sexta-feira, 28 de junho de 2019

*Fernando Gabeira: Seis meses à direita

- O Estado de S. Paulo

A linha-mestra do comportamento político de Bolsonaro é flertar com a morte

Neste primeiro período de governo, Jair Bolsonaro afirmou que a cadeira do presidente era sua kryptonita, o metal que enfraquece o super-homem nas histórias em quadrinho. Mais tarde, ele disse que estavam querendo transformá-lo na rainha da Inglaterra. Ambas as afirmações convergem para sua ansiedade sobre o poder escapando entre os dedos. E remetem às primeiras discussões após sua vitória eleitoral.

Naquele momento, a esperança era de que os contrapesos democráticos contivessem Bolsonaro. Da mesma forma que se esperava, guardadas as proporções, que isso acontecesse com Trump nos Estados Unidos.

Na verdade, Bolsonaro foi contido pelo menos sete vezes pelo Congresso e pelo Supremo Tribunal Federal (STF). É verdade que muitas de suas propostas foram lançadas para mostrar ao eleitorado que cumpria as promessas de campanha. Mas foram propostas que desprezaram as necessárias negociações. Parece que Bolsonaro não se importa em perder ou conseguir pelo menos alguma eficácia. Ele quer mostrar que suas ideias morrem no Congresso ou são rejeitadas pelo Supremo.

São coisas tão elementares que qualquer assessoria jurídica desaconselharia. Por exemplo: tentar com uma nova medida provisória passar a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura. Isso havia sido negado e ele reeditou a medida, algo que não pode ser feito na mesma legislatura.

Na verdade, não o estão tornando uma rainha da Inglaterra. Uma combinação de incompetência e arrogância o conduz a sucessivas derrotas.

Ultimamente, tenho observado uma linha-mestra no comportamento político de Bolsonaro. Ele flerta com a morte, como faziam, à sua maneira, os governos de extrema direita do passado. Seus projetos caminham nesta direção: liberação das armas, flexibilização das regras do trânsito, legalização de potentes agrotóxicos que devem dizimar nossos insetos e abelhas, sem falar nas consequências disso para a saúde humana.

Eliane Cantanhêde: Show de besteiras?

- O Estado de S. Paulo

Merkel, Ibope, cocaína, prisões, empregos, ministros balançam. E o da Educação?

Motivos não faltam para o presidente Jair Bolsonaro chegar ao Japão cansado, pela longa viagem, e irritado, pela enxurrada de confusões e o “show de besteiras” que envolvem seu governo, dia sim, outro também. Ele e sua comitiva tentam jogar a culpa na imprensa, mas será verdade?

De véspera, a chanceler Angela Merkel, uma das grandes líderes mundiais e presença forte no G-20, criticou a política do governo brasileiro para Meio Ambiente – que classificou de “dramática”. Bravo, Bolsonaro reagiu dizendo que a Alemanha tem muito a aprender com o Brasil e ele não aceita ser advertido.

Merkel – longe de ser petista e “esquerdopata”, frise-se não falou sozinha e não falou por falar. O mundo desenvolvido vê no governo Bolsonaro um retrocesso numa área que não é apenas fundamental para a sobrevivência do planeta como era também um dos grandes trunfos brasileiros em foros internacionais. Era, não é mais.

Pró-Trump, antiglobalizante e visceralmente ideológico, o governo Bolsonaro vê esquerdistas ameaçadores por toda parte e age para desmontar ONGs, conselhos, reservas ambientais e terras indígenas, enquanto tenta reinventar o Ibama e o ICMBio. O primeiro efeito é o espanto dos governantes e das sociedades mundo afora. O segundo pode ser a retaliação comercial e nas relações bilaterais.

E o sargento da Aeronáutica que usou avião presidencial, com brasão da República, para traficar 39kg de cocaína para a Europa? “Uma falta de sorte”, resumiu o chefe do GSI, general Augusto Heleno. Claro que Bolsonaro não tem culpa, mas imagine se isso fosse em qualquer outro governo, no Brasil, Alemanha, EUA ou China? Um escândalo internacional.

Bolsonaro no Japão, assessor e aliados do ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antonio, presos no Brasil por desvio de dinheiro do Fundo Eleitoral pelo PSL de Minas. Não se trata, portanto, de incompetência, discordância ou questão ideológica, como na demissão de outros ministros. Por que Bolsonaro insiste em mantê-lo no cargo?

Míriam Leitão: O general e os jornalistas

- O Globo

Santos Cruz exaltou o papel da imprensa, disse que os direitos humanos são para todos e exaltou a democracia

O general chegou na reunião de jornalistas carregando a sua mochila nas costas, como todos os participantes do seminário. A diferença ficou na roupa: ele foi de terno e gravata, vermelha por sinal. Carlos Alberto Santos Cruz, que por cinco meses foi ministro e por cinco anos comandou tropas da ONU, foi ao Congresso da Abraji e deu recados relevantes: defendeu a imprensa profissional, disse que direitos humanos não são apenas para alguns, que o governo deve combater desigualdades, que democracia é um choque de tensões e o Legislativo não está tirando poderes do presidente.

