- IHU On-Line
Transcorrido um ano desde a posse do presidente Jair Bolsonaro, o caminho pelo qual o país enveredou já não é mais “misterioso”, como advertiu o sociólogo Luiz Werneck Vianna em janeiro do ano passado na entrevista que concedeu à IHU On-Line. Ao analisar o primeiro ano do governo Bolsonaro à frente da Presidência da República, o professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro – PUC-Rio é categórico: “Ficou claro neste primeiro ano que o tabuleiro que está posto na nossa frente é de uma guerra de posições. O governo está acantonado na sua trincheira, tentando implementar o seu projeto, que consiste em destruir o que havia antes e começar algo que considera que seja novo”. Do outro lado, diz, está a sociedade civil, que busca formas de resistir através do fortalecimento dela própria e das suas agências. “O importante, a meu ver, é que não há mais nada enigmático, está tudo claro: o que o governo quer e como a sociedade pode responder às pretensões autoritárias do governo”, assegura, na entrevista concedida por telefone à IHU On-Line.
Na avaliação dele, a disputa de posições em curso no país “favorece mais a sociedade, porque deixa à vista de todos que o governo trabalha com certas limitações políticas e institucionais. Ele não pode tudo, embora ele tente, a cada passo, um avanço; tenta sair da sua trincheira e avançá-la um pouco a mais, mas é obrigado a voltar, porque não consegue consolidar suas posições mais à frente”.
Para ele, 2020, ano que será marcado pelas eleições municipais, sinaliza que estamos entrando em um cenário novo, distanciando-se da era pré-Bolsonaro. “É novo porque neste ano tem a novidade das eleições municipais, que vão mexer com este país, vão facilitar os encontros, as alianças, a formulação de projetos alternativos. (...) As eleições deste ano são um balão de ensaio para isso, especialmente em alguns estados relevantes da federação”. A longo prazo, o sociólogo avalia que a sociedade caminha na direção de alternativas ao projeto do governo. “Há um movimento das coisas atuando na sociedade que propicia a emergência da novidade, da nova personalidade política e intelectual. Não estamos congelados no tempo”, conclui.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Na entrevista que nos concedeu no ano passado, logo depois da posse do presidente Bolsonaro, o senhor disse que o país havia enveredado para um caminho muito “misterioso” e não se sabia para onde a balança iria pender. Depois de um ano de governo, já é possível saber para qual lado a balança pendeu? Como o senhor avalia o primeiro ano do governo Bolsonaro?
Luiz Werneck Vianna – Este foi um ano de aprendizado para o governo e para a sociedade. Para o governo, porque ele testou os seus limites e as ideias que apresentou na campanha. Para a sociedade, porque ela aprendeu a encontrar formas de resistência ao projeto do governo. Ela deixou de ficar atônita, perplexa e passou a encontrar formas de respostas. Pelo menos o esforço disso ocorreu.
IHU On-Line - Como o governo se saiu neste primeiro ano, ao testar seus limites?
Luiz Werneck Vianna – Ficou claro neste primeiro ano que o tabuleiro que está posto na nossa frente é de uma guerra de posições. O governo está acantonado na sua trincheira, tentando implementar o seu projeto, que consiste em destruir o que havia antes e começar algo que considera que seja novo. Estamos na fase da demolição, mas haverá outras. O importante, a meu ver, é que não há mais nada enigmático, está tudo claro: o que o governo quer e como a sociedade pode responder às pretensões autoritárias do governo.
Agora estamos num cenário novo. É novo porque neste ano tem a novidade das eleições municipais, que vão mexer com este país, vão facilitar os encontros, as alianças, a formulação de projetos alternativos. Eleição no Brasil é sempre algo que traz novidade e esta não vai ser diferente. Estamos nos dissociando do período anterior, pré-Bolsonaro, assumindo novas identidades, identificando novos problemas e novas soluções. A intenção do governo é simplesmente erradicar todos os obstáculos que estão postos diante de uma afirmação capitalista selvagem no sentido de um projeto neoliberal, como se a experiência chilena encontrasse lugar aqui.
A sociedade brasileira é muito adversa, refratária a isso, independentemente de formações partidárias, ideologias. A resistência a uma ação econômica descontrolada como a que se quer introduzir é algo entranhado na nossa formação. Na questão ambiental, por exemplo, se quer remover os obstáculos que se manifestam nessa dimensão, como a questão indígena, e promover aí um capitalismo selvagem, com garimpos, avanço do agronegócio; isto está visto e não há mais enigma. O projeto do governo está visível diante do olhar de todos.
IHU On-Line – Como o parlamento tem reagido a esse projeto e às tentativas do governo de colocar seu projeto em curso?
Luiz Werneck Vianna – O parlamento tem afrontado tudo isso. Embora esse parlamento tenha uma representação mais fraca do que alguns anteriores, ele é expressivo da nossa cultura política e, para ele, há limites. Ele tem deixado isso claro. Essa não é uma novidade, porque isso apareceu no transcurso do ano que passou. Mas há novidades na emergência de novas lideranças intelectuais muito relevantes.