sábado, 1 de junho de 2013

OPINIÃO DO DIA – Roberto Freire: as mentiras do governo

Diante de mais uma série de lambanças que contam com a assinatura do governo petista e da Caixa Econômica Federal, há de se perguntar o que Maria do Rosário, José Eduardo Cardozo e Dilma Rousseff teriam a dizer neste momento. Ao que tudo indica, os boatos que assustaram os beneficiários do Bolsa Família, infelizmente cada vez mais dependentes das benesses do Estado e ludibriados pelo assistencialismo barato, partiram não de uma “central de notícias da oposição”,mas da inesgotável central de mentiras do próprio governo do PT.

Roberto Freire, deputado federal por São Paulo e presidente nacional da Mobilização Democrática (MD), in “Bolsa Família e a ‘central de mentiras’ do PT”, Brasil Econômico, 31/5/2013

Manchetes de alguns dos principais jornais em circulação

O GLOBO
O nó do crescimento - Dólar sobe e complica combate à inflação
Conta de luz fica mais barata por decreto
A tensão aumenta: Índios ampliam ocupação em MS
Tragédia em Santa Maria: Famílias levam pizza à CPI da Kiss
No cadastro do Enem: TV, geladeira e... doméstica

FOLHA DE S. PAULO
10 das 12 novas prisões paulistas já estão superlotadas
Após 'surpresa' do BC, mercado aposta em nova alta nos juros
Mesmo com ação do Banco Central, dólar bate recorde
Restaurante de área nobre de SP sofre arrastão
Índios terenas voltam a invadir fazenda em MS
Vice de Obama diz que relações com Brasil têm lacunas

O ESTADO DE S. PAULO
BC age, mas dólar atinge o maior valor em 4 anos
Sem aliança com PT, PMDB pode apoiar Campos
Rio corre para entregar o Maracanã

ESTADO DE MINAS
Judiciário: Caminho livre para o TRF de Minas
Índios voltam a invadir fazenda palco de conflito
Dilma discute a relação com a cúpula do PMDB

O TEMPO (MG)
Mesmo com atuação do Banco Central, dólar fecha no maior nível em quatro anos
Dilma deseja sucesso a Rafael Correa por novo mandato no Equador
Para Renan, ‘tensão é natural’
Índios voltam a invadir fazenda depois de morte

CORREIO BRAZILIENSE
Dólar a R$ 2,14 impõe cautela para viagens
Morte de índio no MS mobiliza governo e CNJ
Transplantes: Doação ainda é o maior tabu
EUA-Brasil: Promessas de mais comércio

GAZETA DO POVO (PR)
União cogita suspender a concessão das BRs 376 e 101
TRF do Paraná deve ser promulgado na quinta-feira
Dólar vai a R$ 2,14, o maior valor desde 2009

ZERO HORA (RS)
Em disparada: BC age para evitar dólar a R$ 2,15

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Correios terão licitação para novas franquias

O que pensa a mídia - editoriais de alguns dos principais jornais em circulação

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

O nó do crescimento - Dólar sobe e complica combate à inflação

Moeda americana tem maior alta em 4 anos, apesar de intervenção do BC

Cotação bate R$ 2,15, o que encarece produtos, pondo em risco o controle do custo de vida no país. Juros mais altos nos EUA ajudaram a levar dólares do mundo todo para lá

Após dois meses sem atuar, o Banco Central interveio no mercado de câmbio para tentar segurar a cotação da moeda americana. Mas não foi bem-sucedido. O dólar chegou a R$ 2,15 e acabou fechando a R$ 2,143, na maior cotação desde 2009, em alta de 1,37%. O BC tentou vender US$ 1,5 bilhão em contratos no mercado futuro, mas só conseguiu realizar pouco mais da metade. A alta de juros de papéis americanos está atraindo investidores por lá.

Dólar nas alturas

Banco Central intervém, mas não impede maior cotação em quatro anos, a R$ 2,143

Daniel Haidar, Bruno Villas Bôas

Nem mesmo a primeira intervenção do Banco Central em dois meses no mercado de câmbio foi capaz de evitar que o dólar atingisse ontem o maior patamar desde 5 de maio de 2009, com alta de 1,37% a R$ 2,143. Na máxima do dia, a moeda chegou a R$ 2,152. O comportamento da moeda surpreendeu o mercado, que esperava uma maior atração de dólares depois que a autoridade monetária decidiu elevar a taxa básica de juros para 8% ao ano na última quarta-feira, evidenciando o foco no combate à inflação. Segundo analistas, a alta do câmbio pode pressionar ainda mais os índices de preços. A inflação elevada é considerada uma das vilãs responsáveis pelo baixo crescimento da economia brasileira, que registrou alta de apenas 0,6% no primeiro trimestre, abaixo da expectativa do mercado. Com a disparada do dólar, a moeda americana encerrou o mês com alta de 7,10%, o maior avanço mensal desde setembro de 2011. No ano, sobe 4,89%.

- Isso (a alta do dólar) vai gerar mais inflação e provavelmente vai forçar o Banco Central a ser mais duro na política monetária do que estava planejando - disse José Márcio Camargo, economista-chefe da gestora Opus Investimentos.

Para Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, a ação do BC no mercado de câmbio foi mais um sinal da preocupação da autoridade monetária com o comportamento dos índices de preços. Agostini ressalta que a transmissão da alta do dólar para o consumidor é um processo que leva, em média, 20 dias. Este é o período necessário para renovação de estoques nas empresas, com importados já afetados pelo câmbio mais caro. O economista destaca que no caso de uma alta na taxa de juros, a influência sobre os preços conta com uma defasagem de seis meses ou mais.

Correção nos juros e na bolsa

Desde a abertura dos negócios, a moeda americana já sentiu a pressão do mercado. Logo nos primeiros minutos do pregão chegou a R$ 2,145. O Banco Central acabou decidindo intervir no mercado no começo da tarde, com um leilão de 30 mil contratos de swap cambial , operação que equivale à venda de dólares no mercado futuro. Apesar da oferta de US$ 1,5 bilhão, só foram vendidos US$ 877 milhões. Após a ação do BC, a moeda chegou a perder força e desacelerou para R$ 2,122, mas não sustentou este patamar. Durante a tarde, retomou a trajetória de alta. Segundo analistas, por trás do movimento de valorização do dólar estava uma queda de braço entre o mercado, que testou os limites do teto informal da moeda - apontado até então como R$ 2,05 -, e a autoridade monetária. Além disso, o dia foi marcado por um volume menor de operações, o que ajuda a explicar a oscilação da moeda.

Segundo Luis Otávio Leal, economista do banco ABC Brasil, o aumento da Taxa Selic deveria atrair mais dólares para o país em busca do rendimento dos títulos públicos brasileiros. Ontem, no entanto, o efeito da alta da Selic teria sido a saída de investidores estrangeiros.

- O BC surpreendeu o mercado e provocou uma forte alta dos juros futuros com vencimento mais longo. Os comentários são que isso impôs perdas aos estrangeiros, que apostavam na alta da Selic em 0,25 ponto percentual. Eles venderam seus contratos, com perdas, e preferiram remeter seus dólares para fora do país - explica Leal.

A alta da moeda americana não é um fenômeno local. O dólar também avançou frente a outras moedas nas últimas semanas. Ontem, no entanto, o real foi a segunda moeda que mais se depreciou, com queda de 1,42% na comparação com o dólar, entre as 16 principais moedas do mundo. Segundo especialistas, o movimento de valorização da moeda americana ganhou força com a divulgação de resultados acima das expectativas em indicadores como o de confiança do consumidor, da Universidade de Michigan, e do índice de gerentes de compras de Chicago.

As estatísticas reforçaram a percepção de que a redução dos estímulos monetários do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) está perto. Como foi essa injeção de dólares que desvalorizou a moeda americana e elevou os preços de títulos do tesouro nos últimos meses, esses papéis - os treasuries - passaram a ser negociados a preços menores, o que disparou as vendas para minimizar perdas. Isso também reforçou as apostas de alta do dólar. Diante deste quadro, a maioria do mercado já cogita a hipótese de um novo teto para o dólar, por volta de R$ 2,15.

Num sinal de que o Banco Central está comprometido com o combate à alta de preços, a autoridade monetária voltou a consultar mesas de câmbio de bancos e corretoras sobre a necessidade de nova oferta de contratos de swap na próxima segunda-feira, uma operação que ainda não foi confirmada pelo BC.

Os juros futuros sofrerem forte alta ontem na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F). Os contratos de DI com vencimento em janeiro de 2014 subiram de 8,06% para 8,44%, refletindo apostas de mais até 1,25 ponto percentual de alta na Selic até o fim do ano. Ações da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) sofreram perdas com as perspectivas de uma Selic mais alta. O Ibovespa, principal índice, recuou 2,06%, aos 53.165 pontos, menor patamar desde 18 de abril. Em maio, o Ibovespa acumulou perda de 4,30%, a maior queda mensal desde maio de 2012.

Fonte O Globo

Nova trapalhada do Enem: para o MEC domésticas é objeto

Formulário do Enem causa polêmica com domésticas

Mercadante disse que questão deve ser modificada ano que vem, em respeito aos trabalhadores da categoria

Leonardo Vieira

Quase dois meses após a aprovação da "PEC das Domésticas", que ampliou os direitos trabalhistas da categoria, um questionário aplicado a candidatos que vão prestar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) em 2013 causou desconforto entre alunos, empregadas do ramo e o Ministério da Educação (MEC).

No ato da inscrição, o estudante precisou responder a um questionário socieconômico com itens como a renda mensal familiar e a escolaridade. No entanto, na questão número 7, o candidato deveria assinalar, entre os itens na lista, quais ele possui dentro de casa. Na relação, entre objetos como TV, geladeira, aspirador de pó, automóvel e computador, surge a opção "empregada mensalista". O questionário foi criticado pela categoria:

- É um ato discriminatório porque nos reduziu a objetos. Não foi perguntado se na casa do aluno havia pais, filhos ou parentes. Só objetos e as empregadas domésticas. E o mais grave é que quem elaborou esse questionário são pessoas ligadas à educação, formadores de opinião. Será que eles ensinam para as crianças que empregadas são utensílios domésticos? - questiona a presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza de Oliveira.

Em nota, o MEC reconheceu o problema. O órgão afirmou que "o ministro Aloizio Mercadante considera que a forma da pergunta que se refere a trabalhadores domésticos é inadequada e vai encaminhar a necessidade de sua adequação, preservando os critérios técnicos, mas garantindo integralmente o respeito àqueles trabalhadores".

O questionário é aplicado aos candidatos do Enem desde 1998. O formulário serve para o MEC avaliar o perfil de quem faz o exame e, com base nisso, elaborar políticas educacionais.

De acordo com a a socióloga Maria Salete Souza de Amorim, coordenadora do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal da Bahia (UFBA), a pergunta deveria ter sido feita separadamente:

- Dentre os itens apresentados, constam apenas objetos, portanto, não cabe o item "empregada mensalista". Seria necessário criar outra questão com outras categorias para inserir essa informação - observou.

Já para o professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) Ocimar Munhoz Alavarse, especialista em questionários socieconômicos, a polêmica seria "exagerada". Mas a pergunta específica sobre empregada mensalista poderia ter sido feita separadamente.

- Não necessariamente isso deve ser interpretado como posse de bens materiais, pois "ter em sua casa" pode assumir no português a ideia de haver, existir, encontrar etc... Como hipótese, poderia haver a alternativa "empregada mensalista" separadamente - sugere Alavarse.

Fonte: O Globo

PSDB pede à PF inquérito sobre o caso Bolsa Família

Baime Cardoso

BRASÍLIA - A liderança do PSDB na Câmara dos Deputados entrou ontem com uma representação na Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo investigação sobre eventuais irregularidades e possível improbidade administrativa de autoridades do governo federal no episódio envolvendo os boatos sobre o fim do programa Bolsa Família, ocorridos nos dias 18 e 19 de maio. Os falsos boatos provocaram uma corrida às agências da Caixa Econômica Federal em 13 Estados, sobretudo no Nordeste. A Caixa é a responsável por fazer os repasses do programa.

O líder do partido na Casa, deputado Carlos Sampaio (SP), também encaminhou um requerimento à Polícia Federal solicitando acesso imediato dos partidos de oposição ao inquérito instaurado para apurar o caso.

Na representação, o tucano argumenta que há indícios de luso político de informações sobre o programa, vazamento de dados sigilosos dos beneficiários por sistema de telemarketing e divulgação de informações incorretas pela Caixa Econômica Federal. O presidente ;da Caixa, Jorge Hereda, e o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, admitiram que os recursos do Bolsa Família foram liberados para saque na sexta- feira, dia 17, véspera dos boatos. O documento cita ainda a ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, que, em mensagem no Twitter, atribuiu à oposição a responsabilidade pela onda de boatos. Para o líder do PSDB, os fatos são passíveis de instauração de inquérito civil ou penal.

