sábado, 21 de agosto de 2010

Reflexão do dia – Dora Kramer


" Luiz Inácio da Silva cansou de ensinar isso aos governos aos quais fez oposição. Não que todo oposicionista deva ter como modelo o PT.

Aquele que em nome de um projeto partidário se opõe até ao bem-estar da maioria - por exemplo, sendo o único ente a não se engajar no combate à inflação nos anos 90 - para depois reivindicar a autoria da obra rejeitada.

Em versão suave o nome disso é oportunismo. "


(Dora Kramer, no artigo ‘A revelação’, em O Estado de S. Paulo, ontem, 20/8/2010)

Infantilismo e controle :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

A infantilização do eleitorado brasileiro denunciada pela candidata do Partido Verde, Marina Silva, é um dos sustentáculos da alta popularidade do presidente Lula. E a campanha eleitoral vai se desenrolando de acordo com os planos desenhados por ele à imagem e semelhança do seu governo, praticando o que talvez seja o maior mal que esteja fazendo ao país: a esterilização da política.

O controle dos partidos através da distribuição de cargos e de métodos mais radicais como o mensalão neutraliza a ação congressual, permitindo a formação de uma aliança política tão heterogênea quanto amorfa, com partidos que em comum têm apenas o apetite pelos benefícios que possam obter apoiando o governo da ocasião.

A quase unanimidade a favor se deve também ao assistencialismo e à cooptação dos "movimentos sociais", de um lado, e de outro a uma política econômica que aumenta os gastos com juros, Previdência e programas assistenciais.

Uma frente que tem, num extremo, o setor financeiro e, no outro, os mais pobres, numa estranha aliança dos rentistas do Bolsa Família com os rentistas financeiros.

O pragmatismo que rege essa maneira de fazer política fez com que o PT engolisse a candidata oficial, tirada da cartola do ilusionista Lula e literalmente maquiada pela equipe de marqueteiros, que vende ao eleitorado uma persona política tão falsa quanto a favela cenográfica do programa de estreia do candidato do PSDB.

A ex-guerrilheira, durona e de trato difícil, transformou-se em tempo real numa senhora simpática que quer se tornar "a mãe" do Brasil.

O governo Lula vem acelerando sua transformação, neste segundo mandato, na direção de um Estado nacionalista, populista e patrimonialista, dependente cada vez mais da vontade do líder carismático, que não aceita os limites da lei, muito menos críticas. E se considera "o pai" do "seu" povo.

A autoestima exagerada provoca sentimento de onipotência que faz o seu possuidor acreditar estar acima das regras que o constrangem.

Na política, pode produzir ditadores ou, no nosso caso, uma versão pós-moderna do caudilhismo latino-americano, que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso definiu como um "subperonismo lulista".

Essa geleia geral que hoje apoia a candidatura oficial pode ter o mesmo destino do peronismo argentino na era pós-Lula que se avizinha, com diversos grupos disputando o espólio político do lulismo. E Lula, fora do governo, querendo controlar os cordéis de seu fantoche.

Ao mesmo tempo em que aprofunda suas críticas aos órgãos fiscalizadores do Estado, como o Ibama, o Tribunal de Contas da União (TCU) ou até mesmo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tentando constrangê-los, o presidente Lula insiste na tentativa de neutralizar os veículos da grande imprensa, no pressuposto de que, com sua imensa popularidade, pode controlar a opinião pública.

Não é suficiente uma nota oficial para garantir a liberdade de expressão, quando há tentativas concretas, desde o início do governo, de "democratizar" os meios de informação, uma ideia recorrente que vem sendo derrotada desde que primeiramente foi oferecida a debate, com a proposta de criação de um Conselho Nacional de Jornalismo, que fiscalizaria os jornalistas para evitar "desvios éticos".

Ela ressuscitou com a aprovação, na Conferência Nacional da Comunicação (Confecon), de um Observatório Nacional de Mídia e Direitos Humanos para monitorar a "mídia" e é similar à proposta contida no Programa Nacional de Direitos Humanos de punir os órgãos de comunicação que transgredirem normas a serem ditadas por um conselho governamental.

A questão é que, quando o governo fala em democracia, não está se referindo aos regimes em vigor no mundo ocidental, mas aos regimes bolivarianos gerados a partir do autoritarismo chavista na Venezuela, onde Lula acha que há "democracia até demais".

Não é simples coincidência que tanto lá quanto na Argentina dos Kirchner os meios de comunicação são perseguidos ou coagidos com base em legislações nascidas de poderes cada vez menos democráticos.

E também não é mera coincidência que esses regimes esquerdistas da América do Sul tenham sua gênese no Foro de São Paulo, uma reunião da esquerda da América Latina que Lula e Fidel Castro organizaram em 1990 para o estabelecimento de uma estratégia comum, na definição do próprio Lula em discurso.

O problema é que o Foro de São Paulo abrigava na sua fundação não apenas partidos políticos de vários matizes da esquerda, mas também organizações guerrilheiras como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs) ou a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca (UNRG), consideradas terroristas, acusadas de tráfico de drogas e outras atividades criminosas.

Negar a relação do PT com as Farcs é imaginar que não existam registros confirmando, como uma entrevista de Raul Reys, o número dois das Farcs que morreu recentemente em confronto com o exército da Colômbia, contando como conheceu Lula num desses encontros.

As Farcs classificaram certa vez em nota oficial o Foro de São Paulo como "uma trincheira onde podemos encontrar os revolucionários de diferentes tendências, e diferentes manifestações de luta e de partidos (...)".

A continuidade dessa política de aparelhamento do Estado é o que está em jogo nestas eleições, e é por isso que o presidente Lula está tão empenhado em vencê-las, e não apenas elegendo sua candidata à Presidência da República.

A estratégia de tentar influenciar a eleição do Congresso, sobretudo a do Senado, tem por trás o desejo de abrir caminho para aprovar legislação que aumente o controle do governo sobre o Estado brasileiro e, eventualmente, sobre a sociedade, através da "democracia direta", à base de plebiscitos. (Continua amanhã)

As pitonisas:: Tibério Canuto

DEU NO PITACOS

O Brasil está poluído de pitonisas. Todo jornal que se preza tem no mínimo uma (ou um) pitonisa de plantão. Em coomum, todos já decretaram a vitória de Dilma e, como isto fosse pouco, já deram de barato quem será eleito governador em vários estados, já no primeiro turno.

Se as pesquisas deste fim de semana forem desfavoráveis a José Serra, pontificam as pitonisas, o ex-governador de São Paulo deveria ligar para Dilma e parabenizá-la pela conquista do Planalto.

Segundo os que nasceram com o dom da premonição, já estão eleitos Jacques Wagner na Bahia, Eduardo Campos em Pernambuco, Sérgio Cabral, no Rio de Janeiro e, claro, Geraldo Alckmin em São Paulo. Mais uma pesquisa e decretam também a unção de Hélio Costa para governador de Minas, já no primeiro turno.

São Paulo

Vejamos o caso de São Paulo. Uma coisa é achar que Geraldo Alckmin é o favorito. Outra coisa é dizer que já pode se considerar eleito por ter 54% das intenções de voto.

A política na disputa eleitoral está substituída pelas pesquisas. O horário eleitoral gratuito é um desperdício. O comparecimento dos brasileiros às urnas é mero cumprimento de formalidades.

Fernando Barros, em sua coluna “Alckmin na maciota”, na Folha de São Paulo, praticamente decretou a vitória do ex-governador de São Paulo, sobre Mercadante, “uma barbada”. Do alto da sua “sapiência política”, o colunista insinua que tudo seria diferente se o candidato do PT fosse Ciro Gomes.

Em que base da realidade se baseou para concluir que, com Ciro, a disputa pelo governo do Estado seria mais acirrada? É possível até que acontecesse o contrário. A vitória de Alckmin poderia ser mais fácil. As chances de uma candidatura Ciro cair no ridículo seriam imensas. Sem falar que ela poderia não empolgar os militantes petistas e seus eleitores históricos.

Não morremos de amores por Mercadante. Achamos que sua campanha é equivocada, ao pendurar-se na popularidade de Lula e fazer disto a sua única arma eleitoral. Erra ao destilar raiva na TV contra as diversas gestões de governos tucanos. Vende um mundo cão, como se São Paulo fosse o reino da morte, da miséria, da falta de educação, um caos completo. Em lugar de reconhecer os acertos, fazer críticas pertinentes e diferenciar suas propostas para o porvir, ataca sistematicamente governos tucanos, sucessivamente bem sucedidos e bem avaliados pelos paulistas.

Outra coisa é considerá-lo cachorro morto e ignorar que o PT é um partido com densidade eleitoral em São Paulo. É o segundo partido mais forte no Estado. Subestimá-lo pode trazer danos sérios à campanha estadual e também à luta de Serra para chegar à Brasília.

Alckmin não cai nessa

É possível que Geraldo repita o feito de Serra e se eleja no primeiro turno. É óbvio que essa situação não está dada. Não se pode excluir a hipótese de um endurecimento da disputa pelo governo do Estado. Um segundo turno não está descartado de antemão.

O que vale para a eleição presidencial, também vale para as disputas estaduais. Nada substitui o eleitor. São inúmeros os exemplos de viradas em eleições municipais e estaduais. É impossível assegurar que não existirá troca da poleposition na corrida presidencial, no primeiro ou no segundo turno.

