD, mas uma perda de substância da reforma ainda poderá vir, nos próximos dias. O presidente passou a Rodrigo Maia o recado de que quer concessões para a classe policial. É bom lembrar que o presidente da Câmara tem comentado a aliados, conforme registrou ontem o Valor PRO, que conta com o apoio de 340 parlamentares para a reforma se concessões não forem feitas a categorias de forma isolada. E uma concessão de forma isolada é exatamente o que pediu Bolsonaro. Em outras palavras, enquanto o presidente da Câmara trabalha pela aprovação da reforma mais dura, o presidente da República quer afrouxá-la. Uma situação inédita, que levou a uma nova altercação entre Maia e o líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo, segundo relatos.

Retirado oficialmente da coordenação política do governo, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, apareceu na Câmara, logo após a votação, para garantir que "o governo venceu todas", que será possível votar a reforma em plenário antes do recesso e que, a partir de segunda-feira, a negociação será retomada para se tentar uma emenda aglutinativa a favor de regras mais brandas para policiais federais e rodoviários. Ou seja, chamou para si a conversa. Irá contar com a ajuda do novo coordenador, aquele que foi chamado para tirar poder de Onyx, o ministro da Secretaria de Governo Luiz Eduardo Ramos, que já pediu para não ser chamado de general.

É confuso, e como em toda confusão no governo Bolsonaro, há método na loucura. O presidente terá saldo favorável, independentemente de a reforma ser aprovada com ou sem esta concessão na próxima semana.

*Armando Castelar Pinheiro: O presidencialismo de coalizão fracassou

- Valor Econômico

Uma das principais causas de o país não se desenvolver foi o sistema político que prevaleceu por quase 40 anos

Entre 1985, ano da redemocratização, e 2018 nosso PIB per capita cresceu à taxa média de 0,9% ao ano (a.a.). Nesse mesmo período, observou-se uma alta média de 3,4% a.a. no PIB per capita dos países em desenvolvimento, de 1,6% a.a. no dos países ricos e de 1,2% a.a. no da América Latina, excluindo o Brasil. Caminhamos para deixar de ser um país de renda média e voltar a ser um país pobre.

Por que o Brasil fracassou de forma tão retumbante em se desenvolver durante um período tão longo? Fracasso que, diga-se de passagem, não damos indicação de estar em vias de superar.

Para a quase totalidade dos economistas, com a possível exceção dos de inclinação antiliberal, a resposta é relativamente simples: porque não fizemos o ajuste fiscal e não adotamos as reformas necessárias para promover o investimento e o aumento da produtividade. Não faltam livros, estudos, relatórios de organizações multilaterais etc. elencando essas reformas e detalhando porque e como implementá-las.

Por isso mesmo acho que essa não é a resposta certa. Ou, talvez, a pergunta anterior não tenha sido a correta. Melhor teria sido perguntar por que fomos incapazes de utilizar a mesma "tecnologia de desenvolvimento" adotada por tantos outros países? Por que insistimos em adotar políticas que já se mostraram incapazes de gerar desenvolvimento, quando há alternativas comprovadamente mais bem sucedidas e estas são de conhecimento público?

*Claudia Safatle: Após a Nova Previdência, outras reformas virão

- Valor Econômico

Se aprovada a PEC, déficit cairá de 6% para 5% do PIB

A reforma da Previdência, tal como está sendo encaminhada no Congresso, é suficiente para reduzir pouco mais de 1% do PIB ao ano o déficit da Previdência, em média, nos próximos dez anos e de forma concentrada nos últimos cinco anos. Hoje o rombo é de 6% do PIB ao ano e crescente. Esse é um buraco que continuará existindo e será próximo a 5% do PIB ao ano, o que ainda é muito alto, segundo o economista Paulo Tafner, especialista em Previdência Social.

"Está claro que essa reforma já era. Vamos ter que fazer outras", avaliou Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central e sócio da Gávea Investimentos. Ambos são autores de uma ampla proposta de reforma da Previdência.

A Nova Previdência também não esgota as medidas necessárias para interromper a trajetória de crescimento da dívida como proporção do PIB e terá que ser seguida de outras, a começar de uma "revolução" na área do funcionalismo, adiantou Arminio.

Os dois concordam que a proposta votada ontem na Comissão Especial da Câmara tem um lado positivo: embora ainda não seja possível calcular o quanto a Nova Previdência vai impactar o coeficiente de Gini, a reforma, tal como está, reduz as transferências de renda para os mais ricos. Ela traz, portanto, uma diminuição das desigualdades que não pode ser desprezada.

Eliane Cantanhêde: Bolsonaro, o sindicalista

- O Estado de S.Paulo

Presidente demitiu general por ‘agir como sindicalista’, mas lidera pressão de policiais

O presidente Jair Bolsonaro, que jogou a reforma da Previdência no Congresso e foi para o conforto da arquibancada, entrou em campo aos 45 minutos do segundo tempo, não para ajudar, mas para atrapalhar. Em vez de desestimular pressões corporativas, o presidente liderou a pressão de policiais.

Depois de acusar o general Juarez Cunha de “agir como sindicalista” e demiti-lo dos Correios, Bolsonaro age como sindicalista e insufla as reivindicações dos policiais, que querem condições especiais e equiparação aos miliares na Previdência.

A profissão de policial é, de fato, desgastante e perigosa num país conflagrado como o Brasil. E o que falar de médicos e enfermeiros de hospitais públicos? De lixeiros que carregam peso madrugadas inteiras, descendo e subindo em caminhões? E de trabalhadores em minas e outros locais insalubres?

Por que os policiais são diferentes? Simples. Eles têm apoio do presidente, em quem sempre votaram no Rio, foram leais em 2018 e estão encastelados no seu partido, o PSL. Então, todos têm de dar sua cota de sacrifício, menos os amigões e a base de Bolsonaro.

