domingo, 26 de fevereiro de 2012

OPINIÃO DO DIA – Norberto Bobbio; democracia representativa

Na expressão “democracia representativa“, o adjetivo já adquiriu, de modo estável, os dois sentidos: uma democracia é representativa no duplo sentido de possuir um órgão no qual as decisões coletivas são tomadas por representantes, e de espelhar através desses representantes os diferentes grupos de opinião ou de interesse que se formam na sociedade. Esses dois significados tornam-se evidentes quando se contrapõe a democracia representativa à democracia direta. Com relação ao primeiro significado, a democracia direta é aquela na qual as decisões coletivas são tomadas diretamente pelos cidadãos; no segundo, é aquele que, propondo aos cidadãos quesitos em termos alternativos, torna impossível ou menos provável o espelhamento (La reppresentazione) da sociedade. Paradoxalmente , a democracia direta é, no sentido do “ espelhamento” (della reppresentazione), menos representativa do que a democracia indireta.

Norberto Bobbio (18/10/1909-9/01/2004), filósofo italiano. “Teoria Geral da Política – A Filosofia Política e as Lições dos Clássicos”, p:458-9. Editora Campus, Rio de Janeiro, 2000.

Manchetes de alguns dos principais jornais do Brasil

O GLOBO
Fogo destrói base do país na Antártica e mata dois
Kassab: Serra disputará prévia em SP
Dobra arrecadação de IR pago por pessoas físicas
Cidade já lotou para a Rio +20

FOLHA DE S. PAULO
Falhas e omissões atrasam processos contra políticos
Dois desaparecem após explosão em base na Antártida
Kassab diz que Serra abandonou projeto nacional

O ESTADO DE S. PAULO
Incêndio destrói base brasileira na Antártida e deixa dois mortos
"Segurar inflação não é vocação da Petrobras"
Serra anunciará candidatura em SP e Kassab já indica três vices

CORREIO BRAZILIENSE
Os brasilienses de um bilhão de reais
Acidente mata dois brasileiros na Antártida
R$ 394 mi por apenas 90 dias de trabalho
Serra entra em cena e embola eleição em SP

ESTADO DE MINAS
Tragédia na Antártida

ZERO HORA (RS)
Incêndio atinge base do Brasil na Antártica
Consultores avaliam que banco deve ter mais garantias
Aberta temporada de cursos técnicos fora do Brasil

JORNAL DO COMMERCIO (PE)
Fogo mata dois militares na base do Brasil da Antártida

O que pensa a mídia - editoriais dos principais jornais do Brasil

http://www2.pps.org.br/2005/index.asp?opcao=editoriais

O destino e a prévia:: Merval Pereira

As trapaças do destino acabaram aprontando das suas na sucessão paulistana, que se transformou em centro da disputa nacional pelo poder entre PT e PSDB. O partido que escolhia seus candidatos "ouvindo as bases" deixou de fazê-lo quando chegou ao poder real, passando a impor seus preferidos às direções regionais e a reservar para Lula o papel de candidato único à Presidência da República, sem contestações. Já ao PSDB, diante de um quadro partidário fragmentado e sem grandes nomes para disputar a prefeitura de São Paulo, não restou alternativa que não fossem as prévias, uma maneira de a direção partidária lavar as mãos na escolha de seu candidato, deixando que a frágil militância tucana decidisse o destino do partido que, pela primeira vez em muitos anos, a direção não conseguiu definir.

Agora que o ex-governador José Serra parece ter decidido concorrer à prefeitura, não há mais como desistir das prévias e aclamá-lo candidato único, como era a vontade da direção nacional no início do processo. O próprio Serra, e o governador Geraldo Alckmin, encarregado de fazer as sondagens iniciais com os pré-candidatos a prefeito, chegaram à conclusão de que não realizar as prévias seria um mau começo para uma eventual campanha de Serra.

Ele disputará as prévias, com o apoio das executivas nacional e estadual, e, provavelmente, será o vencedor. Mas terá que cumprir essa etapa.

As prévias, embora existam ainda no estatuto do PT, assim como a defesa do socialismo, foram se tornando um hábito arcaico, um modelo que não serve mais aos interesses embutidos no estágio de poder a que o partido chegou a nível nacional.

O ministro Gilberto Carvalho, representante formal de Lula no governo Dilma, chegou a dizer que seria "um desastre" a realização de prévias para escolher o candidato petista à prefeitura, como chegou a defender o senador Eduardo Suplicy.

Pelo menos coerente ele é, naquele seu jeito sonso de fazer política. Ele e Cristovam Buarque, ambos senadores petistas na ocasião, comandaram uma rebelião na escolha do candidato do partido à Presidência da República em 2002, depois de Lula ter sido derrotado quatro vezes anteriormente, duas para Collor, no primeiro e segundo turnos de 1989, e duas no primeiro turno para Fernando Henrique em 1994 e 1998.

Os dois lançaram dentro do partido a ideia de que Lula deveria dar lugar a uma candidatura de renovação - a mesma tese, aliás, que Lula defendeu agora para tirar da disputa pela prefeitura Mercadante e Marta Suplicy e lançar Fernando Haddad.

Colocaram-se então à disposição do PT para ser esse candidato, a ser escolhido em uma prévia. A candidatura de Lula mais uma vez era bancada pela direção nacional, que, no entanto, não teve força para evitar as prévias.

Cristovam acabou desistindo da empreitada, mas sua pretensão de confrontar o "grande líder" não foi perdoada: convidado para ser ministro da Educação do primeiro governo Lula, acabou demitido por telefone meses depois e teve de sair do PT, indo para o PDT, onde foi candidato a presidente contra Lula nas eleições de 2006.

Suplicy levou adiante sua candidatura e foi massacrado, perdendo por 84,4% a 15,6%. No início do processo atual, para irritação do ex-presidente Lula, ele decidiu pedir a realização de prévias no PT para a escolha do candidato à disputa pela prefeitura de São Paulo em 2012.

O verdadeiro obstáculo ao "dedaço" de Lula que indicou Haddad como candidato era, porém, outra Suplicy, a ex-prefeita Marta, que, até o momento, não aderiu integralmente à campanha petista.

Aguarda o desfecho dos acordos com o prefeito Gilberto Kassab, do PSD, para tomar uma decisão. Já disse que, com Kassab, não sobe no palanque de Haddad, mas quem deve salvá-la dessa saia justa política é nada menos que seu algoz, o ex-governador José Serra.

Com a decisão de disputar a prefeitura, Serra terá o apoio "incondicional" do PSD do atual prefeito Gilberto Kassab, que está no cargo devido ao apoio do então governador Serra à sua reeleição em 2008, contra o atual governador Geraldo Alckmin.

Os tucanos estão à frente do governo do estado de São Paulo há nada menos que 16 anos, e retomaram o controle da prefeitura em 2004, quando Serra, derrotado em 2002 para a Presidência da República por Lula, venceu a petista Marta Suplicy, tendo como vice Gilberto Kassab, àquela altura no DEM, que assumiria o posto para Serra disputar (e vencer) o governo do estado em 2006.

Esse verdadeiro "samba do crioulo doido" da política paulista leva, portanto, o PSDB a mudar seu sistema verticalizado de escolha de candidatos para uma prática mais democrática.

Tentando fazer do limão uma limonada, os dirigentes tucanos viam nas prévias a possibilidade de impulsionar uma revitalização da militância tucana na capital paulista, o que daria novo fôlego ao partido, mesmo sem um nome forte para candidato.

Agora, as prévias se transformarão num primeiro teste para a candidatura de José Serra, que pode sair delas tão fortalecido partidariamente quanto Lula saiu das prévias petistas para vencer a eleição presidencial de 2002.

A candidatura de Serra tem a motivação menos pessoal e mais partidária de quantas eleições já disputou: o partido precisa dele para tentar manter o poder na capital, para Geraldo Alckmin disputar a reeleição no governo do estado em 2014 em condições de vencer.

Caso contrário, o PT estará pronto para assumir o controle político de São Paulo, reduzindo o espaço da oposição ainda mais.

FONTE: O GLOBO

Por que Serra cedeu:: Dora Kramer

José Serra foi para Buenos Aires no carnaval já praticamente decidido a ser candidato a prefeito de São Paulo, faltando apenas organizar na cabeça as razões políticas e pessoais que o fariam entrar numa empreitada até então rejeitada com veemência.

Viajou na companhia de seu melhor confidente: o filho Luciano, com quem pesou os prós e mediu os contras. De volta, na sexta-feira acordou pronto a comunicar a decisão ao governador Geraldo Alckmin o mais rápido possível. Naquela mesma noite ou sábado no mais tardar.

As prévias marcadas para 4 de março, a intensa pressão do PSDB e a indicação dos dias anteriores de que caminhava mesmo para rever sua posição não davam margens a hesitações e adiamentos. Era pegar ou largar e Serra resolveu pegar.

