(Merval Pereira, no artigo “O exemplo de Lula”, ontem, em O Globo
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
segunda-feira, 29 de março de 2010
Reflexão do dia – Merval Pereira
(Merval Pereira, no artigo “O exemplo de Lula”, ontem, em O Globo
Fora de controle:: Ricardo Noblat
No passado, desdenhou o canudo da universidade.
Por hábito, censura o comportamento da imprensa.
Ridicularizou em Cuba a greve de fome e o conceito de direitos humanos. Na semana passada, para completar, debochou da Justiça. E logo após ter sido punido duas vezes com um total de R$ 15 mil em multas por fazer campanha fora de hora para Dilma.
Saiu no lucro, ressalve-se. O que representam R$ 15 mil para quem se ocupa há mais de um ano e meio em afrontar a lei eleitoral? No caso, a Justiça foi cega, lenta e conivente. Em benefício da solidez das nossas instituições, digamos, porém, que na maioria das vezes a Justiça se limita a ser cega e lenta.
Manda Paulo Okamoto, atual presidente do Serviço Brasileiro de Apoio a Micros e Pequenas Empresas, pagar a multa! Em 2004, Okamoto pagou do próprio bolso uma grana que Lula devia ao PT. Sindicalistas zelosos já se ofereceram para quitar a multa e agradar Lula. Sem problema.
Problema e grave é ver o presidente da República incitar seus seguidores a ignorarem a lei. Foi assim em Osasco, São Paulo, durante a inauguração de 106 apartamentos inacabados. A multidão começou a gritar o nome de Dilma. Conhecido por repreender com severidade multidões que vaiam seus aliados, como Lula reagiu?
Disse: Se eu for multado, vou trazer a conta para vocês.
As pessoas acharam graça e fizeram com as mãos o gesto de assentimento.
A faceta cada vez mais debochada de Lula com tudo e com todos combina com a faceta conhecida de um país galhofeiro, mas é imprópria para o titular do cargo mais importante do serviço público.
Nem os generais da ditadura, nem mesmo Jânio Quadros, por exemplo, ousaram tanto. Os militares aviltaram a democracia, mergulhando o país numa treva de duas décadas. O folclórico Jânio avacalhou o voto popular mergulhando sua alcoolizada presidência num porre de sete meses que acabou, três anos depois, com a ressaca do golpe militar.
Mas os generais conseguiram manter a pose e a circunstância ensaiadas em suas academias militares, embora a tortura rolasse nos porões. E Jânio fingiu uma sobriedade expressa em bilhetinhos nervosos que projetavam um bafo austero sobre a administração.
Diferente deles todos, Lula não mascara o que é, nem finge o que não é.
Isso é bom quando ele atravessa a barreira que sempre separou governantes de governados e procura atender às necessidades primárias do povo. É ruim quando, do alto de seus impressionantes 76% de aprovação popular, e no ocaso de uma administração histórica, sente-se no direito de desafiar qualquer coisa, até mesmo a Justiça.
Com frequência, a língua nada presa e muitas vezes irresponsável de Lula vergasta instituições, ideias, princípios e verdades. Em Osasco, ela justificou a falta de revestimento nas paredes dos apartamentos com uma desculpa malandra: Tem gente que vê o azulejinho de uma cor e na semana seguinte tira e coloca outro.
Qualquer cidadão tem o direito de criticar a imprensa.
Eu diria o dever. Ela é poderosa demais para ficar imune a críticas. E se não lhe faltarem sabedoria e bons propósitos, aprenderá com elas. Mas esse não é o objetivo de Lula ao admoestá-la.
Lula é um governante populista e autoritário. Esse tipo de gente prefere uma imprensa servil.
Não consigo entender a predileção (da imprensa) pela desgraça. Há tanta coisa boa no cotidiano do povo brasileiro, repetiu ele outro dia. O lamaçal que derrubou o governo de José Roberto Arruda não arrancou de Lula uma só palavra de indignação. Imagem não quer dizer tudo, afirmou de cara limpa. Referia-se aos vídeos do escândalo.
OK. Lula foi apenas coerente.
Afinal, o mensalão jamais existiu. O preso político cubano Orlando Zapata morreu porque decidiu fazer uma greve de fome. E preso político é igual a preso comum. Pois imagine se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrassem em greve de fome e pedissem liberdade.
O PT no Sudeste:: Fernando Rodrigues
BRASÍLIA - Lula chegou ao Palácio do Planalto em 2002 e reelegeu-se em 2006, mas o PT nunca decolou de fato quando se trata de ganhar os governos dos três Estados mais populosos do país, São Paulo,Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Na eleição deste ano, por enquanto, os petistas continuam pouco competitivos no Sudeste. O partido não deve ter candidato próprio ao governo do Rio. Apoiará a reeleição de Sérgio Cabral. Em Minas Gerais pode ocorrer o mesmo. Lula está impondo ao PT mineiro uma adesão forçada à candidatura de Hélio Costa. É sintomático da atual fase lulista que Cabral e Costa sejam ambos filiados ao PMDB.
Em São Paulo, berço do PT, o partido terá Aloizio Mercadante como candidato próprio ao governo local.
O desempenho do petista é sofrível.
Na pesquisa Datafolha, registra 11% -bem abaixo dos 32% obtidos na eleição para o mesmo cargo em 2006, quando recebeu 6,8 milhões de votos. Antes, em 2002, havia conquistado 10,5 milhões de votos para o Senado.
Tudo somado, o único nome do PT nas disputas pelos governos de São Paulo, Rio e Minas Gerais é o de Mercadante, cuja popularidade enfrenta uma queda real e fulminante nos últimos anos.