Já no requerimento encaminhado ao diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello, a oposição cobra o acesso de seu advogado às informações colhidas pelos policiais até agora. De acordo com o partido, a PF teria se comprometido a liberar o acesso aos autos pela oposição.

Sem novidades. Ainda ontem, ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse que as investigações sobre o episódio continuam em ritmo acelerado, mas que não há nenhum fato novo no inquérito. "Não chegamos até o momento a nenhuma situação que eu possa dizer como conclusiva" , afirmou Cardozo.

Segundo o ministro, nenhuma linha de investigação foi descartada. A apuração do caso é considerada "difícil" pelo fato de que é preciso ouvir muitas testemunhas para se chegar à fonte primária dos boatos. "Isso não é uma investigação fácil, mas nós já temos uma linha de investigação."

Boato causou tumultos

Motivadas por boatos que davam conta de que o governo acabaria com o Bolsa Família, milhares de pessoas correram, a agências da Caixa Econômica no fim de semana dos dias 18 e 19 de maio para sacar o benefício. O corre-corre gerou filas e tumultos em agências de 13 Estados. Uma semana depois do episódio, a Caixa admitiu que, em 17 de maio, véspera dos boatos, alterou o calendário e antecipou o pagamento do Bolsa Família para. Todos os benefícios - um total de R$ 2bilhões - foram liberados de uma só vez para parte dos 13,8 milhões de beneficiários.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Sem aliança com PT, PMDB pode apoiar Campos

Em pelo menos seis Estados onde ainda não há parceria entre PT e PMDB, dirigentes peemedebistas não descartam apoio regional ao PSB, do governador de Pernambuco, Eduardo Campos, caso ele dispute a Presidência.

PMDB ameaça dar apoio a Campos nos Estados onde a aliança com o PT patina

Bruno Boghossian, Julia Duailibi

O estremecimento da relação entre PT e PMDB no Congresso reflete e contamina a formação de palanques estaduais que darão sustentação ao projeto de reeleição da presidente Dilma Rousseff. Apesar da entrada do vice-presidente Michel Temer (PMDB) e da própria petista na costura de alianças regionais para 2014, peemedebistas resistem a se aliar ao PT em Estados estratégicos e ameaçam se coligar com o PSB, do governador de Pernambuco Eduardo Campos, provável candidato à Presidência.

Em Estados onde a situação azedou, o PMDB já usa a aproximação com Campos como uma forma de emparedar o PT. O discurso em favor do pernambucano passou a funcionar como ferramenta de pressão contra os petistas, com um único objetivo: obter condições mais favoráveis de negociação nos Estados.

O principal foco de insatisfação com o PT começou no Congresso. Ficou evidente durante a aprovação da MP dos Portos na Câmara e, depois, na apresentação do pedido de abertura da CPI da Petrobrás. Deputados reclamam da articulação política da presidente e defendem, nos bastidores, a candidatura de Campos. "Ele será o novo presidente da República. Há um grande desgaste com o PT" , declarou um parlamentar do PMDB.

Na eleição presidencial de 2010, o PMDB também ameaçou se rebelar. A diferença é que, agora, há uma alternativa ao PT dentro do campo governista, com Campos, o que garante aos peemedebistas uma tentativa de amenizar a cisão: o apoio não é para o PSDB, da oposição, mas para um partido aliado à própria Dilma.

A presidente, que não costuma entrar diretamente na costura política, começou a agir para apaziguar a aliança. Viajou a Estados em que a relação não estava boa, participou de jantares com bancadas estaduais e até interpretou o Canto Alegretense, num ato de simpatia com os peedemedebistas conflagrados do Rio Grande do Sul.

O discurso peemedebista pró-Campos está mais vitaminado em Estados como Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Mato Grosso do Sul, Pernambuco, Rondônia e Bahia. No Rio Grande do Sul, a aliança é inviável. A tendência é que o partido lance candidato próprio, com José Ivo Sartori, ex-prefeito de Caxias do Sul, ou o ex-governador Germano Rigotto. O PT tentará reeleger o governador Tarso Genro. Com um antagonismo profundo não está descartado o PMDB se aliar ao PSB ou até ao PSDB.

"O cenário hoje é menos pior para a Dilma do que na eleição passada", pondera o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS). Em 2010, o PMDB no Estado apoiou o tucano José Serra.

Em Mato Grosso do Sul, o PMDB reclama do fortalecimento político do senador Delcídio Amaral (PT), cotado para disputar o governo. Dilma foi até a capital, entregou de 300 ônibus ao lado do governador André Puccinelli, mas o PMDB não descarta dar palanque a Campos. "A tendência é apoiar Dilma, desde que possamos lançar candidato. Quem pode estragar isso é o PT", afirmou o senador Waldemir Moka (PMDB-MS).

Na Bahia, os irmãos Geddel e Lúcio Vieira Lima lideram um movimento que deve unir o PMDB do Estado aos principais partidos de oposição (PSDB, DEM e PPS) para lançar uma candidatura de oposição ao PT, do governador Jaques Wagner. Os peemedebistas resistem em apoiar a reeleição da presidente e ameaçam criar uma plataforma para Campos ou até Aécio.

"Já aceitamos abrir um palanque duplo para Dilma em 2010, quando Geddel disputou com Jaques Wagner, mas o PT não cumpriu o acordo, No meio da campanha, quando Geddel estava crescendo, a presidente foi pressionada e disse que só tinha um candidato: Jaques Wagner", explica Lúcio Vieira Lima.

No Ceará, o PT está dividido quanto ao apoio ao PMDB. Há uma tentativa de trazer o PSB, do governador Cid Gomes, para a aliança, o que será difícil se Campos for candidato. "Cid e eu somos aliados leais e temos um acordo de conversar até o último momento para escolher o nome que vai encabeçar a chapa", declarou o senador Eunício Oliveira (PMDB), que quer disputar o governo.

Em Pernambuco, o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB- PE) ensaia uma aproximação com Campos contra o PT.

No Piauí, o PMDB pode ficar dividido entre Dilma e Campos. Lá se desenha um confronto entre José Filho (PMDB), com o apoio do PSB, e Wellington Dias (PT). Os peemedebistas juram apoio à presidente, mas admitem reservadamente que farão uma campanha "menos empolgada" para sua reeleição se tiverem um petista como adversário no Estado.

Rio Grande do Sul

A aliança é inviável. PMDB trabalha com dois nomes: José Ivo Sartori (ex-prefeito de Caxias do Sul) ou Germano Rigotto (ex-governador). PT vai tentar a reeleição de Tarso Genro

Rio de Janeiro

Caso mais explícito de conflito. Governador Sérgio Cabral (PMDB) quer o vice, Luiz Pezão, como seu sucessor e já avisou que retira o apoio a Dilma se o PT lançar o senador Lindbergh Farias ao governo estadual

Mato Grosso do Sul

PT pode lançar Delcídio Amaral, nome rejeitado pelo governador André Puccinelli (PMDB), que já apoiou o PSDB na eleição passada

Pernambuco

Liderados por Jarbas Vasconcelos, peemedebistas podem apoiar um nome do PSB no Estado para ajudar a candidatura presidencial de Eduardo Campos (PSB)

Rondônia

PT rompeu com o governador Confúcio Moura (PMDB)

Bahia

Grupo de Geddel Vieira Lima, do PMDB, será oposição ao nome que o atual governador petista, Jaques Wagner, apoiar em 2014

Piauí

PSB pode apoiar o candidato do PMDB, José Filho, contra o petista Wellington Dias

Ceará

O peemedebista Eunício Oliveira quer se lançar ao governo estadual, mas tem o nome rejeitado por parte do PT; ele ensaia uma união com o PSB para ajudar Eduardo Campos e se vingar dos petistas

Paraná

PMDB ameaça apoiar reeleição do governador tucano Beto Richa

Distrito Federal

PT e PMDB sempre foram rivais. Governador petista Agnelo Queiroz tentará a reeleição, provavelmente sem apoio dos peemedebistas

São Paulo

PMDB quer lançar Paulo Skaf; PT terá candidato próprio, possivelmente o ministro Alexandre Padilha (Saúde)

Fonte: O Estado de S. Paulo

Divórcio iminente nos maiores colégios eleitorais

As rusgas do PT com o PMDB em São Paulo e Rio, primeiro e terceiro maiores colégios eleitorais do País, respectivamente, são emblemáticas sobre os problemas da aliança. Os peemedebistas vão deixar o PT de lado e lançar candidato próprio em São Paulo. No Rio, o partido ameaça fechar suas portas para a campanha de Dilma caso o PT lance a candidatura de um adversário ao sucessor do governador Sérgio Cabral, o vice-governador Luiz Fernando Pezão.

"Defendemos o apoio a Dilma, mas queremos reciprocidade no Rio. Não sendo possível, cada um toca sua vida", resume Jorge Picciani, presidente do PMDB fluminense.

Em São Paulo, o PMDB quer reeditar a estratégia de 2012, quando lançou para a Prefeitura o deputado Gabriel Chalita, que terminou em quarto lugar, mas ajudou a formar uma bancada de vereadores. Em 2014, o principal objetivo é fortalecer a bancada de deputados, lançando candidato o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf - Chalita se enfraqueceu após aparecerem denúncias de que a reforma de seu apartamento teria sido paga por empresário da área da educação.

Mas o lançamento de um candidato próprio em São Paulo também atende a setores do PT, para os quais urna disputa com mus candidaturas favorece ria um eventual o 2º turno com o governador Geraldo Alckmin (PSDB). "Dois palanques para Dilma serão importantes para o PT e para o PMDB", disse o presidente do PMDB, Baleia Rossi.

No PT, o principal cotado para disputar o Palácio dos Bandeirantes é o ministro Alexandre Padilha (Saúde). Há quem defenda aliança entre as duas legendas, tendo o PMDB na cabeça de chapa. O PT poderia apoiar o nome do PMDB em São Paulo desde que o partido abrisse mão de Michel Temer na vice de Dilma. O cargo seria ofertado a Eduardo Campos. / B.B. e J.D.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Palanques duplos podem ser a senha para armistício

Apesar das crises que se desenham em Estados como Bahia Rio e Rio Grande do Sul, os peemedebistas manobram para salvar a aliança com o PT em outros locais - seja com a construção de uma candidatura única ou com a montagem de um palanque duplo na base da presidente Dilma Rousseff.

Onde houver disputas entre PT e PMDB, o objetivo é evitar que a divisão local "contamine" a reeleição de Dilma. "Eu vejo com naturalidade as disputas regionais, mas trabalhamos para que elas não contaminem a aliança presidencial e a própria base parlamentar do governo federal", diz o senador Romero Jucá (PMDB-RR), que pode disputar o governo de Roraima contra a petista Ângela Portela, em ambiente favorável para Dilma.

Em Minas, a tendência é que a aliança PT-PMDB seja mantida, em chapa encabeçada pelo ministro Fernando Pimentel (Desenvolvimento). O senador Clésio Andrade (PMDB-MG) defende candidatura própria do partido, com dois palanques para Dilma.

Em Goiás, há expectativa de apoio do PT ao candidato do PMDB, o ex-governador Íris Rezende, ou ao empresário José Batista Júnior, um dos donos do grupo JBS/Friboi. "O acordo no Estado foi o de apoiar o PT em 2012 em cidades como Goiânia e Anápolis em troca do apoio ao governo do Estado em 2014", declarou o deputado Sandro Mabel (PMDB-GO). Também em Mato Grosso a tendência é que a dobradinha seja reeditada. "A aliança está bem encaminhada pela cúpula dos dois partidos", disse o deputado Carlos Bezerra (PMDB-MT).

No Maranhão, a situação está pacificada. "Faremos um palanque único para Dilma", disse o senador Lobão Filho (PMDB- MA). Peemedebistas também acreditam que Dilma terá espaço nos palanques da sigla no Acre, em Alagoas, no Amazonas e em Sergipe./ B.B e J.D

Fonte: O Estado de S. Paulo

Dilma e PMDB discutem a relação

Três caciques peemedebistas têm reunião com Dilma na segunda-feira para tentar remediar a desgastada aliança com o PT. Preocupação envolve os arranjos para as eleições de 2014

Paulo de Tarso Lyra

A presidente Dilma Rousseff receberá a cúpula do PMDB, na segunda-feira, para tentar conter os ruídos e as fissuras do Planalto com o partido. Organizados, os peemedebistas segmentaram a pauta: o presidente da Câmara, Henrique Alves (RN) levará a demanda dos deputados do PMDB; o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), vai expor as queixas dos senadores do partido; e o vice-presidente Michel Temer detalhará os problemas com a legenda.

