domingo, 9 de outubro de 2016

Opinião do dia - Rosiska Darcy de Oliveira

O poder não se esgota no poder. Nem a democracia nas eleições. Freixo e Crivella, um ou outro governará uma cidade insubmissa, senhora de uma cultura própria e, ao mesmo tempo, cosmopolita, aberta à invenção de modos de vida. Quem quer que seja o eleito, quisera que logo entendesse que é a cultura da cidade que estará sempre no comando. E essa cultura, afeita não propriamente à fé, mas certamente à esperança, só respira em liberdade.

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Rosiska Darcy de Oliveira é escritora. ‘De valores e dogmas’, O Globo, 8/10/2016

PT apodrece na corrupção e é varrido do mapa político

• Partido sofre a pior derrota eleitoral de sua história, perde 50 milhões de votos e vê a narrativa do golpe ser rejeitada pela população. Tenta juntar os cacos para sobreviver, mas se depara com um horizonte sombrio: virou uma sigla nanica, repudiada por seus crimes em larga escala

Ary Filgueira – IstoÉ

Como se iluminada por algum dom divino capaz de decifrar os corações e as mentes dos brasileiros, a narrativa petista produziu algumas certezas nos últimos tempos. A mais marcante delas: a de que a periferia das grandes capitais e os grotões do Brasil, ainda inebriados pelos anos de inclusão social e crédito fácil, haviam fechado os olhos à corrupção institucionalizada pelo PT e estavam ao lado do partido para o que desse e viesse. Por isso, o tilintar das panelas durante os panelaços de abril, segundo essa mesma tese, só ecoavam das varandas gourmets e as manifestações que inundaram ruas e avenidas do País só poderiam estar apinhadas de bem-nascidos e de defensores da meritocracia – “mas que receberam tudo na vida de mãos beijadas”, claro. Em sintonia com esse mesmo raciocínio, as camadas mais pobres da população só poderiam ter achado o impeachment de Dilma Rousseff um golpe contra a democracia e um atentado aos anseios eleitorais desse mesmo estrato social. Puros sofismas destinados a encantar inocentes, muitas vezes úteis. As certezas convenientes da narrativa petista desabaram como castelo de cartas no último domingo 2, na esteira da apuração do primeiro turno das eleições municipais. O povo brasileiro, periferia incluída, não só reprovou o PT, como varreu a legenda do mapa. O Brasil real, – aquele que acorda cedo, enfrenta trânsito, ônibus lotado, e depende dos serviços básicos de saúde, educação e segurança, – praticamente enterrou o partido – e, por tabela, a falácia do golpe.

Jogando no mesmo time

• Fotos e documentos nos computadores do sobrinho de Lula mostram um pouco do ambiente de alegre convescote em que se davam os negócios da Lava-Jato

Thiago Bronzatto – Veja

Lula e a Odebrecht vestiram a mesma camisa durante anos. Quando ainda estava no Palácio do Planalto, o ex-presidente ajudou a empreiteira a expandir seus negócios, enquanto a construtora ajudava Lula a expandir seu poder. A relação simbiótica rendeu dividendos para os dois lados. A empresa multiplicou suas receitas, Lula multiplicou seu patrimônio e o de seus familiares. Até seu sobrinho Taiguara Rodrigues dos Santos faturou com a tabelinha. O jovem passou de vidraceiro falido no litoral paulista a sócio de uma empresa de engenharia com contratos milionários com a Odebrecht. A foto da camisa do Corinthians no início desta reportagem, encontrada pela Polícia Federal no computador de Taiguara, mostra que eles — Lula, o sobrinho e a Odebrecht — jogavam no mesmo time. A camisa, autografada por Lula, foi um presente de Taiguara e do ex-presidente ao “amigo Ernesto”, que vem a ser o executivo Ernesto Baiardi, diretor internacional da Odebrecht, responsável pelo mercado em Angola.