Este negócio de decretar a vitória de alguém antes da hora não serve sequer aos favoritos. Com toda sua experiência, Alckmin não entra nessa, pois conhece de perto o estrago que pode fazer o clima do “já ganhou”. Em eleição, quem calça salto alto corre o risco de levar um tremendo tombo. Nas eleições municipais em 2008, em São Paulo, Marta Suplicy esteve à frente de Kassab nas pesquisas, até mesmo das realizadas na véspera da eleição do primeiro turno. Quando foram abertas as urnas, Kassab teve mais voto do que a petista, já no primeiro turno! Daí em diante, o segundo turno foi uma barbada que nenhuma pitonisa apontou em suas premonições. Resultado: Kassab levou a taça ao se eleger com uma grande folga.

Viradas e viradas

Dá para acreditar que Geddel Vieira, com todo o tempo de TV do PMDB e com a quantidade de prefeitos que tem na Bahia, terá, ao final do primeiro turno, apenas 10% dos votos, como indicam as pesquisas atuais? É bom lembrar que há menos de dois anos, ele conseguiu virar o jogo na disputa da prefeitura de Salvador. Seu candidato, João Henrique, estava em terceiro lugar, antes do horário televisivo, foi para o segundo turno e derrotou o candidato que tinha a máquina do Estado e o apoio do governador, o petista Jacques Wagner.

Quantas e quantas vezes Maluf nadou, nadou e, ao final, morreu na praia? Em 1990, nas eleições para governador, ele não se elegeu no primeiro turno por um fio. No segundo foi derrotado pelo então quercista Fleury. O mesmo Maluf esteve à frente de Luiza Erundina, nas eleições para a capital do Estado. Na reta final, a então petista foi vitoriosa.

Hélio Costa, em Minas Gerais, tem uma história idêntica de liderar as pesquisas até a undécima hora, para em seguida quebrar a cara e perder a eleição. Quem garante que agora ele está livre deste risco?

Estragos reais

Os exemplos são inúmeros. O que é comum a todos eles é que, como diria o Barão Itararé, “cada eleição é uma eleição”. Traçar regras absolutas merece, com louvor, o substantivo estupidez.

O grave não é a proliferação das pitonisas, até porque elas seriam apenas figuras folclóricas, que cairiam no ridículo quando as urnas fossem abertas, ou mesmo quando a próxima pesquisa fosse divulgada.

O problema é que suas adivinhações são divulgadas pelos meios de comunicação como verdades absolutas. Influenciam parcelas do eleitorado menos conscientizadas. Arrefecem o ânimo da militância.

Um dos grandes estragos está no financiamento das campanhas. São poucos os que jogam dinheiro em quem está irremediavelmente por baixo. Quanto menos pontos percentuais nas intenções de votos, menos o caixa da campanha é irrigado. Isso é válido para empresas e grandes doadores. As posições podem ser trocadas, mas quem garante, se os “especialistas” já decretaram quem vence e quem perde, antes que o processo eleitoral sequer esquente?

Desmentido

Poucos são aqueles que pesquisam as posições das “pitonisas”, confrontando o que diziam há semanas ou meses com o que pontificam agora. Sem citar o nome, um membro paulistano dessa espécie garantia em abril que Dilma havia atingido o teto da transferência de votos de Lula para ela, quando Serra conservava a vantagem superior a 7 pontos percentuais. Agora, esse mesmo analista garante que a fatura já está resolvida.

No final de 2009, uma figura proeminente de determinado instituto de pesquisa, numa entrevista, assegurou que os levantamentos indicavam que agora o país vivia uma era tucana e que era praticamente certa a vitória de José Serra, que já era o favorito para obter a indicação do PSDB. Há dias, ele afirmou o contrário.

Como apontou Dora Kramer, se o quadro virar, sem pruridos, os adivinhos arranjarão um fator qualquer para explicar a nova realidade, talvez a propaganda eleitoral gratuita, os debates, ou, quem sabe, a direção das nuvens. Sem rubor, continuarão a reivindicar para si o papel de “especialistas”.

O exercício da adivinhação é livre. A ele pode se dedicar quem quiser. Apesar do estrago que causam, as pitonisas têm contra si a história.

Os eleitores, a quem essa gente pretende reduzir a coadjuvantes, teimam em ter desígnios que a razão das pitonisas desconhece.

Datafolha – Marco Antonio Villa

DEU NO BLOG DO VILLA

É inexplicável a apatia da oposição. Sem panfletarismo barato, este resultado (47% e vitória no primeiro turno) não é devido única e exclusivamente à estratégia do governo. É que do outro lado não há nenhum oponente. Consequentemente, Dilma faz (e muito mais, Lula) sozinha a campanha, como se fosse meramente o cumprimento do calendário eleitoral. Não precisa sequer elevar o tom dos discursos. Eleitoralmente, a campanha de Dilma é perfeita. Politicamente, pensando no futuro do país, bem, aí é outra história.

Numa situação eleitoral péssima para a oposição, qualquer um imaginaria que seus líderes marcariam alguma reunião urgente para analisar e repensar a estratégia. Nada disso. Da lado da oposição temos o silêncio dos omissos e daqueles que imaginam que podem obter algum ganho com a derrocada da candidatura Serra.

Os apoiadores de Dilma já estão com as facas e o garfos prontos para a partilha. É gente que tem experiência, anos de especialização, no saque organizado do Estado.

Política e cultura :: Cesar Maia

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Brizola dizia que governo investir em cultura cria sempre problema, pois, aí, cada cabeça uma sentença: sempre se desagrada mais do que se agrada.

Parece que, em geral, essa tem sido a motivação dos presidentes da República nestas últimas décadas. Às vezes um ministro silencioso, outras vezes um alegre... e tudo vai ficando na mesma: o patrimônio cultural se deteriorando, os museus do mesmo jeito, e episódicos programas, projetos e eventos. As leis de incentivo fiscal têm sido um alívio para os governos: demonstram que gastam e repassam ao setor privado. Ou se empurra para as empresas estatais.

Eventos ocasionais e em dias-calendário de festas religiosas e folclóricas geram um dissenso muito menor. A defesa do patrimônio histórico e cultural se faz com zelo, mas os recursos para recuperar esse mesmo patrimônio são escassos. Há PAC de tudo, só não há de cultura.

As escolas de música vão sendo fechadas país afora, e o apoio se concentra em percussão, como um sinal da relação de cultura com inclusão social. A formação de plateia para concertos, óperas e balés pouco existe e nada cresceu.

Os promotores têm o cadastro praticamente invariável. No Rio, representa mísero 0,1% da população com mais de 14 anos. Os concertos para a juventude ocupam mais de 60% do uso de salas como a Cité de La Musique em Paris ou a Sala de Luxemburgo.

Do outro lado da rua, os discípulos governistas do filósofo marxista Louis Althusser, morto em 1990, pretendem um Estado expandido ("Aparelhos Ideológicos de Estado") e, entre estes, a cultura, as letras e as belas artes.

Esses querem regulamentar a cultura, quebrar a sua diversidade intrínseca e ditar regras sobre o que deve ou não deve ser feito. E ficam pensando em conselhos e conferências de todos os tipos, na busca de respostas à passividade dos governos com seu ativismo ideológico.

E, no meio da omissão e do ativismo, segue a cultura como uma subárea dos governos federais, cujas ações são muito mais para acalmar e ganhar tempo, sem que nada de substantivo ocorra. O ministério é, às vezes, dado como presente na compensação partidária de composição de governo. Ou tem um efeito simbólico com nomes de destaque, para despertar otimismo na "classe".

Às vezes nem isso.

Lá se vai a campanha eleitoral em etapa avançada com a entrada da TV, as entrevistas no "JN", os debates...

E até aqui nenhum dos candidatos reservou um minúsculo minuto do tempo que tem à disposição para falar de sua política cultural. Nem um minuto. "E La Nave Va".


Cesar Maia escreve aos sábados nesta coluna.

Caetano Veloso - Jaques Morelenbaum - "Carinhoso" (2000)

Serra defende Zona Franca de Manaus

DEU EM O GLOBO

Tucano promete, se eleito, manter benefícios tributários ao polo industrial, além de investir em pesquisas ambientais

Paula Litaiff*

MANAUS. Em reunião com mais de cem empresários do Amazonas, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, defendeu para a Zona Franca de Manaus (ZFM) a perenidade do benefício tributário na região. Negando ser contrário ao projeto, Serra afirmou que "por muitos anos" adversários políticos "inventaram" a ideia de que ele queria extinguir a Zona Franca, e que, por isso, alguns trabalhadores e empresários criaram um conceito desfavorável a suas propostas.

- Existia um boato de que sou contra a Zona Franca. Foi muito importante esta vinda a Manaus para ver de perto o progresso da cidade e poder dizer a todos aqui que sou a favor desse desenvolvimento, mas de forma contínua, de forma perene.

Desde sua criação, na década de 60, a Zona Franca precisa passar por aprovação no Congresso Nacional a cada dez anos para permanecer com os benefícios tributários. Ao defender a continuidade do modelo econômico, o candidato recebeu muitos aplausos dos empresários e assessores do grupo Lideranças Empresariais (Lide), que reúne empresas com faturamento acima de R$100 milhões por ano.

No encontro, Serra criticou o aeroporto e o principal porto da região, a Estação Hidroviária de Manaus. Caso eleito, prometeu mudar o cenário:

- A estrutura do aeroporto pode ser considerada indecente, principalmente para uma cidade que vai ser uma das sedes da Copa em 2014.

O candidato criticou o contingenciamento de verbas feito pelo governo federal e afirmou que "dinheiro não falta" aos projetos de infraestrutura viária e portuária do Amazonas.

- O governo federal tem contingenciados mais de R$800 milhões de taxas das indústrias de Manaus, que deveriam ser investidos em obras de infraestrutura, como a construção de estradas e recuperação de vias e portos.

Ao ser indagado sobre políticas de combate ao desmatamento, Serra disse que a fiscalização de órgãos como o Ibama está sendo eficiente. E afirmou que, se eleito, vai aumentar os recursos para pesquisas e fomento da biotecnologia.