Na realidade porque concluiu não existirem contras - a não ser a possibilidade da derrota e o fato de que o projeto de disputar a Presidência da República em 2014 teria de ser necessariamente adiado.

Note-se, adiado, não cancelado, mas essa é outra história a ser construída mais à frente se as circunstâncias assim permitirem.

Por ora, a decisão de José Serra guarda relação com vários fatores, sendo o principal deles a premência de tentar impedir o PT de conquistar São Paulo, a mais vistosa cidadela do PSDB, na perspectiva de que em 2012 seria a prefeitura e em 2014 o governo do Estado.

Uma conta pragmática: perder a prefeitura seria muito pior que não concorrer e ganhar pode significar renascer.

Afinal, a eleição é local, mas em São Paulo tem um caráter nacional inequivocamente simbólico. Na prática, abre-se a Serra a oportunidade de mostrar um enfrentamento com o PT que na campanha de 2010 deu-se de maneira dúbia.

O movimento de aproximação do prefeito Gilberto Kassab em direção ao PT teve um peso fortíssimo: muito provavelmente levaria o candidato Fernando Haddad a uma vitória no primeiro turno e o PSDB a um beco sem saída.

Do ponto de vista pessoal, Serra concluiu que se quisesse permanecer no jogo político não tinha opção a não ser se candidatar.

Uma, para não ser apontado como o responsável pelo início do fim do partido. Outra, porque não adiantava ficar pendurado na hipótese de 2014 levando em conta a situação de correlação interna de forças, a desorganização e a falta de unidade reinante no PSDB.

O governo do Estado desta vez não seria uma alternativa, pois Alckmin é candidato à reeleição.

A candidatura agora seria, então, uma maneira de reorganizar as tropas em São Paulo, reaproximando Gilberto Kassab de Geraldo Alckmin e partindo para a formação de uma aliança com o DEM, o PSD, talvez o PSB e outras legendas menores, mas essenciais para aumentar o tempo no horário eleitoral de rádio e televisão.

O PPS formalmente fica de fora, com a candidatura de Soninha Francine, mas na prática não deixa de ser uma espécie de linha auxiliar.

Contrariando as versões correntes, não houve exigências de cancelamento das prévias nem de formação de chapa puro-sangue. O lugar de vice está aberto, mas a decisão só será tomada em meados do mês de maio, porque depende de negociações: o DEM quer o lugar e Kassab, embora diga o contrário, também pleiteia o direito à indicação, o que certamente conseguirá.

Quanto às prévias, tudo depende dos quatro postulantes à candidatura. Se todos desistirem, ficam naturalmente canceladas. Se alguém persistir, Serra se inscreve e "concorre". Uma disputa de fachada que, no entanto, custaria menos que o desgaste de insistir no cancelamento.

Nostalgia. Os grupos de militares da reserva que reclamaram da falta de censura por parte da presidente Dilma Rousseff às críticas de suas ministras ao governo autoritário queriam o quê?

Pelo visto, interditar o direito à livre manifestação, num surto saudosista. Foram obrigados a recuar, chamados à realidade de que estão fora do jogo político desde a volta ao País à legalidade com o fim do regime de exceção.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Cambalhota em São Paulo:: Eliane Cantanhêde

O pouso de José Serra cria um novo epicentro na eleição para a Prefeitura de São Paulo.

Se todas as atenções, espaços de mídia e, principalmente, articulações políticas giravam em torno de Lula e Haddad, passam agora a girar em torno de Serra e Alckmin.

Serra e Alckmin são amigos na origem, adversários no PSDB e fadados a uma convivência forçada para, quem sabe, todo o sempre.

Serra precisa da força de Alckmin e da máquina do principal governo do país. Alckmin também precisa de Serra, para garantir São Paulo nas mãos dos tucanos.

Haddad míngua, Gabriel Chalita perde até a equipe, Gilberto Kassab assume ares de coordenador e porta-voz, como se sua ostensiva aproximação com Lula e Haddad jamais tivesse existido. Os partidos satélites reavaliam as condições das candidaturas e se reposicionam.

Trata-se, pois, de uma mudança e tanto no quadro e no cenário paulistanos. Mas a eleição ainda não começou... Serra venceu a primeira fase, mas faltam as prévias e a campanha não vai ser fácil. Há dúvidas, como sempre, sobre a participação efetiva dos tucanos: até onde eles vão ajudar, até onde poderão atrapalhar. É o "fenômeno Aécio", que se materializa a cada eleição.

Perfeccionista, obcecado, aplicado, autocentrado e irritante, tudo em Serra parece menor ou maior do que é -e polarizado. Ele é o primeiro nas pesquisas, mas acumula enorme rejeição; boia de salvação para os tucanos, não tem a simpatia de 9 entre 10 deles; é "O" candidato a prefeito, mas só pensa em ser presidente da República.

Convém ter um pé atrás diante das promessas de que Serra não vai abdicar da Prefeitura -de novo- para disputar a Presidência. Sua candidatura não apenas muda o epicentro da eleição paulistana como começa a definir também a campanha presidencial. Com Serra prefeito de São Paulo, tudo pode acontecer.

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Gal Costa - Folhetim / Chico Buarque

Kassab: Serra disputará prévia em SP

O prefeito Gilberto Kassab confirmou que José Serra disputará a prévia que escolherá o candidato do PSDB a prefeito de SP. Até amanhã, Serra oficializará a decisão, o que muda também o quadro para 2014

Kassab confirma candidatura de Serra em S. Paulo

Silvia Amorim, Lino Rodrigues

Tucano deve enviar carta ao partido formalizando decisão de disputar prévias para escolha de candidato

SÃO PAULO. O ex-governador José Serra deve oficializar até segunda-feira, à direção do PSDB, sua pré-candidatura à prefeitura de São Paulo. Em uma reunião na sexta-feira à noite entre Serra, o governador Geraldo Alckmin e o prefeito Gilberto Kassab (PSD), o tucano confirmou a decisão de participar da eleição deste ano. Ontem, Kassab anunciou publicamente a decisão de Serra e acrescentou que o tucano não pretende disputar as eleições presidenciais em 2014:

— O importante é que houve uma decisão. José Serra se definiu. Ele quer ser prefeito de São Paulo e isso é muito positivo. Ele abandonou essa opção (de concorrer à Presidência da República), e seu projeto de vida e político passará a ser pelos próximos cinco anos a cidade de São Paulo — disse o prefeito, durante visita a uma praça no bairro da Freguesia do Ó, na Zona Norte da cidade.

Serra se comprometeu a encaminhar ao diretório municipal do PSDB uma carta formalizando a disposição de disputar as prévias que escolherão o candidato do PSDB à prefeitura de São Paulo, marcadas, a princípio, para o próximo dia 4. Após cumprir a formalidade, está previsto um pronunciamento do ex-governador.

No encontro de sexta-feira não foi estipulada uma data para que Serra envie a carta ao partido, mas dirigentes tucanos disseram ontem que essa etapa deverá ser concluída até amanhã.
Alckmin e Serra tentarão adiar as prévias

Coube a Alckmin tentar obter o aval dos quatro pré-candidatos inscritos na prévia (Andrea Matarazzo, Bruno Covas, José Aníbal e Ricardo Trípoli) para um adiamento da prévia. A ideia é ganhar um pouco mais de tempo, cerca de 15 dias, para tentar costurar apoio ao ex-governador, para que ele saia vitorioso do processo de escolha. Articuladores envolvidos nas negociações disseram que Alckmin não tratará neste momento com os pré-candidatos a possibilidade de desistência deles das prévias.

Serra também deverá procurar os quatro tucanos para conversar. Há uma expectativa de que, pelo menos, Matarazzo, amigo de Serra, e Covas desistam de suas postulações e declarem apoio ao ex-governador. Até ontem à tarde, nenhuma desistência havia sido confirmada. Aníbal e Trípoli disseram ontem que não cogitam abandonar a disputa interna.

Até ontem, as prévias estavam mantidas para a próxima semana. No caso de não conseguir adiá-las, aliados de Serra e de Alckmin disseram que terão de pôr em prática uma operação política de emergência para, ao longo da próxima semana, buscar votos de filiados a Serra.

Em tom de campanha, Kassab disse não acreditar em uma chapa “puro-sangue”, só de tucanos, como chegou a ser cogitada, e aproveitou para lançar três políticos de partidos distintos que poderiam integrar a chapa com Serra como vices: o secretário municipal de Educação de São Paulo, Alexandre Scheneider, do PSD (partido do prefeito); a atual vice-prefeita, Alda Marcoantonio (PMDB); e o secretário municipal do Verde e Meio Ambiente, Eduardo Jorge, do PV.