Antes de subir ao palco principal, o ex-ministro, em bate-papo com repórteres pelo pátio, disse o que depois repetiria na entrevista a Daniel Bramatti, presidente da Abraji, e à jornalista Julia Duailibi, no Congresso Internacional da entidade. Que a imprensa profissional é fundamental, e há uma “massa de irresponsáveis” espalhando notícias falsas e “congestionando o mundo da informação”. O “jornalismo investigativo tem que investigar ao quadrado”, exatamente para ajudar a separar as informações reais do que circula sem critério e sem veracidade pelas redes de comunicação.

Quem queria ouvir novas críticas ao presidente Bolsonaro se frustrou. Santos Cruz mostrou, de forma indireta, que discorda do presidente, mas disse que Bolsonaro tem todo o direito de demitir quem ele quiser e que não se sentiu afetado por isso. Repetiu que não soube o motivo da demissão.

Quando Daniel Bramatti perguntou o que ele consideraria êxito do governo, ao fim do mandato, respondeu que era a redução das desigualdades. Julia Duailibi quis saber: “mas isso é agenda do atual governo?”. Ele disse que deveria ser, porque a desigualdade no Brasil é “imoral”, inclusive entre os salários pagos no setor público.

Merval Pereira: O Rio em disputa

- O Globo

Sem mudar de posição política, Freixo parece querer ampliar seu eleitorado, atingindo um público que preferiu Crivella

Apesar da trégua entre o governador Wilson Witzel e o prefeito Marcelo Crivella, é difícil que os dois marchem juntos na campanha para a prefeitura em 2020. O desejo do prefeito de se reeleger esbarra na vontade do governador de lançar candidato próprio.

Além do mais, o prefeito, com a administração da cidade sendo criticada pela maioria da população, pode ter um concorrente, que está sendo incentivado justamente porque Crivella parece ter poucas chances de ser reeleger.

Trata-se do deputado federal Otoni de Paula, do PSC, mesmo partido do governador Wilson Witzel, e que já está em campanha. Ele é pastor evangélico e está em seu primeiro mandato federal. Anteriormente, era vereador no Rio.

A grande incógnita é o ex-prefeito Eduardo Paes, derrotado por Witzel para o governo do Rio. Ele aparece bem cotado nas pesquisas, mas, além da derrota em si, tem dificuldades para voltar à política devido à pressão da família e ao emprego de executivo de uma empresa chinesa de carros elétricos, BYD Motors, responsável pela sua atuação na América Latina.

Ele já havia se afastado do cargo para disputar o governo do Rio, e retornou depois da eleição. Não se sabe se teria condições de sair novamente. O problema todo é que enquanto a centro direita tende a se dividir, como aconteceu na última eleição para prefeito, a esquerda do Rio está se unindo em torno do deputado federal Marcelo Freixo, do PSOL, considerado o favorito na disputa.

Ele chegou ao segundo turno na disputa contra Marcelo Crivella para a prefeitura do Rio, e foi o segundo deputado federal mais votado no Rio nas últimas eleições. Sua atividade parlamentar em Brasília difere muito da do deputado estadual, considerado radical por parte considerável do eleitorado do Rio.

Marcelo Freixo recentemente defendeu o presidente Bolsonaro no caso dos 39 quilos de cocaína encontrados em avião da comitiva presidencial, afirmando que seria leviandade ligar o presidente ao fato.

Sem mudar de posição política, Freixo parece querer ampliar seu eleitorado no Rio, atingindo um público que preferiu votar em Crivella a vê-lo prefeito do Rio. Aconteceu com ele o mesmo fenômeno que atingiu o PT na campanha presidencial.

Crivella venceu por 60% a 40%, a mesma porcentagem com que Bolsonaro derrotou Haddad dois anos depois. Uma eventual vitória de Freixo no Rio dará ao PSOL um trampolim nacional que pode transformá-lo no partido que o PT foi no seu início.

O PSOL, embora tenha movimentos recentes de se reaproximar do PT, nasceu de uma dissidência petista diante da revelação do escândalo do mensalão. A próxima eleição para prefeito do Rio será uma grande oportunidade para o PSOL tentar se aproximar de uma classe média revoltada com a gestão de Crivella.

César Felício: Sem disfarces

- Valor Econômico

Bolsonaro como presidente repete o candidato

Jair Bolsonaro conclui o primeiro semestre de seu governo produzindo um paradoxo: no Palácio do Planalto, o presidente mostrou nestes quase 180 dias de mando que não dissimula. O lobo solitário mais desenvolto nos canais de entretenimento do que no plenário da Câmara, durante os anos zero e nesta década; o parlamentar de baixo clero com obscuras ligações com elementos do porão do regime militar, nos anos 80 e 90, não era um personagem, era real. O presidente não é um farsante. Ele é o que é.

Com Bolsonaro o presidencialismo de coalizão é impossível. O presidente não faz acordos. Não desenvolveu uma narrativa para ser eleito e se transformou no cargo, como tantos exemplos no Brasil e no exterior, Lula e Menem para ficar em dois casos continentais. É um presidente sem pendor para a administração, que delega poder a seus ministros, mas não admite ser tutelado. Entra em erupções movidas pela inevitável rede de intrigas de Brasília e pela rede social turbinada pela extrema direita. Oscila entre ser a rainha da Inglaterra e a rainha de Copas.

O saldo de se ter um presidente que não gosta de fazer acordos e não gosta de governar ainda é incerto. O economista Armando Castelar, coordenador de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre/FGV-RJ) faz uma análise cautelosa. "Havia uma impressão uníssona dos cientistas políticos e no Congresso que o presidencialismo de coalizão é o caminho natural e que tudo aquilo que Bolsonaro disse na campanha era mero discurso", comentou. "Foi uma surpresa quando ele não pactuou. Com certa habilidade, ele jogou a responsabilidade pela reforma da Previdência para o Congresso. O problema é que há um custo em relação ao ritmo que se queria. A tramitação pode demorar", disse.