Caixa socorreu Odebrecht no estádio do Corinthians com R$ 350 milhões

Camila Mattoso, Julio Wiziack – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A Odebrecht fez uma transação sigilosa com a Caixa Econômica Federal em 2014 para cobrir um buraco milionário para construção da Arena do Corinthians, palco da abertura da Copa no Brasil.

O dinheiro, gasto pela empreiteira no estádio, não tem prazo para retorno. Para ajudar a Odebrecht a recuperá-lo, o banco estatal comprou debêntures emitidas pela empreiteira no valor de ao menos R$ 350 milhões.

Debêntures são títulos de crédito lançados ao mercado para captar recursos. Na prática, funciona como um empréstimo. A Odebrecht terá que devolver esse recurso à Caixa com juros.

O ex-presidente do Corinthians e atual deputado federal Andrés Sanchez (PT-SP), que participou do projeto de construção da arena, confirmou à Folha a transação, mas disse que não comentaria o negócio porque o acerto foi feito entre a Caixa e a Odebrecht, sem envolver o clube.

Crise em instituto empurra Lula para presidência do PT

• Dificuldades financeiras em entidade de ex-presidente têm sido usadas como argumento para convencê-lo a aceitar comandar sigla

Ricardo Galhardo – O Estado de S. Paulo

As dificuldades financeiras enfrentadas pelo Instituto Lula desde que o nome da entidade foi envolvido na Operação Lava Jato se transformaram em um dos argumentos de setores e lideranças do PT favoráveis a que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva assuma a presidência do partido.

Segundo fontes próximas ao ex-presidente, o instituto parou de receber doações privadas desde que foi envolvido em investigações da força-tarefa de Curitiba. Isso fez com que o PT passasse a arcar com algumas despesas do ex-presidente, como viagens para fazer campanha pelos candidatos do partido, serviços de vídeo e fotografia nos quais Lula aparece ao lado de petistas que disputaram as eleições municipais, entre outras.

Aliados, PMDB e PSDB já medem forças

Maiores vencedores do 1º turno, obtendo juntos um terço das prefeituras do país, PMDB e PSDB se tornaram as principais forças na disputa presidencial de 2018, mas há dúvidas de que lado essas duas siglas estarão. O ex-ministro NelsonJobim, quadro histórico do PMDB, diz que seu partido quer fazer o sucessor de Michel Temer, enquanto os tucanos têm pelo menos três pré-candidaturas. Caso se unam, na visão de especialistas, formarão a chapa a ser batida.

Aliança à prova

• Com um terço dos municípios, PSDB e PMDB despontam na corrida à Presidência- O Globo

Bernardo Mello e Gabriel Cariello – O Globo

Embora o Brasil esteja ainda a dois anos de escolher um novo presidente, as forças políticas deram início, desde o último domingo, a um processo de reorganização de suas estratégias de olho na disputa pelo Palácio do Planalto em 2018. Fiel do governo de Michel Temer, o PSDB expandiu seu domínio sobre o eleitorado aproveitando o declínio da esquerda, em especial do PT. Na visão de analistas políticos consultados pelo GLOBO, o avanço tucano sobre os municípios dá força a uma eventual candidatura do partido à Presidência. Mas é preciso combinar com os peemedebistas.

Caciques tucanos desafinam ao falar de prévias para 2018

• Em tons distintos, dirigentes defendem proposta ou a acham prematura

Maria Lima e Sílvia Amorim - O Globo

BRASÍLIA E SÃO PAULO - Possibilidade já cogitada pelo presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), a realização de prévias para escolher o candidato tucano à Presidência em 2018, entre pelo menos cinco pretendentes que saem fortalecidos da disputa municipal, ainda não tem consenso entre os integrantes da Executiva Nacional do partido ouvidos pelo GLOBO. Há, porém, uma forte tendência de apoio à proposta.

Com a vitória maciça em São Paulo, não só na capital, o governador Geraldo Alckmin é o nome que mais ameaça a candidatura de Aécio, que saiu da eleição de 2014 fortalecido após uma disputa acirrada com a ex-presidente Dilma Rousseff no segundo turno.

