terça-feira, 28 de março de 2023

Míriam Leitão - Arcabouço supera debate de mérito

O Globo

A equipe do Ministério da Fazenda tem conseguido afastar as objeções feitas internamente ao arcabouço e a informação que eu tenho é que não há mais discussão de mérito, mas sim debate sobre contas e projeções. A superação de um grande impasse foi possível graças à interpretação do próprio presidente Lula. A proposta de que investimentos ficassem de fora dos limites, que era o ponto mais importante para a ala política, se chocou com a visão de Lula de que educação, saúde, programas sociais também são investimento. Logo, se houver um limite para essas despesas, obras não poderiam ficar de fora. Até agora, permanece o princípio de que nenhuma despesa ficará fora do limite.

É possível que esta semana ainda, nos próximos dias mesmo, o arcabouço seja divulgado. O processo ficou mais ligeiro dado que o presidente não viajou. Ontem, eles discutiam internamente algumas projeções, mas não mais o mérito da nova regra fiscal. Por enquanto, o que impede a divulgação são essas contas que ainda estão sendo feitas sobre os impactos da aplicação do arcabouço.

Merval Pereira - Blindar Lula de si mesmo

O Globo

Lula quer “foder” o Moro. E quer nomear para o Supremo Tribunal Federal (STF) seu advogado privado, que conseguiu tornar suspeito o juiz que o condenou. Vive assombrado pelo passado, que tem mais peso para ele no momento que o futuro.

É risível o malabarismo que a imprensa petista vem fazendo para tentar explicar a fala irresponsável dele sugerindo uma armação da Polícia Federal para favorecer o senador Sergio Moro no inquérito que investiga a trama de uma facção criminosa contra funcionários do Judiciário brasileiro.

As mais aloucadas teorias conspiratórias surgem para tentar mudar o rumo da história, enquanto o verdadeiro problema é deixado de lado: a grave ameaça do crime organizado contra o Estado brasileiro.

Ao minimizar a existência de tal complô, com a intenção de não valorizar o atuação de Moro no combate à corrupção e ao crime organizado, a esquerda deixa de lado a segurança nacional para proteger a segurança pessoal de Lula, que já não pode ser deixado sozinho para seus improvisos. Sugerem que terceirize o embate com Moro e Bolsonaro, uma maneira de blindá-lo.

Outra tentativa de desmoralizar o ex-juiz Moro é tachá-lo de direitista. Ora, alguém tem dúvida disso? Se tinha, quando Moro apareceu na campanha presidencial ao lado de Bolsonaro como seu assessor num debate, depois de tê-lo acusado de tentar interferir na Polícia Federal para salvar seus filhos e apaniguados, já era possível constatar que preferia Bolsonaro a Lula. Ajudou, assim, a alimentar a narrativa de que Lula era um inocente que perseguia por questões políticas.

Carlos Andreazza - Lira contra a República

O Globo

Não existe controvérsia sobre o rito para tramitação de medidas provisórias no Congresso. Isso é falso problema forjado por um oportunista da pandemia: Arthur Lira. Tampouco estão em disputa entendimentos sobre regimentos internos, embora os sucessivos saques de Lira aos regramentos da Câmara sugerissem que ele não tardaria a atacar a Constituição.

É disto que se trata: de atentado de Lira contra a Constituição. Não será o caso de explicar o que a Carta estabelece como trâmite de MP no Parlamento. Já escrevi a respeito no artigo “O assalto de Lira à Constituição”, disponível em meu blog no site do GLOBO. Está tudo lá.

Está tudo, claríssimo, na Constituição.

O presidente da Câmara, aliás, admitiu em entrevista ao Valor que o rito que desrespeita é constitucional. Pondera, porém, que a forma excepcional vigente seria “muito mais” democrática. Voltarei a isso.

Chamei Lira de oportunista da pandemia. Haverá outra maneira de se referir a quem manipula solução extraordinária estabelecida pelas duas Casas, de modo a que as deliberações legislativas pudessem ocorrer durante a emergência sanitária imposta pela peste, para ampliar o próprio poder?

Poderia chamar o oportunista da pandemia de golpista. Porque é um golpe — contra Constituição — o que se arma. Não é hora para meias palavras.

Luiz Carlos Azedo - Não custa nada lembrar, Lula quase perdeu a eleição

Correio Braziliense

Lula ainda nem completou 100 dias de mandato, mas seu governo começa a envelhecer rapidamente. Antigos conflitos e problemas emergiram nesse período, como as invasões de terra pelo MST

Entre os aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que não são de esquerda — muitos dos quais o apoiaram já no primeiro turno —, cresce a preocupação com os riscos de ingovernabilidade que está correndo, diante dos desafios de seu novo governo. A sombra que persegue Lula vai para bem longe, a ex-presidente Dilma Rousseff, que assumirá o comando do banco dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), com um salário equivalente a R$ 200 mil. Entretanto, a comparação do atual governo com o de Dilma, que não é nada alvissareira, está se tornando cada vez mais frequente.

