terça-feira, 24 de março de 2009

FRASES DO DIA

“Agora mais do que nunca, certamente mais do que nos séculos passados, estamos voltados para servir o homem como tal e não só os católicos, para defender, antes de mais nada e por toda parte, os direitos da pessoa humana e não só os da Igreja Católica”.

(João XXIII, maio de 1963)


“Lula está ‘cupinizando’ o Estado brasileiro”

(Ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), ao acusar o governo federal de permitir que “cupins” corroam a política brasileira, associando a ação do inseto à partidarização da máquina pública federal)

O imaginário oculto e 2010

José de Souza Martins*
DEU EM O ESTADO DE S.PAULO / ALIÁS
Domingo, 22/3/2009

No Brasil, uma ebulição silenciosa impulsiona as eleições muito antes de haver candidatos registrados

A proximidade de eleições presidenciais, ao longo da nossa história republicana, tem muitas vezes se anunciado pela mobilização silenciosa e interior de um imaginário que decide antes de as decisões propriamente políticas serem tomadas. Antes mesmo da existência de candidatos oficiais, o que afeta a pauta das interpretações e decisões do eleitorado. E afeta, muitas vezes, até mesmo o modo como o desenrolar do governo é, depois, examinado e avaliado pelos eleitores. Uma imensa condescendência em relação a governos como o de Getúlio, de JK e de Lula representa a eficácia de um imaginário cúmplice que anestesia a consciência política do povo e abre créditos ilimitados de governança aos eleitos. Algumas vezes, essa aura extraeleitoral decorreu de rupturas na rotina do poder, como na proclamação da República, na Revolução de 1930 e na eleição indireta de Tancredo Neves. Collor foi impedido porque já estava condenado de antemão, eleito pelo anômalo voto dos que eram contra Lula e o PT e não necessariamente a favor dele.

É como se o povo que vota tivesse um oculto estoque de sentimentos de fundo propriamente político, um silencioso imaginário regulador do comportamento, a que recorre à medida que o processo eleitoral se aproxima ou o mandato começa a ser cumprido. Deposto pelo Exército em 1945, no mesmo dia Getúlio Vargas já estava reeleito por esse difuso sentimento popular para voltar ao poder em 1951.

Os que queriam o retorno da democracia, em 1985, foram derrotados no Congresso Nacional na recusa das eleições diretas para a Presidência, mas, sentimentalmente, já haviam eleito Tancredo Neves, tanto na campanha das diretas como no que se viu nos sentimentos expressos em seu funeral. Um morto governou o governo de Sarney.

A República foi proclamada pelo Exército menos contra a monarquia do que contra o republicanismo civil do Partido Republicano fundado em São Paulo, em 1873. Em grande parte com base no sentimento generalizado de que o imperador estava no fim e governara em boa parte apoiado no seu carisma pessoal. Não só o do herdeiro da monarquia, mas também o do menino duplamente órfão, deixado pelo pai aos cuidados da nação, que a serviço dela crescera e envelhecera.

A deposição e a morte do imperador foi para muitos a morte do antigo regime. O tumultuado acolhimento da República, que nascia como ditadura, se deu apoiado no difuso sentimento de que a modernização política, e os passos na direção da igualdade que ela anunciava, representava um avanço da civilização. O jornal A Província de S. Paulo mudou de nome para O Estado de S. Paulo e anunciou em destaque o novo regime como episódio brasileiro da Revolução Francesa. Isso também estava na cabeça dos militares do Exército. Pouco depois, na Guerra de Canudos, chamavam-se entre si de cidadãos, designação seguida da respectiva patente militar, como ocorrera no início do regime inaugurado com a Queda da Bastilha. Um civil imaginário governava os militares.

As inovações políticas do Brasil republicano parecem mais governadas pelas rupturas inesperadas ou pelas inevitáveis do que por decisões efetivamente políticas e democráticas.

Fora disso é a prevalência do repetitivo e das permanências. É sob as quietas cinzas que as brasas do imaginário político mantêm acesa a trama do poder e demarcam diretrizes e orientações inconscientes, que se traduzirão em votos ou em movimentos sociais e políticos. As inovações já estão inventadas no que permanece e dura.

O golpe militar de 1964 reorientou esse imaginário e suas orientações nos arrastam até hoje, bloqueando-nos à ousadia. À medida que declinava o getulismo, o País se dividia entre capitalismo e socialismo. Mas a pregação socialista se perdia na fragmentação e diversificação das esquerdas, fragmentação que se apossou do debate, deixando o futuro do País de lado, anulando o tema essencial da política. A pregação capitalista não foi melhor. Também ela se rompeu no dilema em boa parte falso entre imperialismo e nacionalismo. Os 20 anos de ditadura serviram para que as esquerdas se fragmentassem ainda mais e ainda mais se iludissem quanto às possibilidades de um socialismo descolado das determinações históricas da sociedade brasileira. O discurso postiço se arrasta ainda em várias bocas, de vários grupos, que dão continuidade a um cenário em que a fala está separada do pensamento e o pensamento está separado da práxis.

Com o golpe de 64, a temporalidade brasileira foi cindida. De um lado o tempo do progresso material se firmou e ganhou decisiva importância por meio da expansão das fronteiras internas e da urbanização, sobretudo na Amazônia. Reduziu o tempo da política ao tempo do progresso espacial e material e mutilou nosso capitalismo, tornando-o territorial e rentista. De outro lado, o tempo da revolução social, o tempo histórico propriamente dito, ficou confinado em cenários de misticismo, desenraizamento e fragmentação das convicções políticas.