O ministro das Relações Exteriores, José Serra, corre por fora na disputa. Ele espera se fortalecer mostrando resultados no governo de coalizão que tenta arrumar a casa para o sucessor de Michel Temer.

Todos já anteveem uma queda de braço fora dos holofotes entre os dois. Aécio ainda depende do resultado, neste segundo turno das eleições, em Belo Horizonte e outras 11 grandes cidades e capitais para equilibrar a disputa.

Retrocesso na economia vai agravar pobreza até 2025

• Classes D e E devem aumentar mesmo com retomada do crescimento

Nos próximos nove anos, população de baixa renda crescerá em mais 1 milhão de famílias. Maior preocupação dos mais pobres é com o desemprego

Mesmo com a previsão de que a economia volte a crescer, a população de renda mais baixa deve aumentar em mais 1 milhão de famílias até 2025, quando chegará a 41 milhões, segundo a consultoria Tendências, informa Daiane Costa. “Há muita coisa errada para consertar na economia. As famílias vão ter de se acostumar a viver com menos por mais tempo”, diz Adriano Pitoli, autor da pesquisa. Desde 2014, com a recessão e a inflação, as classes De E aumentaram em 3,5 milhões de famílias. Outro levantamento, do Ibase, mostra que o desemprego é a maior preocupação dos mais pobres. Na casa de Glória de Oliveira Brito e Anderson Ornelas, ambos desempregados, a solução foi alugar o térreo da casa para garantir a renda familiar.

Sem alívio para os mais pobres

• Mesmo com retomada do crescimento, classes D e E terão mais 1 milhão de famílias em 2025

Daiane Costa - O Globo

Estica, aperta e corta se tornaram palavras de ordem para lidar com o desemprego e a alta de preços na casa de Glória de Oliveira Brito e Anderson Ornelas, ambos de 42 anos. Depois que Anderson perdeu o cargo de gerente num areal, no início do ano, a renda da família foi reduzida a um terço, para R$ 1.300. A rotina sofreu mudanças drásticas: TV a cabo é coisa do passado, assim como as idas ao shopping e a lanchonetes com as três crianças — Maria Fernanda, de um ano e 7 meses, Daniel, de 6 anos, e Gabriela, de 10 —, que abandonaram as aulas de judô e balé. As viagens habituais para Belo Horizonte e para a Região dos Lagos já não fazem parte dos planos. E até os livros escolares dos filhos mais velhos de Glória só puderam ser comprados no meio do ano.

Pesquisa mostra que maior preocupação é desemprego

• Em comunidades de baixa renda, famílias temem perder conquistas

Daiane Costa - O Globo

Entre os mais pobres, o desemprego preocupa mais do que a qualidade de serviços essenciais fornecidos pelo poder público, como saúde, educação e saneamento básico. É o que apontam os resultados preliminares de uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), em parceria com a organização internacional ActionAid, em três comunidades de baixa renda da região metropolitana do Rio. Foram ouvidas famílias de Japeri, Cidade de Deus e São Gonçalo, que têm renda per capita de até meio salário mínimo (R$ 440) ou ganham um total de até três mínimos (R$ 2.640) e integram o Cadastro Único (que reúne a população elegível ao Bolsa Família).

O resultado surpreendeu o economista e coordenador da área de Desigualdade e Pobreza do Ibase, Francisco Menezes, tendo em vista que os últimos indicadores oficiais, de 2014, apontavam melhora na renda e queda da desigualdade. Em uma década até 2014, a distribuição de renda captada pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) melhorou a cada ano: a média cresceu e a desigualdade diminuiu. No mesmo período, a renda domiciliar per capita real pulou de R$ 549,83 para R$ 861,23. E, entre 2013 e 2014, a taxa de pobreza extrema recuou 29,8%.