Nos estados, Dilma e o PT terão que trabalhar para a aliança não ruir em diversos locais. Na Bahia, no Mato Grosso do Sul, no Rio Grande do Sul e no Paraná, são grande os riscos de que a chapa nacional seja contaminada pela montagem dos palanques estaduais. No Rio, o governador Sérgio Cabral (PMDB) não se cansa de emitir sinais de que a presidente terá problemas para garantir a vantagem na corrida presidencial.

Há duas semanas, em jantar com o próprio Temer e demais governadores peemedebistas, Cabral classificou a existência de dois palanques para Dilma no estado — de Luiz Fernando Pezão (PMDB), candidato do atual governador e de Lindbergh Farias, provável candidato do PT — como esquizofrênica e ameaçou se aproximar do presidenciável tucano, Aécio Neves. Ambos compartilham, inclusive, os trabalhos do marqueteiro Renato Pereira. Ontem, Cabral minimizou a crise. “Em ano ímpar, eu não discuto eleição. O apoio à presidente Dilma é total e absoluto. Não há semana em que eu não fale com um ministro e com a própria presidente,” disse.

Renan também não quis aumentar a crise. Para ele, a relação do PMDB com o governo e com o PT é “normal”. “As tensões são comuns na democracia e é preciso aprender com elas”, declarou. Ele voltou a defender a não leitura da MP 605, que criaria um fundo para compensar as perdas das concessionárias de energia com a redução da conta de energia. A proposta foi transferida para a MP 609, que ainda será votada.

Bagunça

O PMDB quer dividir a responsabilidade da bagunça em que se transformou a relação do Planalto com a base aliada. Na quarta-feira, Henrique Eduardo Alves defendeu que o governo encontrasse o problema na articulação política. “Não é possível que, com uma base de 420 deputados, não se tenha conseguido colocar 257 para garantir o quórum para uma votação importante na segunda-feira à noite (MP do setor elétrico)”, reclamou Alves.

Para integrantes da cúpula do PMDB, o governo não tem competência para controlar a própria base e “joga a culpa no colo de Renan e no de Henrique Alves”. Aliados dos dois peemedebistas lembram que Renan assumiu o desgaste de aprovar a MP dos Portos no mesmo dia em que ela chegou ao Senado e que Henrique esperou 2 horas e 50 minutos para tentar garantir quórum e votar a MP 605.

No partido, a maioria dos peemedebistas defende a reeleição da presidente Dilma, apesar das defecções naturais em alguns estados, como Bahia, Pernambuco, Paraná, Mato Grosso do Sul, além da crise instalada no Rio. “Mas é preciso afinar o discurso para que esse cenário não deteriore mais ainda”, disse um cacique da legenda ao Correio.

Desgaste no poder

O PMDB foi convidado pelo PT a integrar a chapa presidencial em 2010 para engordar o tempo de televisão de Dilma Rousseff. Mas os peemedebistas nunca foram bem-vistos no condomínio do poder. O primeiro atrito ocorreu na composição ministerial. Dilma deu à legenda pastas de menor orçamentário. Desde então, a relação entre as siglas viveu momentos de paz — como na convenção que reconduziu Temer ao comando partidário — e de brigas, incluindo votações de matérias importantes no Congresso.

Colaborou Amanda Almeida

Fonte: Correio Braziliense

Segunda versão: 'Meu apoio a Dilma é total e absoluto', diz Cabral

Governador minimiza crise com PT no Rio e condena "especulação"

Renata Leite

Ao lado do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, do PT, o governador do Rio, Sérgio Cabral, do PMDB, minimizou ontem a crise envolvendo os dois partidos no estado. Segundo Cabral, o apoio à reeleição da presidente Dilma nas eleições em 2014 é "total e absoluto".

- Meu apoio à presidente Dilma é total e absoluto. Nosso governo está totalmente integrado. Não há semana em que eu não fale com os ministros da presidente Dilma e com a própria ministra (sic) Dilma. O resto é especulação - declarou Cabral, durante inauguração do Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), no Centro do Rio.

Em jantar com o vice-presidente Michel Temer, do PMDB, na semana passada, em Brasília, Cabral disse que não apoiará a reeleição de Dilma se o PT mantiver a candidatura do senador Lindbergh Farias ao governo do estado. Cabral apoia o vice-governador Luiz Fernando Pezão, do PMDB. No encontro, o governador citou até sua relação pessoal com o senador Aécio Neves, pré-candidato do PSDB contra Dilma, para sugerir que poderia seguir outro caminho em 2014.

- Não é bem assim que a gente não tenha alternativa. O nome do meu filho é Marco Antônio Neves Cabral - afirmou.

Marco Antônio é filho do primeiro casamento do governador, com Suzana Neves, que é parente de Aécio.

Fonte: O Globo

Campos age para conter críticos no próprio partido

Governador de Pernambuco sela acordo de cessar-fogo com Ciro Gomes

Objetivo é reduzir exposição pública de divergências sobre candidatura presidencial em 2014

Natuza Nery

BRASÍLIA - O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, selou um acordo de cessar-fogo com o ex-ministro Ciro Gomes, o integrante do PSB que até agora expressou de forma mais contundente sua discordância com o projeto de Campos de disputar a eleição presidencial do próximo ano.

Em um longo jantar no Recife no domingo passado, os dois correligionários discutiram suas divergências e fizeram um pacto para só definir no ano que vem se o partido terá ou não um nome próprio na corrida presidencial.

Enquanto o governador de Pernambuco trabalha com a hipótese de concorrer ao Palácio do Planalto, Ciro e seu irmão, o governador do Ceará, Cid Gomes, declaram apoio público à reeleição da presidente Dilma Rousseff.

Ciro declarou seu apoio a Dilma novamente no jantar no Recife, mas deixou portas abertas para eventualmente rever sua posição no futuro.

Segundo a Folha apurou, os dois combinaram de conversar mais. Campos pediu que Ciro, que foi ministro da Integração Nacional no governo do ex-presidente Luiz Ináico Lula da Silva e de quem foi próximo no passado, lidere no PSB debates sobre a economia e discuta alternativas para tirar o país do ciclo de baixo crescimento.

Na política, os dois reclamaram da dependência de Dilma em relação ao PMDB, o parceiro preferencial da coalizão governista. Essa relação, aliás, sempre foi criticada pelo cearense.

Ambos conversaram a sós e "desarmados", conforme definiu um integrante da legenda. E Ciro não apresentou resistência a um possível desembarque da Esplanada. Segundo relatos, ele repetiu uma tese antiga: o PSB pode ajudar na governabilidade sem cargos no governo.

Um acordo de paz, mesmo que transitório, é positivo para o pernambucano. Primeiro, porque ajuda a afrouxar a tensão interna no PSB. Segundo, porque tira o correligionário do grupo que expõe, de maneira crítica, divisões internas. Ciro é conhecido pelo estilo mordaz de falar.

A conversa de domingo, até pouco tempo atrás considerada improvável, ocorre num momento em que governadores do partido e o próprio ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, indicado por Campos para o governo, expressam apoio à reeleição de Dilma.

O jantar no Recife ocorreu por iniciativa do pernambucano, após um emissário telefonar para sondar se haveria consentimento de Ciro Gomes. Minutos depois, o convite foi formalizado.

A distância entre os dois ficou nítida em 2010, quando Ciro teve sua candidatura à Presidência retirada pelo PSB. Na ocasião, a sigla preferiu ficar com a candidata indicada pelo presidente Lula. Hoje é Campos quem ensaia voo solo e enfrenta a resistência dos irmãos Gomes.

Incômodo

Enquanto se esforçam para aliviar as tensões internas, defensores da candidatura de Eduardo Campos não escondem o incômodo com o que chamam de "governismo" do vice-presidente nacional da legenda, Roberto Amaral.

O mal-estar começou em fevereiro, quando o dirigente foi à festa de 10 anos do PT e fez elogios ao governo federal num discurso. Depois, intensificou-se em março, após o dirigente confirmar presença em outra festa petista, no Ceará, terreno considerado inimigo naquele momento.

A reação foi tão forte que Amaral cancelou a viagem. Mas as queixas persistiram. Aliados de Campos dizem que o vice tem feito restrições a uma chapa para 2014 que não seja puramente de esquerda, o que inviabilizaria a formação de uma aliança competitiva, com mais tempo de TV.

"Sou a favor da candidatura própria e o nome que unifica é o de Eduardo", disse Amaral à Folha. "Não ajuda nada meu partido ficar remexendo essas coisas. Sou o mais entusiasta da candidatura própria."

Fonte: Folha de S. Paulo

Eduardo abre guerra aos laboratórios

Débora Duque

As queixas constantes sobre a falta de medicamentos nas farmácias públicas estaduais levaram o governo do Estado a abrir, há um mês, uma "guerra" contra laboratórios e distribuidoras. Pesa sobre ambos a acusação de "cartelização" e "boicote" às licitações para a compra de remédios lançadas pela secretaria Estadual de Saúde. Ontem, o governador Eduardo Campos (PSB) se pronunciou, pela primeira vez, sobre o assunto e disse que o "jogo", que penaliza pacientes dependentes do fornecimento gratuito desses produtos, é "articulado", "irresponsável" e "criminoso".

A denúncia já foi levada ao Ministério Público e motivou a abertura de um inquérito investigativo sob o comando da promotora Helena Capela. As dificuldades na aquisição de medicamentos também foi pauta do terceiro encontro de secretários estaduais do Nordeste, realizado no dia 16 de maio.

"Estamos promovendo uma ação mais articulada, reunindo todos os secretários de Saúde e mostrando que essa é uma atitude criminosa, irresponsável. Esse tipo de cartel agride a legislação brasileira e deve ser enfrentado pelo poder público", afirmou Eduardo. Ele disse ainda que os órgãos jurídicos e de controle devem penalizar laboratórios e distribuidoras que, de modo "articulado", fazem um "jogo de bandido".

O argumento do governo é de que as empresas não têm participado dos processos licitatórios. E, quando se habilitam, costumam apresentar preços acima do limite cotado pela Secretaria de Saúde. A prática, segundo a versão oficial, termina por forçar a realização de contratações de caráter emergencial, que costumam sair por um custo ainda mais elevado. "Começamos a fazer um monitoramento semanal do abastecimento de remédios e percebemos que o problema não era administrativo. Tínhamos orçamento, fazíamos a licitação com antecedência e ainda assim não conseguíamos comprar os remédios. Isso é uma questão muito grave e coletiva. Outros Estados do Nordeste passam pela mesma dificuldade", justifica a secretária-executiva de Saúde, Ana Paula Sóter.

Levantamento feito pela secretaria indica que dos 1.740 tipos de medicamentos licitados em 2012, 663 (40%) não puderam ser comprados porque as licitações foram esvaziadas. Em 2013, já foram feitos certames para aquisição de 391 tipos remédios, mas 123 deles (31,46%) não foram obtidos pelo mesmo motivo. Além da punição às empresas que integram o cartel, o governo, em conjunto com demais Estados do Nordeste, pleiteiam que haja uma tabelização dos preços dos medicamentos.

Fonte: jornal do Commercio (PE)

PSDB em transição - Fernando Rodrigues

O PSDB entra na disputa pelo Palácio do Planalto em 2014 de maneira inédita em sua história.

Pela primeira vez os tucanos terão um candidato que não é de São Paulo nem fez carreira nesse Estado. Sempre prevaleceram os políticos paulistas: Mário Covas (1989), FHC (1994 e 1998), José Serra (2002 e 2010) e Geraldo Alckmin (2006).

Covas disputou no sacrifício em 1989, com um partido criado no ano anterior. FHC (nascido no Rio, mas com carreira em São Paulo) surfou no Plano Real e na máquina federal. Daí para a frente, houve uma luta intensa entre as diversas seções regionais do PSDB. Os paulistas prevaleceram, embora sempre chegando depauperados para a disputa.

Em 2002, Serra entrou para valer no páreo só no ano da eleição. Tinha fortes adversários internos, como Paulo Renato e Tasso Jereissati. Aécio Neves também jogava contra. E o governo FHC estava atolado em baixa popularidade.

Em 2006, Alckmin só virou candidato de fato em abril. Não teve a ajuda dos tucanos quando no Nordeste corria solto o boato de que o PSDB iria acabar com o Bolsa Família. O partido estava completamente rachado.

Em 2009, Serra e Aécio disputaram palmo a palmo a vaga de candidato. Quando o cenário pendeu para Serra, já em 2010, o PSDB de novo estava fragmentado e sem coesão.

Desta vez, o mineiro Aécio Neves terá o que ninguém teve no passado dentro da legenda pós-FHC. Está com a máquina nacional do partido na mão. Usou quase sozinho o tempo de TV e de rádio do PSDB em maio. Fez como quis a propaganda, na qual foi a estrela maior.