Esse tempo residual foi assumido pelo PT, que conseguiu reaglutiná-lo numa concepção milenarista e messiânica de futuro. Nesse clima, Lula foi eleito e reeleito. Mas o milenarismo de Lula e do PT propuseram o governo petista como um governo do fim dos tempos, do fim da História, o último governo, como o de Carlos V, o último imperador. O governo Lula realizaria todas as possibilidades da História, não restando história alguma a ser feita e, portanto, anulando o sentido da política e dos partidos.

A próxima eleição presidencial será pautada por esse aniquilamento da História e do futuro, pelo primado pós-moderno de um presente eterno, em conflito com a esperança do imaginário brasileiro. A candidatura Dilma nasce cauterizada por essa anulação. Resta saber se o PSDB tem alguma compreensão disso e quanto Serra tem condições de situar-se e propor-se como o homem que restituirá a historicidade à política brasileira e poderá repropor a esperança como o principal item da agenda política do País.

*Professor titular de sociologia da Faculdade de Filosofia da USP e autor, entre outros títulos, de A Aparição do Demônio na Fábrica (Editora 34)

PPS LANÇA TESES PARA SEU CONGRESSO


Lula e FHC trocam farpas pela imprensa

DEU NO JORNAL DO BRASIL

Presidente volta a demonstrar irritação com críticas de tucano

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que não pensa em voltar para a política após a conclusão de seu mandato no Palácio do Planalto, em dezembro de 2010. Em entrevista à uma rádio local, o presidente fez, também, duras críticas indiretas ao tucano e ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.

– Eu não acho que um presidente da República tenha que imediatamente voltar para a política. Eu acho que ele tem que ficar fora, tem que fazer uma reflexão. Eu não tenho vontade de ser deputado, não tenho vontade de ser senador. Eu não estou pensando em voltar para a política, não – disse Lula.

O presidente - que viu a aprovação ao seu governo cair de 70% para 65% - foi a Pernambuco para inaugurar uma fábrica da Sadia em Vitória de Santo Antão. – Eu acho que agora, ao sair, eu tenho que ensinar como é que se comporta um ex-presidente da República: nunca dar palpite sobre o futuro presidente. Nós temos que entender que se o povo elegeu, o povo tem que deixar ele trabalhar – disse.

Cargos

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, por sua vez, disse ontem, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, que as influências políticas em nomeações de cargos eram menores em seu governo do que no de Luiz Inácio Lula da Silva.

– Tinha muito menos. Em certas áreas zero – afirmou FHC. – Eu era contra e tentava limitar.

Questionado se havia nomeações políticas em Furnas, disse que sim. Mas afirmou que houve regressão. Segundo FHC, uma nova espécie de privatização do Estado é a ocupação de cargos por sindicalistas. O ex-presidente disse ainda que as prévias no PSDB podem ser realizadas, a menos que um dos pré-candidatos tucanos, os governadores José Serra (SP) e Aécio Neves (MG), desista. – Acho preferível se houver convergência – afirmou. (Folhapress)

ELEIÇÕES: CAFÉ COM LEITE E AÇUCAR


Fotografias regionais

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A última rodada da pesquisa Datafolha para as eleições estaduais de 2010 traz notícias frescas. Revela, por exemplo, a verdadeira motivação do governador José Serra para promover a paz com o ex-governador Geraldo Alckmin, com quem mantinha até janeiro um atrito fidalgo, porém sincero.

Com 41% das intenções de voto, Alckmin é o predileto do eleitor paulista para governador do Estado, seguido de longe pelo segundo colocado - seja Paulo Maluf (13%) ou Marta Suplicy (13% ) -, posicionado a léguas de vantagem do preferido pelo governador, Aloysio Nunes Ferreira (1%).

Isso depois de não ter conseguido chegar ao segundo turno na eleição de prefeito, há cinco meses.

Serra deve ter examinado o cenário e resolvido não brigar com os fatos, posta que está a discrepância entre sua preferência e a opinião do eleitorado.

Isso não ocorre só em São Paulo, devido ao maior distanciamento entre a sociedade e o aparelho de Estado. Em vários outros a pesquisa mostra que, não raro, uma coisa é o desejo dos partidos, outra bem diferente é a vontade do eleitor.

Em Minas Gerais, o governador Aécio Neves e o então prefeito de Belo Horizonte, Fernando Pimentel, já tinham levado um susto quando não conseguiram eleger Márcio Lacerda em primeiro turno na capital, a despeito de a união dos dois ter aprovação superior a 80%.

Na pesquisa Datafolha o presumido candidato de Aécio em 2010, Antonio Anastasia, aparece com 5% das preferências. O líder é o ministro das Comunicações, Hélio Costa, do PMDB, com 41%. Quer dizer, pelo visto, em Minas também não é a posição do governador o fator preponderante para a definição das condições de competitividade do candidato.

Tanto isso é verdade que a pesquisa para presidente da República, quando desdobrada por Estados, desfaz o mito de que o mineiro pegará em armas contra São Paulo caso o PSDB escolha Serra e não Aécio como seu candidato.