- É preciso compatibilizar a defesa do meio ambiente com o oferecimento de oportunidade econômica para as pessoas.

O tucano ressaltou que no Amazonas, assim como em outros estados da Região Norte, ainda faltam mais investimentos em pesquisas ambientais.

- Vou investir pesado em pesquisas para aproveitar a biodiversidade. Não é caro. Em São Paulo, investimos R$150 milhões na Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e a colocamos na dianteira.

Ontem também, José Serra visitou a fábrica da Moto Honda, no Distrito Industrial de Manaus.

(*) Especial para O GLOBO

PT e grupo da AL apoiam controle da mídia

DEU EM O GLOBO

Em encontro em Buenos Aires, participantes dão respaldo ao venezuelano Chávez e elogiam Dilma

Monica Yanakiew

BUENOS AIRES. O maior controle estatal sobre os meios de comunicação de massa, a descriminalização do aborto e uma política regional de combate ao narcotráfico (para limitar a presença militar dos EUA na América Latina e no Caribe) foram algumas das propostas aprovadas ontem no XVI encontro do Foro de São Paulo. Da reunião participaram 600 representantes de 54 organizações políticas de esquerda da América Latina e do Caribe, entre elas o PT.

No Foro, discutiu-se a "democratização dos meios de comunicação", elogiando a Argentina. Por iniciativa da presidente Cristina Kirchner, o Congresso aprovou uma polêmica lei que limita o poder de conglomerados da mídia - como o Clarín. Mas a lei, segundo a oposição, aumenta o controle do Estado sobre a divulgação de informações. A lei prevê que as ONGs terão acesso a um terço do espaço audiovisual, assim como as mídias públicas e privadas. Ao mesmo tempo, impede empresas de ter um canal aberto e um canal a cabo de TV na mesma região.

A resolução, aprovada no Foro, considera necessário que o Estado intervenha para "colocar limites na concentração dos meios" e formular "políticas públicas de comunicação". O documento cita, além da Argentina, o Paraguai e o Brasil - três países que teriam conseguido instalar o debate sobre a credibilidade dos grandes meios de comunicação. Um dos resultados, diz a resolução, foi "a queda nos níveis de venda e de audiência" dos jornais e das emissoras de TV.

Na declaração final do encontro, em Buenos Aires, os participantes do Foro - que tem como secretário-geral Valter Pomar, do PT - deram apoio ao presidente da Venezuela, Hugo Chávez, nas eleições legislativas, e felicitaram Dilma Rousseff, candidata do PT no Brasil.

PSDB e PT se atacam sobre mídia

DEU EM O GLOBO

BRASÍLIA. O PSDB voltou a criticar ontem o governo Lula por medidas que considera contra a liberdade de imprensa. O presidente do partido, Sérgio Guerra, divulgou nota classificando de "falsa e nociva" a resposta do ministro da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, às declarações do presidenciável José Serra sobre o assunto, no 8º Congresso Brasileiro de Jornais. Franklin acusou o tucano de "faltar com a verdade"ao dizer que o governo Lula cerceia a liberdade de expressão.

"As liberdades de imprensa e de informações não são dádivas de governo. São conquistas da sociedade brasileira, imperativos constitucionais indissociáveis do estado democrático de direito. O PT tem investido contra elas desde o início do atual governo. As ações do ministro Franklin Martins as têm ameaçado desde o início de sua gestão", disse Guerra em nota. Franklin não comentou a nota.

Em outra nota, porém, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Luiz Dulci, atacou Serra, que criticara as conferências setoriais. Para Dulci, Serra defende a volta da"democracia elitista": "As acusações descabidas do candidato Serra contra a participação social desconsideram a trajetória de lutas e conquistas da sociedade civil brasileira e a sua contribuição para o enriquecimento da democracia representativa".


Guerra: Franklin ameaça liberdade de expressão

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Presidente do PSDB afirma que o ministro da Comunicação Social e o PT têm investido contra a imprensa desde o início do governo

Ana Paula Scinocca

A guerra entre o Planalto e o PSDB em torno da liberdade dos meios de comunicação esquentou ainda mais ontem. O senador pernambucano Sérgio Guerra, presidente nacional do partido e coordenador da campanha de José Serra (PSDB), acusou o ministro Comunicação Social, Franklin Martins, de ameaçar a liberdade expressão.

Guerra divulgou nota pela manhã, na qual classificou como "falsa e nociva" a manifestação da véspera de Franklin Martins.

Em reação às declarações de Serra, que anteontem acusou o governo Lula e o PT de tentar intimidar e manipular a imprensa, o ministro da Comunicação Social havia afirmado que era "grave e descabida" a acusação do presidenciável e que o tucano "falta com a verdade", além de "contribuir para arranhar a imagem internacional do Brasil, dando a entender que nossas instituições são frágeis".

Sérgio Guerra advertiu que "as liberdades de imprensa e de informações não são dádivas de governo, mas sim conquistas da sociedade brasileira, imperativos constitucionais indissociáveis do Estado Democrático de Direito".

Em nota, o dirigente do PSDB prosseguiu: "O PT tem investido contra elas desde o início do atual governo. As ações do ministro Franklin Martins as têm ameaçado desde o início de sua gestão."

Guerra lembrou que "se a imprensa no Brasil é livre e cumpre sua missão", como diz Franklin, "deve isso não ao governo e a seu partido, o PT, mas à derrota e à rejeição das ameaças contra a liberdade de expressão expostas no Plano Nacional de Direitos Humanos III e no primeiro da série de programas de governo registrados pela candidata do PT, Dilma Rousseff, no Tribunal Superior Eleitoral".

Guerra também citou as "conferências nacionais, em que um punhado de militantes pretendendo falar em nome da sociedade, que não lhes deu tal delegação, propõem o "controle social da mídia" e a criação de instâncias punitivas para os que não se submetam aos seus ditames". Acrescentou: "Jornalista, o ministro Franklin Martins já manifestou publicamente seu entusiasmo pelas teses que conspiram contra os fundamentos mais elementares de sua profissão."

Ontem, Franklin preferiu ficar fora da polêmica. Mas, em nota à imprensa, o ministro Luiz Dulci, da Secretaria-Geral da Presidência, rebateu Serra, dizendo que o candidato ataca a "promoção da participação social na elaboração e fiscalização das políticas públicas". Afirmou que, ao fazer esses ataques, o tucano defende o retorno de "uma concepção elitista de democracia", na qual a população não tem o direito de ser ouvida nas decisões de governo.

"As acusações descabidas do candidato Serra contra a participação social desconsideram a trajetória de lutas e conquistas da sociedade civil brasileira e a sua contribuição para o enriquecimento da democracia representativa."

'Serra tem tido todo o meu apoio'

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

Alckmin diz que cancelará sua agenda para acompanhar o presidenciável em São Paulo

Roberto Almeida e Daniel Bramatti

O tucano Geraldo Alckmin anunciou ontem, durante a sabatina promovida pelo Estado, que deixará de lado sua própria agenda de candidato sempre que for preciso acompanhar seu correligionário José Serra em eventos de campanha em São Paulo.

Alckmin disse estar seguro de que Serra chegará ao segundo turno na disputa presidencial e prometeu "todo o apoio" a ele. O candidato a governador negou que sua derrota na disputa pela Prefeitura de São Paulo, em 2008, tenha sido causada pela falta de empenho de Serra em sua campanha. Então governador, Serra praticamente não participou da campanha do colega de partido, pois preferia que Gilberto Kassab, do DEM, fosse o vitorioso. "Em eleição a gente não deve transferir responsabilidade. A responsabilidade (pela derrota) é minha." A seguir, trechos da sabatina:

Lula na TV

O Serra nem mencionou o Lula (na televisão). O fato é que o Serra foi governador de São Paulo no mesmo período em que o Lula foi presidente. A política exige civilidade. Não vejo nenhum problema nisso. Não é desespero (usar a imagem do presidente). A campanha está começando. O Serra vai para o segundo turno. Eu já estou apoiando, é óbvio. O Serra está em primeiro lugar em São Paulo. Ele terá todo meu apoio, como tem tido. Eu já fui candidato a presidente da República.
Você não tem como ficar apenas em São Paulo. São 26 Estados, e mais o Distrito Federal, para fazer campanha. Mas, quando o Serra estiver em São Paulo, eu cancelo toda a minha agenda. A agenda é dele. Nós estaremos juntos, percorrendo o Estado inteiro. Serra foi um bom prefeito de São Paulo, um bom governador do Estado, um bom ministro da Saúde, um bom ministro da área econômica.

Serra em 2008

(Serra) Não deixou na mão, não. Em eleição a gente não deve transferir responsabilidade. A responsabilidade (pela derrota) é minha. Quando fui candidato a prefeito de São Paulo, eu andava na rua e as pessoas diziam: "Tudo bem, mas daqui a dois anos o senhor vai ser candidato a governador, não é?" Não, eu dizia que seria prefeito.

TV Cultura

Não acho (que haja interferência do PSDB na TV Cultura), não tem procedência. A matéria (sobre pedágios, que supostamente teria provocado a queda de um diretor) foi ao ar. É um assunto interno. A TV Cultura tem uma fundação, tem conselho próprio. Eu fui governador por cinco anos e meio e nunca interferi em nada. Só acho que ela deve ter foco cada vez mais educativo e cultural, porque é isso que justifica colocar recursos públicos. Zero de interferência.

Dossiês

Na eleição passada, (houve apreensão de) R$ 1,7 milhão para comprar um dossiê falso. O candidato (Aloizio Mercadante, do PT) disse ontem que não tinha conhecimento. Será que a pessoa que foi presa com o dinheiro tirou do seu bolso, tinha guardado R$ 1,7 milhão?