Ao enviar ao Congresso uma proposta diferenciada para as Forças Armadas, o governo pôde pelo menos alegar que são condições muito específicas e a defasagem salarial vem de muitos anos. Na reta final da comissão, Bolsonaro ainda tentou equiparar as situações, alegando que os policiais “nunca tiveram privilégios”. Não é bem assim. Que outras categorias se aposentam aos 50 anos, com salário integral?

Os policiais federais, rodoviários federais e legislativos estavam, e estão, no papel deles de pressionar, brigar por condições especiais e bater em todas as portas. Quem vai à residência oficial do deputado Rodrigo Maia se depara, já na enorme mesa da sala de jantar, com várias pastas, separadas por temas. A maioria delas tem o carimbo de categorias de policiais. Mas Maia, o presidente da comissão, Marcelo Ramos, e o relator, Samuel Moreira, pensam no macro: se cedessem para uma categoria, seriam alvo fácil de todas. A reforma viraria pó.

Marco Aurélio Nogueira*: A educação como valor permanente

- O Estado de S.Paulo

Professor Jorge Nagle morreu amargurado com a situação educacional brasileira

Consta que Bertolt Brecht, numa de suas magistrais tiradas, escreveu: “Não basta ter sido bom quando se deixa o mundo, é preciso deixar um mundo melhor”.

Não são muitas as pessoas que mereceriam o elogio implícito na frase. Fazer o mundo melhor é difícil, requer talento, determinação e resiliência, passa pela habilidade de reunir colaboradores e pela sabedoria de modular o tempo, para que as mudanças amadureçam e seus frutos sejam conhecidos e valorizados.

O professor Jorge Nagle, que faleceu no último dia 21 de junho, aos 90 anos de idade, foi uma dessas pessoas. Deixou marcas fortes por onde passou, graças ao estilo agregador e à coragem de enfrentar circunstâncias adversas.

Nagle foi um apaixonado estudioso da educação. Com a publicação de sua tese de livre-docência (1966), Educação e sociedade na Primeira República, tornou-se uma referência na história da educação paulista.

A escola pública foi seu foco permanente, na versão republicana que tanta dificuldade teve (e tem) de se fixar no Brasil. Sua utopia era a existência de uma escola para todos, livre de imposições ideológicas ou religiosas e de influências políticas espúrias: uma escola que interagisse com a sociedade e contasse com um sistema administrativo eficiente, mas que em nenhum momento minimizasse a dimensão técnico-pedagógica, intelectual.

Graduado em Pedagogia pela USP em 1955, Nagle foi docente e diretor da Faculdade de Ciências e Letras (FCL) do câmpus de Araraquara da Unesp. Foi de lá que partiu sua longa carreira. Tornou-se professor titular e atuou na linha de frente das discussões sobre a escola e a educação, o que o fez receber do governo federal, em 1993, a medalha da Ordem Nacional do Mérito Educativo, condecoração criada para premiar personalidades com serviços excepcionais prestados à educação brasileira.

Nagle foi um líder. Em agosto de 1984 chegou à Reitoria da Unesp. O momento era difícil. A reabertura democrática avançava, mas a universidade ainda vivia sob o comando de interventores nomeados pelo governo estadual. O clima interno era de conflito. O governador Franco Montoro queria mudar a situação e pressionou o Conselho Universitário da Unesp para que o ajudasse a fazer isso. Dos professores titulares que integravam o órgão, nem todos dispunham do respaldo acadêmico indispensável e da vocação administrativa exigida pelo cargo. Nagle se diferenciava e foi indicado pelo governador para, na condição de reitor pro tempore, acalmar a universidade e preparar o conselho para a escolha de um dirigente sintonizado com os novos tempos. Meses depois, por indicação do conselho, o governador o nomeou.

Elena Landau*: MP 579, nunca mais

- O Estado de S.Paulo

Mudanças são importantes. Cabe à sociedade exigir que as leis sejam cumpridas

Depois de 16 anos tramitando, foi promulgada a nova Lei das Agências Reguladoras. Oportunidade para um recomeço. Surgiram em meados dos anos 90 para acompanhar o programa de desestatização. Com a privatização da energia elétrica e das telecomunicações foram criadas a Aneel e Anatel.

Esses serviços eram prestados por estatais, muitas vezes na forma de monopólio, sem preocupação com fiscalização, regulação ou competição. As agências são autarquias com autonomia técnica, operacional e decisória. Suas decisões devem preservar os compromissos definidos nos contratos de concessão, assinados por ocasião da privatização. Não devem atuar nem como órgão de defesa do consumidor, nem como implementador de interesses do governo, devendo evitar a sua captura pelas empresas reguladas.

Depois de um início promissor, sua independência passou a ser questionada. Lula logo que assumiu reclamou de não ter sido consultado a respeito de reajustes tarifários para energia homologados pela Aneel. Bolsonaro reagiu ao método de escolha de diretores. O mundo político nunca se conformou com a ideia de autonomia. Hoje, as agências sofrem críticas até de libertários, que enxergam a regulação como uma forma de intervenção do Estado. Esquecem que até mesmo o austríaco Hayek defende a necessidade de arcabouços legais em casos de falhas de mercado.

O grande desafio para o regulador é desenhar as regras sem afetar a competição onde ela é possível e necessária. Nesse sentido, uma das mais importantes exigências trazidas pela nova lei é a Análise de Impacto Regulatório (AIR), com consultas e audiências públicas.