O governador é disparado o predileto, com 67% das preferências. Mas, quando a pesquisa apresenta, no lugar dele, o nome do governador de São Paulo, Serra tem 40% das intenções.

O eleitor paulista, porém, não é tão generoso na recíproca: confere 52% para Serra e 14% quando a hipótese de candidato a presidente é Aécio.

Os governadores candidatos à reeleição aparecem mais bem posicionados. Ainda assim, só Jacques Wagner, da Bahia, ganharia hoje disparado com 36% contra 19% do segundo colocado, o senador do DEM e ex-governador Paulo Souto.

José Roberto Arruda (DEM), do Distrito Federal, tem Joaquim Roriz (PMDB) nos calcanhares. Roriz praticamente acabou de renunciar ao mandato por causa de denúncias de corrupção. No entanto, aparece com 35% nas pesquisas, pouco menos que os 41% de Arruda.

Em Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) está na frente (40%), mas é seguido de perto pelo adversário Jarbas Vasconcelos (34%), cujo partido, PMDB, recentemente pensou em afastar do comando regional alegando insuficiência de desempenho. Na verdade, era uma tentativa de retaliação pelas acusações de corrupção no PMDB.

O Rio Grande do Sul é o caso mais dramático de governador em dissonância com o eleitor. Yeda Crusius (PSDB) se fosse disputar a reeleição hoje não chegaria a dois dígitos nas preferências (9%).

O Rio de Janeiro talvez seja o caso mais emblemático de dificuldade. Sérgio Cabral Filho elegeu prefeito Eduardo Paes numa disputa duríssima, leva Lula quando quer ao Rio e tem linha aberta em matéria de verbas federais.

Cabral aparece com 26% na pesquisa e três adversários (Marcelo Crivella, Fernando Gabeira e Wagner Montes) que somam 42%.

Um ano e meio é antecedência suficiente para mudar qualquer cenário. Mas a fotografia de antes da partida, de todo modo, mede a distância entre o valor que o poder acha que tem e a importância que o eleitor lhe dá.

Trem fantasma

Opinião de quem conhece o meio: crise de verdade eclodirá se o poder moralizador atravessar a rua e, do edifício do Senado, for dar com os costados na gráfica, nas secretarias especiais de informática (Prodasen) e integração à distância dos poderes legislativos (Interlegis).

Da onça

O ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia fez chegar a vários gabinetes o seguinte lembrete: perdeu o cargo, mas não perdeu os arquivos de computador.

É guerra

Depois de afirmar que se fosse aberto o baú do uso indevido das passagens aéreas das cotas dos senadores o constrangimento seria geral, o primeiro-secretário, Heráclito Fortes, achou por bem recuar.

Pelo sim, pelo não, no fim da semana passada funcionários prepararam as listas com os nomes de beneficiários de passagens e as têm separadas ano a ano, no aguardo da ordem para divulgação.

PPS lança prévias na internet para 2010

Yan Boechat, de Brasília
DEU NO VALOR ECONÔMICO


Enquanto o PSDB não decide como, quando e se de fato terá prévias para escolher quem será seu candidato à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um de seus principais aliados, o PPS, tomou a dianteira e vai consultar seus filiados para decidir quais dos dois pré-candidatos tucanos vai apoiar. Os integrantes do PPS poderão votar no governador de São Paulo, José Serra, no governador de Minas, Aécio Neves, ou em um terceiro candidato indefinido no plebiscito que será realizado pela internet. As prévias internas do partido presidido pelo ex-senador pernambucano Roberto Freire começam amanhã e terminam no dia 25 de abril.

O anuncio oficial das prévias internas será feito hoje, durante o lançamento do XVI Congresso Nacional do PPS, em que será eleita a nova direção do partido para o biênio 2009 e 2011. A decisão de fazer a consulta entre os integrantes da legenda foi tomada neste final de semana pela direção executiva do PPS e tem como objetivo definir uma posição do partido a respeito de um tema que divide os partidos de oposição.

Até a ofensiva do governador de Minas Gerais em forçar o PSDB a realizar uma prévia para definir o candidato do partido, em maioria, integrantes do PPS estavam decididos a apoiar José Serra. Com o avanço de Aécio Neves nas disputas internas no PSDB, a direção do partido reviu sua decisão informal de apoiar o governador de São Paulo e começou a abrir mais espaço para o governador mineiro. Na semana passada a executiva do PPS se reuniu com Aécio, assim como havia feito com Serra, para discutir as eleições de 2010.

Internamente a aposta é de que José Serra seja o escolhido pelos integrantes da sigla para disputar a sucessão de Lula. Apesar do efeito prático quase nulo, a direção do partido entende que o PPS precisa se posicionar em um disputa que vai definir os rumos da oposição na corrida eleitoral, caminho oposto ao adotado pelo DEM, o aliado mais importante do PSDB.

Depois de um apoio explícito e oficial ao governador de São Paulo, o Democratas decidiu esperar a definição do PSDB em prévias para só depois adotar posição entre um ou outro. O presidente do partido, o deputado federal Rodrigo Maia (DEM-RJ), chegou a afirmar que havia se equivocado ao definir o apoio do partido a Serra, e foi a Minas, levar apoio ao governador Aécio Neves.