Faltam ainda os acertos regionais, alianças locais e um discurso mais atraente. E o mais importante de tudo: os eleitores dispostos a mudar o comando do país. Não é fácil, embora Aécio esteja nesta largada melhor do que o PSDB esteve nas últimas três eleições.

Fonte: Folha de S. Paulo

As forças retrógrado-petistas - Miguel Reale Júnior

Em maio de 2011 foi apresentada no Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional nº 33 (PEC 33), de iniciativa do deputado Nazareno Eonteles (PT-PI). Por essa emenda se impõe grave restrição ao poder jurisdicional do Supremo Tribunal Federal (STF) como forma de combater o "ativismo judicial". Na justificativa da emenda afirma-se que o STF, sem legitimidade eleitoral, passou a ser um legislador ativo, pois, indo além da solução do caso concreto, cria normas invadindo a atribuição reservada aos parlamentares, os únicos legisladores.

A PEC 33 ficou em "banho-maria" por mais de ano e meio, 1 tendo sido apresentado na Co- j missão de Justiça parecer favorável à sua admissibilidade apenas em dezembro de 2012 e reconhecida sua constitucionalidade em abril do corrente ano, com publicação da decisão 15 dias atrás.

Dois fatores foram desencadeadores da agilização do procedimento para apreciação da PEC: o julgamento do mensalão e a sustação liminar da tramitação do projeto de lei, aprovado na Câmara dos Deputados, impondo limitação ao uso do Fundo Partidário e do tempo de televisão aos novos partidos a serem constituídos.

Merece ser ressaltado o conteúdo autoritário das duas propostas legislativas, que tem em comum pretender limitar o exercício da democracia, um submetendo o Judiciário ao Legislativo, o outro criando insegurança à ida de parlamentares para um novo partido, com efeito imediato durante a própria tramitação, uma forma insidiosa de estrangular o surgimento de agremiações, garantindo-se, de outro lado, maior tempo de televisão aos partidos da base governista, como forma de se tentar perpetuar no poder a coligação entre políticos retrógrados e petistas que domina o País.

Cabe, então, uma breve a análise do teor desses dois projetos. A Proposta de Emenda Constitucional n.° 33/11 constitui uma verdadeira aberração: primeiramente, pretende-se garantir a intocabilidade das leis consideradas inconstitucionais pela maioria dos ministros do STF, pois a Constituição passaria a exigir para decretação da inconstitucionalidade das leis que esse reconhecimento fosse feito por quatro quintos dos ministros do STF. Assim, apenas se 9 dos 11 ministros entenderem a lei inconstitucional será ela assim reconhecida. Sc 8 ministros considerarem inconstitucional a norma, esta permanecerá eficaz, pois sua inconstitucional idade foi reconhecida "apenas" por três quartos dos ministros. Dessa forma se pretende instalar a supremacia do Legislativo, cujas afrontas à Constituição devem ser perenizadas autorizando-se que lei, reconhecida inconstitucional pela maioria do STF, permaneça intangida.

Em outro artigo, a proposta de emenda generosamente permite ao STF criar súmula, também por quatro quintos dos seus membros, mas que somente terá força vinculante se tal efeito lhe for outorgado pelo Congresso Nacional. Recebida a comunicação de prolação da súmula pelo STF, o Congresso terá prazo de 90 dias para deliberar, em sessão conjunta, por maioria absoluta, sobre o seu efeito vinculante.

Assim, em matéria de cunho eminentemente jurisdicional como o relativo à interpretação de norma constitucional tributária, o entendimento, mesmo de quatro quintos do STF, apenas terá força vinculante para a administração pública se o Congresso entender de atribuir a tal enunciado esse efeito. A decisão técnico-jurídica do STF, fruto de decisão de quatro quintos de seus membros, ficará, então, sujeita ao crivo do Congresso Nacional, o único que, em sua suprema onisciência, poderá ou não dar força vinculante a uma súmula.

Em outro dispositivo se chega a mais um absurdo: se o STF reconhecer a inconstitucionalidade de uma emenda constitucional, como essa mesmo, por exemplo, tal decisão não terá efeitos imediatos, mas dependerá de apreciação do Congresso, que julga o julgamento cio STF. Se o Congresso rejeitar a decisão do STF, a matéria será objeto de consulta popular, um plebiscito, para que o povo diretamente avalie se a emenda constitucional é constitucional ou inconstitucional, se deve ou não ter eficácia. Avilta-se o STF em favor de um populismo perigoso ao se submeter questão técnica de inconstitucionalidade á apreciação da população!

De outra parte, o Projeto n.° 4.470/2012, já aprovado na Câmara dos Deputados, torna impossível a transferência dos recursos do Fundo Partidário e do horário de propaganda eleitoral no rádio e na televisão proporcionalmente ao número de deputados que venham a integrar o novo partido, com isso desestimulando a migração de parlamentares para agremiações em formação.

Com toda a razão se argumenta que o projeto leva ao esvaziamento do direito fundamental à livre criação de partidos e do pluralismo político, em ofensa ao já decidido pelo STF em ação direta de inconstitucionalidade, a ADI 4.430.

Assim, diante do perigo iminente de dano à liberdade política, o ministro Gilmar Mendes deu liminar para sustar a tramitação do projeto, cujos efeitos nefastos já se faziam presentes. Foi o bastante para se espalhar a revolta dos parlamentares governistas em nome de um "espírito de corpo", para chamar às falas a "honra" do Congresso, pois o STF teria interferido na apreciação de projeto ainda em votação, intrometendo-se no curso do processo legislativo.

Cabe ver, contudo, que o efeito pretendido pela maioria governista de intimidar colegas a não se transferirem para novas agremiações já se estava consumando no decorrer do processo legislativo, garantindo-se, pela mera ameaça, o garroteamento de novos partidos e a satisfação da fome de poder das ; forças retrógrado-petistas.

Esse quadro autoritário, fruto da aliança dos chefetes desde; ontem com a corporação petista instalada na burocracia, é próprio dos atuais donos do poder.

Advogado, professor titular da Faculdade de Direito da USP. Membro da Academia Paulista de Letras, foi ministro da Justiça

Fonte: O Estado de S. Paulo

São as eleições - Ivan Iunes

A antecipação do debate eleitoral torna a paz entre aliados, neste momento, desinteressante. Corda tensionada, o poder de barganha se multiplica

Com a oposição extremamente enfraquecida, especialmente depois da diáspora promovida pela criação do PSD, era questão de tempo a transformação da própria base aliada em principal adversária do Palácio do Planalto. Um tempo eleitoral, claro. Com uma base estimada em cerca de 420 deputados, a presidente da República, Dilma Rousseff, deveria ter facilidade para aprovar o que bem entendesse. Nos primeiros anos de governo, noves fora questões de forte cunho ideológico, como a reforma no Código Florestal, o Planalto aprovou o que bem entendeu, enterrou as comissões parlamentares de inquérito (CPIs) que quis e reteve ao máximo o pagamento de emendas parlamentares. Até mesmo a principal pedra no sapato do Orçamento, a definição do salário mínimo, foi removida com uma fixação prévia do índice de reajuste até o fim do governo.

Tudo ia relativamente bem até que... bem. Até que o período pré-eleitoral foi antecipado. Na disputa presidencial, Dilma parece ter diminuído a disposição para um voo solo do aliado e governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). O problema é que a movimentação se estendeu, quase que por inércia, às definições estaduais. E elas estão ligadas, diretamente, à atual crise na base aliada. Muito do mantra repetido por peemedebistas e petistas “falta diálogo do Planalto com a base” tem como objetivo manter a relação entre base e governo federal sob tensão.

Existem problemas sérios de diálogo, é verdade, mas a antecipação do debate eleitoral torna a paz entre aliados, neste momento, desinteressante. Corda tensionada, o poder de barganha se multiplica. Sem se esquecer dos interesses individuais, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também cria dificuldades a rodo na Câmara dos Deputados de olho na corrida fluminense, onde o governador, Sérgio Cabral (PMDB), tenta a todo custo evitar que Lindbergh Farias (PT-RJ) entre na disputa contra Luiz Fernando Pezão (PMDB). A cada entrevista concedida, Cunha promete transformar o plenário da Casa Baixa em um campo minado para Dilma. Deixa, assim, um grau de tensão suficiente para colocar em dúvida os benefícios do Planalto em se manter como fiador da campanha de Farias.

Os petistas adotaram estratégia semelhante e o presidente do partido, Rui Falcão, deixou claro que a legenda também merece atenção na costura. O político paulista repetiu o “falta articulação política ao governo”. O recado é claro: se ceder demais ao PMDB nas definições estaduais, o Planalto que se prepare para encarar no PT um adversário no Congresso. A falta de quórum para votar a Medida Provisória da Energia na segunda-feira é mais uma demonstração de que peemedebistas e petistas pretendem jogar com a tensão entre base e governo para colher vantagens nas alianças estaduais em 2014. Na prática, a MP caducar na próxima segunda-feira não significaria problema algum ao governo. Como o texto foi editado no ano passado, poderia ser repetido em nova MP, que passaria a valer a partir de terça-feira, sem deixar lacunas para o consumidor no desconto da conta de luz. A mesma manobra foi utilizada a rodo pelos governos de Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva. Simbolicamente, no entanto, o governo não conseguir levar sua base aliada numa segunda-feira ao Congresso representa demais. Um tensionamento medido a régua para não provocar rupturas.

Não é apenas a disputa no Rio de Janeiro que acende o pavio no parlamento. A situação não é menos tensa no Rio Grande do Sul, onde o PMDB lançará candidato contra o governador Tarso Genro (PT). Nos maiores estados ao sul do país, os dois partidos ainda serão adversários no Paraná, com Roberto Requião (PMDB) e Gleisi Hoffmann (PT), e, provavelmente, em São Paulo, estado em que os nomes das duas legendas ainda estão indefinidos. Em Pernambuco, a chance de uma chapa única também é próxima de zero, mesma realidade da Bahia. No Nordeste, ainda caberá aos petistas cederem espaço para os principais caciques peemedebistas, em Alagoas, com Renan Calheiros; e no Maranhão, com a sucessão de Roseana Sarney. Da mesma forma, Amazonas é um estado onde Eduardo Braga (PMDB) deve contar com o apoio petista, e no Pará e no Ceará, Jader Barbalho e Eunício Oliveira, respectivamente, também pressionam por apoio. Os peemedebistas se preparam para devolver a “gentileza” no Acre, com apoio a Tião Viana, e no Distrito Federal, com Agnelo Queiroz. A lógica em todas essas disputas, tanto para petistas quanto para peemedebistas, é tentar eliminar o adversário/aliado já no ponto de partida e garantir a exclusividade de Dilma e de Lula no palanque. Onde isso não for possível, que o Palácio do Planalto se comprometa à neutralidade. Ficar em cima do muro, contudo, é uma posição que Dilma não conseguirá tomar até a formatação final das alianças, em meados do ano que vem. Até lá, que não espere facilidade.

Fonte: Correio Braziliense

Sede de indignação - Cristovam Buarque

O presidente do STF teceu duras críticas aos representantes do povo e o povo aplaudiu, não viu como uma ameaça às instituições democráticas, ao contrário, ampliou sua admiração pelo ministro Joaquim Barbosa. A razão é simples: ele mostrou indignação, exatamente o que sempre tem faltado na política brasileira.

A reforma política que o Brasil precisa só ocorrerá quando os brasileiros sentirem indignação com os "partidos de mentirinha" e demais deficiências do nosso sistema político apontadas pelo ministro Barbosa.

Por séculos convivemos sem indignação com o absurdo da escravidão, inclusive de antepassados do ministro. A ideia da abolição só começou a se espalhar quando seus defensores passaram ao povo o sentimento de indignação moral contra a escravidão. Enquanto os argumentos eram econômicos - "o trabalho livre é mais inteligente e produtivo" - ou ideológicos ("a escravidão não é condizente com o espírito da época"), a abolição não era entendida, nem sentida, não indignava. Quando o discurso passou a ser ético, apresentando a escravidão como uma vergonha nacional, o assunto passou a crescer, até prevalecer.

Na Inglaterra, o grande abolicionista William Wilberforce reconheceu que a ideia da abolição só cresceu quando ele e seus companheiros de luta saíram do discurso lógico e provocaram indignação popular contra a escravidão. A abolição foi o resultado da força moral que surgiu da indignação.

Assim também não adiantam apenas argumentos lógicos para justificar a necessidade da abolição do analfabetismo - a escravidão do século XXI; é preciso que os brasileiros sintam indignação com o fato de que para abolir o analfabetismo só precisamos de R$ 1,6 bilhão ao ano, por apenas quatro anos, de uma renda nacional de R$ 4,5 trilhões, empregando por dez horas semanais apenas 125 mil dos atuais 1,6 milhão de universitários que estudam com financiamento público.