— Não acredito em chapa puro sangue. Acho que não é o caminho. Uma aliança ampla como está sendo feita pressupõe uma chapa com candidatos de outros partidos — disse Kassab, negando que a sua aproximação com o PT tenha pesado na decisão de Serra se candidatar à prefeitura de São Paulo.

O fato de a confirmação da pré-candidatura de Serra por Kassab vir acompanhada de um discurso de que ele, ao decidir disputar a eleição deste ano, está abrindo mão de uma candidatura em 2014 não é por acaso. Faz parte da estratégia para tentar reduzir os índices de rejeição a Serra e, ao mesmo tempo, neutralizar o discurso do PT de que o tucano abandonaria novamente a prefeitura no meio do mandato para se candidatar à Presidência.

Os tucanos admitem que o ex-governador terá que passar toda a campanha se defendendo das acusações. Em 2006, ele deixou o cargo de prefeito para concorrer à eleição para o governo de São Paulo. Serra é o candidato com maior índice de rejeição pelos eleitores, e o PSDB atribuiu a esse episódio boa parte dessa reprovação.

Aníbal e Trípoli dizem que vão manter candidatura

Se depeder de Aníbal e Trípoli, a candidatura de Serra não será emplacada com facilidade pelos caciques do PSDB. José Aníbal, atual secretário de Energia de Alckimin, reagiu às declarações do prefeito, consideradas “estranhas”. Segundo ele, a entrada de Serra na disputa não muda nada na sua campanha às prévias do partido.

— É estranho o Kassab falar pelo Serra. Mas isso (a entrada de Serra) não muda nada na minha campanha, nem a data das prévias — disse o tucano.

No Twitter, Aníbal postou um link para um vídeo, gravado ontem mesmo, em que diz que fez inúmeras reuniões “entusiasmantes” e que todos os filiados do partido querem participar da escolha e da campanha do partido. Ele termina o vídeo reiterando o pedido de voto para ser o candidato do PSDB à prefeitura de São Paulo.

O deputado federal Ricardo Trípoli também afirmou que não abre mão de sua candidatura em favor de Serra.

— Não existe nenhuma possibilidade de eu desistir de ser candidato. O Serra, se quiser ser candidato, terá que passar pelas prévias — afirmou o deputado tucano.

Procurados, os outros dois pré-candidatos do PSDB à prefeitura paulistana, Bruno Covas e Andrea Matarazzo, não quiseram se manifestar.

FONTE: O GLOBO

Decisão de José Serra vai nacionalizar a disputa política

Candidatura também antecipa escolha de Aécio como nome da oposição em 2014

Gerson Camarotti

BRASÍLIA e SÃO PAULO. Já são dois os efeitos imediatos no xadrez político com a decisão do ex-governador José Serra (PSDB-SP) à prefeitura de São Paulo: a nacionalização da disputa paulistana e uma definição precoce do nome da oposição para a sucessão presidencial de 2014. De forma reservada, os próprios tucanos admitem que, no cenário atual, a decisão de Serra de entrar na disputa para prefeitura deve facilitar o caminho do senador Aécio Neves (PSDB-MG) como o presidenciável tucano.

Essa avaliação foi verbalizada ontem pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), que ao confirmar a candidatura de Serra, afirmou que o tucano tem um projeto de cinco anos para a cidade de São Paulo. A cúpula do PSDB reconhece que, a partir de agora, será possível construir a unidade do partido, com a definição da candidatura de Serra. Além disso, os tucanos reconhecem que, ao entrar na disputa, o PSD voltou para órbita do PSDB em São Paulo, o que irá reequilibrar sucessão municipal.

— A candidatura de Serra é importante para São Paulo e é muito positiva para o PSDB. Agora, as coisas ficam serenadas. Teremos um ambiente de mais tranquilidade. Essa definição acomoda as disputas internas do PSDB, abrindo espaço para uma candidatura presidencial de consenso em 2014. Além disso, Serra traz de volta o PSD. A melhor candidatura sempre é aquela que agrega — ressaltou o senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB).

Serra neutraliza aliança do PSD com petistas

No núcleo do PSDB, a decisão de Serra foi recebida com alívio. Até então, havia muita preocupação com indefinição do ex-governador. O partido temia que, sem ele na disputa, o PT avançaria num projeto hegemônico com chances reais de vencer na cidade de São Paulo, inclusive com o apoio de Kassab. De uma só vez, ressaltam os tucanos, Serra neutraliza não apenas a debandada do PSD, mas também nacionaliza a sucessão municipal em São Paulo.

— Com a candidatura de Serra, é inevitável a nacionalização da disputa em São Paulo. Até porque essa eleição será transformada numa espécie de prévia de 2014 — disse o líder do PSDB, senador Álvaro Dias (PR), para, em seguida, defender prévias para a escolha do presidenciável tucano: — O PSDB não tem apenas duas lideranças. Temos que mudar os procedimentos e adotar primárias para escolha dos nossos nomes, independente da candidatura de Serra.

FONTE: O GLOBO

Serra anunciará candidatura em SP e Kassab já indica três vices

O ex-governador José Serra deve oficializar amanhã sua disposição de concorrer à Prefeitura de São Paulo e disputar as prévias do PSDB. O prefeito Gilberto Kassab (PSD), que até então namorava o PT, anunciou apoio "incondicional" a Serra e já indicou três nomes para vice. Segundo Kassab, o projeto de ser candidato a presidente em 2014 está encerrado para Serra. Para a colunista Dora Kramer, está só adiado.

Entrada de Serra na disputa esquenta "mercado" das coligações; PT mira PSB

Sucessão. Candidatura do tucano conta com adesão automática do DEM e do PSD, mas partido aposta também nos apoios do PPS e do PV; como ex-governador tende a nacionalizar eleição, PSB de Eduardo Campos deve se aproximar de Fernando Haddad na capital

Fernando Gallo, Bruno Boghossian, Daniel Bramatti

A entrada do ex-governador José Serra (PSDB) na campanha pela Prefeitura de São Paulo aumenta a tensão no "mercado" de coligações e cotas de propaganda eleitoral gratuita na televisão ao atrair partidos para a órbita tucana e empurrar o PSB, aliado do governo federal, ao campo petista.

Com Serra no páreo, a chapa tucana, que até o momento dá como certo apenas o apoio do PP de Paulo Maluf, terá também o alinhamento automático do DEM e do PSD do prefeito Gilberto Kassab. Líderes do DEM já indicaram até que, se o ex-governador sair candidato, poderão abrir mão da vaga de vice para facilitar uma composição.

A candidatura do tucano também torna mais plausível a atração do PPS e do PV, que negociam a formação de um "bloquinho" na capital. Juntos, eles somariam ao tempo de TV dos tucanos quase dois minutos por bloco de horário eleitoral, além de duas inserções de 30 segundos (veja quadro).

O PPS mantém a pré-candidatura de Soninha Francine, mas já foi sondado por Serra na quarta-feira, conforme antecipou o Estado. O partido é aliado do PSDB nas esferas federal e estadual, e apoiou a candidatura do tucano à Presidência em 2010. O mais provável é que ceda e se una a uma chapa tucana com Serra.

O PV, por sua vez, sofre forte influência de Kassab, que sempre apontou essa parceria como primeira opção no cenário eleitoral. "Participamos dos governos municipais do Serra e do Kassab", disse o presidente do partido, José Luiz Penna. "O mínimo de coerência exige abrir uma conversa com o PSDB."

Uma das maiores preocupações de Serra para entrar na corrida eleitoral é a formação de uma chapa forte em termos de exposição na televisão. A propaganda seria fundamental para reduzir a taxa de rejeição ao ex-governador, que chega a 33%, segundo a última pesquisa Datafolha.

Em 2008, o então candidato tucano Geraldo Alckmin, com uma chapa fraca, teve 4min27s, contra 6min40s de Marta Suplicy (PT) e 8min44s de Kassab. Não chegou ao segundo turno.

Planos nacionais. O ingresso de Serra na campanha nacionaliza a disputa eleitoral. Na avaliação do PT, a disputa na capital pode se tornar uma espécie de terceiro turno da eleição presidencial de 2010. Isso afasta o PSB da órbita tucana, já que o presidente nacional da legenda, governador Eduardo Campos (PE), tem planos para se aproximar cada vez mais da presidente Dilma Rousseff e do PT, por duas razões: é visto como um possível vice da petista na reeleição de 2014, caso haja percalços na aliança com PMDB, e também projeta um voo solo para 2018.

Por essas razões, embora o PSB seja aliado dos tucanos no governo Alckmin, Eduardo Campos terá dificuldades para apoiar Serra. Além disso, o governador já disse a petistas que caberá à cúpula nacional do PSB definir o rumo do partido em São Paulo.

A cada dia, o PT conta mais com o PSB, com quem costurava, juntamente com Kassab, um acordo envolvendo a vice da chapa do ex-ministro Fernando Haddad. Até agora, líderes do PT dão como certa apenas a aliança com o PR, que lhe dá pouco mais de um minuto e meio na televisão. O PSB, por sua vez, traria mais um minuto e 19 segundos.