'Congresso não representa mais nada'

Flávio Freire
DEU EM O GLOBO

FH critica parlamentares, "leniência" do governo e fisiologismo

SÃO PAULO. Em meio às denúncias envolvendo congressistas, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem, em São Paulo, que o atual sistema de representação política do país está "bambo" e, por isso, "não representa mais nada".

- Isso é visível, e provoca um efeito de desmoralização extraordinário. Como ter democracia se não há respeito pelo Congresso? E como ter respeito ao Congresso se todo dia a imprensa noticia coisas que não são corretas no Congresso?

Ao mesmo tempo, Fernando Henrique, num discurso de pouco mais de uma hora, responsabilizou a "leniência" do governo federal com o problema, muitas vezes envolvendo denúncias de corrupção.

- Por trás do Congresso está a forma de representação, e até certo ponto está o interesse do Estado de também deixar a coisa muito leniente, indulgente para amarrar o Congresso - atacou ele, na cerimônia de instalação do Conselho Político da Associação Comercial de São Paulo, presidida pelo ex-senador Jorge Bornhausen (DEM).

Embora sem apresentar um modelo, o ex-presidente sugeriu mudanças no sistema eleitoral.

Fernando Henrique retomou o discurso contra as indicações políticas para cargos estratégicos, chamando de "cupins" militantes que atuam em diferentes repartições do governo.

- Há hoje um partidarismo, uma troca de técnicos por militantes, e o cupim vai minando.

Estamos assistindo a uma cupinização do Estado brasileiro - disse ele: - A máquina tem que ser mais profissional, ela foi muito penetrada nos últimos anos por interesses partidários. Não só de um partido, mas de vários. É a chamada fisiologia.

Senador do PMDB rebate em tom duro

Cecília Ramos
DEU NO JORNAL DO COMMERCIO (PE)

Assim como tem feito no cenário nacional, confrontado diretamente o governo Lula, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) reforçou seu papel de principal opositor do presidente no Estado, ontem. Jarbas rebateu as declarações de Lula, feitas na terceira visita oficial a Pernambuco, este ano. A principal delas, que parece ter incomodado mais o presidente, diz respeito ao Bolsa-Família. O ex-governador reiteirou suas críticas à iniciativa de repasse de renda mínima, alegando ser contra “o uso eleitoral que o governo faz do programa”.

“Não disse nada muito diferente dos questionamentos sobre o Bolsa-Família feitos pelo Frei Betto, ex-auxiliar do presidente da República”, provocou Jarbas, por meio de nota à imprensa.

Ele se refere ao ex-coordenador de mobilização social do programa Fome Zero e amigo pessoal de Lula, que deixou o governo em 2004. Para Frei Betto, o Bolsa-Família se transformou em um “manancial de votos para o PT”.

Na sua entrevista à Rádio Jornal, Lula diz não saber porque Jarbas “não gosta” dele. O senador, por sua vez, tentou levar o debate para a esfera política. “Não tenho nada pessoal contra o presidente Lula, mas fui eleito para ser de oposição. Além do mais, não tenho vocação para o adesismo”.

Jarbas também rebateu as críticas feitas pelo presidente e pelo governador Eduardo Campos (PSB), em discursos, sobre a privatização da Celpe, ocorrida em 2000, primeira gestão do peemedebista. Os opositores do ex-governador sempre que enxergam uma oportunidade questionam a gestão passada sobre a aplicação dos recursos com a venda da antiga estatal.
Também por meio de nota, Jarbas lembrou que a privatização foi iniciada pelo terceiro governo Arraes (PSB) – mas não citou as ações que, junto com Mendonça Filho (DEM), implementou na ocasião. “Nossa gestão apenas deu sequência ao processo. Ao contrário do que fizeram meus adversários, os recursos obtidos pela privatização foram depositados numa conta específica, com transparência na aplicação em obras e projetos aprovados pelos pernambucanos. Isso é história.
Mas talvez o presidente acredite que a história começou depois que ele foi eleito”.

Quanto às transferências de recursos da União para Pernambuco, Jarbas sustentou que o repasse foi maior no governo FHC. “O governo Lula é recordista brasileiro de marolinha, de espuma”, provocou.

Brasil perdeu 750 mil empregos em três meses, aponta Dieese

DEU NO JORNAL DO COMMERCIO(PE)

O mercado de trabalho nacional perdeu 750 mil vagas de emprego formal de dezembro a fevereiro, segundo um estudo divulgado nesta segunda-feira (23) pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). O levantamento da entidade mostra que a perda representa um corte de 2,3% do total de postos de trabalho do país e é um dos impactos da crise mundial na economia brasileira.

“Estes três meses [dezembro, janeiro e fevereiro] são, tradicionalmente, meses de ajustes sazonais no nível de emprego. Geralmente, temos mais demissões que contratações. Mas, este ano, a crise agravou a situação”, disse o coordenador de relações sindicais do Dieese, José Silvestre, em entrevista à Agência Brasil.

Só em dezembro, por exemplo, a crise aumentou em 305 mil o número de demissões no país, de acordo com o Dieese. Nas previsões da entidade, o Brasil perderia 350 mil vagas de trabalho naquele mês. Porém, o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) acabou apontando um corte de 655 mil vagas.

O estudo do Dieese aponta ainda que boa parte das vagas eliminadas desde dezembro são do setor de agropecuária e da indústria de transformação, os mais prejudicados em termos percentuais. Só agropecuária demitiu 8,6% dos seus empregados durante esse período. Já a indústria de transformação demitiu 5%.