Só agiremos quando sentirmos vergonha por não podermos colocar, em 2014, em frente de cada aeroporto, uma placa dizendo: "Você está entrando em um território livre do analfabetismo." Da mesma forma, não basta dizer e mostrar que o Brasil não tem futuro, na economia ou na sociedade, se não colocarmos todas nossas crianças em escolas com a mesma máxima qualidade. É preciso indignar-se com a falta de qualidade e com a desigualdade da educação. Os argumentos lógicos fracassaram, é a vergonha de não despertar o espírito nacional para resolver o problema.

Houve um tempo em que precisávamos de consciência, agora precisamos de raiva e vergonha. Por isso, o presidente do STF é capaz de enfraquecer a independência dos Três Poderes ao denunciar os partidos, os congressistas e, portanto, o Congresso Nacional, e mesmo assim ser aplaudido. Mesmo sendo verdadeiras as declarações, os aplausos não se justificariam do ponto de vista lógico das instituições democráticas, mas se explicam moralmente: o povo está com sede de indignação.

Cristovam Buarque, senador (PDT-DF)

Fonte: O Globo

Pouco tempo para salvar um governo - Ralf Kuntz

A presidente Dilma Rousseff está arriscada a completar o seu mandato com um balanço sinistro, um crescimento econômico próximo de 24% ao ano, em média. Será esse o resultado se o produto interno bruto (PIB) avançar 2,5% em 2013, por enquanto uma projeção otimista, e 3,5% em 2014. Será um desempenho bem inferior à media mundial - 3,6%, segundo estimativa do Fundo Monetário Internacional (FMI) - e muito distante dos 5,6% esperados para os países emergentes e em desenvolvimento. Mas a estagnação poderá ser, e quase certamente será, apenas um dos componentes mais feios do quadro brasileiro se o rumo da política for mantido. As contas públicas estarão mais desajustadas, o balanço de pagamentos, mais esburacado, a inflação, distante da meta, e a imagem do País, prejudicada no mercado internacional.

Não só os brasileiros perceberam a maquiagem fiscal: "medidas contábeis para atingir a meta de superávit primário reduziram a transparência", segundo relatório publicado na quarta- feira pela Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), o clube dos países desenvolvidos e de alguns emergentes de boa reputação.

Boa imagem é essencial para um país com déficit em conta corrente já na casa de 3% do PIB e com perspectiva de aumento. Não se mede reputação só pela capacidade do Tesouro de captar dinheiro no exterior, principalmente quando paga juros muito mais altos que os do mercado internacional. Mede-se também pelo ingresso do investimento estrangeiro direto, insuficiente, a partir de março e abril, para cobrir o buraco nas transações correntes. Investimento direto tende a ser menos especulativo e mais seguro para as contas externas do que outras formas de financiamento. Alem disso, representa, em geral, um compromisso de longo prazo com a economia do país receptor.

Em sua última projeção das contas externas, o Banco Central (BC) estimou para este ano um déficit e m conta corrente de 2,78% do PIB e um saldo de investimento direto equivalente a 2,69%, pouco menor que o necessário. Mas o cálculo inclui um superávit comercial de US$ 15 bilhões, pouco provável, nesta altura. O saldo da conta corrente é a soma dos resultados da balança comercial (mercadorias) , da balança de serviços (viagens, fretes, juros e lucros, entre outros itens) e das transferências unilaterais (remessas de trabalhadores, por exemplo).

O desequilíbrio entre importações e exportações de bens diminuiu nas últimas semanas, mas o déficit acumulado no ano até 26 de maio ainda ficou em US$ 4,6 bilhões. O número final do mês deve ser divulgado nos próximos dias. Se o buraco até o fim de maio mês tiver encolhido para US$ 4 bilhões, será necessário um superávit mensal de US$ 2,7 bilhões até dezembro para alcançar o saldo projetado pelo BC. Em estimativa divulgada na quarta-feira, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) reduziu de US$ 12 bilhões para US$ 7,7 bilhões o excedente comercial esperado para 2013.

É preciso algum otimismo, portanto, para prever, como o BC, um déficit de apenas US$ 67 bilhões na conta corrente. Não há risco iminente de uma crise cambial, mesmo com um rombo proporcionalmente maior no próximo ano. O País dispõe de reservas de moeda estrangeira superiores a US$ 370 bilhões (US$ 374,8 bilhões no dia 28). Isso oferece alguma segurança. Nenhum volume de ouro, dólares ou euros pode substituir, no entanto, uma política sensata e uma evolução saudável das contas externas. Reservas são finitas e os financiadores fogem tanto mais velozmente quanto mais o país precise de dinheiro de fora.
Qualquer brasileiro familiarizado com a história das grandes crises nacionais deveria saber disso. Negligenciar o balanço de pagamentos tende a ser desastroso, exceto quanto o país tem o privilégio de imprimir dólares e sua economia é a maior e a mais forte do mundo. No caso do Brasil, o erro mais grave é descuidar do comércio de bens, porque o déficit da conta de serviços é normalmente muito amplo e assim será por muito tempo.

Entre janeiro e março a exportação de bens e serviços foi 6,4% menor que nos três meses finais de 2012. A importação, 6,3% maior. O resultado dessa conta foi um dos grandes componentes negativos do PIB do primeiro trimestre. Esse déficit é explicável em parte pelo câmbio valorizado, mas o governo deveria dar maior atenção a outros fatores, mais característicos do País e mais importantes a longo prazo.

Não é preciso repetir a lista dos mais graves problemas de competitividade (bastaria lembrar a tributação irracional, a escassez de mão de obra qualificada e a logística deficiente). Além disso, o desajuste cambial é explicável, em boa parte, por um erro inteiramente made in Brazil, a prolongada tolerância à inflação. Também isso afeta a relação entre o real e as principais moedas do comércio internacional. Mas raramente algum empresário cobra do governo maior esforço contra a alta de preços ou contra a gastança, um dos principais fatores inflacionários.

O Executivo federal apenas começou, muito lentamente, o combate aos desajustes internos. A nova Lei dos Portos é um raro exemplo de acerto. Em contrapartida, as desonerações, mal concebidas e amplamente improvisadas, são ainda os componentes principais do arsenal da política econômica, apesar de sua comprovada ineficiência. Além disso, o compromisso com a seriedade fiscal é cada vez mais frouxo. Não se discute mais, em Brasília, se o governo será capaz de alcançar a meta, mas se usará ou deixará de usar toda a lista, cada vez mais ampla, de redutores do superávit primário. Contra esse fundo, a decisão do BC de levar a sério a inflação e acrescentar meio ponto porcentual à taxa básica de juros tem um brilho especial. Obstáculos muito maiores que os juros entravam o crescimento./ Jornalista

Fonte: O Estado de S. Paulo

Déficit público vai a R$ 132,2 bi e é o 2º pior da história

A combinação de aumento de gastos? arrecadação em baixa e inflação em alta elevou o déficit público para RS 132,2 bilhões nos 12 meses encerra¬dos em abril. É o segundo pior valor das estatísticas do Banco Central.

Esse déficit, chamado nominal, é o que faltou para zerar a diferença entre a conta de juros, que foi de R$ 218 bilhões no mesmo período, e o dinheiro economizado por União, Estados e municípios para pagar a dívida pública - o chamado superávit primário, que ficou em R$85,8 bilhões.

Mesmo com a redução da taxa básica de juros (Selic) iniciada em 2011, os gastos com juros da dívida pública se mantiveram praticamente estáveis. Isso porque alguns títulos que compõem o endividamento são antigos e foram emitidos com ças elevadas. Além disso, há papéis cujo valor é corrigido conforme a inflação, que tem se mantido alta desde 2010.

Ao mesmo tempo, o superávit primário continua em trajetória de queda, por causa da atividade mais fraca da economia e das medidas de aumento de gastos e redução tributária para alguns setores. Em 2013, a eco¬nomia do setor público deve ficar novamente abaixo de 3,2% do Produto Interno Bruto (PIB), nível que serviu de meta nos últimos anos.

Nos 12 meses encerrados em abril, por exemplo, a economia é de 1,89% do PIB e as previsões do mercado são de queda para um nível ainda menor neste ano. Nas estatísticas do BC, porcentuais abaixo disso só foram registrados no segundo semestre de 2009, em plena crise.

Segundo o BC, o superávit primário tem mostrado tendência de baixa este ano. No primeiro quadrimestre, a economia do setor público recuou 32% ante o mesmo período de 2012, para R$ 41 bilhões. Os gastos com juros praticamente dobraram, com valor recorde de R$ 80,3 bilhões. Com isso, o déficit das contas públicas somou R$ 39,2 bilhões entre janeiro e abril, também o maior valor da série histórica iniciada em 2001.

0 chefe adjunto do Departa¬mento Econômico do BC, Fernando Rocha, afirmou que a trajetória do superávit primário 110 ano é de redução e destacou que a economia feita em abril, de R$ 10,3 bilhões, é o pior resultado para o mês desde 2004. Sazonalmente, abril é um mês de resultados bons, pois é um período de ingresso de receitas com Imposto de Renda (IR), pessoa física e jurídica.

Questionado sobre a piora nas contas públicas, afirmou que esse é um indicador que fora da área de controle do que é responsável apenas por medir o resultado. Na semana passada, o presidente da instituição, Alexandre Tombini, afirmou que o a política fiscal hoje é expansionista, ou seja, funciona neste momento como estímulo à demanda.

Antes da crise de 2008, o bom momento da economia levou o déficit público ao menor nível da história, 1,35% do PIB para um período de 12 meses. Hoje, o rombo nas contas de União, Estados e municípios está em 2,92% do PIB. Para Felipe Salto, da consultoria Tendências, a deterioração observada nos números do setor público soma-se à piora nas contas externas do País, que também apresentam déficit próximo de 3% do PIB.

“Os resultados fiscais e de contas externas do primeiro quadrimestre, portanto, são negativos para o cenário de cresci¬mento e apontam para a redução das possibilidades de variações reais minimamente eleva¬das para a atividade econômica doméstica a médio prazo. Dificilmente, será possível levar à frente um modelo que se baseou, de maneira equivocada, em expansão do crédito e do consumo doméstico (público e privado).”

Dívida. O superávit primário menor também contribuiu para interromper o processo de queda da dívida líquida do setor público, que atingiu o menor nível da história recente em maio do ano passado (35% do PIB) e vem se mantendo desde então acima. O BC estima, no entanto, que o indicador tenha fechado maio de 2013 com novo recorde de baixa, queda provocada pela alta do dólar no mês, o que puxa a dívida líquida para baixo.

Fonte: O Estado de S. Paulo

Uma viagem pelo Nordeste atual guiada pela obra de Graciliano Ramos

O tempo tem um ritmo próprio...

André Miranda

Alimento. Diante da seca arrasadora que já matou boa parte do gado, fazendeiros do agreste alagoano recorrem ao resistente mandacaru para alimentar os rebanhos, mesmo sabendo que os espinhos do cacto podem ferir os animais

O tempo tem um ritmo próprio no sertão de Alagoas. O matuto Manoel Gardino, um senhor de 83 anos, analfabeto, atualmente sem trabalho, com pouca comida e quase sem água, explica o que faz durante o dia: "Ué, vou ficando aqui", diz, caçoando da pergunta, para ele sem muito sentido. O tempo de 2013 parece o mesmo de quando o alagoano Graciliano Ramos se estabeleceu como um dos principais romancistas brasileiros. Seus textos trataram das mazelas da seca, das armações políticas, das relações sociais no campo e na cidade e da capacidade do brasileiro de perseverar.

O que mudou? A seca deste ano foi a pior das últimas cinco décadas e tem deixado marcas difíceis de curar na população. No campo, famílias ainda vêm sendo desfeitas pelo fenômeno do êxodo rural, com adolescentes deixando pais e mães em busca de sonhos nem sempre possíveis nas grandes cidades do litoral ou ao sul do país.

A obra de Graciliano é tão atual quanto a esperança dos muitos matutos de seus livros. É o que mostram histórias coletadas numa viagem de dez dias por Alagoas e Pernambuco, feita em abril, um percurso através das trajetórias dos reais e fictícios Fabianos, o protagonista de "Vidas secas", romance fundamental do escritor.

"Procuro recordar-me dos verões sertanejos, que duram anos. Dificilmente poderia distinguir a realidade da ficção".
Trecho de "Angústia" (1936), de Graciliano Ramos

Não há muitas sombras nas estradas do interior de Alagoas. Mal há vegetação. Com os espinhosos mandacarus, que resistem à seca, e as árvores sem folhas que estão por toda a parte, a paisagem é um grande deserto.