Merval Pereira: Um país tropical

- O Globo

O presidente deve ter se dado conta de que não tem mais a possibilidade de dizer que acima das instituições está o povo

O convite do presidente Bolsonaro para que o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, vá com ele assistir à final da Copa América entre Brasil e Peru, domingo no Maracanã, é um habitual gesto de reconciliação brasileiríssimo que o presidente adota quase sempre que cruza a linha que delimita os poderes do Executivo sobre o Legislativo.

Um gesto cândido que Bolsonaro já adotou em outras ocasiões, quando quer prestigiar um ministro – caso de Sérgio Moro – ou, como no caso de agora, quer se retratar de algum excesso verbal. Ou de um relacionamento precário com o Congresso.

O presidente deve ter se dado conta de que não tem mais a possibilidade de dizer que acima das instituições está o povo, apenas a quem deve “lealdade absoluta”. Esse é um discurso que valeu para ele como candidato a deputado federal, pois cada deputado representa certo grupo de eleitores, ou de corporações.

Como Bolsonaro, que representava as forças militares e as ligadas à segurança pública. Mas não é aceitável para um presidente da República. Além de estar inscrito na Constituição, o respeito aos representantes do povo é um símbolo da democracia representativa.

Menosprezando deputados e senadores, além de um gesto politicamente inábil, Bolsonaro está quebrando um juramento que fez ao tomar posse na Presidência da República. Mesmo que não tenha sido esse seu objetivo imediato.

Míriam Leitão: Reforma avança revelando o Brasil

- O Globo

Rodrigo Maia, Samuel Moreira e Marcelo Ramos têm conduzido a reforma. Bolsonaro e PT perderam na defesa dos privilégios à polícia

A reforma da Previdência fez a etapa final da travessia das comissões da Câmara revelando a cara do Brasil. Foi emblemática a quinta-feira. O presidente Jair Bolsonaro, no segundo dia de luta corporativista aberta, disse que errou ao incluir os policiais na reforma, pediu socorro à bancada ruralista para corrigir a falha e assim abriu espaço para concessões ao ruralismo, que sabe cobrar contas. Foi ouvido pela esquerda, que em peso votou no destaque que criava ainda mais privilégios para os policiais. O destaque acabou derrotado e ficou valendo o texto do relator Samuel Moreira (PSDB-SP). Mas a corporação mostrou força e promete voltar.

Ela reúne as polícias federal, rodoviária, legislativa e agentes da Abin. Nenhum desses grupos tem a mesma mortalidade dos policiais militares, mas tanto a PM quanto a Polícia Civil são dos estados e não entraram pela decisão de excluir os outros entes federativos. Pelo texto da reforma, eles se aposentam com 55 anos e o último salário. Eles querem parar ainda mais cedo, comprovar menos tempo na função e ter uma regra de transição muito mais suave do que a dos outros brasileiros. Esse específico destaque, o 40, era um dos vários a favor dos policiais, mas acabou derrotado. Ficaram a favor o PT, PSOL e PCdoB e o PDT que, ao votar, citou Bolsonaro. O PSL os aplaudiu, mas teve que cumprir o acordo com o centrão e o PSDB, que não queriam votar algo que gerasse uma reação em cadeia em favor de outras categorias. Ao fim, ouviu os gritos da oposição: “PSL traiu a polícia do Brasil.”

Luiz Carlos Azedo: Reforma avança na Câmara

-Nas entrelinhas / Correio Braziliense

“A reforma da Previdência modifica as regras de aposentadoria para o setor privado e servidores da União. Valerá para quem ainda não trabalha. Os que já estão trabalhando terão regras de transição”

A Comissão Especial da Câmara aprovou ontem, por 36 votos a 13, o texto-base da reforma da Previdência, de autoria do relator Samuel Moreira (PSDB-SP), que analisou e fez alguns ajustes na proposta original do governo. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ainda acredita que possa aprovar a reforma em plenário antes do recesso. Dezessete destaques foram apresentados à comissão, mas 16 foram rejeitados, inclusive dois que contavam com o apoio do presidente Jair Bolsonaro, para flexibilizar as regras propostas para aposentadorias de policiais. O único aceito excluiu policiais militares do texto.

A reforma da Previdência é a principal proposta da equipe econômica para resolver o problema da crise fiscal. Ontem, o ministro da Economia, Paulo Guedes, em encontro com empresários em São Paulo, era só elogios ao Congresso por causa da aprovação do texto-base. Guedes não só aposta numa economia de R$ 1 trilhão, com aprovação da reforma, como voltou a falar que não perdeu a perspectiva de implantar um plano de capitalização.

A reforma da Previdência modifica as regras de aposentadoria para funcionários do setor privado e servidores públicos da União. Valerá para quem ainda não começou a trabalhar. Os que já estão trabalhando e contribuindo para o INSS ou o setor público terão regras de transição. Servidores estaduais e municipais foram excluídos da reforma; governadores e prefeitos terão que fazer reformas específicas nos seus estados.

A idade mínima de aposentadoria passou a ser 65 anos para homens e 62 anos para mulheres do setor público e do privado; no caso dos professores, 60 anos para homens e 57 anos para mulheres. O tempo de contribuição no setor privado passou a ser de 20 anos para homens e 15 anos para mulheres; no setor público, 25 anos para homens e mulheres. Essas regras valerão para quem ainda não começou a trabalhar.

Os que já trabalham e contribuem para o INSS ou o setor público terão regras de transição. A idade mínima subirá gradativamente: começa em 61 anos (homens) e 56 anos (mulheres) e terá acréscimo de seis meses por ano. Em 2021, por exemplo, será de 62 (homens) e 57 (mulheres).