Silvestre afirmou, porém, que pelo menos uma parcela de todas essas demissões poderia ter sido evitada, independentemente do agravamento da crise no mundo ou no Brasil. Segundo ele, existe uma grande facilidade para se demitir no país e alguns empresários se aproveitam dessa facilidade para cortar mais vagas que o necessário.

“É difícil mensurar o que foram demissões causadas pela crise e o que foram ajustes antecipados promovidos pelos próprios empresários”, afirmou Silvestre, citando casos de companhias que anunciaram demissões em massa ao mesmo tempo que anunciaram um aumento de sua produção para 2009.

Silvestre disse que o corte desnecessário de vagas tem outro efeito negativo: a precarização do trabalho. Ele disse que o país, desde 2002, apresenta melhorias neste sentido, com o aumento do salário mínimo e do salário dos recém-contratados. Essas melhorias, porém, estão comprometidas pela crise e pela falta de regras rígidas sobre as demissões injustificadas.

De acordo com Silvestre, o Brasil deveria criar leis que impeçam as demissões em justa causa, assim como o previsto pela Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). "O custo da demissão já está embutido no custo do trabalhador. Enquanto não tivermos uma lei que iniba as demissões, vamos ter esta alta rotatividade", afirmou.

LULA E A CRISE


Crise encerra ''lua de mel'' entre Lula e prefeitos

Moacir Assunção, Angela Lacerda e Carmen Pompeu e Mônica Bernarde
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Rebelião, que inclui até fechamento simbólico de prefeituras, é reação ao corte de repasses do FPM

Passados 41 dias do evento com 3,5 mil prefeitos promovido pelo governo em Brasília para anunciar um "pacote de bondades", o clima de "lua de mel" cederá lugar hoje a duras cobranças ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que cumpre agenda em Salvador. Confirmado o corte de 19% no segundo repasse de março do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), um grupo de prefeitos liderados pelo presidente da União dos Municípios da Bahia (UPB), Roberto Maia, entregará um documento a Lula cobrando urgente revisão dos valores.

Amanhã, prefeituras paranaenses fecharão as portas em ato simbólico e outro grupo levará à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, pedido de reconsideração dos repasses. A rebelião contrasta com o ambiente festivo do Encontro Nacional com Novos Prefeitos e Prefeitas, no qual foi anunciado parcelamento das dívidas com o INSS (ver abaixo) e o presidente defendeu a eleição de uma mulher em 2010 para a Presidência. Partidos de oposição viram um ato para promover a pré-candidata Dilma e recorreram ao Tribunal Superior Eleitoral, mas o pedido não avançou.

O corte foi anunciado na sexta-feira, com base em estimativa da Secretaria do Tesouro Nacional, e reflete a queda de arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do Imposto de Renda (IR) nos dez primeiros dias deste mês. Estava previsto um pagamento de R$ 310 milhões, mas só R$ 250 milhões foram efetivamente transferidos.

No acumulado dos últimos três meses - entre o fim de dezembro e o último dia 20 - a Confederação Nacional dos Municípios (CNM) calcula perda de 7,49% sobre o que era previsto. Em relação a igual período do ano passado, a queda, em valores reais, chegaria a 14,5%.

Em 2008, o total repassado no primeiro trimestre foi de R$ 13,6 bilhões, em valores corrigidos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Neste ano, foram R$ 11,9 bilhões - queda de R$ 1,7 bilhão.

Para o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, uma das consequências, nas cidades que sobrevivem do fundo, será a redução brusca no investimento em educação e saúde. "Também o Imposto de Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Serviços (ISS) têm caído de forma assustadora. Os repasses do fundo vinham aumentando havia seis anos e despencaram subitamente, surpreendendo os prefeitos, que contavam com outro perfil de arrecadação e têm compromissos altos a honrar", afirmou.

Ziulkoski lembra que 4 mil dos 5,5 mil municípios brasileiros têm o fundo como principal fonte de recursos. Procurado ontem, o Ministério da Fazenda não respondeu aos pedidos de entrevista.

TORNEIRA FECHADA

A queda nos repasses é atribuída à crise econômica mundial, que levou à redução da receita de IPI e IR. No fim de 2008, Lula isentou automóveis de IPI - 48% da coleta desse tributo vai para Estados e municípios.

Na Bahia, a situação está muito difícil, segundo o presidente da UPB, que é prefeito de Bom Jesus da Lapa. "Muitos prefeitos estão correndo risco de ter as contas reprovadas por não conseguir repassar a parte da arrecadação que cabe às Câmaras Municipais. Não sobrou dinheiro nenhum nos cofres."

No Rio Grande do Norte, 38 municípios tiveram repasse zero em 2009, segundo a associação local. Estão na lista Mossoró, Macaíba, Ceará-Mirim, Assu, Macau, São Gonçalo do Amarante, São José do Mipibu, Nísia Floresta, Caicó e Currais Novos.

Em Fortaleza, de acordo com o secretário de Finanças, Alexandre Cialdini, houve perda de mais de R$ 8 milhões em relação a 2008, acendendo luz amarela na administração Luizianne Lins.