Pelo menos 6 Estados e DF não têm dinheiro para pagar 13º salário

Em crise, Estados dizem não ter caixa para pagamento do 13º salário

• Para aliviar o peso da folha de pagamento no final do ano, alguns Estados já vêm pagando parte do 13º no aniversário do servidor

Murilo Rodrigues Alves, Idiana Tomazelli, Adriana Fernandes - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Em meio à grave crise fiscal, os governos estaduais já preveem dificuldades para pagar o 13.º e o restante dos salários de servidores públicos até o fim do ano. Os Estados evitam admitir oficialmente que não há caixa para pagar o benefício, mas pelo menos sete de 24 unidades da Federação consultadas pela reportagem reconhecem que não há definição de como e quando o 13.º será depositado na conta de 2 milhões de servidores.

Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, Minas, Bahia, Distrito Federal, Sergipe e Roraima não teriam, hoje, os recursos para honrar o compromisso, segundo os secretários de Fazenda. Alguns deles não conseguirão fazer o pagamento mesmo com a ajuda esperada do governo federal. Além do socorro do Tesouro, eles contam com a recuperação, mesmo que mínima, da economia – o que contribuiria para o aumento da arrecadação.

Freixo reúne líderes religiosos em contraponto a Crivella

• Candidato evita ataques, mas aliados criticam a Igreja Universal, à qual o adversário pertence

Marco Grillo - O Globo

O candidato do PSOL à prefeitura do Rio, Marcelo Freixo, reuniu ontem representantes de diversas religiões e pregou a “diversidade”, em um movimento para se contrapor ao adversário, Marcelo Crivella (PRB), bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). O ato ecumênico aconteceu na Praça Afonso Pena, na Tijuca.

Freixo não fez ataques à religião de seu oponente, mas lideranças convidadas a falar afirmaram, por exemplo, que existem fiéis da Iurd que pregam a intolerância religiosa e perseguem adeptos das religiões de matriz africana.

O candidato do PSOL discursou ao lado da menina candomblecista Kailane Campos, que foi atacada com uma pedrada após sair de um culto, no ano passado.

Ataques à trincheira adversária

No Rio, Crivella (PRB) e Freixo (PSOL) planejam invadir áreas onde, no 1º turno, o adversário teve seu melhor desempenho. Crivella prepara agenda na Zona Sul e Freixo, atos na Zona Oeste.

Para vencer, trincheira do adversário entra na mira

• Crivella prepara investida na Zona Sul, e Freixo monta estratégia para ganhar votos na Zona Oeste

Marco Grillo, Vera Araújo e Miguel Caballero - O Globo

Para pavimentar seu caminho à prefeitura do Rio, Marcelo Crivella (PRB) e Marcelo Freixo (PSOL) pretendem avançar sobre os territórios dominados pelo adversário no primeiro turno. Com votação amplamente favorável na Zona Oeste, Crivella tem participado de reuniões com pequenos grupos na Zona Sul, onde o oponente conseguiu seus melhores resultados. Freixo, por sua vez, acredita que o programa de televisão — no qual terá dez minutos, contra os onze segundos do primeiro turno — será fundamental para alcançar os eleitores de bairros como Santa Cruz e Guaratiba, onde registrou seus piores índices. Ao menos dois grandes atos na Zona Oeste, em Bangu e Campo Grande, também estão marcados.

— Em algumas áreas, ou você chega com a televisão, ou chega pessoalmente. Tem lugares em que a gente tem problemas de chegar pessoalmente na Zona Oeste, por causa da milícia. Com a televisão, a gente entra em todas as casas — analisa Freixo.

Vozes e silêncio no domingo - Fernando Gabeira

- O Globo

Ganhar ou perder eleições, vitórias apertadas, derrotas humilhantes — tudo isso faz parte da política. Mas, diante das urnas totalizadas, a melhor reação não é remoer rancores, mas entender o que as pessoas tentaram dizer com seu voto. Em primeiro lugar, o recado dos que não foram às urnas, votaram em branco ou anularam. Em número, superaram os votos do candidato eleito em primeiro turno em São Paulo. No Rio, foram mais numerosos que a soma dos votos dos dois Marcelos que chegaram ao segundo turno.

