domingo, 17 de dezembro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

A maior mudança na economia desde o Plano Real

O Globo

Reforma tributária inaugura período de trabalho intenso para eliminar o caos brasileiro nos impostos

Não seria exagero afirmar que a reforma tributária aprovada na última sexta-feira representa uma transformação na economia brasileira comparável à do Plano Real. Não apenas pela simplificação e racionalização dos impostos sobre serviços e consumo. Mas, acima de tudo, pelo fim da cobrança cumulativa, que faz do Brasil o país com o “pior sistema de tributação” do mundo, nas palavras certeiras da tributarista portuguesa Rita de la Feria, da Universidade de Leeds, em entrevista ao GLOBO.

Levará algum tempo para o novo sistema entrar em vigor plenamente — o prazo para substituição completa dos cinco impostos vigentes pelos dois criados pela reforma é de dez anos —, mas rapidamente o brasileiro se dará conta da diferença dele para o velho. Hoje nem o governo tem noção de quanto o consumidor paga de imposto em cada produto ou serviço, tantas são as categorias, exceções e regimes estaduais e municipais distintos. Com a adoção do modelo consagrado internacionalmente — o imposto sobre valor adicionado —, toda a tributação ficará explícita. O fim da cobrança cumulativa e sua transferência para o local de consumo trarão um grau de racionalidade e transparência que o Brasil desconhece.

Merval Pereira - Tradição e modernidade

O Globo

O embaixador francès Alexandre Conty, ao doar o Petit Trianon para a ABL, destacou o parentesco latino da França e do Brasil, dizendo que o palácio carioca seria um símbolo

Segundo o filósofo espanhol Ortega y Gasset, “o homem é o homem e suas circunstâncias”. Quando Machado de Assis, o fundador da Academia Brasileira de Letras em 1897, a definiu como uma “torre de marfim”, afirmando que a história se fazia fora dela, estava refletindo sua época, assim como, em 1923, quando o governo francês doou o Petit Trianon para ser a sede da ABL, tratava-se de uma política de Estado, “ precursora do que chamamos “soft power”, na qual a cultura, e em especial a literatura, a história, a filosofia e as artes plásticas, assumiam um papel fundamental para manter a presença e a influência francesa no Brasil e na América do Sul”, na definição do historiador e membro da ABL Arno Wehling na palestra comemorativa do centenário do Petit Trianon como sede da ABL.

Era patente, disse, que essa política se voltava “contra a extensa influência econômica inglesa no país, que vinha do século XIX e que, após a Primeira Guerra Mundial, já começava a ceder terreno ante a expansão do comércio norte-americano”. O embaixador Alexandre Conty destacou o parentesco latino da França e do Brasil, dizendo que o Petit Trianon carioca seria um símbolo: “Sua arquitetura do século XVIII, época da razão pura, de fina crítica e de sabedoria fresca e seca, tornar-se-á para vós uma fortaleza contra a escola da retórica que ameaça todos os descendentes dos latinos”.

Míriam Leitão - Real permanece vivo na memória

O Globo

Um estudo obtido pela coluna com exclusividade mostra que o Plano Real ainda tem avaliação alta, mas o país continua com medo da inflação

Trinta anos depois, os brasileiros se lembram bem do plano econômico que estabilizou a economia do país. O Plano Real é considerado a política pública mais importante, depois do Bolsa Família. Uma pesquisa feita neste mês de dezembro, pelo Ipespe para a Febraban, mostra a força da reforma monetária lançada no começo de 1994 pelo governo Itamar Franco, e formulada pela equipe do ministro Fernando Henrique Cardoso. Quase oito em cada dez brasileiros, 77%, avaliam como ótimo ou bom o Plano Real. Quando se pergunta qual é a moeda da estabilidade brasileira, 70% citam o real. A população brasileira, porém, permanece vigilante: 66% estão preocupados com a inflação e 79% consideram que o seu combate deve ser prioridade do governo.