EMPENHO

Lula prometeu ontem ajudar as prefeituras a atingirem "um mínimo de capacidade de investimento" para enfrentar a queda do FPM. "Isso é um problema", admitiu ele, em Vitória de Santo Antão (PE), durante inauguração de uma fábrica da Sadia. "Se a prefeitura não estiver bem, o povo não estará bem." Mais tarde, prometeu "empenho pessoal" no assunto.

Lula reconheceu que "os prefeitos estão agoniados porque está diminuindo o FPM", mas garantiu estar atento à questão. De forma didática, ele afirmou para a plateia que, "se cai a receita do governo federal, cai a receita do governo estadual e cai a receita do município".

Apesar da promessa de socorro aos prefeitos, Lula não explicou como agirá para promover o "mínimo de capacidade de investimento". Limitou-se a dizer que, se cada prefeitura atingir esse nível, vai facilitar a vida do governador, que vai "chorar menos" para o presidente, o que facilitará sua vida. "E vai sobrar dinheiro para a gente fazer as coisas."

A moral e a crise

Luiz Carlos Bresser-Pereira*
DEU EM O ESTADO DE S.PAULO/ ALIÁS
Domingo, 22/3/2009

Deu pane no sistema de valores e princípios construído nos '30 anos de ouro do capitalismo'

A crise que hoje enfrenta o capitalismo é econômica, mas suas causas são também políticas e morais. A causa imediata foi a quebra de bancos americanos devido à inadimplência das famílias em relação a dívidas hipotecárias que, em um mercado financeiro cada vez mais desregulado, puderam crescer sem limites porque os bancos se valiam de "inovações financeiras" que lhes permitiam empacotar os respectivos títulos de tal maneira que os novos pacotes pareciam, aos novos credores a quem eram repassados, mais seguros do que os títulos originais. Quando a fraude foi descoberta e os bancos quebraram, a confiança das famílias e empresas, que já estava profundamente abalada entrou em colapso. Elas passaram a se proteger adiando todo tipo de consumo e de investimento, a demanda agregada sofreu uma queda vertical e a crise, que era inicialmente apenas bancária, se transformou em crise econômica.

Essa explicação é razoável, mas, dado que no seu centro está a questão da confiança, pergunto: será que a confiança foi perdida por motivos meramente econômicos - pela dinâmica do ciclo econômico, pela natureza intrinsecamente instável do capitalismo - ou na base da crise está uma questão política e moral? É verdade que o sistema econômico capitalista é instável, mas desenvolvemos durante todo o século 20 uma série de instituições que, todos esperavam, fossem capazes de reduzir substancialmente a gravidade das crises. E, de fato, no pós-guerra, nos "30 anos gloriosos do capitalismo" (1945-1975) - tempos do novo Estado social e da macroeconomia keynesiana - as crises perderam frequência e intensidade, as taxas de crescimento econômico foram elevadas e a desigualdade econômica diminuiu.

Entretanto, nos últimos 30 anos - os anos da hegemonia neoliberal e da criação de riqueza fictícia - as taxas de crescimento baixaram, a renda voltou a se concentrar nas mãos dos 2% mais ricos da população e a instabilidade financeira aumentou em toda parte, culminando com a crise global de 2008 - uma crise infinitamente mais grave do que a modesta desaceleração econômica combinada com inflação que assinalou o fim dos 30 anos gloriosos. Ora, embora se confunda o neoliberalismo com o liberalismo (uma grande e necessária ideologia) e com o conservadorismo (uma atitude política respeitável), essa ideologia não é nem liberal nem conservadora, mas caracterizada por um individualismo feroz e imoral. Enquanto o liberalismo foi originalmente a ideologia de uma classe média burguesa contra uma oligarquia de senhores de terras e militares, e contra um Estado autocrático, o neoliberalismo, que se tornou dominante no último quartel do século 20, é uma ideologia dos ricos contra os pobres e os trabalhadores, contra um Estado democrático e social. Enquanto os liberais e os conservadores autênticos são também "republicanos" (como também o são os socialistas e os ambientalistas), ou seja, acreditam no interesse público ou no bem comum e afirmam a necessidade de virtudes cívicas para que o mesmo seja garantido, os neoliberais negam a ideia de interesse público, adotam um individualismo que tudo justifica, transformam a tese da mão invisível em uma caricatura e estimulam cada um a defender apenas seus interesses, porque os interesses coletivos serão garantidos pelo mercado e pela lei. Esta, por sua vez, deve tudo liberalizar. E qual o novo papel do Estado? Em vez de ser identificado à própria lei, é apenas a organização de burocratas que deveria garanti-la, mas o faz muito mal. Qual sua função? Ser só "regulador", diz o neoliberalismo, mas, invertendo o sentido das palavras, como fazia o big brother de Aldous Huxley, a ideologia dominante advogou sempre a desregulação geral.