No mesmo domingo em que houve eleições municipais no Brasil, colombianos e húngaros foram às urnas, também com um alto nível de abstenção. Isso acontece em muitos países, mas em cada um tem suas razões. No caso brasileiro, a julgar pelo que ouvi nas ruas, e olha que rodei muito para um não candidato, muitos se sentem não representados, outros temem que seu voto acabe fortalecendo a roubalheira de sempre. A agonia do sistema político brasileiro ficou evidente, e já é mais do que hora de alguma mudança, para não chegarmos ao nível do plebiscito húngaro: somente 39% dos eleitores votaram.

Não basta ter razão – Ferreira Gullar

- Folha de S. Paulo

Não tem cabimento demonizar o populismo, ainda que ele contenha inevitavelmente contradições que podem levá-lo ao impasse. É inegável, porém, que ele parte da constatação de que a sociedade é, sem dúvida alguma, desigual.

Há uma minoria rica, uma classe média de alguns recursos e –particularmente em países com o nosso– uma maioria que vive ao nível da necessidade, mal tendo como sustentar e educar os filhos.

Eleger como objetivo de governo a melhoria das condições de vida dos mais pobres é indiscutivelmente um propósito louvável. Mas não basta ter razão para estar certo.

O que é voto válido? – Merval Pereira

- O Globo

Sem falar nas abstenções, que bateram recordes em várias capitais do país, nas recentes eleições municipais houve também uma enxurrada de votos brancos e nulos, que são considerados inválidos pela Justiça Eleitoral. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), numa jurisprudência do século passado, considera que votos nulos não existem, “é como se nunca tivessem sido dados.”

Essa interpretação mais parece uma alienação dos especialistas em lei eleitoral do que uma decisão baseada em alguma boa base técnica. Ignorar o recado que as urnas enviaram aos nossos políticos, considerando que os votos nulos nunca existiram, é um reflexo da legislação oficial da leniência com que tratamos nossas mazelas político-partidárias.

Desobediência cidadã - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

• Do alto de seu livre-arbítrio, eleitor avisa ao Estado que não aceita o voto impositivo

Pelo que se viu nas análises sobre o resultado das eleições municipais, ficaram todos muito impressionados com o índice de abstenção. Na verdade, quase igual ao registrado em 2012. Na época foi pouco mais de 16% e agora pouco menos de 18%. Isso no cômputo da votação geral do País. Vistos do ponto de vista local, porém, os números são maiores, sendo o Rio de Janeiro o campeão de ausências com algo em torno de 26%. Um quarto do eleitorado.

A julgar pelo que restou de escolha no segundo turno na cidade realmente maravilhosa, capital do Estado de fato em situação falimentar – Marcelo Crivella contra Marcelo Freixo, duas pontas extremas do espectro ideológico – o prezado leitor e a cara leitora não se iludam e preparem-se: o número de ausentes vai aumentar.

O colapso do petismo - Luiz Carlos Azedo

-Correio Braziliense

• A velha cultura nacional-desenvolvimentista, esquerdista e voluntarista, continua sendo um refúgio ideológico

A cúpula do PT ainda está atordoada com o resultado das eleições municipais, como aquele lutador de boxe que foi à lona e levanta dando socos no ar, completamente grogue, sem se dar conta de que foi a nocaute. Acredita que a narrativa do golpe varrerá para debaixo do tapete tudo o que aconteceu. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se comporta da mesma maneira, como se fosse possível separar o fracasso do governo Dilma Rousseff dos seus dois mandatos e escapar da Operação Lava-Jato, embora os dois principais artífices de sua ascensão ao poder, os ex-ministros José Dirceu e Antônio Palocci, estejam presos. Mesmo que matem no peito o escândalo da Petrobras, como fizeram Delúbio Soares e João Vaccari Netto, o cerco está se fechando.