Em fevereiro de 1994, o governo anunciou que, no dia primeiro de março, seria instituída a URV, Unidade Real de Valor. Parecia uma abstração de economistas no meio de uma realidade dolorosa dos brasileiros que haviam enfrentado no ano anterior 2.477% de inflação. Vinha após os fracassos dos planos Cruzado, Bresser, Verão e Collor e dos remendos Cruzado II e Collor II. A URV era uma moeda virtual, num tempo ainda não digital. Existia, mas não era vista pelas pessoas. Era unidade de conta, mas não meio circulante. Aquele começo abstrato foi o caminho pelo qual os economistas oriundos da PUC do Rio venceram o que parecia invencível. A URV virou a moeda real no dia primeiro de julho de 1994.

Luiz Carlos Azedo - Reforma tributária é vitória estratégica de Lula

Correio Braziliense

Além do ganho de produtividade e de qualidade do financiamento da máquina pública, a reforma dará mais segurança jurídica aos negócios e investimentos

Há 30 anos em discussão no Brasil, a reforma tributária (PEC 45/2019) foi aprovada na sexta-feira com o plenário praticamente vazio, mas com 510 deputados presentes, a maioria remotamente, por 365 votos a favor e 118 contrários, além de uma abstenção. Na primeira rodada de apreciação, o placar foi de 371 a 121, com três abstenções. Agora, será promulgada pelo presidente do Congresso, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), depois de muita negociação com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e os relatores das duas casas legislativas, o senador Eduardo Braga (MDB-AM) e o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), em razão das mudanças feitas pelo Senado.

A reforma é uma vitória estratégica do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estabeleceu a mudança da estrutura tributária como prioridade de seu primeiro ano de governo, e fortalece o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que a negociou exaustivamente com deputados e senadores. Seu principal artífice foi o economista Bernard Appy, secretário extraordinário da Reforma Tributária de Haddad, que enfrentou forte contestação do ex-secretário de Receita do governo Fernando Henrique Cardoso Everardo Maciel, muito respeitado como tributarista. No Congresso, o deputado Luís Carlos Hauly (Podemos-PL), batalhou pela reforma por sete mandatos e participou de todos os debates sobre o tema, com a experiência de ex-prefeito e ex-secretário estadual de Fazenda no Paraná.

O novo sistema tributário transforma cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) no Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) vai substituir os tributos estadual e municipal e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) ficará em lugar dos tributos federais. O texto estipula a alíquota padrão a ser paga na maioria dos produtos. Haverá uma alíquota reduzida, de 30%, 60% ou 70% para produtos ou serviços considerados exceção nos debates da Câmara. A PEC criou, ainda, o Imposto Seletivo (IS), para sobretaxar produtos que façam mal à saúde.

Elio Gaspari - 180 escrituras no Morro do Alemão

O Globo

Há duas semanas, como parte do Programa Solo Seguro, a Corregedoria Nacional de Justiça entregou 180 títulos de propriedade a moradores do Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro. (Naquele cenário, em 2011, foi instalado o espetáculo do teleférico que custou R$ 210 milhões. Ficou sete anos parado e seria reaberto no início deste mês. Tudo bem, o que começa como presepada, como presepada se encrenca.)

A regularização dos lotes onde vivem 180 famílias do Alemão custou três meses de trabalho a 17 pessoas: duas da Corregedoria, cerca de 12 da Prefeitura do Rio e três do cartório de registro de imóveis. A impressão das escrituras deve ter saído por uns R$ 2 mil. Só.

As duas iniciativas mostram a futilidade das obras espetaculares que beneficiam primeiro a turma do andar de cima, e a utilidade de ações onde o que se precisa é apenas interesse pelo andar de baixo, mais algum trabalho.

O economista peruano Hernando de Soto mostrou há décadas que, no Terceiro Mundo, milhões de famílias vivem em modestas residências, sobre terrenos desprovidos de documentação. Sem escrituras, sofrem com milicianos, não têm acesso a serviços públicos regulares e têm dificuldade para obter crédito. Com escrituras, ganham uma espécie de cidadania financeira.