Rubens Valente: Moro vazou para Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Presidente disse que ministro lhe deu cópia de investigação da PF, mas ela está em segredo

Que o presidente da República tenha revelado isso e nenhuma reação provocado é um sinal preocupante de debilidade das instituições. Em entrevista coletiva no Japão, no dia 28, Jair Bolsonaro disse que o ministro Sergio Moro lhe deu acesso privilegiado a dados do inquérito sobre os laranjas do PSL: "Ele [Moro] mandou a cópia do que foi investigado pela Polícia Federal pra mim. Mandei um assessor meu ler porque eu não tive tempo de ler".

Ocorre que a investigação tramita sob segredo na 26ª Zona Eleitoral de Minas Gerais. Surgem aqui dúvidas éticas e legais. Bolsonaro foi além. Revelou que "determinou" a Moro, que por sua vez iria "determinar" à PF, que "investigue todos os partidos" com problemas semelhantes. "Tem que valer para todo mundo, não ficar fazendo pressão em cima do PSL para tentar me atingir."

As declarações devem assustar policiais das diversas carreiras da PF —alguns dos quais hoje em cargos de direção, reconheça-se— que nos últimos 30 anos trabalharam para que o órgão evoluísse para uma instituição "de Estado, não de governo", como cansaram de repetir. Uma PF que não esteja à mercê dos rancores do presidente e do ministro de plantão. Um órgão que investigue fatos e não pessoas.

Reinaldo Azevedo: Greenwald é ou não um investigado?

- Folha de S. Paulo

Não fala claro quem, como a PF, investe na ambiguidade e na confusão

Glenn Greenwald, do site The Intercept Brasil, está ou não sob investigação? E, se está, é preciso saber a razão. É impossível obter do aparelho do Estado que cuida do assunto uma resposta objetiva.

Sergio Moro, ministro da Justiça, foi indagado a respeito na audiência de que participou na Câmara. Disse que a questão deveria ser encaminhada à Polícia Federal. E foi o que fiz.

A reportagem do programa "O É da Coisa", que ancoro na BandNews FM, encaminhou, a meu pedido, à assessoria da PF estas duas perguntas: “1) O jornalista Glenn Greenwald é oficialmente investigado?; 2) a Polícia Federal pediu o auxílio do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) nessa investigação?”

E recebeu a seguinte resposta: “A Polícia Federal não confirma tal solicitação e não se manifesta sobre eventuais investigações em andamento”.

Prossegue a PF: “Segundo nota encaminhada pelo Coaf e divulgada pela imprensa, ‘o Coaf não comenta casos específicos em função do sigilo fiscal e bancário a que está submetido. Além disso, não é função do Coaf realizar investigações; o que faz é encaminhar às autoridades competentes de investigação —geralmente Ministério Público e/ou Polícia Federal— informações sobre movimentações financeiras atípicas. O Coaf também esclarece que não tem conhecimento de nenhum pedido por parte da Polícia Federal’”.

Gosto de linguagem, gosto de palavras, e estudá-las é até a minha primeira inclinação. Não ignoro os vocábulos crus da truculência, que me causam repúdio até físico, mas lhes reconheço um esboço ao menos de virtude: a clareza.

Vejam o caso do presidente Jair Bolsonaro e filharada: sinceros, convenham, eles são... O “Mito” não foi eleito porque “manso de espírito”. Sua Bíblia nunca reconheceu o “Evangelho Segundo São Mateus”.

Vinicius Torres Freire: Euforia com a reforma, povo bestificado

- Folha de S. Paulo

Lideranças na Câmara dizem que votam Previdência até dia 17, se Bolsonaro não atrapalhar

Se o governo e o PSL não atrapalharem, a reforma da Previdência vai ser posta em votação a partir da quarta-feira que vem, dia 10 e votada até dia 17, dizem lideranças da Câmara. É uma mistura de clima de euforia com “ou vai ou racha” e Terça Gorda de Carnaval (“é hoje só”).

Pelo menos até agora, a média do país assiste bestificada à tramitação de uma reforma emperrada faz quase 20 anos. Protestos maiores vêm de policiais e, bem menos, de professores; sindicatos, movimentos sociais e oposição em geral parecem todos atropelados.

No mercado financeiro, as taxas de juros rolam a ladeira para mínimas históricas, empurradas principalmente pela situação da finança mundial, mas agora também pela chegada próxima da reforma ao plenário da Câmara.

O ministro Paulo Guedes (Economia), falando para a turma em São Paulo, chegou a antecipar os próximos grandes projetos do governo na economia. Em evento de uma instituição financeira, disse que virão uma reforma tributária, que concorreria de modo “positivo” com aquela que tramita na Câmara, e o que chamou de “pacto federativo”, mas parece outra coisa. Isto é, Guedes disse que vai mesmo propor o fim da obrigatoriedade de certas despesas do governo, como aquelas em educação e saúde, entre as mais importantes.

Não parece ser boa ideia, por vários motivos. Se de fato passar a reforma previdenciária, será um milagre que passe também uma reforma dos impostos que mexe com interesses de montes de empresas e acaba com boa parte da autonomia tributária dos estados. É ambição irrealista misturar nesse angu o caroço da desvinculação ampla, geral e irrestrita.

Dora Kramer: O vencedor

- Revista Veja

O êxito do Congresso pode dar bons frutos eleitorais a Bolsonaro

Reza um velho dito que Congresso forte corresponde a presidente da República fraco. Nele parece basear-se Jair Bolsonaro quando reclama do excesso de ativismo do Parlamento, que estaria por essa via subtraindo-lhe poderes. Pode ser que assim seja, mas pode ser que não seja assim que venha a ser mais adiante na cena eleitoral, de olho na qual atuam partidos e políticos.