O 'AT' e o 'DT' - Eliane Cantanhêde

- O Estado de S. Paulo

• Temer dá sua maior cartada nesta semana, mas a Lava Jato continua

A votação do teto de gastos públicos, principal item da agenda política desta semana, tende a ser um divisor de águas do governo Michel Temer. Pela ansiedade no Planalto, a efervescência no Congresso, o envolvimento direto de Henrique Meirelles e a ofensiva política e midiática do próprio Temer, a expectativa é de AT e DT: “Antes do Teto” e “Depois do Teto”.

Até aqui, o “Fora, Temer”, a desconfiança da população, a economia estagnada, os empregos evaporando, as críticas e as concessões políticas para aprovar propostas essenciais contra a crise que Dilma Rousseff criou e não teve força política nem competência para frear. O melhor exemplo dessas propostas é a meta fiscal, mas essa não foi a única vitória do novo governo no Congresso.

Reforma política para quê? - Sérgio Besserman Vianna

- O Globo

• Sistema político perdeu a legitimidade

A reforma política é imperativa e urgente. Em tempos de vacas gordas, esse não seria um desafio urgente. Frente aos desafios do Brasil, é.

O país necessitará de muita governabilidade para aprovar o teto de gastos, as futuras medidas para cumpri-lo e obter a obrigatória interrupção do crescimento da dívida pública. Da mesma forma que para produzir uma revolução de produtividade nos serviços e políticas públicas que permita, mesmo com redução de gastos per capita, melhorar e muito a qualidade destas. Isso é perfeitamente possível, considerando o baixo patamar de eficiência da oferta de serviços públicos.

Debate morno favorece Crivella – Bernardo Mello Franco

- Folha de S. Paulo

No primeiro debate entre Marcelo Crivella (PRB) e Marcelo Freixo (PSOL), na Band, faltou confronto e sobraram gentilezas entre os candidatos. O tom morno favoreceu Crivella, que lidera com folga a disputa pela Prefeitura do Rio.

O senador começou melhor. Prometeu reduzir as filas nos hospitais, problema que afeta o cidadão comum. Freixo anunciou uma assembleia com servidores da educação, que já são simpáticos a ele.

O deputado estadual protestou contra o bombardeio virtual à sua candidatura. Crivella se esquivou e disse não ter responsabilidade pela artilharia. Ficou por isso mesmo.

Temer não é ilegítimo, é caótico - Elio Gaspari

- O Globo

Em agosto do ano passado, o então vice-presidente Michel Temer apresentou-se como candidato ao lugar de Dilma Rousseff dizendo que “a grande missão, a partir deste momento, é a da pacificação do país, da reunificação do país”. Em maio, já pintado para a guerra, dizia que “é preciso alguém que tenha a capacidade de reunificar a todos”.

Na Presidência, o doutor e sua caravana de sábios decidiram torrar dinheiro da Viúva com uma campanha publicitária essencialmente política, falando bem de si e mal do governo de sua antecessora e companheira de chapa. Nessa gastança, prometeu: “Vamos tirar o Brasil do vermelho para voltar a crescer”.

Ao pisar no Planalto, Temer demitiu um garçom e agora vangloriou-se de ter extinguido “4,2 mil cargos de confiança”. Na realidade, em junho ele prometeu cortar os cargos comissionados, mas entre junho e julho demitiu 5,5 mil servidores e contratou 7,2 mil.

Incômodo com Clara – Samuel Pessôa

- Folha de S. Paulo

O Brasil é um país desigual, injusto e de renda média baixa. A nossa tendência é sempre achar que a culpa é do outro: as multinacionais, ou, simplesmente, o capital.

Não há, no entanto, nenhuma evidência de que o Brasil tenha sido explorado por esses agentes. Os juros da dívida externa e a remuneração do investimento estrangeiro são equivalentes aos que ocorrem nos demais países.

Os bancos seriam outro candidato. No entanto, aproximadamente metade do sistema bancário brasileiro é público. Além disso, o Imposto de Renda sobre os seus lucros, incluindo a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, é de 50%.