Dorrit Harazim – Brincadeirinha

O Globo

Trump deseja vingança contra seus opositores políticos, contra o cerco jurídico que se estreita

Sem querer estragar o Natal de ninguém, é bom ficar atento desde já: 2024 será o ano de Donald Trump. Seja como reeleito para a Casa Branca, seja como condenado num dos quatro processos criminais a que responde, ou ainda como figura que a toda hora ameaça atear fogo às vestes para dominar o noticiário. Neste último quesito, ele é imbatível. Em recente entrevista à emissora de maior audiência no país, declarou que atuará de forma ditatorial se reeleito — mas somente no primeiro dia de governo. Boa parte da grande imprensa deu-lhe o que ele queria: a manchete, seguida de incredulidade ou pouco-caso. David Brooks, o colunista conservador do New York Times, resumiu essa postura ao escrever que, desta vez , não levou as palavras de Trump a sério, pois eram mera brincadeira com seus seguidores. A claque, de fato, adorou.

Hélio Schwartsman - A imaginação no poder

Folha de S. Paulo

Livro sustenta que são as ideias que movem o mundo e se propõe a fazer uma história dessas ideias

São as ideias que movem o mundo. Essa é a tese central de Felipe Fernández-Armesto em "Out of Our Minds", livro em que ele se propõe a fazer uma história dessas ideias. O resultado é bastante interessante, mas, antes de entrar nos meandros, convém enfrentar algumas preliminares.

"Out of Our Minds" é mais um exemplar de "big history", a tentativa de explicar ou pelo menos organizar grandes nacos da história recorrendo a alguns poucos princípios ordenadores, quase sempre de base multidisciplinar. Se você pensou em "Armas, Germes e Aço", de Jared Diamond, é isso mesmo. O pessoal das humanidades pode pelo menos se regozijar com o fato de que Fernández-Armesto não vai buscar as explicações últimas em forças físicas como as da geografia, mas no que há de mais tipicamente humano, que é imaginar coisas, isto é, criar representações mentais, e tentar colocá-las em prática.

Muniz Sodré* - A tribuna sem sentido

Folha de S. Paulo

Sem debates relevantes, decisões são tomadas nos bastidores por líderes de bancadas

Dias atrás, quando o Congresso agia contra os povos originários, impôs-se à memória um evento expressivo de meados dos anos 80. Mário Juruna, primeiro indígena eleito deputado federal, num recesso na Câmara, levou a visitá-la um grupo de xavantes, com suas flechas e bordunas. No recinto vazio exceto por alguns curiosos, o parlamentar e militante tomou a tribuna e discursou em xavante. Uma incógnita o que disse, mas a pequena plateia vibrou, agitando maracás.

Acontecimento sugestivo, pois soava como simbólica a ocupação daquele espaço por uma representação inédita de povo e língua originários. Afinal, na época, a ditadura militar estava matando um terço dos indígenas do Amapá. Pouco importava o dito, o gesto coletivo excedia qualquer restituição semântica de palavras, como se nele mesmo, sem um significado imediato disponível, o observador presenciasse a tomada de posse ritualística do Legislativo pelos filhos espirituais da terra. Juruna fazia todo o sentido.

Bruno Boghossian - Fascistas em todo lugar

Folha de S. Paulo

O presidente ainda procura uma mensagem para 'quem não votou no Lula'

O governo lançou uma campanha com o slogan "O Brasil é um só povo". Um dos vídeos fala em "paz e reconstrução de laços". O ministro Paulo Pimenta apontou que o país continua marcado pela polarização e disse que é preciso dialogar com "quem não votou no Lula".

O presidente já declarou que alguma polarização pode ser saudável. Ela ajuda a diferenciar projetos, energizar militantes e nutrir a rejeição a opositores. Quem está no poder, porém, prefere reduzir essa tensão para ampliar o alcance de suas ações.