O estado do gado também torna a visão mais árida. Sem comida e sem água, bois e vacas emagrecem, muitos morrem. Os fazendeiros costumam amarrar os animais mais fracos a cercas ou caules de árvores para evitar que eles caiam. É uma tentativa de adiar a morte, de evitar que o clima imponha sua força. Aos poucos, os mugidos silenciam, as carcaças se acumulam, a vida se vai. Porém, entre os rios sem água, os animais mortos estirados no solo e as plantas cinzentas, ressecadas, a imagem que mais chama atenção é mesmo a da desolação humana. O homem não consegue viver sem os rios, sem os bois, sem a terra. Só que ele permanece de pé, continua a caminhar. O clima faz seu estrago, mas o tempo sertanejo parece não autorizar o homem a morrer.

Já era assim quando Graciliano Ramos de Oliveira nasceu, em 27 de outubro de 1892. Ele escreveu, décadas mais tarde, em "Angústia", seu terceiro romance, publicado em 1936: "O que lhe interessa na minha terra é o sofrimento da multidão, a tragédia periódica das secas. Procuro recordar-me dos verões sertanejos, que duram anos. A lembrança chega misturada com episódios agarrados aqui e ali, em romances. Dificilmente poderia distinguir a realidade da ficção".

A realidade de Graciliano começou em Quebrangulo, município do agreste alagoano próximo a Pernambuco. A ficção veio depois. Quebrangulo teve, há um século, as finanças sustentadas pelas riquezas do Ciclo do Algodão, o que levou a cidade a contabilizar 30 mil habitantes. Hoje são apenas 12 mil, e uma economia baseada na pecuária de corte. No centro, suas casas bem conservadas e ruas tranquilas lembram o ambiente colonial, aconchegante, de algumas cidades históricas de Minas Gerais. Mas 50% da população vive alheia ao movimento do centro, trabalhando na roça, em fazendas criadoras de gado ou na agricultura de subsistência. Na teoria, por se situar no agreste, próximo à Zona da Mata, Quebrangulo deveria sofrer menos com a estiagem do que as cidades do sertão. A realidade, entretanto, vem desafiando a geografia: em todo o Nordeste, as áreas de sertão, agreste e até Zona da Mata estão sofrendo com os longos meses sem chuva.

Os primeiros indícios da seca atual apareceram no ano passado. Em geral, as chuvas da região se concentram no inverno. É quando, entre os meses de junho e setembro, prefeituras, governos e os próprios donos de terra erguem barragens e abrem açudes para reter o máximo possível de água, um excedente que normalmente permite que se aguente a penúria do restante do ano. Em 2012, porém, as chuvas foram fracas no inverno, insuficientes para preencher a necessidade de água nas outras estações. Também quase não houve o que os sertanejos chamam de trovoadas, chuvas de poucos dias, mas de muita força, que costumam cair entre novembro e janeiro, e que são fundamentais para que se mantenha a produção até a chegada do inverno seguinte.

Com um inverno mais fraco e sem as trovoadas, mais de 90% dos rios do interior de Alagoas secaram. Poucos açudes se mantiveram com água, e o abastecimento das barragens passou a ser insuficiente para a necessidade da população. A intensidade da seca fez com que Quebrangulo e outros 38 dos 102 municípios alagoanos viessem a ser reconhecidos em estado de emergência pela Secretaria Nacional de Defesa Civil. Este ano, são mais de 1.300 cidades do Nordeste e do norte de Minas Gerais na mesma situação, afetando cerca de 10,4 milhões de pessoas.

No caso da cidade natal de Graciliano, a seca tem ainda um fator trágico, quase fantasioso. Em 18 de junho de 2010, durante uma tempestade, uma barragem estourou em Bom Conselho, município de Pernambuco, próximo dali. A água correu pelos montes, até desembocar, por volta das 14h, em Quebrangulo. Como a chuva havia impedido que os serviços de telefonia se mantivessem ativos, a cidade não pôde ser avisada. Por sorte ninguém morreu, mas algumas casas foram inundadas com água a quase dois metros de altura. Uma ponte por onde passava a estrada de ferro inaugurada em 1912 despencou, e até hoje o trem que transportava mercadorias não foi reativado. Por causa das chuvas de 2010, os prejuízos em Quebrangulo passaram de R$ 4 milhões.

Hoje, a água que quase destruiu a cidade é o bem mais desejado por lá.

- A partir deste ano, com tudo o que estamos vivendo, as pessoas não vão ter mais como honrar seus compromissos - afirma Manoel Tenório (PSDB), prefeito de Quebrangulo desde janeiro. - É preciso que o governo federal faça mais para garantir o abastecimento de água, com barragens e sistemas de adutora. E também é importante que se financie a recuperação da economia. Hoje, recebemos carros-pipa e farelo (uma ração para o gado, feita à base de milho e soja) . Mas são ações paliativas.

Apesar da seca, a prefeitura de Quebrangulo tem planos para dias melhores - de preferência, aproveitando o apelo turístico que o nome do filho ilustre pode gerar para a cidade. Mas ele não é lembrado muito além de homenagens esporádicas e comentários feitos por moradores orgulhosos. Aos olhos dos visitantes, existe apenas uma placa na entrada do município, e nada mais, indicando que o escritor nasceu por lá. O imóvel que pertenceu à família de Graciliano e que continua de pé, bem ao lado direito da prefeitura, não tem referência alguma sobre o passado. Sua fachada foi alterada, perdendo os detalhes coloniais para paredes lisas, pintadas com uma cor clara, entre o verde e o azul. A prefeitura já tentou comprá-la, mas o atual proprietário, o fazendeiro Sebastião Silveira Lima, recusou-se a vendê-la.

- Temos vontade de fazer algo com a casa, talvez um museu. E outra coisa em que já pensei foi convocar um plebiscito para alterar o nome da cidade, de Quebrangulo para Graciliano Ramos - conta o prefeito. - Acho que seria de grande valia para a nossa imagem.

"Na planície avermelhada os juazeiros alargavam duas manchas verdes. Os infelizes tinham caminhado o dia inteiro, estavam cansados e famintos"
Trecho de "Vidas Secas" (1938)

Agrande obra da literatura brasileira a tratar do tema da seca foi publicada em 1938. O título era direto e resumiu bem o sentimento de milhões de nordestinos. "Vidas secas" foi o quarto livro lançado por Graciliano Ramos - depois de "Caetés" (1933), "São Bernardo" (1934) e "Angústia" (1936) - e, hoje, é seu romance mais representativo, com 120 edições no Brasil e traduções para mais de 20 idiomas.

Inspirada em muitas das histórias que Graciliano acompanhou desde a infância, a trama de "Vidas secas" mostra como uma família de retirantes - guiada pelo pai Fabiano e acompanhada pela cachorra Baleia, dois dos personagens mais famosos da literatura nacional - parte em busca de uma condição mais humana para a sobrevivência. Não há um trajeto definido no livro, mas as paisagens descritas pelo autor ainda estão presentes em vários cantos do interior do Nordeste, não somente em seu estado natal.

Em 1895, a família de Graciliano deixou Alagoas para viver em Buíque, cidade do sertão de Pernambuco, próxima a Garanhuns, hoje com 52 mil habitantes. Porém, apesar do número maior de pessoas, na memória coletiva de Buíque há ainda menos sobre o escritor do que em Quebrangulo. Apenas sua biblioteca municipal, inaugurada em maio de 2002, leva o nome de Graciliano Ramos. Em conversas com uma dezena de buiquenses, poucos sabem dizer quem exatamente foi o escritor. Mesmo um vaqueiro sentado numa calçada a menos de dez passos da biblioteca afirma que nunca ouviu falar nele.

Há alguns anos, havia, ao menos, uma placa numa casa que pertenceu aos pais de Graciliano, indicando aos visitantes quem foi o famoso morador. Um proprietário recente, contudo, resolveu não só tirar a placa como reformar completamente o imóvel antigo, transformando-o numa loja de confecção, igual a todas as outras. É essa loja que funciona hoje na casa em que o escritor morou. Os vizinhos ainda se lembram que havia uma placa lá há uma década, mas uma jovem vendedora da loja, perguntada sobre Graciliano, responde com carinha de esperta como quem fosse ganhar um prêmio: "Não é nossa biblioteca?"

O mesmo tempo que fez com que Graciliano passasse a ser praticamente ignorado em Buíque não privou a cidade das vidas secas que o autor descreveu no passado. Buíque teve que decretar estado de emergência para tentar combater os efeitos da estiagem. Sua situação é tão ruim ou talvez pior do que a dos municípios alagoanos: como a Barragem do Mulungu, a principal que abastece a cidade, secou quase completamente, seus moradores não recebem água nos encanamentos das casas desde janeiro. Até mesmo o hospital municipal vem dependendo de carros-pipa.

Para suprir a necessidade, uma nova categoria profissional proliferou em Buíque: o vendedor de água. Os donos de casas e fazendas que contam com poços artesianos perceberam a carência e passaram a oferecer seu excedente para seus concidadãos. Não de graça, claro. Mil litros de água, se comprados diretamente na propriedade do dono do poço, custam cerca de R$ 10. Já se comprados com os entregadores que percorrem diariamente a cidade, custam entre R$ 25 e R$ 30.

Assim, é raro caminhar mais de cinco minutos por Buíque sem ver alguém carregando um balde de água - no carro, na moto, no cavalo, na cabeça ou onde mais houver espaço.

- Gasto R$ 120 por mês com água, numa casa em que moram apenas duas pessoas - conta a técnica de enfermagem Ieda Maria Sousa. - Tenho que reaproveitar a água o tempo todo. A que usamos para lavar roupa também é usada para a descarga. E estamos sempre economizando. Mas o nordestino é um cabra forte. A gente dá um jeito.

O que todos se perguntam é até quando é possível dar um jeito. Na zona rural de Buíque, num terreno com duas casas geminadas, duas famílias, que reúnem um total de 17 pessoas, dividem 16 galões de água diariamente. Gastam R$ 40 e cerca de três horas para, todos os dias, sair de casa, ir até uma fazenda mais ou menos próxima, pegar a água e voltar. Os filhos, inclusive os menores, têm que se revezar na tarefa de trazer, numa carroça puxada por cavalos, os galões cheios.

- Não dá para ficar aqui, não. No ano passado, fui para São Paulo trabalhar na colheita de cana. Voltei em novembro, mas quero ir de novo para São Paulo - diz Flávio José da Silva, rapaz de 22 anos que, quando está em Buíque, depende de bicos para ter alguma fonte de renda.

O drama se estende ainda mais porque a água não é um bem necessário apenas para a higiene e para matar a sede. O que qualquer sertanejo bem sabe, e Graciliano Ramos explorou em exaustão em seus livros, é que a natureza e o homem se misturam no campo. Mas, na seca, quem deveria viver unido acaba morrendo separado. Em vários pontos do percurso entre Buíque e Alagoas, o drama nordestino mostra uma de suas facetas mais duras: o gado morto, abandonado na beira da estrada, sem dono ou responsável.

Para quem depende exclusivamente da agropecuária, perder um animal é quase como enterrar um parente próximo. Os cemitérios de gado, que estão em todos os cantos, em todas as cidades afetadas pela seca, atraem urubus e exalam um cheiro difícil de se esquecer.

- Não estou nem comendo carne de boi porque a gente vê tanto bicho morto na estrada que isso me dá um enjoo muito grande - afirma a feirante buiquense Josefa Correa dos Santos, de 50 anos. - Por causa da seca, tudo o que eu vendo aqui na feira está muito caro. E, como está caro, eu mal consigo vender. É um negócio muito ruim. É a pior seca que eu já vi.

Em Buíque, enquanto Josefa trabalha na feira, crianças correm em torno de um boi morto, dentro de uma fazenda, a menos de dez metros de uma estrada de terra. Pequeninas, elas passaram por entre a cerca de arame farpado com o intuito de atirar pedras nos urubus que comiam os restos do animal.

Para as crianças, trata-se de uma brincadeira. Para a cidade, um sinal da tragédia.

"Sofri sede e fome, dormi na areia dos rios secos, briguei com gente que fala aos berros e efetuei transações comerciais de armas engatilhadas"
Paulo Honório, protagonista de "São Bernardo" (1934)

"Resolvi estabelecer-me aqui na minha terra, município de Viçosa, Alagoas, e logo planeei adquirir a propriedade São Bernardo, onde trabalhei, no eito, com salário de cinco tostões", escreveu Graciliano Ramos em "São Bernardo", o seu segundo romance. O livro conta a história de Paulo Honório, homem de origem humilde, empreendedor, que vai acumulando riquezas, numa típica trama de ascensão social que, aos poucos, torna-se uma de derrocada pessoal.

A paisagem escolhida para ambientar a trama foi uma das mais agradáveis pelas quais Graciliano passou, uma cidade na Zona da Mata alagoana que, por suas belezas naturais, ganhou o apelido de Princesa das Matas. Foi em 1899 que seus pais, Sebastião Ramos de Oliveira e Maria Amélia Ferro Ramos, deixaram Pernambuco e se mudaram para Viçosa. A família viveu lá poucos anos, tirando sua renda de uma loja de tecidos, localizada na praça principal da cidade. O imóvel existe até hoje e conserva sua fachada histórica, mas abriga o arquivo da prefeitura - sem placas ou referências sobre Graciliano Ramos.