O comportamento de Bolsonaro em relação à iniciativa mais importante de seu governo é emblemático do estilo. O presidente está distante, muito distante, em uma distância que nenhum presidente jamais esteve, do debate sobre a reforma da Previdência.

*Fernando Abrucio: Dois slogans emblemáticos de Bolsonaro

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

O presidente namora com um 'chavismo pós-moderno', que une a aglomeração das ruas com as manada virtuais

Os governantes modernos adotam slogans como seu principal símbolo junto aos cidadãos. O mais conhecido na história brasileira foi o de JK: 50 anos em 5. Com esse lema sintético, Juscelino soube expressar claramente seu bem-sucedido projeto de desenvolvimento. Personagem tipicamente midiático, como foram Collor e Lula, Bolsonaro também propôs dois que podem ajudar o entender o perfil de seu mandato. Um é o oficial do governo: Brasil acima de tudo, Deus acima de todos. Mas há outro que é emblemático dessa nova era: Mais Brasil, menos Brasília.

Ambos os slogans expressam a visão que Bolsonaro tem do poder. O primeiro é o mais óbvio: o presidente quer simbolizar tanto uma postura patriótica como uma comunhão da política com a religião. O segundo é uma crítica, ao mesmo tempo, à centralização política e ao mundo oficial da política brasiliense - em outras palavras, à velha política, nos termos bolsonaristas.

É possível ler o significado desses lemas sob três óticas. A primeira é a da relação com o eleitorado. A segunda diz respeito ao relacionamento com o sistema político. E a terceira, não menos importante, vincula-se ao modelo de governança das políticas públicas.

O slogan Brasil acima de tudo, Deus acima de todos captou um sentimento conservador forte na população brasileira, que tem raízes antigas, mas que ganhou força com a profunda crise dos últimos anos. Em particular, essa visão de mundo prosperou no ambiente de combate à corrupção e de antipetismo.

Num primeiro plano, o patriotismo foi colocado como antípoda da era petista, com o "verde e amarelo" substituindo o "vermelho comunista". Mas o sentido patriótico vai além: ele é peça-chave frente ao descrédito da classe política frente à população. Nessa linha, é preciso ter um líder que pense no país, e não nos interesses menores e comezinhos predominantes na velha política.

*José de Souza Martins: Feminicídio na intimidade

- Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Entre 2012 e 2017, a taxa de homicídio na residência, por 100 mil mulheres, aumentou 17,5%. A família abrigou a violência

Sou de uma família em que minha mãe, viúva e casada pela segunda vez, em várias ocasiões sofreu tentativa de assassinato por parte de meu padrasto, sem motivo, repentinamente. Ela se tornaria evangélica, e isso deve ter aprofundado o abismo entre os dois. Ele tentou ser evangélico e desistiu. Católico nominal, foi duas vezes à igreja, no batismo e no casamento. Da vida regular e ordenada da roça, onde nascera e crescera, migrara para as incertezas da cidade e da fábrica, que nunca compreendeu.

Em mais de uma ocasião tentou matar os enteados também. A última tentativa foi contra mim. Eu já era adulto, aluno da Universidade de São Paulo. Foi quando, então, saí de casa e fui cuidar de minha vida. Por essa época, minha mãe teve o bom senso de se separar do marido. Ele acabou voltando para a roça e, com o tempo, foi morar com outra mulher, que, anos depois, o mataria a pauladas. Dois casamentos costurados pela violência, sem causa aparente.

Era uma boa pessoa. Trabalhador, não bebia, não fumava, que esse era o estereótipo das pessoas honradas. Analfabeto, caipira de quatro costados, com fortes traços mamelucos. Tampouco se adaptou à fábrica. Na cultura caipira, era um erudito. Tudo que sei sobre esse assunto, e sei relativamente muito, aprendi com ele, num período em que a família viveu na roça, quando eu estava na escola primária.

A experiência negativa em casa deu-me a experiência da observação participante, como se diz nas ciências sociais. Vivi e conheci o invisível das problemáticas relações de família numa sociedade em transição, que separa e confronta em vez de unir, a sociedade do descompasso e da ira.

Enquanto pesquisador e estudioso dos temas sociais, sinto uma grande angústia quando me deparo com estatísticas sobre violência contra mulheres. Seus dados documentam um fato, mas não revelam o essencial, os mecanismos sutis e imperceptíveis no cotidiano. Os que corroem os relacionamentos e disseminam a violência entre os que violentos não são ou não deveriam ser.

Hélio Schwartsman: Partos ideológicos

- Folha de S. Paulo

No plano individual, optar pela cesariana está longe de ser uma roleta-russa

A cesariana sem indicação médica é, afinal, um direito da mulher ou um crime contra a saúde pública?

Ideologia é um troço esquisito. Ela está sempre em busca de novos temas, que levem as pessoas a posicionar-se mais em razão de lealdades de grupo do que de uma análise objetiva do problema.