Dias depois da estreia da campanha, o presidente tirou as medidas desse abismo. Lula reclamou de uma mulher que interpelou Dilma Rousseff num avião para ironizar o fato de a ex-presidente viajar na primeira classe. O petista se referiu à passageira como "uma fascista" e acrescentou que eles "estão em todo lugar".

Celso Rocha de Barros - Primeiro ano de Lula foi bom

Folha de S. Paulo

Brasil manteve direitos e ganhou dinheiro por ter derrotado golpe bolsonarista

O primeiro ano do governo Lula superou todas as expectativas razoáveis e pelo menos empatou com alguns chutes otimistas.

O crescimento deve ser quase quatro vezes (3%) as expectativas do mercado no início do ano (0,8%). O desemprego é o mais baixo desde o começo de 2015. Em se confirmando as previsões do relatório Focus, a inflação deve ficar dentro da meta pela primeira vez desde 2020. O salário-mínimo teve seu primeiro aumento real em anos.

Fatores externos certamente ajudaram o sucesso econômico. Mas Fernando Haddad construiu e implementou com competência uma agenda econômica de frente ampla.

A aprovação da reforma tributária é um dos grandes eventos políticos no Brasil neste século. Haddad ainda emplacou o arcabouço fiscal, a tributação de fundos exclusivos e offshores, e segue na briga pela correção das ineficiências e iniquidades do Estado brasileiro.

Vinicius Torres Freire – Natal de notícias econômicas melhores

Folha de S. Paulo

Juro menor nos EUA, inflação contida, exportação recorde, reformas aprovadas, um alívio

O fim do ano deu notícias animadoras para a economia e é ocasião de lembrar algumas outras, que se confirmaram ao longo deste 2023. Dão alguma esperança de que o PIB de 2024 não seja tão mais fraco, se não fizermos besteira.

Não quer dizer que o país esteja se virando do avesso, que a economia passe a crescer bem mais rápido e de modo duradouro —quanto a isso, o desânimo ainda é grande, por causa de doenças crônicas. Mas as melhoras podem nos ajudar a enfim sair do grande trauma da década passada, da Grande Recessão de 2014-2016 e das trevas de 2019-2022. Quais as notícias, não necessariamente pela ordem de importância?

Primeiro, a conversa sobre taxas de juros nos Estados Unidos mudou rapidamente e para melhor, depois de idas e vindas nervosas durante este ano todo, com implicações até agora ruins para o Brasil. A taxa básica de juros americana pode começar a cair mesmo em março.

Taxas menores por lá tornam possíveis taxas menores aqui —não é determinante, não é uma relação direta e depende também da política econômica brasileira e do restante da conjuntura mundial, da China em particular. Mas, em tese, é boa notícia para juros e, talvez, câmbio e inflação no Brasil.

Eliane Cantanhêde - Lula, Lira e fez-se a luz na pauta econômica

O Estado de S. Paulo

Reforma tributária e retirada das armas do ‘imposto do pecado’: vitória e derrota do Brasil

Foi numa confraternização a dias do Natal, mas não exatamente natalina, que o presidente Lula abriu os cofres do governo, e o presidente da Câmara, Arthur Lira, destravou a pauta econômica aos 45 do segundo tempo, antes do início do recesso parlamentar. Enquanto os dois fechavam a contabilidade política, os relatores e líderes no Congresso ajustavam o texto da reforma tributária, finalmente aprovada após décadas de debates vazios.

Venceram Lula, Lira, Rodrigo Pacheco e os dois relatores, Eduardo Braga, no Senado, e Aguinaldo Ribeiro, na Câmara, mas os mais aliviados eram o mentor intelectual da reforma, Bernard Appy, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que passou poucas e boas, mas encerra o ano com a vitória da reforma tributária e da joia da coroa do seu plano de arrecadação: a revisão dos incentivos de empresas via ICMS, com previsão de receita de R$ 35 bilhões. O saldo é positivo no Congresso, como na própria economia.