Tudo depende da perspectiva. Olhando hoje, o panorama mostra-se bastante desfavorável ao presidente: Legislativo atuando em faixa própria, postulantes à sua sucessão mexendo-se desde já e todos pertencentes ao campo que o elegeu em 2018, popularidade em queda inédita para um governante que normalmente ainda estaria vivenciando os tradicionais seis meses de boa vontade do país, clima de conflitos, em sua maioria produzidos no Palácio do Planalto, economia empacada, desemprego alto, desacertos na equipe, o surgimento de um problema a cada dia a ponto de obscurecer o ótimo momento do acordo Mercosul-União Europeia, e por aí vão as agruras de Bolsonaro na primeira metade do primeiro ano de mandato.

Olhando adiante, porém, é possível projetar um cenário diferente daquele em que transitam as piores perspectivas, que no momento parecem as mais plausíveis. Obviamente, uma virada da chave do infortúnio depende de a economia deslanchar. Mas tal melhora está sujeita, sobretudo, ao andamento dos trabalhos no ambiente político.

Conversa com o Sr. Democracia

O cientista político Steven Levitsky diz que o aumento da impopularidade de Bolsonaro preserva as instituições

Thiago Prado / Revista Época

“Sempre que presidentes com instintos autoritários são eleitos, a democracia está em risco.
Mas a inépcia de Bolsonaro e o crescimento de sua impopularidade ajudam a proteger a democracia. Ele acaba sendo menos perigoso com a aprovação atual”, avaliou Levitsky

Steven Levitsky analisa Bolsonaro No segundo semestre do ano passado, o livro Como as democracias morrem, de Steven Levitsky, professor de ciência política na Universidade Harvard, tornou-se um best-seller e a principal referência acadêmica usada por aqueles que temiam os efeitos da vitória de Jair Bolsonaro na eleição presidencial. Ao longo de 272 páginas, Levitsky e seu colega Daniel Ziblatt defendem a tese de que os riscos para os sistemas políticos atuais não são mais os tradicionais golpes de Estado com uso de armas e fechamento do Congresso, mas sim os ataques sutis e sistemáticos contra as instituições — mecanismo que estaria sendo usado nos últimos anos por governos como o de Donald Trump, nos Estados Unidos, Viktor Órban, na Hungria, e Recep Tayyip Erdogan, na Turquia.

Em outubro do ano passado, às vésperas do segundo turno das eleições, Levitsky tratou de incorporar Bolsonaro a seu seleto grupo de autocratas do século XXI. Em um artigo para o jornal Folha de escreveu que o então candidato do PSL era uma séria ameaça à democracia brasileira e que, caso eleito, poderia prejudicar as instituições assim como fez Hugo Chávez na Venezuela. Bolsonaro levou a melhor contra Fernando Haddad (PT) e acaba de completar seis meses de governo. O professor exagerou ou de fato há riscos pairando sobre Brasília?

Durante uma hora de conversa por Skype, Levitsky teve o cuidado de mostrar que vem acompanhando o turbilhão de notícias que brotam do Palácio do Planalto desde janeiro. Está se preparando para uma mesa na Bienal do Livro no Rio de Janeiro, em setembro. Ele sabe da ascendência dos militares no Executivo federal (“Não acho bom. A participação na política não é a função primordial das Forças Armadas em uma democracia, mas sim a defesa das fronteiras e da segurança nacional.”) Sabe também das suspeitas envolvendo Fabrício Queiroz e de sua proximidade com policiais militares ligados a milícias (“Não sei se Bolsonaro tem envolvimento, mas pessoas de seu entorno certamente sim.”) Levitsky só se agitou quando perguntei se suas análises não acabam sendo mais condescendentes com a esquerda do que com a direita. “Isso é ridículo, reflexo de como vocês estão polarizados. Pergunte ao pessoal do PT o que acham de mim. Agora só porque critico Bolsonaro sou comunista?”, rebateu, lembrando, por exemplo, que discorda da narrativa petista de que o impeachment de 2016 foi um golpe.

Ricardo Noblat: É pelo país, e não por ninguém!

- Blog do Noblat / Veja

Sobre impressões digitais

Se um juiz orienta uma das partes em um processo a proceder assim ou assado e antecipa decisões que tomará em breve, isso caracteriza prova de que beneficiou um lado em detrimento do outro? Seria a impressão digital que faltava para comprovar um crime?

Se um procurador da República só aceita firmar um acordo de delação premiada depois que o preso conta o que ele gostaria de ouvir, isso prova que ele prevaricou ou que o delator mentiu para livrar-se de uma pena maior? Seria a impressão digital que faltava?
No segundo semestre de 2005, às voltas com o escândalo do mensalão do PT, Lula amargou no final de um dia o que mais tarde o levou a pensar em renunciar à presidência da República. Um assessor do PT no Ceará foi preso com maços de dólares na cueca.

Ainda faltam dólares no escândalo das mensagens trocadas pelo ex-juiz Sérgio Moro com procuradores da Lava Jato durante a instrução do processo que condenou Lula a 12 anos de cadeia. Recentemente, a pena foi reduzida para oito anos. É possível que jamais apareçam.

Mas impressões digitais não faltam. E disso dão conta as revelações que pingam a conta gotas desde que o site The Intercept Brasil recebeu de um informante volumoso e explosivo material que levanta a suspeita de que Moro e procuradores agiram de má fé, sim.

As revelações mais recentes podem ser lidas na edição de hoje da VEJA. Muitas são de arrepiar os mais céticos. Se tudo o que se conhece até agora, e se tudo o que está por vir simplesmente derem em nada, é de crer-se então que a justiça entrou em colapso.

A essa altura, num país sério, tribunais superiores deveriam estar a debater a hipótese de anular o julgamento de Lula, mandando-o para casa. O passo seguinte, ordenar que seja refeito o processo que o condenou sem prejuízo para os demais processos a que responde.

Não é por Lula, nem por Moro, nem por nenhum dos personagens dessa triste e vergonhosa história. É pelo país no qual vivemos.