Um caso bem documentado é o do aquecimento global. Até o fim dos anos 90, essa não era uma questão ideológica. Pesquisa Gallup nos EUA mostra que, em 1998, 47% dos eleitores republicanos e 46% dos democratas concordavam com a afirmação de que os efeitos do aquecimento global já se faziam sentir. Em 2018, os números eram 34% para os republicanos e 82% para os democratas.

Algo parecido está ocorrendo com outros temas científicos, como a vacinação e as cesarianas. Seria tentador dizer que essas são questões técnicas que deveriam ser respondidas tecnicamente, mas, como sabemos desde Hume, não dá para extrair um “ought” (deve ser) de um “is” (é). Tomadas de decisão envolvem sempre um juízo de valor, que vai além das descrições oferecidas pela ciência.

Rubens Valente: Esqueceram-se do casal Bolsonaro

- Folha de S. Paulo

Presidente admitiu ter recebido R$ 40 mil da conta de ex-assessor, mas é poupado na apuração

O escritor Ivan Lessa (1935-2012) dizia —ou pelo menos dizem que ele dizia— que, a cada 15 anos, o país esquece o que aconteceu nos 15 anteriores. Em tempos de “Justiça seletiva”, uma expressão que está na moda, cabe atualizar a conta para um ou dois anos.

Vejamos o caso de Fabrício Queiroz. O ex-assessor amigo da família Bolsonaro tinha uma conta bancária turbinada com parte dos salários de assessores da Assembleia Legislativa do Rio. Dinheiro público, portanto. Nessa mesma conta foi compensado um cheque de R$ 24 mil em benefício da primeira-dama, Michelle Bolsonaro.

Após um sintomático delay de 38 horas, o presidente saiu em defesa da mulher. Disse que Queiroz devolvera dinheiro de um empréstimo pessoal seu e que o valor total na verdade era maior, R$ 40 mil, quitado em prestações.

Desde então sabemos que a conta alimentada com dinheiro público também alimentou o casal Bolsonaro. Isso posto, o que fez o sistema judicial encarregado de apurar o caso Queiroz? Quebrou o sigilo da primeira-dama ou do presidente? Não. Tentou ouvi-los em depoimento? Não. Ao menos instou o presidente a esclarecer alguma coisa por escrito? Não.

Reinaldo Azevedo: É a Constituição, estúpido!

- Folha de S. Paulo

Mais que economia ou política, a divisa neste momento é a ordem legal

Ou o país se reencontra com o Estado de Direito e com o devido processo legal ou... Bem, eu poderia concluir o raciocínio com o que seria mais óbvio em construções assim: “... ou sobrevém o caos”. Mas vocês podem substituir a desordem pelo atraso permanente. Para os amantes da literatura, lá vai o que já é um clichê: o desastre não precisa ser acompanhado de um estrondo. Pode ser um suspiro.

Este artigo tem como objeto a ordem legal e a responsabilidade que pesa sobre os ombros do Supremo, que terá de ter a coragem de enfrentar o alarido. Mas é preciso fazer uma digressão sobre o que se dá em outros pontos da praça.

Há, como não cansam de advertir os colunistas deste jornal, e das mais diversas tendências, imensos desafios pela frente, a pedir a ação de homens e mulheres que, vistos pelas lentes do futuro, com o devido distanciamento, terão se comportado ou como um misto de heróis e mártires —dispostos, pois, a sacrificar também a sua popularidade se necessário —ou como ogros bisonhos do atraso, mas sob o aplauso de seus radicais. Os indícios não são bons.

Um emblema? Em seis meses de governo, foram editados sete decretos sobre armas, mas não se conseguiu ainda estabelecer um consenso mínimo para incluir os estados na reforma da Previdência. Isso reflete o que o demiurgo saído das urnas entende como prioridade do país. No exterior, damos um recado ressentido aos ricos, certos de que eles querem sequestrar as nossas matas e as nossas solidões: “Vão procurar a sua turma”.

Se vivo, Nelson Rodrigues substituiria o diagnóstico: do “complexo de vira-lata” para o “complexo de pitbull”. Bastou meio ano para que um ativo construído ao longo das três últimas décadas —sermos uma das grandes economias, mas com a maior cobertura vegetal original do planeta— se transformasse em fonte de conflito. E conflito a troco de quê? Ora, de nada! Pelo gosto de arreganhar os dentes e de rosnar.

Ricardo Noblat: O preço de um desgoverno

- Blog do Noblat / Veja

Em queda a popularidade de Bolsonaro

Há uma semana, o general Carlos Alberto dos Santos Cruz, ex-ministro da Secretaria de Governo da presidência da República, bateu duro na administração do seu ex-amigo Jair Bolsonaro:

– Se você fizer uma análise das bobagens que se têm vivido, é um negócio impressionante. É um show de besteiras. Isso tira o foco daquilo que é importante e que acaba não aparecendo porque todo dia tem uma bobagem ou outra para distrair a população.

A pesquisa Ibope há pouco divulgada não aponta as besteiras do governo, mas os resultados delas, sim. Aumentou a má avaliação do governo e caiu a boa. Aumentou a desaprovação à maneira como Bolsonaro governa. Aumentou a falta de confiança nele.

O presidente imaginou que ganharia tempo (para quê?) tentando distrair os brasileiros com factoides e polêmicas estéreis. Quebrou a cara. Dos nove setores da administração pública pesquisados, apenas em um (segurança) o governo obteve nota positiva.