Lula ainda nem completou 100 dias de mandato, mas seu governo começa a envelhecer rapidamente. Antigos conflitos e problemas emergiram nesse período, como as invasões de terra pelo MST, o risco de aparelhamento das estatais e fundos de pensão pelo PT e a eterna disputa entre os moderados e a esquerda petistas pela política econômica do governo. Para complicar ainda mais, pululam no governo os possíveis candidatos à sucessão de Lula, o que é uma insanidade, em se tratando de uma administração que precisa primeiro dar certo.

Alguém precisa refrescar a memória dos petistas de que Lula quase perdeu a eleição para Jair Bolsonaro: a vitória no segundo turno foi por 50,9% a 49,1% dos votos válidos. Lula ganhou a eleição graças ao voto das mulheres e dos mais pobres, mas a diferença decisiva veio dos votos de Simone Tebet, que se empenhou na campanha de Lula no segundo turno, e Ciro Gomes, por gravidade, via PDT. Bolsonaro obteve mais votos da chamada “terceira via” do que Lula, o que é um sinal de que esses segmentos sociais e políticos de centro podem se deslocar facilmente para a oposição ao governo.

Raphael Di Cunto - Os próximos passos da crise no Congresso

Valor Econômico

Eleição em Alagoas deve pôr à prova aliança com Lula

A briga entre Senado e Câmara já tem um derrotado: o governo Lula (PT). Os petistas defendiam há semanas que as comissões mistas, formadas por deputados e senadores para tratar das medidas provisórias (MPs), não fossem instaladas, com a crença de que isso deve atrasar a agenda do Executivo no Congresso. A queda de braço entre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e o da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), rompeu as tentativas de acordo que vinham sendo costuradas.

O governo agora precisará se desdobrar para fazer avançar 13 medidas provisórias em 13 comissões diferentes em meio ao embate sobre se os deputados as boicotarão ou não. A composição não deve ser favorável - siglas mais fiéis, como PDT, PSB e Psol, não terão assento nesses colegiados, dominados pelo Centrão. As primeiras MPs do governo, como a reforma administrativa e parte do ajuste fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, começam a perder a validade daqui a 60 dias. A alternativa, péssima para o Executivo, é enviar parte dessas MPs como projetos de lei.

A briga ainda contaminaria outros projetos. A reforma tributária depende de um texto de consenso entre as duas Casas. Na legislatura passada, um acordo entre os dois fez com que o Senado começasse a discussão sobre simplificar os impostos sobre o consumo, enquanto a Câmara trataria do imposto de renda e dividendos. Os deputados aprovaram sua parte, travada pelos senadores, que tampouco avançaram a votação das propostas de emenda constitucionais (PECs).

Pedro Cafardo - Juros altos em todo lugar e o tempo todo

Valor Econômico

“O país está viciado e precisa se livrar da intoxicação de juros”

Teve discreto destaque a declaração do presidente da Fiesp, Josué Gomes da Silva, na semana passada, na qual chamou os juros brasileiros de “pornográficos”. Na verdade, ele adotou a palavra usada por outro industrial, Antônio Ermírio de Moraes, que dedicou longos anos de sua vida à luta contra os juros altos brasileiros e morreu em 2014 sem ganhar a batalha.

Essa luta do setor produtivo, portanto, vem de longe. Nos últimos anos, foi arrefecida porque predominou, inclusive entre industriais, a ideia liberal de que os juros elevados são a única arma para combater a inflação. Com a nova posse de Lula na Presidência da República, a batalha foi retomada.

Pesquisando publicações do passado sobre o tema, o colunista encontrou um artigo de outro grande industrial brasileiro, Benjamin Steinbruch, com o título “Viciados em juros”. Com atualização dos números, o texto se aplicaria ao momento atual brasileiro. Vejam alguns trechos escritos pelo empresário em novembro de 2015, durante o então agonizante governo Dilma Rousseff:

“Na semana passada, ficamos sabendo que o déficit fiscal do setor público brasileiro neste ano é um número que deve variar entre R$ 50 bilhões e R$ 100 bilhões, dependendo de como será encarado o problema das pedaladas fiscais. Ficamos todos horrorizados com esses números. Esse déficit é aquele que os economistas chamam de ‘primário’ e decorre de atuação ineficiente e/ou irresponsável da administração dos recursos públicos. Há, porém, outro déficit muito maior, previsto para atingir R$ 350 bilhões neste ano. É aquele que advém das despesas financeiras do setor público, ou seja, do custo da dívida pública de R$ 2,7 trilhões”.