Atualmente com cerca de 26 mil habitantes, Viçosa tem metade do tamanho de Buíque, mas é claramente mais bem preservada e desenvolvida. Lembra Quebrangulo pelos prédios históricos e ambiente acolhedor, porém é maior, com um comércio mais robusto. Além disso, a cidade tem uma movimentação turística regular, muito por conta de suas belezas naturais. É nas redondezas de Viçosa que fica a Serra Dois Irmãos, com cachoeiras, trilhas e o local onde o líder negro alagoano Zumbi dos Palmares foi morto em 20 de novembro de 1695.

Só que, com a seca, o volume de água no início do ano não foi suficiente para dar vazão às cachoeiras de Viçosa. O município teve que decretar, em meados de abril, estado de emergência. O panorama se tornou crítico quando o Rio Caçamba secou, e a prefeitura precisou reativar uma pequena barragem, não utilizada havia 12 anos, para tentar acumular água.

- Minha geração nunca havia visto uma seca assim - afirma o escritor Audálio Honorato, autor do livro "Viçosa viva". - Antigamente, as pessoas passeavam de canoa no Rio Paraíba. Este ano, o rio se transformou em pedras. Eu lembro quando apareceram os primeiros carros-pipa por aqui, e muitos nem sabiam o que era carro-pipa.

Próximo a Viçosa foram gravadas cenas do filme "São Bernardo" (1972), de Leon Hirszman, com roteiro baseado no livro de Graciliano. Manoel dos Passos Vilela, o Vô, hoje com 64 anos, foi figurante em "São Bernardo". Seu papel era mínimo: sem diálogos, ele viveu um deputado estadual que aparecia todo vestido de branco numa estação de trem, ao lado do governador.

A participação de Vô no filme não lhe rendeu cachê, mas a experiência já indicava seu futuro profissional. Não o de ator, cuja carreira se resumiu a "São Bernardo", e sim o de político. Vô foi vereador por cinco vezes e está no segundo mandato de vice-prefeito. O Vilela em seu sobrenome revela um parentesco com o antigo senador Teotônio Vilela (1917-1983) e com seu filho, Teotônio Vilela Filho, atualmente governador de Alagoas, ambos naturais de Viçosa.

O apelido vem da juventude. Como era mais alto e aparentava ser mais velho do que os outros alunos, passaram a chamá-lo de Vô. O título tem tudo a ver com seu jeitão tranquilo, bem-humorado, de quem gosta de contar histórias sobre o passado misturando realidade e fantasia. O próprio Vô admite que sua memória é ruim.

Talvez por isso, para ajudá-lo a se recordar, Vô tenha fundado há 15 anos o Centro de Tradições Populares Synfrônio dos Passos Vilela - Museu do Vô. O Centro, que leva o nome de seu pai, fica numa casa que pertenceu a seu sogro e que abriga desde maquetes até bonecos do folclore viçosense. Numa sala no final do corredor de entrada, a que Vô diz ser a mais visitada, há uma série de fotos de pessoas que já morreram, numa seção batizada de "Amigos do Vô".

Dentro do museu, Vô faz questão de procurar algum objeto que remeta a Graciliano Ramos. Tenta na estante de livros, mas não encontra suas obras. Depois pensa, anda por uma sala repleta de imagens religiosas, reafirma sua certeza de que há alguma referência, vai até os fundos da casa e, bem no final, no final mesmo, retira um quadro encostado na parede para revelar, por trás, um tecido escuro no qual se vê o rosto de Graciliano pintado.

- Eu sabia que tinha - brada Vô. - O Graciliano foi uma grande influência para todos da região. Ele olhava para o futuro. Para ele, o futuro não era um carro. Era uma locomotiva. Não era uma asa-delta. Era um avião. Não era um barquinho. Era um transatlântico.

Foi em Viçosa que Graciliano estreou no universo literário, com a publicação do conto "O pequeno pedinte" no jornal "O Dilúculo", um periódico feito por alunos do Internato Alagoano, onde estudava. A data foi 24 de junho de 1904. Graciliano tinha 11 anos e escolheu para tema de seu conto um menino que passava os dias pedindo esmola pelas ruas.

"Quantas noites não passara dormindo pelas calçadas exposto ao frio e à chuva, sem o abrigo do teto. Quantas vergonhas não passara quando, ao estender a pequenina mão, só recebia a indiferença e o motejo", escreveu Graciliano.

Parece ingênuo imaginar que, aos 11 anos, aquele menino já se preocupava com os problemas sociais do país. Mas também seria injusto ignorar que, em praticamente toda a obra de Graciliano, questões como exclusão foram exploradas. Tanto na obra literária, quanto na política. E foi em ambas que sua trajetória se encontrou com Palmeira dos Índios, cidade em que escreveu a maioria de seus livros, casou-se duas vezes, teve seis de seus oito filhos e foi eleito prefeito.

"Fui ocultar-me entre as catingueiras que ensombravam as margens da lagoa vazia. Meninos andavam por ali, brincando com ossos e seixos"
Trecho de "Infância" (1945)

Leva-se, de carro, cerca de meia hora de Viçosa a Quebrangulo. E mais meia hora de Quebrangulo para Palmeira dos Índios. Só que o tempo da modernidade não é o tempo da seca. O gado, para sobreviver, não pode esperar muito por alimento e água. Homens e mulheres, por mais calejados que estejam por anos e anos de seca, também não.

Alguns vão embora. Outros se rebelam, mas às vezes é difícil escolher contra quem direcionar sua revolta. Os governos, para quem mora numa pequena casinha no meio do campo, a horas de distância de algum centro urbano, parecem inalcançáveis. Os vizinhos, por mais que sejam objeto de ciúme e intriga, principalmente quando aparecem com uma caixa d"água cheia sabe-se lá como, em geral passam pelas mesmas dificuldades. E Deus? Deus, repetem todos, significa a salvação.

Logo em Paulo Jacinto, um município no caminho entre Viçosa e Quebrangulo, de 7.500 habitantes, pode se ter uma ideia dos efeitos da seca. Numa sexta-feira, um carro-pipa leva água para distribuir entre as casas, mas não há o suficiente para todas. Desde fevereiro, quando a seca se agravou, os motoristas dos carros passaram a alternar as residências. Quem não recebe numa ocasião, tem sua oportunidade três dias depois.

O que se segue, porém, é tão duro de descrever quanto de lembrar. As pessoas gritam. Não por dinheiro, comida ou terra. Gritam por água. Os moradores de Paulo Jacinto cercam o caminhão e exigem que o motorista encha todos os baldes. Aposentada, com 56 anos, Marlene Lopes da Silva consegue encher dois. Ela própria carrega um em cada mão, enfrenta uma fila, briga com o motorista e depois retorna para casa ao lado do marido, Miguel Antônio da Silva, de 90.

- O motorista disse que Deus ia reclamar comigo porque eu peguei água na segunda-feira e voltei hoje. Como ele pode dizer uma coisa dessa? - afirma Marlene, entre a revolta e o choro.

Enquanto Marlene se lamenta, um grupo de moradores consegue puxar a mangueira do carro-pipa para dentro de uma casa, para encher uma caçamba. Dois policiais chegam para tentar manter a ordem, mas há mais de duas dezenas de pessoas em torno do carro-pipa. Seguem reclamando, gritando, exigindo o direito à água. Ao se despedirem, dizem, um por um: "Deus os leve".

A fé não é exclusiva dali, e Deus é lembrado em muitas das respostas dos alagoanos. Nos municípios próximos a Palmeira dos Índios, cenas como a de Paulo Jacinto vão se repetindo, a qualquer hora. Pela estrada, pessoas carregam baldes. Nos leitos dos rios ou nos açudes secos, os mais humildes tentam retirar o que for possível. Cavam buracos no solo úmido, rezando para que algum sinal de esperança escorra da terra.

- Há dois anos não chove direito. E agora piorou. A única coisa que a gente pode fazer é esperar que Deus mande alguma coisa - afirma a dona de casa Maria Solange Soares, que mora com cinco filhos e o marido numa casinha de taipa na beira da rodovia BR-316, próximo ao município Estrela de Alagoas (17 mil habitantes), e recebe a ajuda do Bolsa Família.

Apesar de menos comuns do que na época de Graciliano Ramos, as casas de taipa ainda são fáceis de se avistar no interior do estado. Elas são feitas numa estrutura de galhos de árvore coberta por barro, e são mais conhecidas ao sul do país como casas de pau-a-pique. São extremamente quentes e bem pequenas, sobretudo para famílias que às vezes passam de dez integrantes. Costumam ter imagens religiosas e fotos dos filhos nas paredes. A sala serve de quarto de dormir; o quarto de dormir serve de sala de jantar; o banheiro fica na parte de fora, geralmente atrás da cozinha. Na de Maria Solange, a telha do teto foi malfeita e deixou frestas por onde entram constantes fachos de luz.

Não muito longe dali, num povoado isolado do município sertanejo de Santana do Ipanema (45,5 mil habitantes), mora José Maria Vieira da Silva, de 56 anos. Ele tem 9 filhos, mas apenas três vivem em Alagoas. Quatro já desistiram de tentar a sorte na seca e foram para São Paulo. Outros dois, de 18 e 20 anos, estavam na casa de amigos, bebendo e festejando. Iriam embora, também para São Paulo, dali a dois dias.

- Quando tem chuva, tem serviço. Quando não tem, aí é o problema - explica José Maria.

A história de José Maria tem um quê de Brasil esquecido. Ele é descendente quilombola e sempre viveu na zona rural. O terreno da casa em que vive há cerca de uma década veio por projetos de assentamento de reforma agrária, e ele ainda deve R$ 17 mil ao banco para quitar o valor da moradia.

- Quando eu era moço, meu pai me tirou do estudo e me jogou para a enxada. Então não sei ler. Só sei assinar meu nome a pulso - conta. - Se eu pudesse, com certeza também iria para São Paulo. Aqui está muito ruim para sobreviver. Antes a gente até pescava, mas com o rio assim há dois anos, não dá.

O Rio Ipanema passa bem em frente à casa de José Maria, mas está completamente seco na região. Descendo um barranco íngreme, é possível caminhar pelas pedras no que outrora foi o fundo do rio. O que marca a paisagem árida é um jumento morto que foi jogado lá por alguns moradores. Sem água, o Ipanema acabou se tornando mais um cemitério de gado.

São muitas as histórias dessas novas vidas secas presentes no interior de Alagoas, muitas delas comparáveis à trajetória da família de Fabiano, criação literária de Graciliano. Nenhum morador das pequenas casas daquela zona rural, porém, jamais havia ouvido falar no escritor.

"Dos administradores que me precederam uns dedicaram-se a obras urbanas; outros, inimigos de inovações, não se dedicaram a nada"
Relatório de Graciliano como prefeito de palmeira dos Índios

Graciliano deixou Viçosa em 1905, para estudar em Maceió. Ficou na capital alagoana por cinco anos, onde, ainda adolescente, passou a colaborar regularmente com jornais e revistas, publicando sonetos e assinando com pseudônimos como Feliciano de Olivença e Soeiro Lobato.

Exatamente no dia em que completou 18 anos, em 27 de outubro de 1910, ele se mudou para Palmeira dos Índios, município que seria a base para sua vida pública, tanto de escritor quanto de político. Hoje, Palmeira dos Índios é certamente a cidade mais lembrada quando se fala de Graciliano Ramos - o que não significa que Palmeira dos Índios se lembre bem do autor.

Palmeira tem mais de 70 mil habitantes, e uma economia apoiada na pecuária leiteira. É o terceiro maior município de Alagoas em população. A cidade tem seis universidades e se orgulha de estar se tornando um polo educacional para o interior do estado. Por outro lado, o espaço para a cultura vem diminuindo. Logo no início de seu segundo mandato, iniciado em janeiro, o prefeito James Ribeiro (PSDB) fechou a Secretaria de Cultura, transferindo suas atribuições para a pasta da Educação.

- Em Palmeira dos Índios, não se faz nada pela cultura, quanto mais para preservar o nome do meu pai - diz, por telefone, a alagoana Luiza Ramos Amado, de 82 anos, única dos oito filhos de Graciliano ainda viva, que hoje mora em Salvador. - Em Maceió também se faz pouquíssimo. Se você pensar na maior parte dos políticos que Alagoas tem hoje, dá para compreender a razão.