56% dos entrevistados desaprovam o desempenho na área da Saúde; 55%, na criação de empregos; 54%, na Educação; e 51% no combate à pobreza. Ou seja: em tudo o que tem a ver diretamente com a vida das pessoas, o governo Bolsonaro vai mal, obrigado.

Nada de estranho ou surpreendente. Este é um governo sem rumo, se é que algum dia terá rumo. Um governo onde o presidente e seus filhos se recusam a compartilhar o poder com os partidos como se pudessem se sustentar sozinhos.

É também até aqui um governo de uma nota só – a reforma da Previdência, que representaria uma economia de 1,2 trilhão de reais em 10 anos e que acabou reduzida a 800 bilhões. O Congresso dará ao governo o suficiente para que ele chegue ao fim.

O segundo e o terceiro escalões do governo mal foram preenchidos. Parte do primeiro foi ocupada por funcionários medíocres. À falta de um projeto para o país, Bolsonaro se oferece como o Messias que veio para quebrar o sistema, não para construir.

O que esperar disso tudo? Ora, o que as pesquisas de opinião começam a mostrar.

Uma droga de viagem

Desenha-se mais um fiasco internacional de Bolsonaro

Dificilmente uma coisa que começa errada termina certa. A receita universal se aplica também a viagens – e com mais razão, a mal iniciada viagem do presidente Jair Bolsonaro ao Japão para o encontro anual da cúpula das 20 maiores economias do planeta. Ela não promete ser boa, antes pelo contrário.

A dar-se crédito ao que disse o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional da presidência da República, Bolsonaro pretende aproveitar a viagem para mudar a própria imagem no exterior que é muito ruim. Quer dizer: pretendia. Porque ainda não deverá ser desta vez.

Dora Kramer: Fantasia, nada mais

- Revista Veja

Não é parlamentarismo branco, é autonomia do Congresso

Não só a mentira, mas também uma invencionice repetida mil vezes acaba tornando-se verdade para ouvidos dispostos a aceitar a versão em lugar do fato. É o caso do “parlamentarismo branco”, a respeito do qual tanto se fala mas nada se prova, entre outros motivos porque tal instituto não existe em lugar algum, muito menos onde o regime seja presidencialista.

O tema voltou à cena com a ideia do presidente Jair Bolsonaro de que o Congresso pretende relegá-lo à condição de “rainha da Inglaterra”. No instante seguinte, as análises sobre a declaração já estabeleciam conexão com o exótico sistema de governo pelo qual o Poder Legislativo teria instituído um parlamentarismo à brasileira, solapando atribuições do Executivo.

De fato, o presidente referia-se a isso, mas seus conhecimentos institucionais não permitem que suas leituras da realidade ultrapassem o limite do senso comum. Na verdade, Bolsonaro usou a metáfora da rainha da Inglaterra para externar sua contrariedade por não conseguir exercer o poder absoluto. Pensou que a Presidência era uma coisa, mas na prática está vendo que é outra, que de resto não lhe agrada.

Luiz Carlos Azedo: Desemprego abala o prestígio de Bolsonaro

Nas entrelinhas / Correio Braziliense

“A narrativa de Bolsonaro perde eficácia junto aos eleitores que o apoiaram no segundo turno, ainda mais com a radicalização do discurso para agradar seus redutos eleitorais tradicionais”

Pesquisa divulgada pelo Ibope, ontem, mostra o presidente Jair Bolsonaro com 32% de bom e ótimo, 32% de regular e 32% de ruim e péssimo; 3% de não sabem ou não responderam. Encomendado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), o levantamento foi realizado entre 20 e 23 de junho e ouviu 2 mil pessoas em 126 municípios. Em relação à pesquisa de abril, houve queda de 3% na avaliação positiva, portanto, fora da margem de erro de 2%. A avaliação regular era de 31%, variou dentro da margem de erro, mas o ruim ou o péssimo passou de 27% para 32%, ou seja, houve crescimento da avaliação negativa de 5%.

A notícia chegou à comitiva presidencial no Japão como uma razão a mais para o azedume de Bolsonaro, que já estava na bronca por causa do sargento da Força Aérea Brasileira (FAB) preso na Espanha após desembarcar do avião de apoio da comitiva presidencial com 39kg de cocaína na mala de mão e do comentário da primeira-ministra alemã Angela Merkel sobre o desmatamento no Brasil, que o presidente brasileiro considerou uma afronta à soberania nacional. Bolsonaro chegou à reunião do G20 na defensiva, como uma espécie de patinho feio do encontro. Realmente, não é um bom momento para o governo brasileiro.

O ministro da Economia, Paulo Guedes, sentiu o golpe da pesquisa do Ibope. O mantra da reforma da Previdência começa a perder efeito junto aos agentes econômicos, na medida em que a Câmara dos Deputados avança na direção de aprovar uma reforma mitigada, que pode chegar a uma economia de R$ 850 bilhões em 10 anos. Frustra-se a intenção do ministro de financiar o seu plano de capitalização com uma economia de R$ 1 trilhão. Ontem, Guedes anunciou que pretende liberar para os bancos privados mais de R$ 100 bilhões em depósitos compulsórios. O objetivo é permitir que as instituições financeiras ampliem o crédito para pessoas e empresas, para ampliar o consumo e aquecer o mercado.

*Monica De Bolle: Tempo do dia, clima da era

- Revista Época

Conceitos e consensos estão sendo postos à prova, e isso não é necessariamente ruim.