Os petistas mantêm o discurso do esforço na busca por alianças com siglas da base de Dilma, mas têm assistido ao PMDB fincar pé na candidatura do deputado Gabriel Chalita, o PDT na do deputado Paulinho da Força, o PC do B na do vereador Netinho de Paula e o PRB na do ex-deputado Celso Russomanno.

O PTB, que está timidamente na base do governo em Brasília, mas é forte aliado dos tucanos em São Paulo, também ensaia a candidatura própria com Luiz Flávio D"Urso, presidente da seção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP).

Das cinco pré-candidaturas dos partidos da base mencionados, duas são dadas por dirigentes petistas como irreversíveis: a de Chalita e a de Russomanno. O PT ainda aposta na desistência de Netinho. Com o PDT, o diálogo é mais áspero. Um membro do partido avalia que, caso a candidatura própria não se concretize, a executiva deve apoiar Serra.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Kassab diz que Serra abandonou projeto nacional

Serra abriu mão de projeto presidencial, afirma Kassab

Prefeito diz que tucano abandonou pretensão para concorrer à prefeitura de SP

Matarazzo e Covas indicam que aceitam se retirar das prévias do PSDB, abrindo caminho para o ex-governador

Maíra Teixeira, Catia Seabra

SÃO PAULO, BRASÍLIA - O prefeito Gilberto Kassab (PSD) afirmou ontem que o ex-governador José Serra (PSDB) abandonou suas ambições presidenciais para concorrer à Prefeitura de São Paulo nas eleições deste ano.

"Ele entendeu que deveria abandonar esse projeto, e ele abandonou", disse Kassab, durante vistoria de uma praça na Zona Norte da capital. Serra tomou a decisão de se candidatar na sexta-feira, como a Folha informou ontem.

O prefeito afirmou que a atenção de Serra a partir de agora estará toda voltada para São Paulo. "Suas preocupações, seus projetos, seus estudos", disse Kassab. "Os próximos cinco anos dele serão voltados para a cidade."

Segundo o Datafolha, Serra é o nome do PSDB com melhores chances na eleição deste ano, com 21% das intenções de voto na sondagem mais recente. Ele também enfrenta altos índices de rejeição: 33% dos eleitores dizem que jamais votariam nele.

Serra administrou São Paulo entre 2005 e 2006 e deixou o cargo para disputar o governo do Estado, embora tivesse se comprometido anteriormente a ficar na prefeitura até o último dia do seu mandato.

O rompimento da promessa, que foi registrada em documento assinado durante sabatina da Folha na campanha eleitoral de 2004, certamente será explorado agora pelos adversários de Serra.

Serra deve formalizar sua candidatura amanhã, numa carta dirigida à executiva municipal do PSDB. A direção do partido deverá se reunir em seguida para decidir como incluí-lo nas prévias convocadas pelo PSDB para definir seu candidato à prefeitura.

As prévias estão marcadas para o dia 4, daqui a uma semana, e o prazo para inscrição de candidatos já acabou. O partido pode reabrir o prazo, ou adiar as prévias para que Serra entre no processo.

Há quatro nomes no páreo, os secretários estaduais Andrea Matarazzo (Cultura), Bruno Covas (Meio Ambiente) e José Aníbal (Energia), e o deputado Ricardo Tripoli.

O governador Geraldo Alckmin vai procurá-los para conversar um a um até amanhã. Matarazzo e Covas indicaram em conversas reservadas que aceitam se retirar da disputa para facilitar as coisas para Serra. Aníbal e Tripoli dizem que vão manter suas candidaturas até o fim.

No início do ano, Serra dizia não ter nenhum interesse em concorrer à prefeitura porque preferia ficar livre para disputar novamente a Presidência da República nas eleições de 2014. Serra concorreu a presidente em 2002 e 2010.

Mas o ex-governador, que perdeu a eleição do ano passado para a presidente Dilma Rousseff (PT), viu seu espaço dentro do PSDB encolher nos últimos meses e isso o levou a reconsiderar a ideia de entrar na disputa municipal.

Também contribuiu para sua decisão a movimentação de Kassab, que começara a negociar uma aliança com o PT para apoiar seu candidato a prefeito, o ex-ministro da Educação Fernando Haddad.

Os tucanos temiam que uma união de Kassab com os petistas deixasse o PSDB isolado em São Paulo, onde a hegemonia política detida pelo partido é ameaçada pelo PT.

Colaborou Daniela Lima

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Enterro de aliança com PSD abre crise no núcleo de Haddad

Petistas trocam farpas em reunião do Conselho Político; 'É a volta dos que não foram', ironiza pré- candidato sobre Kassab

O conselho político criado pelo PT para comandar a pré-campanha do ex-ministro Fernando Haddad à Prefeitura de São Paulo passou a manhã de ontem debatendo as consequências da entrada de José Serra (PSDB) na disputa e trocando farpas sobre o naufrágio da articulação - que contou com o aval do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva - para atrair o PSD do prefeito Gilberto Kassab ao polo petista. A reunião exacerbou a crise petista sobre qual grupo deve comandar a campanha do ex-ministro.

O Estado apurou que Haddad reagiu com irritação aos alertas sobre as dificuldades da campanha com a entrada de Serra e chegou a propor que o partido negasse oficialmente a existência de tratativas de aliança com Kassab, o que foi rechaçado.

Ao fim da reunião, questionado sobre o enterro da aliança com o PSD, Haddad foi irônico: "É a volta dos que não foram". O ex-ministro afirmou que não se surpreendeu com a entrada de Serra. "Já esperava que isso fosse acontecer." Disse ainda que encara com "naturalidade" ter o tucano como adversário. "Não muda nada. Ele (Serra) vai defender a administração atual e nós vamos apresentar um plano alternativo de mudança."

"Boa parte do conselho já trabalhava com a hipótese de candidatura do Serra e não trabalhava com a hipótese de apoio do Kassab. Em nenhum momento o Kassab procurou o partido formalmente. Foram só conversas com dirigentes do PT", alfinetou o vereador Chico Macena.

Tese nacional. Ainda que os petistas tenham divergências sobre a estratégia de campanha, há um consenso: Serra vai agregar os partidos que fazem oposição ao governo da presidente Dilma Rousseff e nacionalizar a eleição. A constatação obriga o PT a agilizar a composição de alianças com partidos que integram a base de Dilma. "Temos que convencer os partidos que a disputa em São Paulo, agora, terá um tom nacional", relatou um petista presente à reunião.

O conselho político de Haddad já enfrenta uma primeira crise. A corrente majoritária do PT, Construindo um Novo Brasil (CNB), reivindica ter papel mais atuante das decisões de campanha. Até aqui, o diretório municipal do PT, comandado pelo vereador Antonio Donato, tem dado as cartas na pré-campanha.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Maiores siglas cobiçam 9 inserções diárias de TV 'sem dono'

No leilão político da pré-campanha pela Prefeitura de São Paulo, as peças mais valiosas em negociação são as nove inserções diárias de propaganda eleitoral na TV que ainda não têm "dono".

Estão em jogo 270 segundos - em cada emissora - das cotas de dez partidos que ainda oscilam entre as coligações do PSDB, do PT ou do PMDB, ou que acenam com possíveis candidaturas próprias, mesmo sem força política na cidade.

As inserções - peças publicitárias de 30 segundos exibidas ao longo dos intervalos comerciais das emissoras de rádio e televisão - são o instrumento mais importante do marketing político, pois atingem também a população que "foge" do horário eleitoral fixo ao desligar a televisão ou mudando para os canais pagos.

Nas eleições para prefeito, as inserções ganham importância ainda maior, porque os candidatos têm mais tempo à disposição nessa modalidade que no horário político tradicional. São 30 minutos de inserções, todos os dias, contra apenas dois blocos de 30 minutos no programa eleitoral, três vezes por semana. No final das contas, a cada semana os candidatos a prefeito aparecem em 210 minutos de inserções e 180 minutos de programas eleitorais.

Em uma eleição presidencial, os candidatos têm menos inserções, porque é preciso dividir os 30 minutos diários com os concorrentes a governador, senador e deputado.

Empate técnico. Até o momento, as coligações encabeçadas pelo PSDB e pelo PT garantiram número similar de inserções diárias - 12,5 e 12, respectivamente. Esse cálculo leva em conta a adesão do DEM e do PP à candidatura tucana e pressupõe uma aliança do PR com os petistas.

No bloco dos indefinidos, o partido com maior cacife é o PSB, cobiçado abertamente pelo PSDB e pelo PT. Ele pode acrescentar 2,5 inserções diárias ao arsenal do candidato com quem se coligar. Parece pouco, mas não é: trata-se de um minuto e 15 segundos diários de propaganda em cada uma das emissoras de TV aberta da cidade, durante 45 dias.