Alguém vai acreditar numa coisa dessas? E até hoje não descobriram a origem do dinheiro. É lastimável. São desvios de conduta muito graves, sérios e reincidentes. E há outros casos, de violação do sigilo do vice-presidente do PSDB na Receita Federal. A injustiça cometida contra um cidadão é uma ameaça à toda a sociedade. Hoje a vítima é uma, amanhã vai ser outra.

Existem princípios de gestão, de espírito público, que nós precisamos recuperar no Brasil.

Recursos de campanha

Fazemos uma campanha modesta. Vamos gastar o mínimo necessário. O caro numa campanha eleitoral é rádio e televisão. Mário Covas diz que deveria ter uma mesinha e uma cadeira. Você tem 4 minutos por dia. Então você senta lá fala o que defende. Custo zero.

Hoje virou uma coisa cinematográfica. Quanto mais dinheiro tem, mais pode produzir isso.

Eu defendo a mesinha e a cadeira. Já melhorou, hoje está proibido camiseta, brinde, show de artista. Precisávamos fazer uma coisa mais verdadeira. O objetivo de uma campanha é discutir propostas, ver o que as pessoas pensam. Sou favorável ao financiamento público de campanha, mas não nesse momento, O Brasil não tem partido político ainda. Quando há mais de 30 partidos, não há partidos.

Conflitos no campo

Nós temos o Itesp, Instituto de Terras do Estado de São Paulo. O Estado faz reforma agrária, temos milhares de famílias assentadas. Agora, invasão de terra, não. Invadiu, vai desinvadir.

Ou nós respeitamos a lei ou vai virar bagunça. Terra invadida não pode ser objeto de desapropriação. E alguns fazem discurso contra invasão de terra, mas o PT liberou para essas entidades ligadas ao Movimento dos Sem-Terra R$ 160 milhões em 8 anos. Dinheiro público. Sou favorável à reforma agrária. Contra invasão de terra. Entramos na Justiça e conseguimos parte das terras no Pontal do Paranapanema. Temos mais de 100 assentamentos no Estado.

Ficha Limpa

Sou favorável. Acho que os próprios partidos poderiam implementar. O Supremo Tribunal Federal vai acabar dando a interpretação final sobre a polêmica. A lei vale para condenações anteriores ou só daqui para a frente? Minha opinião é de que já vale. O objetivo do legislador, quando aprovou a lei, era evitar que alguém condenado em crimes contra o patrimônio pudesse se candidatar. Não é para o futuro, É para o que já ocorreu.

Ex-adversários

O último governador antes do Mário Covas foi o (Luiz Antonio) Fleury, não o Orestes Quércia (sobre o comentário de que o PSDB teria assumido um Estado quebrado). É inegável que a situação financeira do Estado era dificílima. Tanto é verdade que nós, que éramos oposição, ganhamos a eleição. Vivemos em um sistema pluripartidário. O PMDB é um partido grande, importantíssimo. O Quércia tem sido muito correto conosco e com o Serra. Uma parte do PMDB está apoiando o Serra. Jarbas Vasconcelos, candidato ao governo de Pernambuco, um setor de São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul... Temos aí sete ou oito Estados em que o PMDB nos apoia, o que é muito necessário e positivo.

Serra defende uso da imagem de Lula

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O candidato à Presidência José Serra (PSDB) defendeu a exibição de imagens suas com o presidente Lula no horário eleitoral contestada pelo PT. "Não sei por que estão se incomodando. Só dissemos que eu e Lula somos políticos experientes", afirmou Serra, em referência à suposta inexperiência da candidata Dilma Rousseff (PT). Aliados do tucano questionaram a eficácia da estratégia, mas o núcleo próximo do candidato diz que a ideia é mostrar Serra como o candidato do pós-lula.

Serra defende uso da imagem de Lula no seu programa no horário eleitoral

Aparição do presidente ao lado do tucano causou polêmica entre aliados do ex-governador e levou PT a anunciar recurso ao TSE

Julia Duailibi, Ana Paula Scinocca, Liege Albuquerque e Anne Warth

O candidato do PSDB à Presidência, José Serra, defendeu ontem a exibição de imagens suas com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no horário eleitoral gratuito. "Não sei por que estão se incomodando", reagiu o tucano.

"Só dissemos que eu e Lula somos políticos experientes, é uma verdade. Que nossos nomes têm história, outra verdade. Por último, que eu tenho mais vivência do que Dilma, mais uma verdade indiscutível", afirmou Serra, em entrevista ontem em Manaus (AM), depois de almoço com empresários.

No programa na televisão exibido na noite de quinta-feira, foi mostrada uma imagem de Serra, então governador de São Paulo, ao lado do presidente. A locução da peça dizia que os dois eram "líderes experientes" e "homens de história".

A aparição do presidente no programa tucano alimentou polêmica entre integrantes do PSDB e legendas aliadas, que questionaram a eficácia de colocar a imagem no ar. Mas para o núcleo mais próximo do tucano a exibição atende à estratégia de mostrar que Serra é o candidato do pós-Lula. O alvo, dizem, é a adversária do PT, Dilma Rousseff, e não um presidente muito bem avaliado pela população.

Os testes feitos com eleitores pela campanha tucana também mostraram que as pessoas não teriam achado confusa a aparição de Lula no programa de Serra. Durante cinco segundos, foram exibidas fotografias que, no entender dos estrategistas do partido, mostram que, embora de partidos diferentes, Lula e Serra teriam mais coisas em comum, como história e liderança, do que Lula com Dilma.

Os advogados do PT informaram que entrarão com representação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra o uso das imagens de Lula. Para os petistas, o artigo 54 da Lei Eleitoral vedaria a exibição de Lula no programa.

A lei diz que poderá participar no horário eleitoral gratuito de determinado partido "qualquer cidadão não filiado a outra agremiação partidária ou a partido integrante de outra coligação".

De acordo com essa lógica, o presidente Lula, filiado ao PT, não poderia aparecer no programa do PSDB, seu adversário.

Os tucanos questionaram o argumento legal. Informaram que trata-se de uma foto do presidente da República com um então governador. Exibi-las seria diferente de colocar Lula pedindo votos a Serra, o que seria ilegal.

Tropa. Apesar de algumas críticas no bastidor, a tropa de choque serrista saiu publicamente em defesa do programa. O coordenador da campanha, senador Sérgio Guerra (PE), disse que a aparição de Lula reflete a verdade. "Ambos têm trajetória parecida, experiência e liderança comprovada", disse. "Já a candidata Dilma não tem."

Segundo Guerra, a aparição de Lula é "algo momentâneo" e sem a relevância que a imprensa dá. "Essa discussão está mais na cabeça das pessoas iluminadas do que na do povo", minimizou. "Não é um fato de campanha."

Para o deputado Jutahy Júnior (BA), um dos principais aliados de Serra, a cena mostra "civilidade" entre os dois políticos. "Não existe mentira ou ilegalidade na cena. Mostra uma relação civilizada e institucional", disse. "Não tem trucagem nem texto mentiroso."

Sucessor de Serra no Palácio dos Bandeirantes, o governador Alberto Goldman (PSDB) afirmou que o uso das imagens não configura crime eleitoral, pois mostram apenas o presidente ao lado do então governador. "Qual é o mal disso?", questionou, durante a inauguração do campus de Sorocaba da Universidade Federal de São Carlos.

"A legislação proíbe que alguém vá a alguma apresentação na TV ou em lugar de um outro candidato. Não proíbe a apresentação de fotografia. Isso é o fim do mundo", disse, em referência ao anúncio do presidente do PT, José Eduardo Dutra, de que entrará com representação contra Serra. Sobre as declarações de Dilma, que classificou de patética a tentativa de Serra de associar seu nome ao de Lula, Goldman alfinetou: "Ela é patética."

O senador Cícero Lucena (PSDB-PB) também defendeu o uso da imagem de Lula. "A imagem é para mostrar que vamos olhar o Brasil para frente, que não vamos acabar com os bons projetos feitos. Não vai haver rupturas. Isso é importante para esclarecer o eleitor", defendeu.

Empresários. Serra reuniu ontem cerca de 500 empresários do Amazonas em evento do grupo Lideranças Empresariais (Lide). O candidato fez uma visita à fábrica da Honda, no Distrito Industrial de Manaus. No fim da tarde, houve uma caminhada no centro comercial, na qual Serra foi acompanhado do senador Arthur Virgílio (PSDB).

Durante o almoço, Serra conseguiu aplausos ao defender a perenização do modelo de isenção de tributos da Zona Franca de Manaus. Buscou desmentir boatos no Estado onde o PSDB tem historicamente as piores votações em eleições à Presidência.

"Além desse boato antigo de que sou contra a Zona Franca de Manaus, que só posso repetir que é mentira sempre, hoje vieram dizer que sou contra o Prosamim (programa de saneamento ambiental dos igarapés de Manaus, do governo estadual). Nem sei direito o nome do projeto e não sou contra, meus aliados dizem que é um bom projeto."

Na palestra aos empresários, Serra criticou o aeroporto e o principal porto da região, anunciando que seu projeto de governo inclui obras nesses locais. "A estrutura do aeroporto pode ser considerada indecente, principalmente para uma cidade que vai ser uma das sedes da Copa em 2014", declarou o candidato.

Serra aposta em estados onde PSDB é favorito

DEU NO ESTADO DE MINAS

Ivan Iunes

Brasília - O comando da campanha do PSDB à Presidência definiu como prioridade para as próximas semanas garantir os votos nos estados em que há chances claras de candidatos tucanos se elegerem governador. Assim, José Serra reforçará a agenda no Paraná, Pará, Goiás e São Paulo, considerados trincheiras mais fortes da oposição. A ideia é tentar estancar a queda de Serra nas pesquisas, amparando o tucano em candidaturas regionais bem avaliadas pelo eleitor.