Poesia | Vinícius de Morais - O Haver

 

Morre Carlos Lyra, compositor histórico da bossa nova, aos 90 anos

Por Ruy Castro /Folha de S. Paulo

A morte do músico, que estava internado desde quinta no Rio de Janeiro por causa de uma febre, foi confirmada pela mulher

Morreu Carlos Lyra, um dos precursores da bossa nova, aos 90 anos neste sábado. Ele havia sido internado na quinta-feira, dia 14, com febre e teve uma infecção, segundo sua mulher. Lyra será velado no Crematório Memorial do Carmo, em uma cerimônia restrita a familiares e amigos.

De 1958 a 1965, Carlos Lyra, em parceria com Vinicius de Moraes, Ronaldo Bôscoli e poucos mais, produziu maravilhas como "Primavera", "Minha Namorada", "Marcha da Quarta-Feira de Cinzas", "Coisa Mais Linda", "Canção que Morre no Ar", "Lobo Bobo", "Saudade Fez um Samba", "Se É Tarde me Perdoa", "Feio Não É Bonito", "Samba do Carioca", "Samba da Legalidade", "Aruanda", "Quem Quiser Encontrar o Amor", "Influência do Jazz", "Sabe Você", "Você e Eu", "Maria Ninguém", "Maria Moita" e muitas mais —gravadas por João Gilberto, Nara Leão, Sylvia Telles, Astrud Gilberto, Elis Regina, Billy Eckstine, Brigitte Bardot e incontáveis grupos instrumentais.

Dele, disse Tom Jobim que "Carlinhos é o maior melodista da bossa nova".

Se Jobim falou, estava falado —embora, para o resto do mundo, o maior melodista da bossa nova fosse o próprio Jobim, com Lyra pagando um honroso placê. Seja como for, esse corpo de canções, produzido em tão pouco tempo, foi suficiente para sustentar Carlos Lyra pelos 50 anos seguintes —período em que, por vários motivos, sua produção não se comparou à dos tempos heroicos da bossa nova.

O que fez com que seu mais antigo parceiro —e cordial desafeto— Ronaldo Bôscoli o definisse, dizendo "Carlinhos Lyra é o contrário do vinho". "Quanto mais moço, melhor."

Bôscoli sabia o que dizia. Os dois juntos, e mais uma plêiade de garotos por volta dos 20 anos, compunham uma turma que, naquela época, passava as noites no apartamento da quase adolescente Nara Leão, na avenida Atlântica, em Copacabana, para tocar violão, trocar acordes, cantar suas composições, rir muito e filar o uísque do dono da casa, pai de Leão.

Hugo Sukman - Nome revolucionário na bossa nova e no samba

O Globo

Sem deixar de fazer canções líricas como “Minha namorada” e “Primavera”, compôs também o Hino da UNE a fez a comédia musical “Pobre menina rica”, romantismo e política misturados para descrever um país que precisava ser socialmente transformado

Carlos Lyra já teria seu nome na história simplesmente por ajudar a definir – ao lado de Tom Jobim e, como os dois, ninguém mais – o que seria Bossa Nova, sobretudo em sambas curtos, diretos, modernos e buliçosos como “Você e eu”, “Lobo bobo” e “Saudade fez um samba”, e canções líricas e não menos modernas como “Coisa mais linda” e “Se é tarde me perdoa”, todas escolhidas para cantar por João Gilberto, arranjadas por Tom, letradas por Vinicius de Moraes ou Ronaldo Bôscoli. Bossa Nova estabelecida, ponto. Primeira revolução.

Mas tinha um país no meio do caminho. E um país nada bossa nova, leve e amoroso. Por isso, deixou por um tempo as manhãs da Ipanema onde vivia e compunha, e as noites da Copacabana onde tocava e ouvia música (sobretudo Johnny Alf, na boate do Plaza, sua maior influência), e tornou-se diretor musical do Teatro de Arena em São Paulo e engajou-se no Partido Comunista Brasileiro (“lá ninguém falava de Marx e Lênin, só de Brasil, cultura brasileira”).

Música | Nara Leão - Samba da Legalidade (Carlos Lyra e Zé Kétti)