A seguir aparecem PDT e PTB, com 2 e 1,5 inserções por dia. Líderes dos dois partidos falam em concorrer com candidatos próprios, mas o peso da caneta do governador Geraldo Alckmin (PSDB) pode pesar na definição - as legendas têm cargos na administração estadual e fazem parte da base de apoio ao governo na Assembleia.

O PMDB do deputado Gabriel Chalita abocanhou o "nanico" com maior poder de fogo em termos de propaganda: o PSC. O peemedebista já tem garantidas 9 inserções por dia - uma delas decorrente da aliança com o PSC.

O PSD não tem tempo de TV para negociar. Mas o prefeito Gilberto Kassab - que quase selou uma aliança com o PT e voltou para o ninho do PSDB quando Serra deu sinais de que sairia candidato - pode levar o PV para a coligação tucana. Os verdes de São Paulo, muito ligados ao prefeito, têm direito a uma inserção de propaganda por dia. / D.B., F.G. e B.B.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

A invenção da democracia :: Hélio Schwartsman

Já que estão tirando tudo dos gregos, dou minha contribuição à pilhagem, roubando-lhes os direitos autorais sobre a democracia.

Desde criancinhas, aprendemos que foram os gregos, mais especificamente os atenienses do século

5º a.C., que inventaram e implementaram o sistema pelo qual o povo governa a si mesmo. O problema é que essa ideia é falsa. Trata-se de um mito forjado no século 19 e que perdura até hoje, apesar do acúmulo de evidências em contrário.

Como mostra John Keane no instigante "Vida e Morte da Democracia", a palavra "democracia" e práticas a ela relacionadas já circulavam pelo mundo grego desde o final da Idade do Bronze (c. 1.500-1.200 a.C.).

Suas raízes remontam a inscrições conhecidas como Linear B, do período micênico, nas quais aparece o termo "damokoi", para designar funcionários que agiam em nome do "damos", isto é, do povo. Pelo menos a metade das cerca de 200 cidades-Estado gregas experimentou a democracia, muitas delas antes da Atenas do século de ouro.

Keane vai mais longe e oferece farta documentação de que o elemento central da democracia, as assembleias populares autônomas, surgiram ainda antes no Oriente, em territórios que hoje correspondem a Irã, Iraque e Síria -sim, a história pode ser profundamente irônica.

De lá, ela se espalhou para todos os lados, como forma eficaz de combate contra a tirania. A leste, chegou até o subcontinente indiano. Por volta de 1.500 a.C., no início do período védico, repúblicas dirigidas por assembleias eram comuns. A oeste, o costume do autogoverno atingiu as cidades fenícias de Biblos e Sidon, de onde ganhou a civilização grega.

Essas descobertas implicam que ciclos de nascimento e morte da democracia são bem mais comuns do que pensamos. Num mundo em que até o passado é incerto, devemos nos acautelar contra o excesso de otimismo com o futuro.

FONTE:FOLHA DE S. PAULO

Trocas e truques:: Ferreira Gullar

Senador não é eleito para legislar? Por que então o presidente da República o convida para ministro?

Pouca gente há de se lembrar de um personagem que, antigamente, habitava o livro de leitura no colégio e que se chamava João Pergunta. E, se assim se chamava, era porque vivia a perguntar sobre tudo o que via ou ouvia. Às vezes penso que sou um pouco como ele, já que estou sempre a questionar o que acontece em meu redor. E particularmente no campo político, uma vez que é ali que muita coisa de nossa vida se decide.

Como não sou especialista no assunto, posso às vezes formular perguntas tolas, cuja resposta todo mundo já sabe, menos eu. Mesmo assim, insisto, porque, se não o entendo, não fico quieto.

Uma dessas coisas é a insistência com que ultimamente se nomeiam parlamentares para a função de ministro. Sei muito bem que isso não é de agora, mas sei também que nunca se tornou tão frequente. Alguma razão deve haver, porque político não prega prego sem estopa. E tanto mais pelas implicações decorrentes disso.

Pense comigo: deputado, senador não é eleito para legislar? Por que então o presidente da República os convida para ministro? Desconfio haver algo de errado nisso.

Ou será que não? Vamos examinar: o Estado brasileiro é composto de três poderes que, para o bom funcionamento do regime democrático, são independentes uns dos outros. Se não me engano, o Congresso tem como uma de suas funções fiscalizar o Executivo, impedindo assim que o presidente da República desobedeça o que o Parlamento decidiu e a legislação prevê. Logo, a relação entre esses dois poderes, se deve ser harmoniosa, deve também preservar-lhes a autonomia.

Será que essa autonomia se mantém quando o presidente da República coopta deputados e senadores para compor seu ministério?

Estará, no mínimo, comprometida, uma vez que o ministro é um auxiliar subalterno do presidente da República, a quem deve obedecer. E então a coisa fica assim: elegemos o cara para a função de legislador -o que significa representar-nos na elaboração das leis, na defesa de nossos direitos de cidadão, e ele passar a servir ao poder. Não só não cumpre com a função para a qual o elegemos como passa a servir ao poder que deve ser fiscalizado por ele. Há algo de errado nisso ou sou eu que estou vendo chifre em cabeça de cavalo?

Não estou não, mesmo porque a coisa não fica aí. Na verdade, o presidente não o nomeia ministro por sua competência técnica, e sim por sua importância dentro do respectivo partido. Ou seja, ao fazê-lo, o presidente coopta não apenas o escolhido mas também o partido a que ele pertence. Disso resulta que, se por um lado, a relação autônoma entre os dois poderes se rompe, por outro lado e por isso mesmo, o ministério passa a ser um feudo do partido, que o usa conforme seus interesses político-eleitorais.

E como isso implica o desvio do dinheiro público para os cofres do partido, essa operação fraudulenta, para se efetuar, leva inevitavelmente ao envolvimento de outros personagens e instituições fajutas, como se viu recentemente nos escândalos de vários ministérios.

Mas a coisa não para aí. Como causa primeira de tudo isso, no caso do governo Lula, por exemplo, havia um projeto de poder pouco democrático, que está na origem mesma do PT. Como seu propósito era (e é) manter-se no poder indefinidamente, Lula evitou, em seu primeiro governo, aliar-se ao PMDB, que exigiria dele a partilha dos ministérios.

Como se sabe, está aí a origem do mensalão, que consistia em comprar com dinheiro os pequenos partidos, em vez de lhes dar cargos importantes no governo. Devido ao escândalo que resultou disso, Lula mudou de tática e passou a comprar os partidos de outro modo, oferecendo-lhes ministérios. Era o passo que faltava para que o governo petista se convertesse nessa espécie de neopopulismo, que rege hoje o país.

Essa cooptação de políticos visando a manutenção do poder teve como resultado um fenômeno até então inédito na vida política brasileira: a demissão, em apenas um ano, de sete ministros implicados em corrupção. O último deles entregou o cargo outro dia, e seu substituto -do mesmo partido, claro- também responde a processos na Justiça. Como se vê, ficha limpa, entre essa gente, é raridade.

FONTE: ILUSTRADA/FOLHA DE S. PAULO

Dois caminhos:: Míriam Leitão

Dois fantasmas estiveram presentes na história da América do Sul do século XX: o autoritarismo e a inflação. Em alguns momentos, chegaram juntos. Às vezes, o autoritarismo se vestiu com o discurso modernizante e benemérito. Perón fez isso na Argentina com os "descamisados", Getúlio fez isso com a legislação trabalhista. Em alguns vizinhos os fantasmas voltam a rondar recentemente.

Traços desse caudilhismo benemérito estão na Venezuela de Hugo Chávez. Ele implantou políticas públicas importantes num país que tem uma alta taxa de pobreza e miséria. Surgiu e se fortaleceu nas falhas do sistema político tradicional, que em décadas no poder - no revezamento entre Copei e Ação Democrática - mantinha a mesma oligarquia e a mesma exclusão no país.

O problema de Chávez, demonstrado nesses 13 anos no poder, é o uso da democracia contra a democracia. Ele ameaçou e encurralou a imprensa, mudou regras eleitorais para se beneficiar, fez eleições que lhe deram maioria e usou as maiorias para mudar a Constituição em seu favor. A oposição perdeu-se em seus erros. Para e eleição deste ano, ela se uniu em torno de Henrique Capriles, governador de Miranda, e pela primeira vez em muito tempo parece competitiva.

Ao mesmo tempo, a economia sente o peso dos gastos sem lastro do governo Chávez, da hostilidade aos investidores locais e estrangeiros e da instabilidade normativa do governo. Os supermercados enfrentam crônico desabastecimento e a inflação está entre 25% e 30% ao ano há muito tempo. Isso faz com que o dinheiro dado ao pobre perca valor mais rapidamente. O país cresceu 4,5% no ano passado, mas depois de dois anos de recessão.