Pela estratégia, os candidatos aos governos serviriam de motor para alavancar Serra nessas regiões. Nos locais em que existe rejeição maior a Lula, há a chance de crescermos. Lula foi ao Paraná, por exemplo, e o Osmar Dias (candidato do PDT ao governo paranaense) caiu 10 pontos. Ganharam Beto Richa (adversário tucano de Osmar) e Serra, aponta o coordenador da campanha tucana, Sérgio Guerra (PSDB-PE).

O Pará receberá a visita de Serra na segunda-feira, seguido por Paraná e Goiás. São Paulo, assim como Rio de Janeiro e Minas, é agenda semanal fixa. No Rio, os eventos se repetem religiosamente na Baixada Fluminense aos sábados. Serra já foi a Duque de Caxias e Nova Iguaçu nos últimos 20 dias. A rotina no estado tem como principal motivação a falta de palanque a governador e a crise constante com o DEM, maior aliado dos tucanos.

Outra polêmica foi a exibição da imagem de Lula que abriu o programa de quinta-feira. Os tucanos são acusados por petistas de tentar ludibriar o eleitor ao sugerir proximidade entre Lula e Serra. Para o PSDB, a imagem apenas tem o intuito de aproximar os currículos. Serra tem trajetória. Dilma, não. Além do mais, o eleitor está muito bem informado, sabe que Lula apoia a candidata do partido dele, aponta Guerra.

Em visita a Manaus, Serra aproveitou para criticar a adversária, que seria contrária ao fundo para preservação do meio ambiente em escala mundial, rejeitado no ano passado pela convenção do clima em Copenhague, na Dinamarca. O maior beneficiado seria o Brasil porque ele vai dar valor de mercado à preservação florestal. Devo dizer, sem qualquer veneno eleitoral, que Dilma era contrária a participar deste fundo.

Dilma dispara, dobra vantagem e venceria Serra no 1 º turno

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Petista sobe 6 pontos e vai a 47%; tucano cai a 30%, diz Datafolha; Embalada pela TV, candidata ganha em todas as regiões e classes, à exceção dos mais ricos

Pesquisa Datafolha em todo o país mostra que Dilma Rousseff (PT) duplicou sua vantagem em relação a José Serra (PSDB) depois de três dias de propaganda eleitoral no rádio e na TV. Com esses números, a candidata se elegeria no primeiro turno. Dilma tem agora 47%, ante 30% de Serra. Em votos válidos, a petista vai a 54%, acima dos 50% para definir a eleição. A diferença entre os dois subiu de 8 para 17 pontos. Hoje, o tucano não lidera em nenhuma região do país. Com 9%, Marina Silva (PV) variou um ponto para baixo.

Na pesquisa espontânea, Dilma foi de 26% para 31%. Serra, de 16% para 17%. A margem de erro máxima do levantamento é de dois pontos percentuais.


Dilma abre 17 pontos sobre Serra e venceria no 1º turno

Petista vai a 47%, e tucano tem 30% após horário eleitoral, aponta Datafolha

Marina oscilou de 10% para 9%; candidata do PT tem 54% dos votos válidos; 34% dizem ter assistido propaganda

Fernando Rodrigues

DE BRASÍLIA - Na primeira pesquisa Datafolha depois do início da propaganda eleitoral no rádio e na TV, a candidata a presidente Dilma Rousseff (PT) dobrou sua vantagem sobre seu principal adversário, José Serra (PSDB), e seria eleita no primeiro turno se a eleição fosse hoje.

Segundo pesquisa Datafolha realizada ontem em todo o país, com 2.727 entrevistas, Dilma tem 47%, contra 30% de Serra. No levantamento anterior, feito entre os dias 9 e 12, a petista estava com 41% contra 33% do tucano.

A diferença de 8 pontos subiu para 17 pontos. Marina Silva (PV) oscilou negativamente um ponto e está com 9%. A margem de erro máxima do levantamento é de dois pontos percentuais.

Os outros candidatos não pontuaram. Os que votam em branco, nulo ou nenhum são 4% e os indecisos, 8%.

Nos votos válidos (em que são distribuídos proporcionalmente os dos indecisos entre os candidatos e desconsiderados brancos e nulos), Dilma vai a 54%. Ou seja, teria acima de 50% e ganharia a disputa em 3 de outubro.

Os que viram o horário eleitoral alguma vez desde que começou, na terça-feira, são 34%. Entre os que assistiram a propaganda, Dilma tem 53% e Serra, 29%.

Nos primeiros programas, Dilma apostou na associação com Lula, que tem 77% de aprovação, segundo o último Datafolha

A petista cresceu ou oscilou positivamente em todos os segmentos, exceto entre os de maior renda (acima de dez salários mínimos).

Dilma tinha 28% de intenção de voto entre os mais ricos e manteve esse percentual. Mas sua distância para Serra caiu porque o tucano recuou de 44% para 41% nesse grupo, que representa apenas 5% do eleitorado.

Mulheres e Sul

Já entre as mulheres, Dilma lidera pela primeira vez. Na semana anterior, havia empate entre ela e Serra, em 35%. Agora, a petista abriu 12 pontos de frente nesse grupo: 43% contra 31% de Serra.

Marina tinha 11% e está com 10% entre as mulheres. A verde continua estável desde março no Datafolha. Tem mostrado alguma reação só entre os mais ricos, faixa em que tinha 14% há um mês, foi a 17% e agora atingiu 20%.

A liderança de Dilma no eleitorado masculino é maior do que entre o feminino: tem 52% contra 30% de Serra. A candidata do PV tem 8%.

Outro número bom para Dilma é o empate técnico no Sul. Ela chegou a 38% contra 40% de Serra. Há um mês, ele vencia por 45% a 32%.

Serra não lidera de forma isolada em nenhuma região. No Sudeste, perde de 42% a 33%. No Norte/Centro-Oeste, Dilma tem 50%, e ele, 27%.

No Nordeste a petista teve uma alta de 11 pontos e foi a 60% contra 22% do tucano.

Houve também um distanciamento de Dilma na disputa de um eventual segundo turno. Se a eleição fosse hoje, ela teria 53% contra 39% de Serra. Há uma semana, ela tinha 49% e ele, 41%.

Na pesquisa espontânea, em que eleitores declaram voto sem ver lista de candidatos, Dilma foi de 26% para 31%. Serra foi de 16% a 17%.

Estratégia de Serra tem "prazo de validade"

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Sob fortes críticas dos aliados, campanha do tucano pede 15 dias para avaliar êxito da tática de grudar em Lula

Ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é um dos mais insatisfeitos; Jefferson também ataca a propaganda de Serra

Catia Seabra


DE SÃO PAULO - Apesar da reação de tucanos e aliados, está mantida a linha de comunicação da campanha de José Serra à Presidência, incluindo o eventual uso de imagens do presidente Lula na TV.

A estratégia tem, no entanto, prazo de validade: a Semana da Pátria.

A menos que haja grave turbulência até lá, a campanha trabalha com um prazo de até 15 dias para avaliação da eficácia do programa.

Haverá correção de rota se a candidatura não apresentar, até o feriado de Sete de Setembro, fôlego para chegada ao segundo turno.

Serra avaliza o trabalho do coordenador de comunicação, Luiz Gonzalez. Mas já dá sinais de desconforto, consultando aliados sobre a qualidade dos programas.

"Precisamos de pelo menos 10 dias para que haja uma maturação", afirma o presidente do PSDB, Sérgio Guerra (PE), escalado para pedir um voto de confiança aos aliados.

Inconformados, tucanos alertam para o risco de exaltação da imagem de Lula, patrocinador de Dilma Rousseff (PT). O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é um dos mais insatisfeitos.

"O programa homogeiniza todo mundo: "Somos todos herdeiros de Lula". Não sou filho de Lula. Nem a Dilma é minha madrasta", protestava Roberto Jefferson (PTB).

A intenção, porém, é persistir no confronto de biografias, o que inclui a associação com a trajetória de Lula.

O ex-prefeito Cesar Maia (DEM) confirma que a disposição é "checar o resultado em duas semanas mais". Segundo ele, a intenção de Gonzalez é mostrar que "Serra e Lula são "estadistas"". Mas que Dilma não está no mesmo patamar.

"Se o eleitor entender isso, será que ele quer um novo "estadista" ou exatamente o contrário, um pau mandado do Lula? Se for a segunda hipótese, é bumerangue. Se for a primeira, será um gol do Gonzalez."

A dificuldade, porém, será conter o PSDB. Ministro do governo FHC, Sérgio Amaral afirma que Serra tem sensibilidade social, mas lamenta que a candidatura não seja capaz de vocalizar esse compromisso para além das fronteiras de São Paulo.

O ex-ministro José Gregori defendeu a estratégia. Mas usou a expressão "esperança" para se referir às chances de Serra. "Minha esperança é que possamos desmontar o marketing de Lula."

Governo Lula não mudou a calamidade no saneamento

DEU EM O GLOBO

Pesquisa do IBGE revela que em 2008, sexto ano do governo Lula, o país ainda enfrentava situação de calamidade no saneamento: nada menos que 32 milhões de domicílios brasileiros (56% do total) ainda não eram atendidos por rede de esgoto, índice de pais subdesenvolvido. Em 2000, quando a pesquisa foi feita pela última vez, havia 36 milhões de domicílios sem esgoto (66%) - o que mostra que a situação pouco mudou. Neste período, os municípios sem rede coletora diminuíram apenas de 2.630 para 2.495 - cinco deles no Estado do Rio. O Ministério das Cidades descumpriu prazo para apresentar um plano de orientação dos investimentos em saneamento. Ele acabou em dezembro de 2008.