Atravessamos época muito esquisita. Os movimentos ultraconservadores e nacionalistas de direita trouxeram questionamentos sobre o que é verdade e o que é mentira, o que é fato e o que é invenção, o que é ciência e o que é crendice, o que é avanço e o que é retrocesso. Em muitos casos — talvez em todos — os questionamentos estão embalados por premissas erradas em um mundo onde o conhecimento, aquele que não se alcança por completo nem mesmo após uma vida inteira de estudos e leituras, está sendo rapidamente trocado pelo arranhão intelectual. Arranhão intelectual é aquela assistida rápida ao vídeo do YouTube, leitura do grupo da família ou aquele passar de olhos por um punhado de caracteres no Twitter. Arranhão intelectual é aquela frase em latim para marcar pose, não posição, é aquele monte de asneiras sobre o cabeçote de meio milímetro do parafuso que não faz a menor falta no argumento estruturado. Arranhão intelectual às vezes é apenas o tempo do dia. O problema é quando ele é confundido com o clima da era.

Para quem teve a oportunidade de se sentir cidadão do mundo nos últimos 20 e poucos anos ao estudar e morar em outros países, convivendo com culturas diversas, era fácil acreditar que o clima daquela era seria insuplantável. Assim como para quem cresceu rodeado de mentores excepcionais era fácil não enxergar discriminação de gênero. Tive professores, mentores, parentes e marido — o último no presente e no singular — realmente fora de série. Foi apenas ao retornar ao Brasil com um filho pequeno, depois de alguns anos no FMI, que senti o peso de ser mulher numa profissão dominada por homens. Mas minha história não interessa. Interessam os fatos que hoje tornam inevitável a constatação de que mais do que o tempo do dia, o clima da era é de enfrentamento de uma realidade ainda brutal e ameaçada pelas inclinações ultraconservadoras que passaram a ocupar grande espaço no Brasil e no mundo.

Rogério Furquim Werneck: Bolsonaro encastelado

- O Globo / O Estado de S. Paulo

Presidência se retrai a círculo cada vez mais fechado de ministros da Casa, tirados de lista curta, de forma espantosa

De início, pareciam notícias alvissareiras. O governo se dera conta de que a reestruturação político-administrativa do Planalto não estava funcionando a contento. Teria de ser repensada.

Foi mencionada até a possibilidade de que viesse a ser restaurado, na Presidência da República, o arranjo que vigorava no governo Temer. Na esteira de dissabores recentes com sucessivos reveses no Congresso, o governo afinal se convencera de que seu esquema de articulação política teria de ser reconcebido.

Foi o que bastou para que os mais otimistas alimentassem a esperança de que, afinal, o Planalto se permitiria entregar

a articulação com o Congresso a um profissional do ramo. Houve até rumores de que a tarefa poderia vir a ser confiada ao talentoso ex-deputado federal Rogério Marinho, atual secretário especial de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia.

Ledo engano. O que o presidente tinha em mente eram alterações de outra ordem. A articulação com o Congresso foi transferida da Casa Civil, de Onyx Lorenzoni, à Secretaria de Governo que, após a destituição do general Santos Cruz, ficou a cargo do general Luiz Eduardo Ramos, um velho amigo dos tempos da Escola Preparatória de Cadetes do Exército que o presidente trouxe do Comando Militar do Sudeste.

Claudia Safatle: Corte de juros não garante crescimento

- Valor Econômico

Selic deve cair por que a inflação está abaixo da meta

O Banco Central indicou que pretende retomar o ciclo de queda da taxa básica de juros, a Selic, estacionada em 6,5% ao ano desde março de 2018. O espaço para corte não é muito grande, apesar da revisão de expansão do Produto Interno Bruto de 2% para 0,8% neste ano.

Das projeções de inflação para 2020 - foco da política monetária a partir de agora - é possível inferir que o Comitê de Política Monetária (Copom) trabalha com uma redução dos juros para 5,75% ao ano. A queda de 0,75 ponto percentual manteria a inflação do ano que vem em 3,9%, praticamente na meta, de 4%, e em 3,6% neste ano, abaixo, portanto, da meta.

O Copom condicionou o afrouxamento da política monetária a avanços concretos na agenda das reformas e de ajustes que possam fortalecer as contas públicas e gerar ganhos de produtividade na economia. O BC espera, sobretudo, a aprovação da reforma da Previdência.

No regime de metas para a inflação o importante é averiguar como uma frustração na aprovação da nova Previdência vai impactar os prêmios de risco e, por consequência, aumentar a inflação no horizonte relevante que é de agora até o fim de 2020.

O BC reconhece que houve uma "interrupção da recuperação da economia" e conta com uma retomada gradual do crescimento.

Vinicius Torres Freire: o estranho caso do emprego na saúde

- Folha de S. Paulo

Mercado formal se arrasta, mas medicina e serviços profissionais vão bem

O emprego formal anda meio de lado desde setembro de 2018, como quase o resto todo da economia brasileira. Os raros brotos verdes murcham desde o começo da primavera do ano passado.

Os números relativos a maio confirmam a quase estagnação, mostram os dados do Caged, divulgados nesta quinta-feira (trata-se dos registros do emprego formal no ministério da Economia).

A situação é diferente apenas no setor de serviços, mais especificamente nos de “serviços médicos, odontológicos e veterinários” e de “administração de imóveis e valores, serviços técnico-profissionais”.