É nesse contexto que surge um fator que aumenta o grau de incerteza do país, o câncer de Chávez, que está agora enfrentando sua segunda cirurgia. Como ele manteve o poder espalhando o conflito na sociedade, a Venezuela enfrentará nos próximos anos tempos instáveis, qualquer que seja a evolução dos acontecimentos.

A Argentina dos Kirchner vive um quadro parecido em alguns pontos. Cristina iniciou com força seu segundo mandato e aproveitou o bônus eleitoral para aprovar lei que encurrala a imprensa: por um lado, a censura; por outro, o controle da matéria-prima dos jornais, o papel. O governo argentino não fez tantas barbaridades constitucionais quanto Chávez, mas está desorganizando a economia.

A inflação está alta e o governo decidiu brigar com os índices. Os números subversivos sofrem perseguição. O governo fabrica os seus no Indec (o IBGE argentino) e multa o instituto privado que divulgar seus dados. Garante que a inflação está em 9%, mas seus próprios companheiros da CGT pedem 25% nas negociações trabalhistas alegando que querem a reposição da inflação. Em quatro anos, ela acumula 137%. A revista "Economist" decidiu que não vai mais publicar índices oficiais da Argentina entre os mais de mil dados de todos os países que publica semanalmente. A revista, num artigo com o título "Não minta para mim, Argentina", avisa que passará a usar o índice feito nos Estados Unidos por internet, que testado no Brasil e na Venezuela conseguem se aproximar muito dos índices oficiais. O que leva um país que enfrentou 200% de inflação ao mês a brincar com um inimigo desses?

No Equador, o presidente Rafael Correa decidiu seguir um roteiro inspirado em Hugo Chávez. Foi para a Justiça contra um jornal e um editorialista, pedindo uma indenização milionária e a prisão dos donos do "El Universo" e do autor do texto. O artigo foi republicado em oito jornais do Grupo de Diários América, inclusive no GLOBO, na sexta-feira. Saiu em 55 jornais da Colômbia.

No artigo, Correa é criticado e chamado de ditador pela maneira como conduziu um caso de protesto policial. Mais do que o fato em si é a maneira de enfrentar a crítica. Primeiro, ele mudou a Suprema Corte e trocou seus integrantes. Depois, submeteu seu processo contra o jornal e o jornalista. E o que aconteceu? Bingo! Ele ganhou a causa. O jornalista Emílio Palácio está pedindo asilo, os donos do jornal "El Universo" também estão fora do país, e o jornal está ameaçado por uma dívida que é maior do que o seu patrimônio. O presidente vem dando sinais de que pode "perdoar" os donos do jornal e o ex-editorialista da pena de prisão.

Os governantes na América do Sul que chegaram ao poder pelas eleições e com programas de combate à pobreza atendem a velhas demandas da sociedade, que quer ser democrática e menos desigual. Lamentável que alguns tenham preferido o caminho de minar pilares da democracia, perseguir adversários, ameaçar a imprensa, intervir no Judiciário e manipular eleições subsequentes para permanecer no poder.

O caudilhismo benemérito já vivemos. Alguns deixaram suas ambiguidades a confundir historiadores. Getúlio foi ditador e governante eleito. Representou a seu tempo o progresso social e trabalhista mas comandou uma polícia política violenta, instaurou a censura do DIP, Departamento de Imprensa e Propaganda, e impôs uma Constituição.

Temos aqui exemplos demais para mostrar que o caminho é democracia com estabilidade econômica.

FONTE: O GLOBO

Um fundo para distribuir renda : Suely Caldas

Finalmente - se não surgirem novas resistências - a Câmara dos Deputados vai retomar esta semana a votação da criação do Funpresp, o Fundo de Previdência Complementar do Serviço Público Federal, que o governo pretendia aprovar em 2011, mas o PT e outros partidos aliados boicotaram. O último boicote foi o faniquito do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), que bateu o pé e, intempestivamente, retirou a matéria de pauta em represália à não nomeação de um apadrinhado seu para a diretoria do Banco do Brasil. É com tal descaso e desrespeito aos eleitores e ao País que parlamentares do PT tratam os problemas da República. Mas agora parece não haver mais desculpa e o fundo pode ser definido esta semana.

A criação do fundo não resolve no curto prazo o bilionário déficit previdenciário dos servidores do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, que saltou de R$ 29,5 bilhões, em 2002, para R$ 56 bilhões, em 2011, e vai terminar 2012 acima de R$ 60 bilhões. Mas aprová-lo é uma questão de justiça social. Além de vedar o ralo por onde se esvaem a cada ano mais e mais bilhões de reais, no longo prazo ele resolve em definitivo o maior foco da desigual e injusta distribuição de dinheiro público no País.

Algumas comparações comprovam a injustiça: enquanto 1 milhão de servidores (0,005% da população) mordem R$ 56 bilhões do dinheiro que os 190 milhões de brasileiros pagam em impostos, o governo vai aplicar este ano apenas R$ 42,5 bilhões em investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento - incluindo rodovias, ferrovias, portos, hidrelétricas, saneamento, habitação. E a vida de muitos milhões de brasileiros poderia melhorar se o governo aumentasse esse valor. Tanto se fala em deficiências em saúde e educação, mas, se essa minúscula parcela de 0,005% da população não concentrasse tanta verba pública, sobraria mais dinheiro para melhorar esses serviços.

O Brasil é o país que mais gasta para seus servidores terem o privilégio de se aposentar com o mesmo salário da vida ativa. Até os ricos países europeus da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) - e sua conhecida generosidade com sistemas previdenciários - gastam menos do que nós. Os funcionários aposentados desses países custam aos governos em média 2% do PIB (varia entre 0,8% a 3,5%), equivalente a 5% da arrecadação tributária (entre 2,4% a 7,6%). Já o Brasil gasta quase 5% do PIB ou 15% da receita com impostos. O governo Dilma tem pressa em aprovar o fundo porque em 2012 estão previstas 57 mil novas contratações de servidores, que já entrariam sob o novo regime.

O projeto original do governo foi modificado, em comissões na Câmara, em três itens essenciais: ele igualava em 7,5% do salário a contribuição mensal do governo e a dos servidores. Na nova versão, o governo contribui com 8,5%, rompendo a paridade; o projeto original previa a constituição de um único fundo para os Três Poderes. Por pressão do Judiciário, ficaram três fundos distintos; e a gestão do dinheiro seria profissional, terceirizada e confiada a instituições financeiras especializadas. O novo projeto entrega a gestão a diretorias e conselhos indicados pelos Três Poderes e seus funcionários.

Das três mudanças, a mais perigosa é a relativa à gestão. O passado dos fundos de estatais é estarrecedor em matéria de incompetência e interferências políticas que resultaram em prejuízos enormes aos participantes dos fundos. Está tudo documentado no relatório de uma CPI em que aparecem investimentos desastrosos em imóveis, hotéis, shoppings e até em sepulturas. Marcados por corrupção e desvio de dinheiro, esses investimentos geraram déficits milionários que os 190 milhões de contribuintes sempre bancavam. É arriscado abrir brechas para repetir essa prática. O governo não deveria abrir mão da terceirização. Ela é quase uma norma em fundos de empresas privadas, com resultados altamente positivos. Já a gestão entregue a sindicalistas ou apadrinhados políticos... nossa história é farta em desastres para aceitar repeti-los.

Suely Caldas, jornalista, é professora da PUC-Rio

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Ano 1 depois da Dilma:: Marcelo Neri

Como Ayrton Senna, o Brasil anda bem debaixo de chuvas e trovoadas de uma crise internacional

No dia 1º de janeiro deste ano escrevi neste espaço sobre as perspectivas sociais do novo ano. Meu ponto era que o impacto da crise europeia aqui seria conhecido somente no dia seguinte após a passagem do ano gregoriano. As crises asiática de 1997 e do Lehman Brothers de 2008, ambas de setembro, repercutiram nas séries apenas em janeiro do ano seguinte (a crise de desemprego e a ressaca de 2009).

Entre os dois artigos, desci aos microdados da POF, os mais completos em termos de abrangência dos conceitos de renda e de despesa. Constatei que a crise aportou no bolso do brasileiro na primeira semana de 2009. A pobreza sobe 11% quando comparada à última semana de 2008. Tal como os dados semanais da PME sugeriam, a crise de 2008 não foi nem tsunami nem marolinha, mas ressaca tão forte quanto passageira.

Nos idos de 2009, divulgamos pesquisa com dados até dezembro de 2008 sem observarmos nenhum impacto relevante nos primeiros três meses e meio depois da crise. Desigualdade e pobreza mantiveram viés de baixa até a reversão da primeira semana de 2009. A ponto de lançarmos logo novo capítulo do que virou a série "Crônica de uma crise anunciada".