Retrato de subdesenvolvimento

Pesquisa do IBGE mostra que, em 2008, 56% dos domicílios não tinham rede de esgoto

Rafael Galdo

Num país que é considerado a oitava maior economia do mundo, 32 milhões de domicílios (56% do total) ainda não eram atendidos por rede geral de esgoto em 2008, sexto ano do governo Lula. Os números, com contornos de calamidade pública, foram revelados na Pesquisa Nacional de Saneamento Básico (PNSB) 2008, divulgada ontem pelo IBGE. De acordo com o levantamento, 2.495 municípios (44,8% do total) ainda eram totalmente descobertos de redes de esgoto dois anos atrás, e seus moradores tinham que recorrer a alternativas como fossas sépticas e rudimentares ou despejar esgoto em valões, rios ou terrenos vazios.

Dos temas investigados pela pesquisa do IBGE, (esgoto, lixo, abastecimento de água e drenagem), o saneamento foi o que apresentou os piores resultados e que avançou menos em relação à pesquisa anterior, em 2000. Em oito anos, só 135 cidades passaram a prestar o serviço. Os municípios sem rede de esgoto diminuíram apenas de 2.630 (em 2000) para 2.495 (em 2008). Neste período, o número de domicílios sem rede de esgoto diminuiu apenas de 36 milhões (66,5% do total) para apenas 32 milhões (56%).

A situação era mais grave nos estados mais pobres, no Norte e no Nordeste, e nas cidades menores, expondo desigualdades regionais. Enquanto 86,3% dos domicílios do Distrito Federal eram atendidos por rede geral de esgoto, em Rondônia o sistema só beneficiava 1,6% das residências. Quase a totalidade (99,8%) dos municípios paulistas prestavam o serviço, mas no Piauí eram só 4,5%, na lanterna do ranking nacional.

Rio: 31 cidades não tratam o esgoto

Mesmo no Sudeste, de onde vieram os melhores resultados, grande parte das cidades enfrentava graves deficiências em saneamento. No Rio, por exemplo, só cinco municípios (Teresópolis, Guapimirim, Mangaratiba, São Francisco do Itabapoana e Japeri) não tinham rede coletora, mas o serviço de saneamento era oferecido a menos da metade (49,2%) dos domicílios fluminenses.

Em Engenheiro Pedreira, distrito de Japeri, município com cerca de 100 mil habitantes na Baixada Fluminense, a doméstica Ana Marcelina Lins, de 61 anos, instalou fossas sépticas no quintal para receber o esgoto. Mas na porta da sua casa corre um valão. O córrego segue até o Rio Guandu, que quilômetros à frente receberá mais de 160 toneladas diárias de produtos químicos, a elevados custos ao estado, para ter suas águas tratadas e abastecer cerca de 9 milhões de pessoas na cidade do Rio e em parte da Região Metropolitana.

- O esgoto de Engenheiro Pedreira vai todo para o Guandu. É bom que o povo do Rio, que consome essa água, saiba disso, e que aqui tentem uma solução - reivindica Ana, enquanto o município diz buscar parcerias com o estado e a Fundação Nacional de Saúde (Funasa) para obras de saneamento.

Para André Castro, ex-presidente do Instituto Trata Brasil, esse desenvolvimento a passos lentos reflete o subdesenvolvimento que ainda persiste no país:

- O Brasil se orgulha de estar se desenvolvendo e de poder ser, em alguns anos, a quarta ou quinta economia do mundo. Mas não prioriza questões básicas como saneamento. Isso é a prova do nosso subdesenvolvimento. Não adianta dizer que é desenvolvido se não garante condições básicas de vida.

De acordo com a pesquisa, a situação em 2008 era ainda mais grave quando o assunto era o tratamento do esgoto, o que só 28,5% dos municípios, menos de um terço deles, fazia. E mesmo as cidades que o coletavam, muitas despejavam esses efluentes sem qualquer cuidado na natureza, na maioria das vezes em rios. No Rio, por exemplo, 31 municípios com rede de esgoto não o tratavam. Como resultado, rios degradados e obstáculos à recuperação de lagoas e da Baía de Guanabara, com prejuízos não só ao meio ambiente, mas também à saúde e à qualidade de vida de milhares de fluminenses.

O lixo e a água escura da Praia do Catalão, na Ilha do Fundão, são o retrato desse problema, a despeito dos milhões gastos em programas de despoluição da Baía. É nessa praia que o aposentado Genival de Oliveira, de 79 anos, morador da Favela Nova Holanda, passa parte de seus dias há mais de 50 anos, pescando. Mas, se antes voltava para casa com fartura de peixes, hoje o que mais traz do mar no anzol é plástico:

- Chamo de "peixe saco". Às vezes passo o dia aqui, e volto para casa sem peixe. Todos os rios que chegam à Baía estão poluídos.

Na mesma praia, o serralheiro Rui Fernando Bastos, de 63 anos, morador de Bonsucesso, se exercita diariamente na curta faixa de areia que sobrou:

- Bom é quando a maré leva todo o lixo embora e deixa a areia branquinha. Apesar de todo esse lixo, a natureza aqui sobrevive. Ainda espero ver esse lugar livre da poluição.

Colaborou: Carolina Benevides

Número de crianças catadoras cresce e hoje é de 5.636

DEU EM O GLOBO

Houve aumento de 4,5% desde 2000. Rio é o estado com maior taxa

Rafael Galdo, Duilo Victor e Efrém Ribeiro

RIO e TERESINA. Apesar de o trabalho infantil ser proibido no aterro controlado de Jardim Gramacho, em Duque de Caxias, é comum ver filhos de catadores nas favelas do entorno separando lixo para trocar por algo que seus pais não podem oferecer, como um doce. No Parque Planetário, favela próxima ao aterro, Raíssa dos Reis, de 5 anos, ajudava ontem o pai a carregar latas de alumínio até um dos atravessadores de lixo para reciclagem. Uma realidade de 5.636 crianças com até 14 anos no universo de mais de 70 mil catadoras de lixo no país em 2008, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico 2008, divulgada ontem pelo IBGE.

Entre os desejos, ir à escola e ganhar uma bicicleta

De 2000 a 2008 nada avançou no combate ao trabalho de crianças e adolescentes nos vazadouros de lixo. Pelo contrário, houve até pequena piora. Em 2000, eram 5.393 crianças, 4,5% a menos que oito anos depois. No Parque Planetário, a menina Raíssa admitiu que o saco que carregava estava pesado, apesar de negar na frente do pai. E não escondia dois desejos: ir à escola e ganhar uma bicicleta.

- Onde eu vou, ela vai atrás. Ainda não está na escola, mas vou botar quando chegar a idade - prometia o pai, Samuel dos Reis, que tem outros três filhos mais velhos e negou que a filha já tenha ficado doente por causa do contato com o lixo.

Presidente de uma cooperativa de catadores de Gramacho e um dos líderes da classe na região, Nilson José dos Santos explica que o trabalho infantil é menos frequente do que no passado. Mas a atividade dos catadores é tão dominante em Jardim Gramacho que as crianças revolvem o lixo que sobra do lado do aterro por conta própria, como alguns dos filhos de Mara Lúcia de Almeida, de 36 anos, com 11 filhos e catadora em Gramacho desde os 13 anos.

- Nos últimos anos, porém, a mentalidade do catador mudou muito. As crianças agora estão na escola. O que não mudou foi o descaso do poder público - resume Nilson, que calcula 3.500 catadores em Gramacho.

Em 2008, o Rio era o estado com maior número de crianças catadoras no país: 1.150 entre seus 9.480 catadores, segundo reportaram municípios e entidades que trabalham com o lixo ao IBGE. Mas o ambientalista Sérgio Ricardo fala em mais de 40 mil catadores no estado, muitos deles crianças, que trabalham até nos vazadouros que proibiram sua presença, ou em lixões clandestinos.

No Piauí, por exemplo, havia 20 catadores com até 14 anos em 2008, segundo o IBGE. Mas a realidade parece diferente. Em Teresina, ainda com uniforme escolar, a menina Dângela Oliveira da Rocha, de 9 anos, andava esta semana sobre pneus e monitores de computadores quebrados no lixão do Morro da Esperança. A mãe, a catadora Rosângela Maria Oliveira Rocha, de 37 anos, justifica que, por uma questão de sobrevivência, leva Dângela para o lixão:

- Sustento oito filhos sozinha. Queria que eles só estudassem, mas não dá.

Para melhorar a vida de pessoas como Rosângela, a Política Nacional de Resíduos Sólidos, aprovada pelo presidente Lula no início do mês, prevê incentivos a catadores. Mas, se levada em conta a PNSB 2008, os desafios a essa política são enormes. A começar pelos lixões (a nova política institui o fim deles em quatro anos), que de acordo com o IBGE ainda eram o destino do lixo de 50,8% das cidades em 2008, contra 22,3% para os aterros controlados (também considerados inadequados) e 27,7% para os aterros sanitários. Em relação a 2000, porém, houve avanços. Naquele ano, 72,3% das cidades utilizavam lixões. Mas a substituição desses vazadouros se concentrou basicamente em Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo.

Os estados do Sul e Sudeste também se destacam na reciclagem do lixo, presente em 46% e 32,4% dos municípios dessas regiões, respectivamente, mas presente em apenas 994 municípios (17,8%) do país.

Doze milhões de casas sem água

DEU EM O GLOBO

Número de domicílios com abastecimento, porém, subiu de 34,6 milhões em 2000 para 45,3 milhões, diz IBGE

Fabio Brisolla e Efrém Ribeiro

RIO e TERESINA. O sistema de abastecimento de água ainda não chega a 12 milhões de residências brasileiras, segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, realizada pelo IBGE. E isso apesar de o número de domicílios conectados às redes de fornecimento de água ter subido de 34,6 milhões (em 2000, no levantamento anterior) para os atuais 45,3 milhões de lares - um aumento de 30,8% na oferta.