Novos diálogos revelam que Moro orientava ilegalmente ações da Lava Jato

Mensagens inéditas analisadas pela parceria entre VEJA e o site The Intercept Brasil mostram que ele cometeu, sim, irregularidades enquanto atuava como juiz

Por Glenn Greenwald, Edoardo Ghirotto, Fernando Molica, Leandro Resende e Roberta Paduan

As manifestações do último dia 30 tiveram como principal objetivo a defesa de Sergio Moro. Em Brasília, um enorme boneco de Super-Homem com o seu rosto foi inflado na frente do Congresso. Símbolo da Lava-Jato, que representa um marco na história da luta anticorrupção no país, o ex-juiz vem sofrendo sérios arranhões na imagem desde que os diálogos entre ele e membros da força-tarefa vieram a público revelando bastidores da operação. As conversas ocorridas no ambiente de um sistema de comunicação privada (o Telegram) e divulgadas pelo site The Intercept Brasil mostraram que, no papel de magistrado, Moro deixou de lado a imparcialidade e atuou ao lado da acusação. As revelações enfraqueceram a imagem de correção absoluta do atual ministro de Jair Bolsonaro e podem até anular sentenças.

Só uma pequena parte do material havia sido divulgada até agora — e ela foi suficiente para causar uma enorme polêmica. Em parceria com o site, VEJA realizou o mais completo mergulho já feito nesse conteúdo. Foram analisadas pela reportagem 649 551 mensagens. Palavra por palavra, as comunicações examinadas pela equipe são verdadeiras e a apuração mostra que o caso é ainda mais grave. Moro cometeu, sim, irregularidades. Fora dos autos (e dentro do Telegram), o atual ministro pediu à acusação que incluísse provas nos processos que chegariam depois às suas mãos, mandou acelerar ou retardar operações e fez pressão para que determinadas delações não andassem. Além disso, revelam os diálogos, comportou-se como chefe do Ministério Público Federal, posição incompatível com a neutralidade exigida de um magistrado. Na privacidade dos chats, Moro revisou peças dos procuradores e até dava bronca neles. “O juiz deve aplicar a lei porque na terra quem manda é a lei. A justiça só existe no céu”, diz Eros Grau, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, falando em tese sobre o papel de um magistrado. “Quando o juiz perde a imparcialidade, deixa de ser juiz.”

Não seria um escândalo se um magistrado atuasse nas sombras alertando um advogado de que uma prova importante para a defesa de seu cliente havia ficado de fora dos autos? Pois isso aconteceu na Lava-Jato, só que em favor da acusação. Uma conversa de 28 de abril de 2016 mostra que Moro orientou os procuradores a tornar mais robusta uma peça. No diálogo, Deltan Dalla¬gnol, chefe da força-tarefa em Curitiba, avisa à procuradora Laura Tessler que Moro o havia alertado sobre a falta de uma informação na denúncia de um réu — Zwi Skornicki, representante da Keppel Fels, estaleiro que tinha contratos com a Petrobras para a construção de plataformas de petróleo, e um dos principais operadores de propina no esquema de corrupção da Petrobras. Skornicki tornou-se delator na Lava--Jato e confessou que pagou propinas a vários funcionários da estatal, entre eles Eduardo Musa, mencionado por Dalla¬gnol na conversa. “Laura no caso do Zwi, Moro disse que tem um depósito em favor do Musa e se for por lapso que não foi incluído ele disse que vai receber amanhã e da tempo. Só é bom avisar ele”, diz. (VEJA manteve os diálogos originais com eventuais erros de digitação e ortografia.) “Ih, vou ver”, responde a procuradora. No dia seguinte, o MPF incluiu um comprovante de depósito de 80 000 dólares feito por Skornicki a Musa. Moro aceita a denúncia minutos depois do aditamento e, na sua decisão, menciona o documento que havia pedido. Ou seja: ele claramente ajudou um dos lados do processo a fortalecer sua posição.

Avanço de gastos obrigatórios expulsa os investimentos: Editorial / Valor Econômico

Com a adoção do teto de gastos, a redução ao longo do tempo do déficit da previdência - que perderá velocidade, mas não deixará de crescer com a reforma -, é o problema mais urgente, mas não o único. Com as despesas congeladas em termos reais, os gastos obrigatórios estão, como sempre, reduzindo os demais, em um ajuste de baixa qualidade, com a aniquilação do investimento público e cortes de custeio da manutenção de infraestrutura. O aperto fiscal deve prosseguir, ou até mesmo se intensificar no curto prazo.

A próxima revisão orçamentária pode aumentar o contingenciamento de verbas, pois a margem para o cumprimento da meta de déficit primário de R$ 139 bilhões, o sexto rombo anual consecutivo, está se estreitando. Pela segunda revisão orçamentária bimestral, a execução pressupunha déficit de R$ 138,8 bilhões, dentro da meta, com margem potencial de R$ 33 bilhões para despesas. Mas a promessa de crescimento maior não se realizou e, confeccionado com a perspectiva de expansão de 2,5%, depois 1,6%, o orçamento terá de se adequar de novo ao figurino de um PIB bem mais magro. Nesta segunda revisão a previsão de receita líquida para o ano encolheu 3,2% e novas revisões para baixo ocorrerão, pois as atividades econômicas não reagirão até o fim do exercício fiscal.

O drama fiscal foi mais uma vez expresso nos cálculos da ONG Contas Abertas, feitas a pedido do Valor, que comparam os gastos obrigatórios e discricionários no primeiro trimestre de 2014 com os do mesmo período de 2019. Na trajetória atual, para manter o teto de gastos, será inevitável desvincular o orçamento, se a União quiser preservar alguma capacidade de investimento, que tende a zero se tudo continuar como está, e impedir que a infraestrutura dos serviços públicos se deteriore em um grau ainda maior do que o que já ocorre.