Apesar das limitações da PME, todas as grandes inflexões de distribuição de renda dos últimos 20 anos foram antecipados por ela (www.fgv.br/cps/debatesocial), como aquelas provocadas pela estabilização do Plano Real, a quebra da desigualdade inercial e a ascensão da nova classe média (real do Lula). Ou você quer ficar ilhado na última Pnad disponível (hoje, a de setembro de 2009)?

Lanço no dia 7 de março, às 19h, na Bolsa de Valores de São Paulo, livro que ensina todos os nós de marinheiro para você navegar com os emergentes. Fecha parênteses.

A fim de não nos afogarmos na flutuação dos números, esperamos a virada da maré de janeiro para aferir o efeito da instabilidade europeia intensificada em agosto.

Janeiro de 2012 coincide com o marco ano 1 depois da Dilma. Pois bem, as variações de 12 meses mostram:

1) crescimento da renda familiar per capita média da PME de 2,7%, que coincide com o crescimento observado entre 2002 e 2008, apelidado por muitos de "era de ouro mundial", e superior ao 0% do ano 1 depois da crise de 2008; 2,7% de crescimento também coincide com o crescimento do PIB total de 2011, recém-anunciado pelo Banco Central. A diferença é o crescimento populacional de pouco menos de 1%, mantendo a tendência, observada desde o fim da recessão de 2003, da renda das pesquisas domiciliares crescerem mais que o PIB;

2) A desigualdade tupiniquim continua em queda de 2,13% ao ano, ante o 1,11% observado no período de 2001 a 2009, conhecido como o de "queda da desigualdade brasileira". O Gini brasileiro foi, de 1970 a 2000, quase uma constante da natureza. A desigualdade brasileira está hoje 3,3% abaixo do seu piso histórico de 1960;

3) Como consequência, a pobreza segue sua saga descendente ao ritmo de 7,9% ao ano, superior aos 7,5% ao ano da "era de ouro" citada. Reduzimos em 2011 a pobreza num ritmo três vezes mais rápido que o necessário para cumprir a Meta do Milênio da ONU de reduzir a pobreza à metade em 25 anos.
Na leitura de 2011, não devemos esquecer que o Pibão e a histórica queda de 16,3% da pobreza observados em 2010 foram ao sabor da retomada da crise e do ciclo político eleitoral que inflam a amplitude de comparação.

A economia brasileira estava superaquecida no começo de 2011, assim como em 2008. A crise, como uma inesperada chuva de verão, esfriou a inflação de demanda anunciada. Sorte ou não, os resultados sugerem que o brasileiro, tal como Ayrton Senna, anda bem debaixo de chuvas e trovoadas de uma crise internacional. Nosso desempenho relativo depois das crises foi melhor do que a da "era de ouro mundial".

Agora, como se diz, o ano novo brasileiro só começa na semana depois do Carnaval. Nesse caso, temos de esperar para ver o que acontece amanhã -primeira segunda-feira após o Carnaval.

Marcelo Neri, 48, é economista-chefe do Centro de Políticas Sociais e professor da EPGE, na Fundação Getulio Vargas, e autor de "Microcrédito, o Mistério Nordestino e o Grameem Brasileiro" (editora da Fundação Getulio Vargas) e "A Nova Classe Média" (editora Saraiva).

FONTE: FOLHA DE S. PAULO

Nova chuva de euros:: Celso Ming

Nesta próxima quarta-feira, o ministro Guido Mantega terá mais razões para reclamar dos efeitos da tal guerra cambial que ele não para de denunciar.

Será o dia em que as impressoras do Banco Central Europeu (BCE) voltarão a funcionar a alta velocidade para emitir moeda destinada a empréstimos (ilimitados) para os bancos.

A primeira operação dessa natureza foi realizada dia 27 de dezembro, quando foram emprestados 489,2 bilhões de euros, por três anos, a juros de 1% ao ano. Foi a primeira grande descarga de artilharia comandada pelo novo presidente do BCE, Mario Draghi

Alguns analistas esperam procura ainda maior por essa linha de crédito pelos bancos europeus nesta segunda operação agendada para o dia 29. Argumentam eles que, desta vez, não haverá o constrangimento dos bancos que houve na anterior, quando a procura pelas generosas tetas do BCE ainda poderia ser entendida como sinal de fragilidade patrimonial, algo que pode ser mortal para um banco.

O objetivo do BCE com essas operações é acabar com o estancamento do crédito na Europa e contribuir, assim, para a redução dos juros cobrados pelos investidores no financiamento da dívida dos países do euro. Fácil de entender: mais dinheiro disputando o mesmo volume de títulos implica redução da remuneração paga por esses títulos.

Mesmo que o total dessa segunda rodada de financiamentos do BCE também fique em torno do meio trilhão de euros, será mais uma chuvarada de moeda que será despejada no mercado internacional. Parte dessa dinheirama acabará inevitavelmente fluindo para o Brasil e se encarregará de ajudar a derrubar as cotações da moeda estrangeira no câmbio interno. É esse reforço à tendência de valorização do real que o ministro Mantega mais teme.

Apenas para completar o cenário da guerra cambial, convém relembrar que o Federal Reserve (Fed, banco central dos Estados Unidos) emitiu US$ 2,9 trilhões desde 2008 para recomprar no mercado financeiro tanto títulos públicos como privados. E o BCE já carrega em seu balanço 2,7 trilhões de euros (veja gráficos no Confira).

É claro que nem as autoridades monetárias dos Estados Unidos nem as da Europa aceitam o diagnóstico da guerra cambial cultivado por Mantega. Eles repetem que não estão fazendo nada além de defender suas moedas contra as estocadas da crise. E mais: recomendam que, em vez de denunciar essas operações, o resto do mundo deveria aplaudi-las, porque contribuem para estancar o contágio financeiro.

Mantega está avisando que vai acionar seu arsenal de medidas para defender o real contra a excessiva valorização provocada por esse afluxo de moeda estrangeira. Mas ele não diz nem a que cotação começa a excessiva valorização do real nem o que vai fazer para evitá-la, além da habitual operação enxuga-gelo levada adiante pelo Banco Central.

Em todo o caso, já deu para conferir que o ministro fica muito incomodado quando a cotação do dólar resvala para abaixo de R$ 1,70 (sexta-feira fechou a R$ 1,71). E esse nível tem sido entendido como uma espécie de piso para o câmbio do Brasil.

CONFIRA

Os gráficos acima mostram como o BCE e o Fed (o banco central dos Estados Unidos) estufaram seus balanços com despejo de moeda.

FONTE: O ESTADO DE S. PAULO

Dobra arrecadação de IR pago por pessoas físicas

O valor desembolsado pelos brasileiros no pagamento de Imposto de Renda dobrou, em dez anos, de R$44,9 bilhões para R$90,7 bilhões. A melhoria dos salários e a crescente formalização dos empregos (com carteira assinada) explicam grande parte desse aumento na arrecadação. O avanço sobre as pessoas físicas foi bem maior do que a arrecadação total de IR, que cresceu 72% no mesmo período. Um fator que contribuiu para engordar os cofres públicos foi o fato de a correção da tabela do Imposto de Renda, nos últimos anos, não ter acompanhado o ganho de renda do brasileiro. Ou seja, em muitos casos, o aumento salarial veio junto com uma mordida maior do Leão. As conclusões são de estudo da consultoria Ernst & Young, com base em dados da Receita Federal. Segundo analistas, o governo está desperdiçando um bom momento para aliviar a carga tributária: "O momento ideal para reduzir esse peso é justamente quando a arrecadação sobe como agora, em que há aumento de renda e de formalização do trabalho", diz o tributarista Rubens Branco. A partir da próxima quinta-feira, a Receita começa a receber as declarações do IR 2012

O dobro do IR em dez anos

Valor pago por pessoas físicas dispara e amplia fatia no total arrecadado pela Receita

Lucianne Carneiro

IMPOSTO DE RENDA 2012

O brasileiro dobrou o volume de recursos que paga para o Leão nos últimos dez anos, enquanto a arrecadação dos demais setores da economia aumentou 72,21%. Levantamento da consultoria Ernst & Young Terco feito para O GLOBO, com base em dados da Receita Federal, mostra que a arrecadação com Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) e o Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), que inclui venda de imóveis, veículos e outros rendimentos de trabalho, foi de R$ 90,798 bilhões. Em 2002, o montante tinha sido de R$ 44,953 bilhões, considerando os valores ajustados pela inflação. Já a arrecadação total saltou de R$ 405,486 bilhões em 2002 para R$ 698,320 bilhões. Com isso, a fatia dos impostos de pessoas físicas frente ao total arrecadado subiu de 11% para 13% entre 2002 e 2011.