A distribuição de água ocorre em 99,4% das 5.565 cidades do país. O número, entretanto, está longe de representar um sistema eficaz. A pesquisa inclui na lista de municípios abastecidos por água aqueles onde o fornecimento é apenas parcial. Há situações, por exemplo, onde a água chega a apenas uma região do território municipal.

A rotina da dona de casa Antônia do Nascimento da Silva, de 34 anos, retrata a dificuldade enfrentada por outros milhões de brasileiros. Moradora da Zona Rural de Teresina, capital do Piauí, ela percorre diariamente uma distância de 500 metros até a chácara mais próxima de sua casa, onde consegue água potável no poço artesiano de um vizinho.

Antônia vive em um assentamento organizado pelo governo do Piauí, que conta com um poço com água imprópria para o consumo. Os assentados disseram ter investido R$300 na compra de uma bomba para puxar a água do poço. Mas o sabor salinizado obtido após a extração frustrou a pequena população local.

Segundo Antônia, as 26 famílias instaladas por lá acabam recorrendo à opção mais arriscada. Nem sempre elas têm à disposição um meio de transporte, como carroças ou bicicletas, para buscar a água potável no poço mais distante.

- Eu passo o dia carregando água e, quando chega a noite, estou com o corpo dolorido. Quando a gente bebe a água do poço do assentamento, imediatamente vêm as dores de barriga. Aconteceu comigo, com meu marido e minha filha. Meu filho de 12 anos deixou de ir à escola por causa de diarreia - contou a dona de casa.

Vizinho de Antônia, o agricultor José Ribamar Cardoso da Silva, de 44 anos, diz que os assentados já reivindicaram abastecimento de água para a comunidade. Mas, até o momento, não obtiveram a resposta esperada. A solução temporária escolhida pelo agricultor tem sido estocar em casa garrafas de plástico e vasilhames cheios de água.

- Assim não preciso ir todos os dias pegar água fora do assentamento - diz Ribamar.

O IBGE constatou a completa inexistência de redes de distribuição de água em 33 cidades. São áreas onde a população recorre a carros-pipa, poços particulares, chafarizes ou minas. Em 2000, a mesma pesquisa identificou 116 municípios sem qualquer acesso a redes de distribuição de água. No atual levantamento, a região Nordeste lidera o ranking, concentrando 21 dos 33 municípios sem rede de abastecimento. Onze cidades sem acesso à distribuição de água estão na Paraíba e outras cinco ficam no Piauí. A segunda região do ranking é a Norte, com sete municípios sem fornecimento, quatro deles em Rondônia.

A precariedade do sistema de distribuição de água é retratada pela pesquisa do IBGE. Entre as localidades equipadas com redes de fornecimento, 365 municípios distribuem a água para o uso da população sem tratamento adequado. Quase todos (99,7% dos casos) são municípios com menos de 50 mil habitantes. Enquanto a baixa qualidade da água predomina em algumas pequenas cidades do Brasil, em outras, chama atenção a existência de fontes alternativas de fornecimento.

A pesquisa identificou em 794 municípios, com redes oficiais de abastecimento de água, a existência de outras formas de distribuição avalizadas pelas próprias prefeituras. Neste último caso se enquadram as empresas privadas que oferecem o fornecimento de água através da instalação de poços artesianos particulares em residências, condomínios, estabelecimentos comerciais e indústrias. Cabe ressaltar que os poços construídos sem o aval da prefeitura ficam fora do alcance da pesquisa.

- Em algumas cidades, as próprias comunidades se associam para distribuir a água por meio de carros-pipa ou poços artesianos. Se esse grupo for registrado, com CNPJ, vai aparecer na pesquisa. Mas, caso contrário, não conseguimos identificar. O mercado informal escapa à pesquisa - explica Antônio Tadeu de Oliveira, gerente da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico do IBGE.

Além de poços artesianos instalados sem autorização, o tal mercado informal inclui também os "gatos", nome dado às conexões ilegais realizadas nas redes oficiais de distribuição de água.

'É vergonhoso e atenta contra a saúde'

DEU EM O GLOBO

Para médicos, saneamento evitaria mortes por diarréia, hepatite A e dengue

Carolina Benevides e Tatiana Farah

RIO E SÃO PAULO. "Devíamos ter tolerância zero com doenças que podem ser evitadas por um dos três pilares da saúde pública: saneamento, abastecimento de água e vacinação", diz Edmilson Migowski, médico e professor de infectologia da UFRJ. No entanto, de acordo com o Ministério da Saúde, em 2009, 206.414 pessoas morreram em todo Brasil de complicações da diarreia e gastroenterite. Em nota, o Ministério explica que não tem estimativa de quantas dessas pessoas chegaram ao óbito por conta de uma relação direta com a falta de saneamento, mas reconhece que várias doenças têm entre seus fatores determinantes essa questão.

- Há várias doenças, a exemplo da dengue, das doenças diarréicas, da esquistossomose e da hepatite A, entre outras, que têm influência do saneamento básico entre seus fatores determinantes. No entanto, o cenário epidemiológico dessas doenças é bem mais complexo. Não se pode dizer, por exemplo, que todo caso ou óbito por diarréia tenha a ver com falta de saneamento. O mesmo em relação à dengue - diz a nota.

Diretor do Instituto de Estudos de Saúde Coletiva da UFRJ, Roberto Medronho acredita que um país que se propõe a ser de primeiro mundo devia estar perto do zero quando o assunto são essas doenças:

- A baixa cobertura da rede de esgoto no Brasil é vergonhosa e atenta contra a saúde da população. É um problema antigo. E a minha teoria é que os governos não se interessam em fazer obras que passam por debaixo da terra. Preferem o que é visível, tanto que o Brasil tem avançado em energia elétrica, em telefonia, em urbanização.

Doenças sanitárias: 820 crianças internadas por dia

Segundo ele, como o país avança devagar na universalização do saneamento, uma política paliativa poderia diminuir o número de doentes e da taxa de mortalidade:

- O governo devia pelo menos criar campanhas que pudessem melhorar a qualidade de vida de quem mora numa situação precária. As doenças de transmissão hídricas, que são hepatite A, febre tifoide, leptospirose e diarréia, podem ser evitadas com medidas simples que poupariam muito sofrimento.

Mesmo com índices melhores do que o acesso ao saneamento, a questão do abastecimento de água também reflete na saúde do brasileiro, especialmente por conta da dengue. Segundo o ministério, 737.756 casos foram notificados até a 17ª semana de 2010, e não é possível determinar quantos têm relação com a falta e a descontinuidade do abastecimento de água. No entanto, para Mary Baran, médica especialista em saúde pública, "há relação direta entre falta de saneamento, desabastecimento de água e casos de dengue":

- As pessoas armazenam água e acabam com criadouros em casa. A relação existe do mesmo jeito que a falta de coleta de lixo acarreta, por exemplo, leptospirose, já que os ratos se proliferam nesse ambiente. É preciso mais investimento.

Um relatório divulgado ontem pela ABDIB (Associação Brasileira de Infraestrutura e Indústrias de Base) mostra que investimento no setor é o melhor caminho para que os dados ligados à Saúde melhorem. Segundo o estudo, o número de internações de crianças até 9 anos por doenças sanitárias caiu, em 2009, ao menor patamar dos últimos 12 anos. De acordo com o documento, baseado em dados do Sistema Único de Saúde (SUS), no ano passado, ano de maior investimento em saneamento básico do país (R$6,85 bilhões), foram internadas 820 crianças diariamente. Entre 1998 e 2006, a taxa de internações nunca ficou abaixo de mil/dia. A partir de 2007, quando os investimentos em saneamento aumentaram de R$4,43 bilhões para R$5 bilhões, a taxa caiu abaixo de mil.

O estudo não considerou a curva de natalidade da década, mas, segundo o especialista em doenças parasitárias da Unicamp Marcelo de Carvalho Ramos, da Unicamp, existe uma relação direta entre a redução das internações e as melhorias no saneamento, principalmente na distribuição de água tratada:

- O impacto mais direto é o da qualidade da água. E é sobre as crianças que esse impacto é mais sentido, uma vez que elas são mais vulneráveis e amplificam a transmissão de algumas doenças.

Segundo o médico, as despesas médicas custam mais ao Estado do que os investimentos em saneamento:

- Qualquer cálculo que se faça, a falta de saneamento sai mais cara: seja contando as internações hospitalares, seja pensando nas perdas das vidas, o que é muito mais grave.

'Governo priorizou PAC, em vez do planejamento'

DEU EM O GLOBO

Ministério das Cidades ainda não elaborou estratégia para ampliar a cobertura de saneamento em todo o país

Fábio Fabrini

BRASÍLIA. Aprovada em 2007 após anos de tramitação no Congresso, a Lei 11.445, que regula o setor de saneamento, determinou que União, estados e municípios criem planos para orientar os investimentos na área. Mas, contrariando recomendação que fixou 31 de dezembro de 2008 como data-limite, o Ministério das Cidades ainda não apresentou o documento.

Ainda em 2007, a Resolução 33 do Conselho das Cidades, presidido pelo ministro Marcio Fortes, sugeriu que o prazo fosse incluído na regulamentação da lei. Mas só em junho deste ano o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o decreto regulamentador, sem definir uma data para a União.