A confiança, portanto, não foi perdida apenas por motivos econômicos. Além de trazer a desregulação dos mercados, a hegemonia neoliberal trouxe consigo a deterioração dos padrões morais da sociedade. A virtude e o civismo foram esquecidos, senão ridicularizados, em nome de uma racionalidade econômica de mercado superior, que se pretendia legitimada por modelos econômicos matemáticos. Os bônus se transformaram no único incentivo legítimo ao trabalho. Os escândalos corporativos se multiplicaram. A prática de corromper servidores públicos e políticos generalizou-se. Estes, por sua vez, se adaptaram aos novos tempos, "confirmando" a tese fundamentalista de mercado do Estado mínimo. Ao invés de se pensar Estado como o grande instrumento de ação coletiva da sociedade, expressão da racionalidade institucional que cada sociedade alcança no seu respectivo estágio de desenvolvimento, e guardião legal da moralidade, passou-se a vê-lo como uma organização de funcionários e políticos corruptos. A partir desse reducionismo político, desmoralizava-se o Estado e sua lei, reduzia-se o papel dos valores e se estabelecia a permissibilidade favorável aos ganhos fáceis. Não foi por acaso que o livro publicado por John Kenneth Galbraith em 2004 chamou-se Economia das Fraudes Inocentes. Quando comparado com seu clássico, Capitalismo Americano: O Conceito das Forças Contrabalançadoras, de 1957, este último livro do grande economista, falecido pouco depois aos 95 anos, nos dá a medida da degradação dos padrões éticos dos últimos 30 anos.

*Economista, cientista político, três vezes ministro (no governo Sarney e nos dois mandatos de Fernando Henrique) e professor emérito da FGV desde 2005

Geithner reloaded

Panorama Econômico :: Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO


O governo americano reconheceu o óbvio: "O sistema financeiro está travando a recuperação econômica" e divulgou detalhes do mesmo plano de seis semanas atrás. O grande problema continua sendo: como remover dos balanços dos bancos US$2 tri em ativos podres? A equipe econômica de Obama tem andado em círculos. Ontem, detalhou os passos para tentar sair do círculo.

Passo um: o banco identifica que ativos podres ele quer vender, e todos os bancos, de qualquer tamanho, podem entrar no programa. Passo dois: o FDIC, fundo garantidor de depósitos, vai organizar um leilão de compra desses ativos. Os compradores serão os fundos público-privados de investimento, formados por dinheiro do contribuinte e de sócios privados. Passo três: o financiamento para a compra dos papéis será dado pela garantia do FDIC. Passo quatro: os administradores dos fundos de investimento vão controlar o processo de recuperação ou liquidação desses ativos que forem comprados.

Antes, as dúvidas eram: quem iria comprar, como seria o processo de venda e como dar preço em ativo podre. Agora, já se sabe que será feito por um leilão de preço mínimo, em que os fundos, formados nesta parceria público-privada, vão comprar os papéis, em parte com dinheiro público. O mesmo plano, que não fez sucesso há seis semanas, encantou o mercado ontem, por ter explicado os mecanismos, e fez subir as bolsas.

Mesmo assim, as dúvidas continuam, como explicou a economista Monica de Bolle, da Galanto Consultoria. Ela acha que o plano corre dois sérios riscos: o primeiro é partir do pressuposto que os ativos podres ainda têm algum valor; o segundo é achar que os próprios bancos vão pôr seus ativos podres em leilão, explicitando a fragilidade em que estão. Monica lembra ainda que esta crise se arrasta há um ano e que tanto tempo assim tem um efeito demolidor sobre os ativos de um banco.

- Os bancos possuem ativos podres que, de fato, não valem nada, mas também possuem ativos podres que valem um pouquinho. O banqueiro será estimulado a pôr à venda os que têm valor, porque assim o banco ganha um pouco e as ações se valorizam.

O que o governo Obama está dizendo é que, mesmo num momento de descrédito das instituições financeiras, o caminho escolhido é o de trabalhar com elas para que seja possível realizar um projeto de solução. Tudo bem, se houvesse algum tipo de punição para os administradores responsáveis por decisões que arruinaram os bancos, as economias das pessoas, a economia global. Mas, pelo contrário, o que há é distribuição de bônus para quem quebrou bancos.

O anúncio de ontem, que animou as bolsas, empilha o que foi feito nas últimas semanas e dá os contornos da ideia de fazer uma parceria público-privada para comprar os ativos podres.

O Tesouro disse que no mês passado aumentou 30% o refinanciamento de hipotecas através de um dos programas, que é o de ajudar os mutuários que sempre foram bons pagadores - e que tiveram dificuldade para a elevação dos juros cobrados pelos bancos - a refinanciar suas hipotecas a custos menores.

Existem algumas pequenas melhoras pontuais, mas o grande problema continua sendo o que fazer para remover o lixo tóxico dos ativos dos bancos. Para que o plano funcione, o Tesouro diz que vai produzir competição entre instituições pela compra dos ativos podres, através dos leilões, para assim definir o preço desses ativos e evitar que o contribuinte pague excessivamente por eles.

A MB Associados lembra que o número de bancos quebrados nesta crise é infinitamente menor do que em outras. Na atual, apenas 30 bancos quebraram, o que no mercado pulverizado americano dá menos de 0,4% das instituições financeiras. Na crise das "savings & loans" (instituições de poupança e empréstimo), na década de 80, quebraram sete mil instituições (28%). Na crise de 29, dos 24 mil bancos, nove mil quebraram (36,5%). O economista Sérgio Vale acha que mesmo sendo difícil banco grande quebrar, depois do Lehman Brothers, instituições pequenas podem ainda falir, prejudicando as pequenas empresas. Sobre o plano de ontem, ele acha que a euforia pode ser passageira.

- A crise não acaba agora. A euforia de hoje é típica de quando sai um plano desse porte. Há dúvidas sobre o operacional do plano e o mercado não está se atendo a isso. As dúvidas sobre a implantação e a separação de ativos podem deixar o mercado volátil ainda.