A boa notícia é que a expansão da renda e o crescimento da formalização do mercado de trabalho puxaram essa alta do montante arrecadado dos brasileiros, com influência, claro, da defasagem da tabela do IR em relação à inflação e da melhora na fiscalização. Nos últimos 15 anos, a diferença foi de 43,50%. Mas mesmo na passagem entre 2010 e 2011 - quando houve desaceleração no ritmo de crescimento da economia brasileira de 7,5% para 2,79%, segundo a prévia estimada pelo Banco Central - a arrecadação de pessoas físicas aumentou 10,61%.

- Há aumento da arrecadação dos impostos de pessoas físicas. Temos mais pessoas pagando impostos por aumento de salários e por mais emprego, já que cresceu o registro de empregos formais - diz o sócio da Ernst & Young Terco Carlos Henrique Martins Tonnus.

Chance perdida de reduzir tributo

Apesar de o governo ter conseguido ampliar o volume de recursos arrecadado, deixa para trás uma oportunidade de reduzir a carga tributária para o brasileiro. Algumas medidas foram tomadas nos últimos anos - como a criação de alíquotas intermediárias e o reajuste da tabela do IR -, mas ainda aquém do que poderia ser feito, para alguns especialistas.

- O momento ideal para reduzir carga tributária é exatamente quando a arrecadação sobe por outros fatores, como agora, em que há aumento de renda, de formalização do trabalho e da classe média. Seria interessante alguma redução de alíquotas ou mudanças nas faixas de contribuição, mas infelizmente não vejo disposição do governo para reduzir gastos e permitir uma menor carga tributária - diz Rubens Branco, diretor da Branco Consultores.

- O governo tem uma chance de ouro de fazer uma melhor política fiscal, mas tem assistido de forma passiva ao aumento da carga tributária - defende o professor do Ibmec-RJ Gilberto Braga.

O analista de sistemas Eduardo Joelson é um dos contribuintes que gostaria de ter algum alívio no Imposto de Renda. Descontado na fonte na alíquota máxima (27,5%), tenta reunir o máximo de recibos de gastos com saúde para ter alguma restituição. No ano passado, teve um casal de filhos gêmeos e agora espera poder usar a dedução do IR por dependente.

- No Brasil, pagamos um Imposto de Renda alto e a contrapartida em bens e serviços é pequena. Acabo tendo que pagar por fora por serviços como saúde e educação - afirma Joelson.

Segundo o diretor tributário da Confirp Consultoria Contábil, Wellinton Mota, seria oportuno ser mais flexível com o contribuinte, permitindo outras deduções:

- Existem algumas incoerências, como os limites por dependente e para educação, que são muito baixos e poderiam ser corrigidos.

No Imposto de Renda 2012, ano-calendário 2011, o valor para dedução por dependente é de R$ 1.889,64, enquanto o limite para deduzir gastos com educação é de R$ 2.958,23.

Além do aumento do montante arrecadado pelo governo, o expressivo ganho de renda nos últimos anos também provocou uma mudança nas faixas de contribuição do Imposto de Renda, quando se considera a classificação por salário mínimo. Em 1996, os trabalhadores que recebiam 8,04 salários mínimos estavam isentos de pagar o imposto. Hoje, esta faixa de isenção é de 2,63 salários mínimos. Por outro lado, a faixa máxima de pagamento de imposto de renda começava em 16,07 salários, enquanto hoje começa em 6,57 salários.

- O aumento do salário mínimo foi muito maior que a atualização da tabela do IR, provocando essa mudança - explica Carlos Henrique Martins Tonnus.

Pelo cálculo da Ernst & Young Terco, o reajuste do salário mínimo foi de 386,61% nos últimos 15 anos, enquanto a tabela do IR foi reajustada em 73,95%, uma diferença de 179,73%.

Gilberto Braga diz que a alteração nessas faixas de contribuição do Imposto de Renda de acordo com o salário mínimo mostra o ganho de renda nos últimos anos, mas lembra que parte dele tem sido corroído por uma carga tributária maior:

- De nada adianta aumentar a média nominal dos salários e retirar parte desse ganho real com carga tributária maior. A defasagem da tabela do Imposto de Renda já é grande quando comparada com a inflação e fica ainda mais gritante quando se compara com o salário mínimo.

FONTE: O GLOBO

Perda da tabela do IR frente à inflação chega a 43,5% em 15 anos

Programa da Receita já está disponível, mas entrega só começa quinta-feira

Lucianne Carneiro, Martha Beck

IMPOSTO DE RENDA 2012

RIO e BRASÍLIA. O reajuste da tabela do Imposto de Renda (IR) nos últimos anos - e que se repete em 2012 - não livrou o brasileiro de uma perda expressiva frente à inflação na hora de acertar as contas com a Receita Federal. A defasagem - quanto a correção da tabela do IR perde para a inflação - chega a 43,5% nos últimos 15 anos, segundo levantamento da consultoria Ernst & Young Terco feito para O GLOBO. No período, a inflação brasileira avançou 149,63%, enquanto a tabela do IR foi atualizada em 73,95%.

- Essas atualizações recentes de 4,5% fixas não refletem a inflação e não são suficientes para resolver a defasagem. É como uma loteria: se a inflação for menor que 4,5%, recupera-se alguma perda passada. Se for maior, continua acumulando perdas - afirma o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), João Eloi Olenike.

A tabela do Imposto de Renda tem sido corrigida em 4,5% ao ano desde 2007 - o centro da meta de inflação estabelecida pelo Banco Central - e o percentual de reajuste será mantido até 2014. A correção, no entanto, não tem conseguido nem evitar o aumento da defasagem - no ano passado, a inflação foi de 6,5% - nem acabar com um problema agravado principalmente entre 1996 e 2001, quando a tabela ficou congelada.

- Quando não reajusta a tabela com a inflação, o governo se apropria de recursos que não são seus - diz o tributarista Miguel Silva, sócio-fundador do Miguel Silva & Yamashita Advogados.

A certeza da defasagem, no entanto, não elimina a responsabilidade de acertar as contas com o Leão. Começa na próxima quinta-feira, dia 1 de março, o prazo de entrega da declaração do Imposto de Renda 2012 (ano-base 2011) e a Receita Federal espera que 25 milhões de contribuintes enviem o documento até 30 de abril. Quem perder o prazo terá que pagar multa de até 20% do IR devido. No ano passado, foram 24,3 milhões de declarações ao Fisco.

Mudanças em regras para doações

Este ano, a Receita fez poucas alterações no programa de preenchimento do documento. Segundo o supervisor nacional do IR, Joaquim Adir, a apresentação do programa continua a mesma. Uma das poucas novidades foi permitir que doações a Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente, feitas em 2012, sejam deduzidas da base de cálculo do IR já este ano. Anteriormente, essa dedução só podia ser feita no ano seguinte à doação.

Outra mudança foi que o programa não vai mais emitir todos os boletos para quem têm imposto a pagar. Só serão emitidos no ato do preenchimento da declaração os documentos para pagamento em cota única, ou a primeira cota para quem recolher o IR em parcelas. Até 2011, todos os boletos eram emitidos, mas isso gerava problemas.

Foram comuns casos de pessoas que caíram na malha fina, porque perderam a data e recolheram apenas o valor já impresso. Quem opta pelo parcelamento precisa corrigir os valores com multa e juros. Agora é preciso entrar na página da Receita (www.receita.fazenda.gov.br) a cada mês e emitir o boleto atualizado.

Estão obrigadas a declarar o imposto as pessoas físicas que obtiveram rendimentos tributáveis acima de R$ 23.499,15 no ano passado. O acerto de contas pode ser feito pela página da Receita ou por meio de disquetes entregues nas agências do Banco do Brasil ou da Caixa. Não são mais permitidos formulários de papel. Os contribuintes que quiserem se antecipar já podem baixar pela internet os programas de preenchimento e de envio da declaração de 2012, disponíveis desde sexta-feira. O documento, no entanto, só poderá ser enviado a partir de quinta-feira. Também já está disponível na rede um serviço da Receita para tirar dúvidas.

As empresas têm até quarta-feira para enviar a seus funcionários os comprovantes de rendimentos. Já os bancos poderão enviar por meio eletrônico os comprovantes de rendimentos relativos a aplicações financeiras. Essas informações só serão enviadas em papel para clientes que não façam operações pela internet.

FONTE: O GLOBO

Teresa Cristina e Grupo Semente - Cem Mil Réis / Se Eu Pudesse

Não me Peçam Razões...:: José Saramago

Não me peçam razões, que não as tenho,
Ou darei quantas queiram: bem sabemos
Que razões são palavras, todas nascem
Da mansa hipocrisia que aprendemos.

Não me peçam razões por que se entenda
A força de maré que me enche o peito,
Este estar mal no mundo e nesta lei:
Não fiz a lei e o mundo não aceito.

Não me peçam razões, ou que as desculpe,
Deste modo de amar e destruir:
Quando a noite é de mais é que amanhece
A cor de primavera que há-de vir.

José Saramago, in "Os Poemas Possíveis"