Dora Kramer - Que Lula é este?

Folha de S. Paulo

Trata-se de um personagem muito diferente, tanto na ação quanto no pensamento

A incerteza permeou o universo político durante a campanha eleitoral: como será Luiz Inácio da Silva de novo na Presidência, tantos anos e inúmeros percalços depois? Agora, com menos de três meses de governo, a indagação já encontra resposta nas análises de políticos de diversos espectros.

É um Lula com faca nos dentes, afetado pela idade, pela influência do entorno menos qualificado que aquele de 2003 e, sobretudo, pelo ressentimento decorrente das acusações, das condenações, da prisão, das perdas pessoais. No estado de espírito do tempo atual conta também o fator volta por cima no estímulo a instintos primitivos.

O diagnóstico é comum a variadas correntes. Sejam de esquerda, de direita, do centro que aderiu pelas circunstâncias do desastre bolsonarista, façam parte do governo atual ou tenham integrado administrações petistas anteriores. Todos esses enxergam um personagem muito diferente tanto na ação quanto no pensamento.

Alvaro Costa e Silva - Lula não pode livrar a cara de Ortega

Folha de S. Paulo

Ditadura nicaraguense deve explicações sobre morte de brasileira

Em 2018, uma onda de terror varreu a Nicarágua para reprimir os protestos que pediam a destituição do presidente Daniel Ortega, o ex-guerrilheiro sandinista que, a despeito de ter lutado nos anos 1970 para derrubar a ditadura da família Somoza, ergueu ao longo da última década um regime autoritário e assassino que o sustenta no poder ao lado da mulher, Rosario Murillo, a vice-presidente.

A revolta de cinco anos atrás deixou mais de 300 mortos, entre os quais a brasileira Raynéia Lima. Na noite de 23 de julho, quando voltava para casa de carro e passava em frente ao condomínio onde mora Francisco López, tesoureiro da Frente Sandinista, partido de Ortega, ela levou um tiro que atingiu o coração, o diafragma e parte do fígado.

Hélio Schwartsman - Fentanil, o perigo bate à porta

Folha de S. Paulo

Apreensão de droga no Espírito Santo acende alerta

apreensão de 31 frascos de fentanil com traficantes no Espírito Santo acende um sinal de alerta. Tudo o que não precisamos por aqui é de uma epidemia de abuso de opioides semelhante à que ocorre nos EUA.

A situação ali pode ser descrita como desesperadora. As mortes por overdose de drogas vinham subindo de forma consistente desde 2000 e explodiram com a pandemia de Covid. Em 2021 foram 107 mil óbitos, 80 mil dos quais provocados por opioides, com o fentanil na liderança folgada. É mais do que as mortes em acidentes de trânsito ou por armas de fogo.

Joel Pinheiro da Fonseca - A inteligência artificial coloca a humanidade em risco?

Folha de S. Paulo

O medo propalado parece exagerado, mas há motivos para preocupação

A foto do papa Francisco usando um casacão branco de inverno marca um novo momento na cultura. Uma foto sem nenhuma agenda secreta, apenas uma brincadeira com a imagem do papa, que circulou pelas redes, enganando muitas pessoas e até um ou outro veículo de imprensa. Tratava-se de uma imagem inteiramente criada por inteligência artificial.

Enquanto isso, ferramentas de escrita por IA não só escrevem cartas como já criam histórias, formulam argumentos e até passam em exames admissionais humanos. Não existe inteligência real por trás da ferramenta; ela apenas ordena palavras seguindo padrões estatísticos de uma base de dados de bilhões de textos humanos espalhados pela internet. É uma versão mais poderosa do autocompletar dos nossos celulares. Mesmo assim, o resultado é espantoso.

Isso justifica a apreensão que muitos têm sentido com as novas tecnologias, como Yuval Harari em artigo no New York Times e Antônio Prata aqui na Folha. Confesso que o medo existencial —o medo propalado pelos próprios criadores/entusiastas de IA de que ela possa extinguir a humanidade— me parece exagerado. Tanto que Harari não é capaz de descrever um cenário plausível que leve a esse fim. Ele nem tenta. Mas há sim motivos de preocupação mais mundanos.