Demonstração de força das corporações: Editorial / O Globo

Início da votação é positivo para a reforma, mas lobby dos servidores tem o reforço até do presidente

As corporações em geral e as dos servidores públicos em particular, em que estão representantes de segmentos privilegiados na sociedade brasileira, agem há algum tempo contra a reforma na Previdência, por meio de seus representantes no Congresso e no próprio Executivo.

Para que não reste dúvida, o presidente da República, Jair Bolsonaro, pegou o telefone na quarta-feira para defender junto a congressistas reivindicações de policiais federais e rodoviários também federais. O lobby do presidente é em defesa da reivindicação das categorias para, por exemplo, não cumprirem o limite de idade de 55 anos para a aposentadoria, muito baixo considerando a expectativa de vida do brasileiro adulto.

O pedido não entrou no relatório do deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), cujo texto básico foi aprovado ontem na Comissão Especial da reforma, por 36 votos a 13. Também foi tentada, sem êxito, a inclusão de uma emenda ainda mais generosa para esses policiais. Isso não significa muito, porque haveria entendimentos para as benesses entrarem na reforma, na votação em plenário.

O deputado Bolsonaro passou 28 anos na Câmara representando esses grupos. Sempre foi contra mudanças na Previdência. Evitou ao máximo o assunto na campanha, mas, eleito, não havia como escapar do tema, o mais estrutural dos obstáculos à volta do crescimento e, consequentemente, do emprego.

O preço da paralisação: Editorial / O Estado de S. Paulo

Na última terça-feira, dia 2, a Câmara dos Deputados instalou uma comissão para acompanhar a execução de obras inacabadas. O mais recente levantamento do Tribunal de Contas da União (TCU), assumidamente incompleto devido à carência de dados consolidados, revela um cenário exasperador. O Tribunal estima que, dos mais de 38 mil contratos de obras públicas, cerca de 14 mil (38%) estão paralisados.

Os valores destes contratos totalizam R$ 144 bilhões. De R$ 11 bilhões a R$ 12 bilhões já foram executados, de modo que seriam necessários R$ 132 bilhões para os concluir – sem contar gastos com danos resultantes do abandono. Além dos valores investidos, há prejuízos indiretos de difícil mensuração, como os entraves à movimentação da economia local e a privação de serviços à população, como atendimento hospitalar ou esgotamento sanitário. Um estudo citado pelo TCU constatou a paralisação de 3 mil obras de creches (75 mil vagas), resultando em um impacto na renda anual das famílias desamparadas da ordem de R$ 3 bilhões.

O pacto que importa: Editorial / Folha de S. Paulo

Bolsonaro sepulta, como se previa, ideia de acordo entre os Poderes por reformas

No dia 27 de maio, o presidente Jair Bolsonaro apresentou ao país uma proposta que, embora se mostrasse pouco realista, parecia ao menos conter um impulso positivo. Tratava-se de firmar um pacto entre os Poderes com vistas a assegurar o encaminhamento e a aprovação de um leque de reformas necessárias para o futuro do país.

Passado mais de um mês, na quarta (3) o mandatário cedeu às evidências de que o acordo, como foi aventado, não seria viável —e decidiu enterrá-lo. Em evento que marcou a troca de chefia no Comando Militar do Sudeste, Bolsonaro afirmou que “não precisamos de pacto assinado no papel”.

O importante, frisou, é que se votem matérias e proposições “que fujam ao populismo”.

Em maio, quando foi formulada a ideia do entendimento formal entre os Poderes, o país passava por mais um dos momentos de acirramento de tensões que vêm pontuando a dinâmica do atual governo.

Bolsonaro havia divulgado um rumoroso texto de autor não identificado acerca da impossibilidade de governar o país sem ceder a conchavos. Na semana seguinte, foi a vez de o ministro da Economia, Paulo Guedes, ameaçar deixar o governo, caso a reforma da Previdência se tornasse insatisfatória —com o que o presidente anuiu.

Por fim, no dia 26 daquele mês, bolsonaristas saíram às ruas em vaga defesa da Presidência, com protestos localizados contra parlamentares, o presidente da Câmara e membros do Judiciário.

Sobre princípios e valores: Editorial / Revista Veja

Ao contrário daqueles que fomentam o ódio ou se aproveitam dele, os compromissos de VEJA não são com pessoas ou partidos

Nesta edição que chega a você, leitor, VEJA publica uma reportagem em parceria com o site The Intercept Brasil. O texto utiliza como matéria--prima o conjunto de diálogos repassados por uma fonte anônima ao jornalista Glenn Greenwald, editor do Intercept, e revela de forma cabal como Sergio Moro exorbitava de suas funções de juiz, comandando as ações dos procuradores na Lava-Jato.

Durante duas semanas, oito jornalistas, cinco de VEJA e três do site, selecionaram os diálogos e checaram — em processos judiciais e com entrevistas — as informações que constavam neles. Pela leitura do material, fica evidente que as ordens do então juiz eram cumpridas à risca pelo Ministério Público e que ele se comportava como parte da equipe de investigação, uma espécie de técnico do time — não como um magistrado imparcial. Alguns dos exemplos de irregularidades: Moro apontava abertamente aos procuradores as delações de sua preferência, alertava sobre a falta de provas nas denúncias e chegava a receber material dos procuradores para embasar suas decisões.