Integrante do conselho, a arquiteta e urbanista Henriqueta Arantes diz que, sem planejamento, não há garantia de que o dinheiro do saneamento esteja sendo bem aplicado. Conforme o ministério, desde 2003, o governo empenhou (comprometeu-se a gastar), em recursos do Orçamento e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), R$49,6 bilhões em saneamento, dos quais só R$23,8 bilhões foram efetivamente pagos. O grosso das ações integra o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que, segundo ela, ainda não leva em conta objetivos estratégicos.

- O governo priorizou o PAC, em vez do planejamento. Se esse planejamento existisse, a União poderia orientar as aplicações de recursos para suprir as carências e as desigualdades do país com mais velocidade - afirma.

A conselheira explica que hoje o governo convoca as prefeituras a apresentar projetos, incluídos no PAC em caso de aprovação. Para ela, a lógica favorece as que têm mais capacidade técnica:

- Os municípios pequenos concorrem em desigualdade.

O secretário nacional de Saneamento Ambiental, Leodegar Tiscoski, disse que a pesquisa do IBGE não mostrou os principais investimentos do governo, feitos após 2008. Ele negou falta de critérios de planejamento. Segundo Tiscoski, isso é feito por vários instrumentos, como a sua secretaria, ligada à pasta das Cidades.

Enquanto... Lula afirma que pedágio em São Paulo "é roubo"

DEU EM O GLOBO

Leila Suwwan

OSASCO (SP) – O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a candidata Dilma Rousseff (PT) atacaram duramente, ontem o PSDB e o DEM. Dilma falou que o a chapa adversária representa uma "ameaça" ao ProUni. E Lula chamou de "roubo" os valores do pedágio das rodovias paulistas.

- Se quiserem ir na festa do peão boiadeiro em Barretos, vão pagar R$ 65. Isso não é pedágio, é roubo do povo brasileiro! - disse Lula, em um dos momentos mais aplaudidos do evento político em Osasco (SP), cidade administrada pelo PT.

O presidente também chamou a gestão Serra em São Paulo de arrogante e acusou a hegemonia do PSDB de ignorar os programas sociais federais, como o Pró-Jovem.

- Faço um desafio público: duvido que seu adversário (Serra) recebeu do partido dele, quando governava, 50% do dinheiro que eu passei para os governadores dele! Duvido! - disse Lula.

Dilma, muito rouca, apresentou novamente a "ameaça" que seus adversários representam ao ProUni, programa de bolsas de estudo superior em universidades privadas financiado pelo governo.

- Sabem quem tentou acabar com o ProUni? O vice, o partido do vice do meu adversário, entrou no STF pedindo que se decretasse o ProUni ilegal, pedindo que os juizes fizessem isso. Agora dizem que são a favor do ProUni. Eles, que ameaçam o ProUni! Será que podem olhar olho no olho para os jovens que conseguiram seu diploma?

Dilma também ironizou a promessa de duplicação do Bolsa Família feita por Serra:

- O povo não é bobo, o povo sabe quem faz e quem apenas promete em época de eleição. Hoje nós estamos vendo as oportunidades que nossos jovens têm - disse Dilma.

Além disso, Lula pediu votos para Marta Suplicy e Netinho de Paula, candidatos ao Senado pelo PT e partidos coligados.

- A princesa que for votar no negão (Netinho de Paula) é a mesma princesa que vai votar na Marta Suplicy - disse o presidente.

- A gente não pode votar nos que estão do lado de lá. Faço um apelo a vocês. Esta companheira não merece ter o Senado que eu tive. Esta companheira precisa ter muitos senadores do lado dela, na base aliada do governo.

Lula também lembrou de pedir votos para João Paulo Cunha, deputado petista que foi acusado como um dos mensaleiros, a quem Lula classificou como um "companheiro que sofreu tanto".

Para Mercadante, Lula pediu que o alvo fosse o primeiro turno, criticando discursos que pediam esforço para levá-lo ao segundo turno - o adversário Geraldo Alckmin (PSDB) lidera as intenções de voto.

Lula inaugura campus que funciona desde 2008

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Durante evento, servidores do Judiciário vaiaram o governador de SP, Alberto Goldman

Jean-Philip Struck
Enviado especial a Sorocaba (SP)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador de São Paulo, Alberto Goldman (PSDB), inauguraram ontem o campus da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) em Sorocaba (99 km da capital) que já funcionava desde 2008.

A obra, que consumiu R$ 17 milhões, atende hoje aproximadamente 2.000 estudantes.Simultaneamente e acompanhado por Lula através de um telão, foi inaugurado o campus da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) em Curitibanos, a 296 km de Florianópolis.O campus catarinense, que custou R$ 7,4 milhões, também já estava em funcionamento -desde abril de 2009, segundo a reitoria.

HADDAD

O ministro da Educação, Fernando Haddad, compareceu ao evento em Santa Catarina. Segundo a pró-reitoria, a inauguração só ocorreu agora por causa da agenda de Haddad.

No seu discurso em Sorocaba, o presidente chamou Fernando Haddad de "Fernando Henrique", mas corrigiu logo em seguida.

O presidente também afirmou que é "irônico que um presidente sem diploma tenha construído o maior número de universidades federais do país".

O presidente não falou com os jornalistas. Já Goldman disse que considera normal inaugurar uma obra que já está funcionamento.

O governador, no entanto, criticou a construção do campus. Ele disse que a região já tem muitas universidades e que era possível expandir o sistema com apenas uma administração se os governos estadual e federal trabalhassem juntos.

VAIAS

Um grupo de 30 servidores do Poder Judiciário que compareceram à cerimônia com cartazes e faixas contra o governo estadual vaiaram Goldman e o prefeito de Sorocaba, Vítor Lippi (PSDB).

Em seu discurso, o governador demonstrou irritação com as vaias. "Nada e ninguém nunca em minha vida há de me intimidar", disse.

Goldman continuou: "O Lula me conhece, sabe muito bem quem sou, de onde vim e que não me abalo com absolutamente nada. Não é, Lula?" O presidente apenas balançou a cabeça afirmativamente de forma discreta.

O que pensa a mídia

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Ao decênio de Castro Alves:: Cruz e Sousa

Quem sempre vence é o porvir!
No espadanar das espumas
Que vão à praia saltar!
Nos ecos das tempestades
Da bela aurora ao raiar,
Um brado enorme, profundo,
Que faz tremer todo o mundo
Se deixa logo sentir!
É como o brado solene,
Ingente, Celso, perene,
É como o brado: - Porvir!

Pergunta a onda: - Quem é?..,
Responde o brado: - Sou eu!
Eu sou a Fama, que venho
C'roar o vate, o Criseu!
Dormi, meu Deus, por dez anos
E da natura os arcanos

Não posso todos saber!
Mas como ouvisse louvores
De glória, gritos, clamores,
Também vim louros trazer.

Fatalidade! - Desgraça!
Fatalidade, meu Deus!
Passou-se um gênio tão cedo,
Sumiu-se um astro nos céus!
As catadupas d'idéias,
De pensamento epopéias
Rolaram todas no chão!
Saindo a alma pra glória
Bradou pra pátria - vitória!
Já sou de vultos irmãos!

Foi Deus que disse: - Poeta,
Vem decantar a meus pés.
Na eternidade há mais luz,
Dão mais valor ao que és.
Se lá na terra tens louros,
Receberás cá tesouros
De muitas glórias até!
Terás a lira adorada
C'o divo plectro afinada
De Dante, Tasso e Garret!

Então na terra sentiu-se
UM grande acorde final!
O belo vate brasílio
Pendeu a fronte imortal!
O negro espaço rasgou-se
E aquele gênio internou-se
Na sempiterna mansão.
A sua fronte brilhava
E o áureo livro apertava
Sereno e ledo na mão...

E o mundo então sobre os eixos
Ouviu-se logo rodar!
É que ele mesmo estremece
A ver um vulto tombar.

É que na queda dos entes
Que são na vida potentes,
Que têm nas veias ardor,
Há cataclismos medonhos
Que só sentimos em sonhos
Mas que nos causam terror!...

E o coração s'estortega
E s'entibia a razão!
No peito o sangue enregela
E logo a história diz: - Não!
Não chore a pátria esse filho,
Se procurou outro trilho
Também mais glória me deu!
E quando os séculos passarem
Se hão de tristes curvarem
Enquanto alegre só eu?...

Oh! Basta! Basta! Silêncio!
Repousa, vate, nos Céus!
Que muito além dos espaços
Os cantos subam dos teus!
Se nesta vida d'enganos
Não são bastante os humanos
Pra te render ovações!
Perdoa os fracos, ó gênio,
Que pra cantar teu decênio
Somente Elmano ou Camões!




BIOGRAFIA (1861 - 1898)

João da Cruz e Sousa nasceu em Desterro, atual Florianópolis. Filho de escravos alforriados pelo Marechal Guilherme Xavier de Sousa, seria acolhido pelo Marechal e sua esposa como o filho que não tinham. Foi educado na melhor escola secundária da região, mas com a morte dos protetores foi obrigado a largar os estudos e trabalhar.

Sofre uma série de perseguições raciais, culminando com a proibição de assumir o cargo de promotor público em Laguna, por ser negro. Em 1890 vai para o Rio de Janeiro, onde entra em contato com a poesia simbolista francesa e seus admiradores cariocas. Colabora em alguns jornais e, mesmo já bastante conhecido após a publicação de Missal e Broquéis (1893), só consegue arrumar um emprego miserável na Estrada de Ferro Central.

Casa-se com Gavita, também negra, com quem tem quatro filhos, dois dos quais vêm a falecer. Sua mulher enlouquece e passa vários períodos em hospitais psiquiátricos. O poeta contrai tuberculose e vai para a cidade mineira de Sítio se tratar. Morre aos 36 anos de idade, vítima da tuberculose, da pobreza e, principalmente, do racismo e da incompreensão.