Desde setembro de 2018, o número de empregos formais no país inteiro cresce em média 1% ao ano. Atualmente, isso quer dizer 400 mil empregos a mais com carteira, por ano. Recorde-se que em 2015, 2016 e 2017 foram perdidos 3,1 milhões de empregos. Portanto, ainda estamos perto do fundo do poço e tão cedo não sairemos de lá.

Guedes defende estados na Previdência para que não usem recursos do pré-sal para pagar contas

Presidente do Senado disse que haverá conversas com governadores para negociar ingresso na reforma

- Daniel Carvalho / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse nesta quinta-feira (27) que defende o ingresso de estados e municípios na reforma da Previdência para que eles não usem recursos futuros oriundos do pré-sal para pagar contas.

Em reunião com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e com o líder do governo na Casa, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), Guedes também procurou baixar a temperatura da relação entre Executivo e Legislativo e elogiou a articulação do Congresso para angariar votos a favor da reforma em troca da inclusão das Unidades da Federação no texto do relator.

A apresentação do novo formato da proposta de reforma da Previdência foi adiada para a próxima terça-feira (2) em sessão da comissão especial da Câmara.

Haverá conversas com governadores durante este fim de semana e um encontro oficial está marcado para terça, já que o encontro desta quarta (26) não prosperou.

Governadores e prefeitos querem ser incluídos na reforma, mas não conseguem entregar votos por causa do desgaste político, consequência do apoio a uma medida impopular como esta.

Tucanos querem valor maior para aposentadorias

Por Raphael Di Cunto, Marcelo Ribeiro, Edna Simão e Lucas Hirata | Valor Econômico

BRASÍLIA E SÃO PAULO - O PSDB, partido do relator da reforma da Previdência na Câmara, o deputado Samuel Moreira (SP), fechou questão a favor da proposta, mas está contra dois pontos defendidos pelo tucano: as regras de cálculo do valor das aposentadorias e de acúmulo para pensões. A sigla fez destaques para que esses dispositivos sejam votados separadamente na comissão especial.

A bancada do PSDB, com 30 deputados, decidiu votar contra a utilização de 100% da média de todos os salários-contribuição à Previdência para calcular o valor da aposentadoria, como propõe o governo Bolsonaro e o relator. Hoje há o descarte das 20% menores contribuições, o que eleva o valor final em até R$ 700. Os tucanos argumentam que a redução é injusta.

O PTB, que faz parte de um bloco com 85 deputados junto com PP e MDB, também apresentou emenda contra a nova regra de cálculo. Unidos à oposição, os quatro partidos devem inviabilizar o modelo pretendido pelo governo, elevando o valor das aposentadorias e diminuindo a economia projetada pela equipe econômica (que não divulgou o valor individualizado dessa mudança no valor do benefício).

Estados devem ficar fora, diz governador

Por Marina Falcão | Valor Econômico

RECIFE - O governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), disse que "há um claro indicativo" no Congresso de que se vai retirar Estados e municípios do texto da reforma da Previdência. "É uma decisão que, se for tomada, vamos respeitar e discutir a Previdência aqui [no Estado de Pernambuco]", disse ontem, após evento de lançamento de empresa aérea.

De volta ao Recife após participar de uma reunião em Brasília dos governadores com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o governador não comentou se vai buscar votos da bancada do PSB em Pernambuco para ajudar na aprovação da reforma.

Seu correligionário, o deputado João Campos (PSB), filho do ex-governador Eduardo Campos, é um dos que têm sido críticos em relação à proposta atual. Nos últimos meses, o deputado fez mais de dez palestras e discussões em universidades e sindicatos do Estado, em uma maratona que nomeou de Pelo Povo, na Previdência. "Não há populismo no discurso, há responsabilidade social, que muita gente não tem. De R$ 1,2 trilhão de economia prevista, R$ 715 milhões é no Regime Geral da Previdência, cuja média de aposentadoria é R$ 1.256, e R$ 200 milhões é em cima do BPC e do trabalhador rural. Está se falando de R$ 900 milhões em cima do pobre. Como ser a favor de algo desse tipo?", disse Campos, ao Valor.

Mais bem votado deputado federal da história de Pernambuco, Campos é o provável candidato do PSB para as eleições municipais no próximo ano na capital pernambucana. Adversário político do PSB no Estado - e também um possível candidato à Prefeitura do Recife no próximo ano - o deputado Daniel Coelho (Cidadania) protocolou emenda para retirar Estados e municípios da reforma. Com isso, o governador se veria forçado a pressionar Campos pelo voto favorável à PEC, se não quisesse enfrentar o desgaste de ter que fazer seu próprio ajuste.

Campos diz que seria melhor para o Brasil que a reforma tivesse amplitude nacional. "É muito ruim você pegar uma pauta do tamanho e da complexidade da reforma da Previdência e responsabilizar cada município e cada Estado por sua própria discussão", afirmou. "É uma pauta que não vai fechar nunca".

É inoportuno tratar da lei do abuso de autoridade: Editorial / O Globo

A ressurreição de projeto que limita investigações ocorre num momento sem espaço para esta discussão

Nunca se pensou que seria fácil enfrentar a corrupção crônica de que participam políticos e empresas privadas que atuam próximas a governos. Mesmo em momentos de avanços históricos da Lava-Jato no desmantelamento do petrolão — a gazua que abriu os cofres da Petrobras e do Tesouro por PT e aliados, mancomunados a empreiteiros —, não era possível garantir que a enraizada cultura de saque do dinheiro do contribuinte seria derrotada de forma terminal.