VEJA sempre foi — e continua — a favor da Lava-Jato. A luta contra a corrupção tem sido um dos pilares da nossa história. Mas os diálogos que publicamos nesta edição violam o devido processo legal, pedra fundamental do estado de direito — que, por sinal, é mais frágil do que se presume, ainda mais na nossa jovem democracia. Jamais seremos condescendentes quando as fronteiras legais forem rompidas (mesmo no combate ao crime). Caso contrário, também seríamos a favor de esquadrões da morte e justiceiros. Há quem aplauda e defenda esse tipo de comportamento, reação até compreensível no cidadão comum, cansado de tantos desvios éticos. Mas como veículo de mídia responsável não podemos apoiar posturas como essa.

Um Estatuto da Democracia e da Cidadania

Caio Augusto Silva dos Santos e Ricardo Toledo Santos Filho* / O Estado de S. Paulo

Dos ventos modernizadores da Revolução de 30 surgiu uma entidade sui generis porque, apesar de criada por decreto do Governo Provisório, iniciou sua trajetória e consolidou-se como instituição autônoma, verdadeiro ente independente a serviço da sociedade civil e sem subordinação a qualquer governo. Nessas quase nove décadas, a Ordem dos Advogados do Brasil tem muito a comemorar, e hoje, 04 de julho, celebra em especial os 25 anos de promulgação do Estatuto da Advocacia, um código deontológico peculiar porque também instituído por lei federal (8.906, de 1994), de modo que não se trata de mera normatização interna corporis.

A importância essencial do advogado no Estado Democrático de Direito (e mais ainda na ausência dele) já estava consagrada na Constituição promulgada seis anos antes. Com direito a uma seção específica, a Advocacia mereceu deferência contemplada no artigo 133:

“O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei”. O embrião dessa iniciativa nascera anos antes, na Associação dos Advogados de São Paulo, foi encampada pelo Conselho Federal da OAB, mas sofreu intensa resistência na Constituinte.

Na época da promulgação da Constituição Federal, parlamentares de orientação diversa, como Amaral Neto e Roberto Campos, opunham-se ao exclusivismo constitucional da Advocacia e argumentavam: “Por que não a Medicina, a Arquitetura, a Engenharia?”, quando foram redarguidos por José Roberto Batochio: “Porque sem engenheiros não teremos estradas, sem arquitetos não teremos o esplendor destas formas, sem os dentistas não teremos o sorriso brejeiro lindo das nossas moças, mas sem todos eles nós podemos ter democracia. Agora, sem advogados não poderemos ter Estado de Direito e muito menos democracia”.

A partir da inserção do artigo 133 da Constituição Federal, que erigiu a Advocacia ao topo da pirâmide kelseniana, o passo seguinte foi cuidar da legislação de regência da Advocacia, a qual se materializou em 1994, por empenho de Batochio, então presidente do Conselho Federal da OAB, com o surgimento do Estatuto da Advocacia – sancionado integralmente pelo presidente Itamar Franco, embora a Associação dos Magistrados Brasileiros tenha sugerido nada menos de 12 vetos. A promulgação da Lei Federal nº 8.906 exigiu acirrado enfrentamento aos opositores da iniciativa, em especial do poderoso setor financeiro e de alguns setores da imprensa, os quais, unidos, tentarem impedir a promulgação da Lei. Sem sucesso, porém.

Inserido, assim, no ordenamento jurídico brasileiro, o Estatuto se impôs como um conjunto de normas acerca dos direitos e deveres do advogado, reiterando a diretriz constitucional de reconhecer a indispensabilidade do exercício da Advocacia para a administração da justiça, com destaque ao postulado supremo de que no “seu ministério privado, o advogado presta serviço público e exerce função social.” Regula a seguir a organização e os objetivos da Ordem dos Advogados do Brasil e até dos estagiários, das caixas de assistência, das eleições internas da entidade, das prerrogativas profissionais para o exercício destemido da profissão, da ética e dos seus processos disciplinares.
A ética e suas implicações no cotidiano da Advocacia ocupam enorme parte do Estatuto, assim como a questão do foro íntimo para aceitar ou recusar causas que estejam conforme ou desconforme com o ideário pessoal ou jurídico. No Estatuto abebera-se a vetusta lição de que o advogado não se confunde com o cliente, nem que sua missão primordial é buscar a absolvição do constituinte a qualquer custo, mas garantir a observância da lei – como, por sinal, apontou Rui Barbosa no brilhante e eloquente texto de 1911: O dever do advogado.
Em tempos de recorrentes fricções com agentes públicos, cabe sempre rememorar o preceito vertido no inédito artigo 6º da Lei Federal: “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos”.

Essa lembrança é de vital relevância, na medida em que as funções da Ordem dos Advogados do Brasil se acham descritas no artigo 44 do Estatuto e ultrapassam os interesses restritos da Advocacia para abarcar a proteção ao cidadão: “A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade: I – defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas”

Assim, além de patrocinar questões vinculadas ao quotidiano da Advocacia, compete à Ordem dos Advogados do Brasil, por exigência normativa federal, a defesa veemente do Estado Democrático de Direito e da própria Cidadania. Dessa forma, inegavelmente, o exercício intimorato, destemido e independente de nosso múnus público em benefício de terceiro que sobre nós deposita a derradeira esperança na obtenção de seu direito material significa, em última análise, resguardar os interesses supremos da Cidadania, mas também, e ao mesmo tempo, à Instituição se impõe a missão de zelar pela Democracia, de defender os poderes constituídos e de primar pela observância dos postulados da República. Muitos avanços foram obtidos neste quarto de século, mas ainda há muito a fazer. Que tenha vida longa o Estatuto que não é apenas da Advocacia, mas, também, da Democracia e da Cidadania.

*Caio Augusto Silva dos Santos, presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo
*Ricardo Toledo Santos Filho, vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção de São Paulo

Vinicius de Moraes: Soneto de separação

De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.

De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.

De repente, não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente.

Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.

Joyce Cândido: Tem nada não