Ex-juiz da Lava-Jato acusa Bolsonaro de intervir na PF; presidente rebate e fala em pressão por cargo no STF
PGR pede ao Supremo abertura de inquérito sobre possíveis crimes
Ex-ministro apresenta prova de tentativa de interferência em investigação
Congresso e governadores reagem com preocupação e choque à nova crise
- O Globo
Ao anunciar sua saída do Ministério da Justiça, o ex-juiz Sergio Moro, símbolo da Operação Lava-Jato e do combate à corrupção, fez acusações contundentes ao presidente Jair Bolsonaro, a quem imputou tentativas de interferência política na Polícia Federal (PF). A crise desencadeada por sua demissão, que pode ser um divisor de águas da era Bolsonaro, teve como estopim a exoneração do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, homem da confiança de Moro, que lembrou a promessa de “carta branca” que o presidente lhe fez ao nomeá-lo. Bolsonaro rebateu afirmando que “autonomia não é soberania”. Moro acusou Bolsonaro de tentar seguidas intervenções na gestão da PF e de desejar nomear para postos de comando pessoas “para quem pudesse ligar para colher informações”.
O presidente negou as acusações, mas admitiu que pedia relatórios diários da PF e que “implorava” por apuração da facada que sofreu em 2018. Segundo Moro, o presidente expressou “preocupação” com inquéritos em curso no STF. Ele se referia a investigações sobre disseminação de fake news e organização de atos contra a democracia, que podem atingir aliados e filhos de Bolsonaro. O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu que seja investigada a possível prática de seis crimes pelo presidente, entre eles falsidade ideológica, prevaricação e obstrução da Justiça. Panelaços foram ouvidos durante a fala de Moro e também quando Bolsonaro respondeu, no Planalto, ladeado por todos os seus ministros.
Ele acusou Moro de ter tentado barganhar uma vaga no STF em novembro, o que foi negado pelo ex-juiz. Ao Jornal Nacional, Moro exibiu mensagem de texto na qual o presidente se refere a diligências da PF como “mais um motivo para a troca” (no comando). No Congresso, no STF e entre governadores, as reações foram de choque e preocupação.
Confirmada no Diário Oficial da União logo no início da manhã de ontem, a exoneração do diretor-geral da Polícia Federal (PF) por decisão do presidente Jair Bolsonaro precipitou não apenas a demissão do ministro mais popular da Esplanada, Sergio Moro, da Justiça, mas aprofundou uma crise que será divisora de águas no governo. Ato contínuo à mudança na PF, Moro convocou um pronunciamento no qual anunciou sua saída por causa da interferência política do presidente em sua gestão. O agora ex-ministro afirmou que o presidente pedia acesso a investigações da PF e que manifestou em conversas preocupação com inquéritos abertos no Supremo Tribunal Federal (STF). Disse ainda que não assinou a exoneração de Valeixo, apesar de seu nome constar da primeira edição do D.O.. À noite, o governo publicou nova edição, sem a assinatura de Moro, e informou que houve um erro no texto anterior.
As acusações elevaram a outro estágio a crise política. Líderes políticos, entre os quais o ex-presidente Fernando Henrique, defenderam a renúncia de Bolsonaro.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao STF a abertura de inquérito para investigar possíveis crimes cometidos pelo presidente a partir do que foi dito por Moro. Seis horas depois da fala de Moro, Bolsonaro fez a sua defesa. Ao lado de ministros para mostrar apoio, e recebido com intensos panelaços em todas as regiões do país, o presidente negou ter pedido acesso a inquéritos em curso na PF. Disse ainda que tinha Moro como “ídolo”, mas que o ex-ministro age com o ego e tenta “botar uma cunha” entre ele e a população.