Além de um busto instalado na entrada da cidade - à boca pequena, muita gente diz que a imagem não se parece em nada com o escritor -, a principal homenagem a ele em Palmeira dos Índios é a Casa Museu Graciliano Ramos, fundada em 1973. Como o nome sugere, o local nada mais é que a casa em que o autor morou, hoje adaptada para um museu. Ela abre diariamente, mas recebe apenas cerca de 30 visitantes por semana.

Para se compreender a baixa frequência, basta visitar a Casa. O imóvel é bom, manteve o jeitão antigo, com paredes grossas, salas espaçosas e tetos altos. O grande problema ali é a organização do espaço. A maioria dos objetos não tem identificação alguma. Numa sala, há uma rede, gravuras, utensílios de cozinha, algumas sandálias, um colete de couro velho e uma espingarda. Qual a relação entre eles? Só perguntando para tentar entender.

Ainda assim, uma simples pergunta feita aos funcionários que ficam no museu pela manhã - todos muitos simpáticos e atenciosos - fica sem resposta. Ninguém sabia dizer em que cômodo Graciliano Ramos dormia.

- O Graciliano nunca vai deixar de ser uma referência alagoana, mas, no dia a dia, nossa visitação é mais de gente de fora. Acho que o nome dele passou a ser tão habitual para os moradores de Palmeira que se tornou menos atraente - explica Marcos Omena, diretor da Casa Museu. - Tínhamos uma proposta de fazer em 2012, na celebração dos 120 anos de nascimento do Graciliano, uma programação com exibição de filmes, apresentação de peças e outras atividades para mobilizar a cidade. O orçamento era de menos de R$ 30 mil. Mas não tivemos como executá-lo.

Fora da Casa, em conversas com os moradores de Palmeira dos Índios, também é raro encontrar algum entusiasmo sobre a obra de Graciliano. Os assuntos que dominam hoje as rodas de conversas na cidade são um processo em curso de demarcação de terras indígenas (a região serviu, séculos atrás, de aldeia da tribo Xucuru) e, claro, a seca.

- A juventude daqui é preguiçosa para ler - diz Ivan Barros, jornalista, promotor aposentado e escritor palmeirense, autor de "Graciliano Ramos era assim" (1984). - Mas, em termos nacionais, o Graciliano é tido como um ícone.

Já estabelecido em Palmeira como comerciante de tecidos, Graciliano concorreu ao cargo de prefeito em 1927, quando escrevia "Caetés", seu primeiro romance, passado na cidade e com direito a descrições sobre sua rotina e relações sociais. O livro é narrado em primeira pessoa, sob o ponto de vista de Paulo Valério, um homem que se apaixona pela mulher de seu patrão, numa história que levará a tragédias e arrependimentos.

Mas, antes de lançar "Caetés", Graciliano fez sucesso com outro tipo de publicação. Ele foi prefeito entre 1928 a 1930. No período, escreveu relatórios para o governo de Alagoas, prestando contas de sua gestão e fazendo um balanço sobre o que conseguiu realizar em seu mandato. Eram textos que, além de descrever gastos e dificuldades do município, traziam ironias e reflexões acerca do cargo.

"Dos administradores que me precederam uns dedicaram-se a obras urbanas; outros, inimigos de inovações, não se dedicaram a nada", escreveu Graciliano. "Houve lamúrias e reclamações por se haver mexido no cisco preciosamente guardado em fundos de quintais; lamúrias, reclamações e ameaças porque mandei matar algumas centenas de cães vagabundos; lamúrias, reclamações, ameaças, guinchos, berros e coices dos fazendeiros que criavam bichos nas praças", acrescentou.

Por sua qualidade, os relatórios circularam pelos meios intelectuais. O poeta e editor carioca Augusto Frederico Schmidt foi um dos que teve contato com os textos e procurou Graciliano. Resultado: "Caetés" foi publicado em 1933, pela editora Schmidt, de propriedade de Augusto Frederico.

De certa forma, a carreira de prefeito de Graciliano ajudou a dar origem à sua carreira literária.

"Sempre tinha sido assim, desde que ele se entendera. E antes de se entender, antes de nascer, sucedera o mesmo - anos bons, misturados com anos ruins"
Trecho de "Vidas Secas"

Os admiradores de Graciliano Ramos adoram...

Rebanho. Falta de alimentos e de água faz das carcaças de bois e vacas que se acumulam, sem dono ou responsável, na beira das estradas elementos cada vez mais comuns na devastada paisagem das cidades castigadas pela seca

Os admiradores de Graciliano Ramos adoram contar uma história, um tanto folclórica, sobre uma norma decretada por ele quando prefeito. Com o objetivo de tentar diminuir a desordem na cidade, ele publicou uma lei para que fossem multados todos aqueles que deixassem animais à solta nas ruas. Até que, certo dia, o fiscal da prefeitura encontrou vacas de Sebastião Ramos de Oliveira, pai de Graciliano, em situação ilegal. E lhe tascou a multa.

Sebastião, então, foi reclamar com o filho. "Como assim você vai me multar? Eu sou seu pai", disse. Impávido, apoiado na certeza da lisura pública, Graciliano rebateu com uma frase que, verdade ou mentira, poderia servir de exemplo para a atual política brasileira: "Prefeito não tem pai".

- Muita gente gosta de falar que ele era uma pessoa carrancuda, mal-humorada. Mas minha avó contava que ele não gostava era de conversa besta. Não respondia perguntas imbecis e, por isso, parecia chato - diz José Clóvis Soares Leite, sobrinho-neto de Graciliano e atual chefe de gabinete da prefeitura de Palmeira dos Índios. - Só não tenho como mentir para você: o Graciliano realmente não tem uma presença forte aqui na cidade. Existe um projeto pronto para fazer um grande centro de convenções que levaria seu nome, com museu e biblioteca. Mas até agora nada foi acertado.

Enquanto a prefeitura não se mexe para oficialmente aumentar a projeção do nome de Graciliano em Palmeira dos Índios, cabe a fãs e parentes tentar manter sua memória viva. Além de José Clóvis, há algumas dezenas de sobrinhos e primos do autor vivendo hoje na cidade. Nenhum deles o conheceu pessoalmente, mas a maioria se diz orgulhosa da genealogia famosa.

- Infelizmente Alagoas tem pouca memória sobre seus filhos - diz o agrônomo Marcos Ramos, de 68 anos, sobrinho de Graciliano. - Se você for para Assaré, no Ceará, vai ver que a economia da cidade gira em torno do Patativa. Mas aqui, nem mesmo a Casa Museu do Graciliano é bem conservada. Aquilo é horrível. 

Aos 68 anos, Marcos Ramos é tido como o parente mais próximo e mais atuante na preservação da memória de Graciliano em Palmeira dos Índios. Filho de Amália, uma das irmãs do escritor, ele nasceu na cidade e é, hoje, um fazendeiro respeitado. Na zona rural, os outros fazendeiros e também os peões o chamam de "doutor" Marcos.

Uma das propriedades da família de Marcos, hoje sob os cuidados de seu filho Thiago, é a fazenda Traipu. Ela fica em Minador do Negrão, município sertanejo vizinho a Palmeira, com 5,3 mil habitantes, e que se tornou parte da mitologia em torno de Graciliano Ramos por ter sido utilizada, no início dos anos 1960, como locação para "Vidas secas". O filme foi dirigido por Nelson Pereira dos Santos e é um dos clássicos do cinema brasileiro, tão importante quanto o livro.

- Na época do filme, a fazenda era do meu sogro - conta Marcos. - Hoje, ela continua do mesmo jeito, principalmente por causa dessa seca.

Palmeira dos Índios fica no limite do agreste alagoano, quase no sertão, e também decretou estado de emergência por conta da estiagem. Em situações de seca, os fazendeiros costumam alimentar os animais com a palma, um tipo de cacto nutritivo, com poucos espinhos e resistente às adversidades climáticas do Nordeste. Assim, para se precaver, é comum que os fazendeiros reservem parte de seus terrenos para a plantação de palmas - e, em alguns casos mais extremos, o cacto é utilizado até mesmo na alimentação humana.

A seca de 2013, porém, tem sido tão severa que nem mesmo a palma vem resistindo à falta de água: a planta não tem crescido suficientemente ou tem morrido. Por isso, há fazendeiros apelando para o uso do mandacaru - também um cacto, mais resistente que a palma, porém geralmente espinhoso - como ração. O mandacaru é considerado um último recurso para alimentar os animais, mas precisa ser utilizado com cuidado por causa dos espinhos, que devem ser arrancados ou queimados. É um risco que os criadores de gado precisam correr.

- De dois anos para cá, nossa produção de leite diminuiu em 80% - relata Thiago Costa, filho de Marcos Ramos. - Teve gente que se suicidou porque perdeu todo o gado.
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De acordo com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), a seca de 2013 é uma das piores dos últimos 50 anos tanto do ponto de vista hídrico quanto por seu impacto social. A informação integrou o relatório das Nações Unidas para o Brasil, publicado em abril.

Ainda segundo o MCTI, há registros de outras grandes secas em 1877, 1914, 1932, 1945, 1953, 1965, 1993 e 1998. A diferença para a deste ano, porém, está em sua duração: a estiagem vem desde 2012, e pouca gente estava preparada para passar tanto tempo sem água.


No interior nordestino não existe um único morador que consiga ficar alheio ao problema. Com "Vidas secas", publicado em 1938, Graciliano ajudou a mostrar essa dura realidade ao resto do país. Porém, já quando prefeito de Palmeira dos Índios, ele escreveu no relatório de prestação de contas do exercício de 1928: "O município é pobre e demasiado grande para a população que tem, reduzida por causa das secas continuadas".

O tempo de Graciliano na seca não durou muito mais. Em 1930, ele renunciou ao mandato de prefeito de Palmeira, mudou-se para Maceió e assumiu o cargo de diretor da Imprensa Oficial de Alagoas. Em 1933, foi nomeado diretor da Instrução Pública de Alagoas, órgão que cuidava da educação do estado.

Depois, passou a vida entre Alagoas e Rio de Janeiro, numa bem sucedida carreira de escritor, publicando obras como livro infantojuvenil "A terra dos meninos pelados" (1939), até morrer, vítima de um câncer no pulmão, em 20 de março de 1953. Uma de suas obras mais célebres, "Memórias do cárcere", um relato sobre o período em que ficou preso na Ilha Grande, no Rio, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas, seria lançada postumamente ainda naquele ano, poucos meses após sua morte.

Mas o que talvez nem Graciliano imaginasse é que as secas continuariam ocorrendo por muitos e muitos anos, e seus efeitos não teriam uma solução definitiva. E que, apesar das poucas referências a ele que existem hoje nas cidades onde morou, sua obra ainda está presente em muitos dos dramas de quem vive no sertão.

Em Minador do Negrão, próximo à fazenda em que foram rodadas cenas de "Vidas secas", por exemplo, funciona a Escola Municipal Antônio Sapucaia. O local é isolado, no meio de uma estrada de terra sem muitas outras casas à vista, mas serve de ponto de distribuição de água para os vizinhos. Cerca de 50 famílias dependem dos carros-pipa que apareciam por lá duas vezes por semana.

Numa conversa com Mauricelia Cavalcante, professora do ensino fundamental da escola, ela própria, sem saber que se tratava de uma reportagem sobre o escritor, fez um pedido que misturava cinema com televisão, televisão com jornal e sonho com realidade.

- Já que vocês são "da Globo", podiam fazer um novo "Vidas secas" por aqui. Para mostrar como estão as coisas hoje, iguais ao tempo de quando Graciliano era vivo - diz a professora.

É o tempo -cujo ritmo é distinto para Mauricelia, para Manoel Gardino, para José Maria, para Marlene Lopes e para todos os personagens das novas vidas secas nordestinas - que responde pelas angústias e também pelas esperanças do povo. Ainda em Minador, o fazendeiro Ari Barros aprendeu que apenas ele, o tempo, pode curar suas feridas.

Ari tinha 80 cabeças de gado antes da seca. Hoje, restam oito. Alguns dos 72 animais mortos entre dezembro de 2012 e abril de 2013 foram colocados num leito de rio, seco, dentro de seu terreno, formando um desolador cemitério sem lápides, com dezenas de vacas mortas espalhadas pelo solo. Ari diz não ter mais lágrimas para lamentar a seca. Diz ter morrido um pouco com cada animal que se foi. Diz que o estado é de calamidade e que só lhe resta esperar por Deus.

Aos 36 anos, com uma filha de 3, ele já pensou em ir embora, mas não quer abandonar a fazenda que pertenceu a seu pai e seu avô. Ari, então, sugere cantar uma toada que ele próprio compôs, e, posicionado em meio aos animais mortos, abre o coração:

- "Ô, meu Deus, o que eu faço/ Vendo meu gado se acabando/ Sertanejo chorando/ Sem nenhuma remissão./ Não existe mais ração,/ Agora é lágrima e tristeza./ Chora toda natureza/ Quando há seca no sertão."

Fonte: Prosa / O Globo