É um risco político e financeiro transferir recursos dos contribuintes para os bancos mantendo os mesmos administradores e beneficiando os controladores, que podem produzir novos escândalos, como o da AIG.

Monica de Bolle, que trabalhou no FMI, na época em que Timothy Geithner trabalhava lá, diz que o Fundo já estudou crises bancárias pelo mundo inteiro. Há um cardápio normalmente seguido nestes casos. A melhor solução, para ela, seria a estatização parcial e temporária dos bancos, com a criação do banco com os ativos podres, o bad bank.

- Neste caso, remove-se a diretoria do banco para implantar uma nova estrutura administrativa, que vai, de fato, limpar o balanço.

Política financeira do desespero

Paul Krugman
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

No fim de semana, The Times e outros jornais noticiaram os detalhes, que haviam vazado, do plano de salvamento dos bancos elaborado pelo governo Obama. Se os artigos estiverem corretos, o secretário do Tesouro, Tim Geithner, convenceu o presidente Barack Obama a reciclar a política do governo Bush - especificamente, o plano "cash for trash" (dinheiro por lixo) abandonado, há seis meses, pelo então secretário do Tesouro, Henry Paulson.

É mais do que uma decepção. Na realidade, isso me enche de desespero. Afinal, acabamos de passar pela tempestade provocada pelas bonificações pagas pela AIG aos seus executivos. Ao mesmo tempo, o governo não conseguiu dirimir as indagações a respeito do que os bancos estão fazendo com o dinheiro dos contribuintes.

E agora Obama aparentemente montou um plano financeiro que, em essência, pressupõe que os bancos são fundamentalmente sadios e que os banqueiros sabem o que estão fazendo. É como se o presidente estivesse determinado a confirmar a crescente percepção de que ele e sua equipe econômica não têm senso de realidade, que sua visão econômica está obnubilada por vínculos excessivamente estreitos com Wall Street. Quando Obama se der conta de que precisa mudar de curso, seu capital político talvez já tenha desaparecido.

Falemos um pouco da situação. Neste exato momento, nossa economia é arrastada para o buraco por um sistema financeiro deficiente, paralisado pelas enormes perdas dos títulos atrelados a hipotecas e outros ativos. Como os especialistas em História da economia poderão explicar, é uma situação que continua se repetindo, em nada diferente de dezenas de outras crises semelhantes ocorridas ao longo dos séculos. Existe um procedimento consagrado pela prática para tratar dos efeitos de uma crise financeira abrangente: o governo assegura a confiança no sistema garantindo muitas dívidas dos bancos. E, ao mesmo tempo, assume o controle temporário dos bancos, para limpar seus livros contábeis.

É o que a Suécia fez no início dos anos 90. É também o que nós fizemos depois da debacle das instituições de poupança e empréstimos dos anos Reagan. Não há motivo para, agora, não fazermos a mesma coisa.

Mas o governo Obama, como o do Bush, aparentemente procura uma saída mais fácil. O elemento comum aos planos de Paulson e de Geithner é a insistência em que os ativos podres valem muito mais do que qualquer um está disposto a pagar. E, portanto, o plano deve usar o dinheiro dos contribuintes para que os preços dos ativos podres cheguem a níveis "justos".

Paulson propôs que o governo pagasse diretamente pelos ativos. Geithner propõe um esquema complicado, segundo o qual o governo empresta dinheiro a investidores privados, que o usam para comprá-los. A ideia, afirma o principal assessor econômico de Obama, é usar "a capacidade e a experiência do mercado" para estabelecer o valor dos ativos tóxicos.

Mas o plano de Geithner oferece uma aposta segura: se os valores dos ativos subirem, os investidores lucrarão, mas se caírem, abandonarão a dívida. Portanto, não se trata de deixar que os mercados façam seu trabalho. Trata-se de uma forma indireta de subsidiar.

Deixando de lado o custo provável da operação para os contribuintes, há algo estranho ocorrendo. Na minha opinião, é a terceira vez o governo Obama lança um remanejamento do plano Paulson, cada vez acrescentando coisas supérfluas e garantindo que estão fazendo algo completamente diferente.

Mas o problema real é que não funcionará. Sim, os ativos podres talvez sejam um tanto subvalorizados. O fato é que os executivos do setor financeiro apostaram literalmente seus bancos na convicção de que não havia bolha da habitação e na crença de que níveis de endividamento sem precedentes com a compra da casa própria não constituíam nenhum problema. Perderam a aposta. E nenhuma mágica financeira - pois o plano de Geithner não passa disso - poderá mudar esse fato.

Perguntarão: por que não adotar o plano e ver o que acontece? Uma resposta é que o tempo está se esgotando: a cada mês que passa sem que se encontre uma solução para a crise financeira, mais 600 mil empregos serão eliminados.

Mas o mais importante é que Obama está desperdiçando sua credibilidade. Se seu plano falhar - como quase certamente falhará - é improvável que consiga convencer o Congresso a desembolsar mais recursos para fazer o que ele deveria ter feito logo de início.

Entretanto, nem tudo está perdido: o público quer que Obama consiga o que pretende; o que significa que ele ainda pode salvar seu plano de ajuda aos bancos. Só que o tempo está se esvaindo muito depressa.

*Paul Krugman é articulista

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