O paradoxo de Temer - Míriam Leitão

O Globo

O presidente Michel Temer está preso a um paradoxo. Ele só poderá ser candidato em 2018 se o seu governo conseguir que o país volte ao ambiente positivo, mas isso só tem chance de acontecer se ele não for candidato. O trabalho para equilibrar novamente a economia é árduo, e, para fazê-lo, Temer precisará manter a base unida. Essa tarefa exige abdicação prévia.

Temer sempre nega que será candidato, mas a dúvida permanece. Se o país começar a melhorar, a dúvida aumentará, porque ficará mais forte a ambição dos que o cercam. No momento em que começarem os sinais de alguma expectativa de candidatura, a sua base vai se desfazer para correr cada grupo atrás de seu projeto.

Vamos ajustar as contas públicas e reduzir a taxa de juros? - Marcos Lisboa

- Folha de S. Paulo

A taxa de juros no Brasil é elevada em comparação com a de outros países, ainda que bem menos do que alguns argumentam quando são considerados os impostos e a inflação.

Em tempos de crise fiscal, a pergunta é inevitável: o governo não deveria reduzir os juros para gastar menos?

A alta taxa de juros é o sintoma da doença, não a sua causa, e decorre de um problema ainda mais grave: o desequilíbrio das contas públicas.

O governo possui diversos mecanismos para financiar os seus gastos. Alguns transparentes, como impostos e dívida. Outros, mais sutis, como a inflação, que cobra um duplo sacrifício da população: bens e serviços mais caros e juros altos para financiar as contas públicas.

O modelo funciona – Editorial / O Estado de S. Paulo

A primeira eleição sem o financiamento empresarial de campanha foi plenamente exitosa. Embora a queixa sobre a falta de dinheiro tenha sido mais ou menos generalizada, os candidatos saíram em busca de votos, os eleitores fizeram suas escolhas livremente e os eleitos tomarão posse no prazo legal. Tudo isso significa que a democracia pode perfeitamente funcionar sem a injeção de recursos de empresas interessadas somente em ganhar favores e contratos dos políticos que ajudaram a eleger. Aliás, pode-se dizer que a democracia saiu fortalecida dessa eleição exatamente porque foi rompido esse vínculo danoso entre políticos e empresas, transformadas em eleitoras privilegiadas. Deu-se um grande passo para restaurar o princípio de “um homem, um voto”.

É evidente que os partidos e os políticos têm muitos motivos para lamentar a mudança no financiamento eleitoral, sacramentada pelo Supremo Tribunal Federal em 2015. Dependentes da fartura proporcionada por generosas pessoas jurídicas – e entre as mais generosas, não por acaso, encontravam-se as empreiteiras que passaram os últimos anos a nutrir relações obscenas com o poder, muitas vezes exercendo-o elas mesmas –, não foram poucos os políticos que, padecendo de síndrome de abstinência, propuseram o restabelecimento do antigo modelo.

É bem-vindo o aumento da representação da direita – Editorial / O Globo

• A eleição deu mais visibilidade aos chamados conservadores, e significou um passo rumo a um quadro político mais diversificado, à disposição dos eleitores

Herança da Revolução Francesa, em que, no salão da Assembleia Nacional, os liberais girondinos se colocavam à direita, e os radicais jacobinos, à esquerda, os dois termos seguem, pelos séculos, a designar aqueles que querem preservar o estabelecido, em oposição aos transformadores pelos votos ou armas.

A fundação da União Soviética, à esquerda, instituiu a antítese dos Estados Unidos, capitalista, e ali foram lançadas as fundações da Guerra Fria do pós-guerra. Para embaralhar conceitos simplistas, o nazifascismo, aliado do Japão imperial, era extrema-direita, mas queria destruir os Estados Unidos, hoje chamados de “fascistas” pela ultraesquerda. Mas nazifascistas foram os alemães, os italianos e os japoneses, derrotados pela ação decisiva americana.

Na Guerra Fria, direita e esquerda eram conceitos bem definidos. Com a queda do Muro de Berlim, as cartas foram novamente embaralhadas. Afinal, o capitalismo, “a direita”, passou a ser adotado pelas peças que desmoronaram da União Soviética, a “esquerda”: Rússia e ex-satélites.