Eliane Cantanhêde - A bruxa está solta

O Estado de S. Paulo

Qualquer comparação entre eles é péssima para Lula, mas Bolsonaro não tem nada a perder

A bruxa anda solta e agora é o governador Tarcísio de Freitas que está com crise renal e teve de cancelar uma agenda internacional, mas esses solavancos servem como freios de arrumação, com mais sangue-frio e a retomada de agendas internas importantes. Com o cancelamento da ida do presidente Lula à China, por exemplo, estão para ser anunciados a âncora fiscal, a paz no Congresso e o reinício da tramitação das medidas provisórias.

Lula chega ao fim do terceiro mês com dois problemaços que se retroalimentam: um é a percepção generalizada de que ele está sem rumo e o governo não vai bem; o outro é que isso não apenas dá discurso para o bolsonarismo como reforça o medo, ou pavor, da volta de Jair Bolsonaro. Que, aliás, está chegando da Flórida, com salário graúdo, casa alugada, microfones, holofotes e a capacidade de enrolar tantos, por tanto tempo.

Rubens Barbosa* - A nova China e a visita de Lula

O Estado de S. Paulo

O que o Brasil quer da relação com a China na defesa dos interesses nacionais concretos, e não subordinados à ideologia ou à geopolítica? É hora de definir esses interesses

A viagem do presidente Lula à China foi adiada por motivo de saúde e ainda não tem data para ser concretizada. A China que vai receber o presidente brasileiro é muito diferente daquela que existia nos últimos anos. A partir da confirmação de um terceiro mandato do presidente Xi Jinping, a retórica cautelosa das lideranças de Beijing se alterou profundamente. Xi Jinping defendeu que a China deve “participar ativamente da reforma e construção do sistema de governança global e promover iniciativas de segurança globais” para a paz e o desenvolvimento mundiais. Essa nova atitude foi responsável pela bem-sucedida mediação entre a Arábia Saudita e o Irã que culminou num acordo para o restabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países. Com isso, a China tornou-se um ator mais importante que os EUA no Oriente Médio.

Essa crescente atividade externa certamente foi ampliada na conversa com Putin e o prometido contato telefônico com Zelenski para tentar influir nos esforços para a suspensão das hostilidades na Ucrânia. Uma proposta de 12 pontos anunciada pelo Ministério do Exterior chinês, apoiada pela Rússia, foi prontamente rechaçada pelos EUA e pela Ucrânia.

Pedro Fernando Nery - A política ‘socindustrial’

O Estado de S. Paulo

O debate público parece ter mais resistência à política industrial do que à agenda social

A novidade da política industrial sob Biden não é só o seu ressurgimento, mas o seu uso para múltiplos fins. Por exemplo, as empresas que atuam na fabricação de chips receberão apoio do governo federal, mas só se garantirem creche para os seus funcionários. O Wall Street Journal chamou de “política industrial social”. Vamos de política “socindustrial”, como definiu o professor Carlos Alberto Ramos, da UnB.

O professor vê na iniciativa uma tentativa de chamar responsabilidade social às empresas, e a possibilidade de a política industrial afetar o PIB de outras formas, como via taxa de participação e via capital humano (pelas crianças).

E no Brasil? Aqui, o debate público parece ter mais resistência à política industrial do que à agenda social: seria a política socindustrial uma chance de conciliação?

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

Lira faz demanda descabida na querela das MPs

O Globo

Congresso precisa destravar a pauta para se ocupar da agenda legislativa essencial para o país

Enquanto o Brasil atravessa dificuldades e tem urgência na aprovação de um novo regime fiscal e de reformas como a tributária e a administrativa, a pauta do Congresso está travada. É como se os congressistas pudessem se dar ao luxo de se desligar da realidade nacional e virar de costas aos que os elegeram em outubro.

O motivo é a querela entre os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em torno do trâmite das Medidas Provisórias (MPs), normas com força de lei editadas pelo presidente da República. Embora tenham efeitos jurídicos imediatos, as MPs precisam ser examinadas e votadas no Congresso. Enquanto isso não ocorre, elas travam a pauta e impedem que o Parlamento analise outras propostas legislativas.

O artigo 62 da Constituição afirma: “Caberá à comissão mista de Deputados e Senadores examinar as medidas provisórias e sobre elas emitir parecer, antes de serem apreciadas, em sessão separada, pelo plenário de cada uma das Casas do Congresso Nacional”. Uma resolução do Congresso de 2002 disciplinou o rito de tramitação. Determinou que essas comissões mistas seriam integradas por 12 senadores e 12 deputados e que haveria alternância entre deputados e senadores na presidência e relatoria. As duas Casas com pesos iguais. Assim foi até a pandemia.

Poesia | O Teu Riso (Pablo Neruda)

 

Música | Moacyr Luz | Toca no telhado | Atravessado