A prova está na retomada da atuação de grupos, com ativas bancadas no Congresso, para construir barreiras legais à atuação de procuradores e juízes, a fim de dificultar a constituição de novas forças-tarefas entre MP, Judiciário, Receita e órgão policiais, no enfrentamento da criminalidade organizada de colarinho branco.

Vexame: Editorial / Folha de S. Paulo

Prisão de segundo-sargento põe a nu falhas de mecanismos de segurança

A prisão de um militar brasileiro com 39 kg de cocaína, em Sevilha, na Espanha, expôs o governo Jair Bolsonaro (PSL) a um constrangimento de proporções globais.

Conforme as autoridades, o segundo-sargento Manoel Silva Rodrigues, da Aeronáutica, foi flagrado na escala do avião que conduzia uma equipe de apoio ao mandatário —em deslocamento, noutra aeronave, rumo a Osaka, no Japão, para o encontro do G20.

O caso, que mancha o prestígio das Forças Armadas e macula a imagem da própria Presidência da República, suscita indagações que terão de ser respondidas com presteza e transparência, sob pena de o mal-estar instaurado transformar-se em descrédito.

Até aqui, as declarações oficiais não têm contribuído para enquadrar o episódio no contexto de gravidade em que se inscreve. A Aeronáutica optou por uma nota protocolar, na qual “reitera que repudia atos dessa natureza” e promete prioridade na elucidação do caso.

Pior desempenho em três anos: Editorial / O Estado de S. Paulo

No pior desempenho desde o fim da recessão, a economia brasileira deve crescer 0,8% neste ano e entrar em 2020 com a indústria ainda muito fraca, segundo o Banco Central (BC) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), dois órgãos oficiais. A redução da confiança de empresários e famílias é mencionada nos dois estudos como um dos principais entraves aos negócios. Se algum choque puder romper o ciclo vicioso de estagnação, deverá vir da melhora das expectativas, de acordo com a análise apresentada pelo Ipea. Isso dependerá, continua o texto, do equacionamento do problema das contas públicas. O outro relatório cita o “recuo dos indicadores de confiança de empresas e consumidores, com impactos sobre as perspectivas de consumo e investimento”. Em março, os dois órgãos projetavam expansão de 2% para o Produto Interno Bruto (PIB) neste ano.

Uma nova baixa do Índice de Confiança da Indústria foi informada nesta quinta-feira, 27, pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). O indicador caiu 1,5 ponto em junho, para 95,7 pontos, e retornou ao nível de novembro, pouco superior ao de outubro (94,2), mês das eleições. Essa divulgação coincidiu com as do Relatório de Inflação do BC e da Carta de Conjuntura do Ipea. Os dois documentos apresentam, a cada trimestre, um exame das condições gerais da economia e de suas perspectivas.

G-20 se torna refém do conflito entre EUA e China: Editorial / Valor Econômico

As reuniões do G-20 se tornaram reféns da errática e desconcertante política do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Na reunião do que é o G-19 mais 1, em Osaka, não será diferente. De novo, evento paralelo ofuscará em boa parte seus resultados, pois o assunto principal e o risco maior para a economia global é a guerra comercial de Washington contra a China.

Se o grupo dos países mais ricos do mundo é incapaz de interferir decisivamente no conflito que está reduzindo o comércio global e acelerando um desaquecimento já em curso, os EUA têm poder suficiente para vetar que temas vitais, como ambiente e protecionismo, que lhe sejam desagradáveis constem do comunicado final do encontro. Com isso, os termos em que são vazados o texto ao fim das reuniões são cada vez mais protocolares.

O que se prefigura no encontro do G-20 é um aumento da dissonância de propósitos. Antes de embarcar para Osaka, Trump apresentou seu cartão de visitas aos líderes com os quais se encontrara. Criticou a União Europeia pelas medidas antitruste que tem tomado contra os gigantes da tecnologia americanos, como Google, um par de dias depois de acusar o Banco Central Europeu de manipulação do câmbio em prejuízo dos EUA. Criticou as tarifas retaliatórias às sobretaxas ao aço e alumínio, determinadas agora pelo governo de Narandra Modi (Índia), considerando-as "inaceitáveis". Por fim, deixou no ar dúvidas sobre a aliança militar americano-japonesa, colocando o anfitrião, o primeiro ministro Shinzo Abe, em situação embaraçosa.

Pablo Neruda: Amigo

Amigo, toma para ti o que quiseres,
passeia o teu olhar pelos meus recantos,
e se assim o desejas, dou-te a alma inteira,
com suas brancas avenidas e canções.

Amigo - faz com que na tarde se desvaneça
este desejo de que todas as roseiras
me pertençam.

Amigo,
se tens fome come do meu pão.

Tudo, amigo, o fiz para ti. Tudo isto
que sem olhares verás na minha casa vazia:
tudo isto que sobe pelo muros direitos
- como o meu coração - sempre buscando altura.

Sorris-te - amigo. Que importa! Ninguém sabe
entregar nas mãos o que se esconde dentro,
mas eu dou-te a alma, ânfora de suaves néctares,
e toda eu ta dou... Menos aquela lembrança...

... Que na minha herdade vazia aquele amor perdido
é uma rosa branca que se abre em silêncio...

Paulinho da Viola: Vai dizer ao vento