No Brasil, a ditadura militar facilitava os rótulos: esta, de direita; na oposição, liberais, sociais-democratas e vários matizes da esquerda. Veio a redemocratização, sociais-democratas como os tucanos do PSDB viraram de “direita”, na boca dos militantes do PT, líder da esquerda até começar a atolar na corrupção. Agora, aí está o PSOL a disputar o espólio imaginário petista do início do partido.

Menos impunidade – Editorial / Folha de S. Paulo

A decisão não teve nada de consensual. Por 6 a 5, o Supremo Tribunal Federal reafirmou a possibilidade de que pessoas condenadas em segunda instância sejam presas, considerando desnecessário esperar até que se esgotem todos os recursos à disposição.

Estavam em jogo, na sessão de quarta-feira (5), princípios constitucionais básicos em qualquer democracia: ninguém deve ser conduzido à prisão sem culpa e ninguém deve ser considerado culpado antes do devido processo legal.

Com frequência, mesmo os mais claros fundamentos jurídicos se abrem a interpretações diversas, e estas permeiam-se das tendências do momento e das lições trazidas pela experiência concreta.

Na prática, o sistema penal brasileiro tem-se caracterizado por flagrante impunidade seletiva. Réus que disponham de alta condição financeira valem-se de excelentes advogados para realizar incontáveis manobras protelatórias nos tribunais, adiando a execução da pena.

Aproveitar o tempo! - Fernando Pessoa (Álvaro de Campos)

Aproveitar o tempo!
Mas o que é o tempo, que eu o aproveite?
Aproveitar o tempo!
Nenhum dia sem linha...
O trabalho honesto e superior...
O trabalho à Virgílio, à Mílton...
Mas é tão difícil ser honesto ou superior!
É tão pouco provável ser Milton ou ser Virgílio!

Aproveitar o tempo!
Tirar da alma os bocados precisos - nem mais nem menos -
Para com eles juntar os cubos ajustados
Que fazem gravuras certas na história
(E estão certas também do lado de baixo que se não vê)...
Pôr as sensações em castelo de cartas, pobre China dos serões,
E os pensamentos em dominó, igual contra igual,
E a vontade em carambola difícil.
Imagens de jogos ou de paciências ou de passatempos -
Imagens da vida, imagens das vidas. Imagens da Vida.

Verbalismo...
Sim, verbalismo...
Aproveitar o tempo!
Não ter um minuto que o exame de consciência desconheça...
Não ter um acto indefinido nem factício...
Não ter um movimento desconforme com propósitos...
Boas maneiras da alma...
Elegância de persistir...

Aproveitar o tempo!
Meu coração está cansado como mendigo verdadeiro.
Meu cérebro está pronto como um fardo posto ao canto.
Meu canto (verbalismo!) está tal como está e é triste.
Aproveitar o tempo!
Desde que comecei a escrever passaram cinco minutos.
Aproveitei-os ou não?
Se não sei se os aproveitei, que saberei de outros minutos?!

(Passageira que viajas tantas vezes no mesmo compartimento comigo
No comboio suburbano,
Chegaste a interessar-te por mim?
Aproveitei o tempo olhando para ti?
Qual foi o ritmo do nosso sossego no comboio andante?
Qual foi o entendimento que não chegámos a ter?
Qual foi a vida que houve nisto?
Que foi isto a vida?)


Aproveitar o tempo!
Ah, deixem-me não aproveitar nada!
Nem tempo, nem ser, nem memórias de tempo ou de ser!...
Deixem-me ser uma folha de árvore, titilada por brisa,
A poeira de uma estrada involuntária e sozinha,
O vinco deixado na estrada pelas rodas enquanto não vêm outras,
O pião do garoto, que vai a parar,
E estremece, no mesmo movimento que o da terra,
E oscila, no mesmo movimento que o da alma,
E cai, como caem os deuses, no chão do Destino.

Luiz Carlos da Vila - O Sonho não acabou (Candeia)