Os petistas rebatem em coro, dizendo que a eleição é só em outubro. Até lá, esperam ser inoculados com os 76% de aprovação do governo Lula. É uma hipótese não desprezível, porém incerta.
Um pouco antes do Datafolha deste fim de semana, lulistas já falavam em vitória em São Paulo. Por esse raciocínio, Dilma Rousseff iria disparar nas pesquisas para presidente e galvanizaria os apoios necessários para Mercadante.
Essa teoria megalômana do PT ruiu com os dados do Datafolha. Para o governo de São Paulo, o tucano Geraldo Alckmin tem até 53%.
Falta muito tempo ainda até a eleição. OK, mas, por ora, o PT repete seu clássico e histórico desempenho medíocre no Sudeste.
Oposição se mobiliza para atrair Jarbas
RECIFE - Se no plano nacional a oposição está próxima de dar um passo adiante na construção da candidatura ao Planalto - com a saída do governador de São Paulo, José Serra (PSDB), do cargo, na próxima quarta-feira (31) -, os principais membros dos quatro partidos de oposição em Pernambuco (DEM, PMDB, PPS e PSDB) planejam para os próximos dez dias a realização de um ato político que demonstre a unidade da base oposicionista e abra as portas para o senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) decidir, enfim, enfrentar a batalha eleitoral. A ação, idealizada pelos deputados Augusto Coutinho (DEM) e Terezinha Nunes (PSDB), deve ser detalhada em reunião a ser realizada até amanhã.
Ainda não definimos, mas é uma ação nossa e do Democratas, afirmou Terezinha Nunes, sem explicitar mais detalhes. Para os oposicionistas, a última pesquisa publicada pelo Datafolha, no sábado (27), enfatiza o projeto do grupo em prol do lançamento da candidatura do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB) ao governo. A pesquisa apontou crescimento da vantagem de Serra (36%) em detrimento da pré-candidatura de Dilma Rousseff (27%), do PT, num cenário com a participação do deputado federal cearense Ciro Gomes (11%). O cenário anterior apontado pelo instituto indicava empate técnico entre Serra e Dilma.
De acordo com o presidente estadual do PPS, deputado federal Raul Jungmann, o senador Sérgio Guerra teria convidado os deputados federais e estaduais da bancada de oposição para uma reunião em sua residência, em Jaboatão dos Guararapes, ontem à noite. Vamos discutir o dia 10 de abril, o lançamento de Serra. Acredito que a reunião também servirá para delinearmos a festa de lançamento de Jarbas, afirmou Jungmann.
Da Tailândia, onde cumpre agenda administrativa do Senado, Jarbas divulgou nota comemorando o desempenho obtido por Serra na última pesquisa do Datafolha e subiu o tom contra o PT. Não tenho dúvida nenhuma de que Serra tem tudo para crescer nas pesquisas daqui para frente e vencer, até no primeiro turno. Agora, a gente da oposição tem de estar preparado, porque esse pessoal do PT não vai querer largar o poder. Temos de estar preparados para tudo que é tipo de agressão, ressaltou. (M.M.N.)
Serra diz ter "infinita alegria" por sua gestão
Governador afirma ter "perfeita consciência de que vamos continuar fazendo as coisas boas acontecerem no Estado e no país"
Em inauguração de obras viárias, o presidenciável tucano diz que nãoficará "eufórico" ao deixar governo paulista, na quarta-feira
Flávio Ferreira
O governador de São Paulo José Serra (PSDB) disse ontem estar ao mesmo tempo triste, por deixar a administração do Estado, e alegre, por ter certeza de que fez e vai "continuar fazendo as coisas boas acontecerem no nosso Estado e no nosso país". Em discursos, Serra também deu pistas de possíveis bordões de sua campanha para as eleições presidenciais.
O tucano participou ontem da inauguração de um complexo viário na intersecção da marginal Tietê com a via Anhanguera e da entrega de três estações de trens metropolitanos reformadas na capital.
Em um dos discursos, Serra disse que as estações e os novos trens entregues pela gestão dele representam uma "bolsa transporte" para o trabalhador.
"É como se fosse uma bolsa transporte porque, no fundo, é um subsídio que você está dando à renda das pessoas indiretamente, através do menor tempo e do menor estresse de um bom sistema de transporte. Renda se distribui também através da saúde, da educação e do bom transporte coletivo", afirmou Serra após o evento.
Ao comentar a entrega do cargo ao vice, Alberto Goldman, prevista para quarta-feira, o governador disse: "Vou passar o cargo para o Goldman com um misto de chateação de deixar o governo, não vou ficar eufórico com isso. Mas, por outro lado, com uma infinita alegria por ter perfeita consciência de que nós fizemos e vamos continuar fazendo as coisas boas acontecerem no nosso Estado e no nosso país".
A expressão "fazer acontecer" foi repetida várias vezes por Serra no fim de semana.
Governador sai com 55% de ótimo/bom
S. PAULO - Após três anos e três meses de governo e às vésperas de deixar o cargo para concorrer à Presidência da República (ele deixará o cargo nesta quarta-feira), o governador de São Paulo, José Serra, é aprovado por 55% dos eleitores do Estado.
A taxa dos entrevistados que consideram sua gestão como ótima ou boa se manteve inalterada desde a última avaliação, realizada em dezembro do ano passado -de lá para cá, o Estado, e especialmente a capital, passaram por dias consecutivos de temporais e enchentes, mas que não alteraram a percepção do paulistano sobre o desempenho do governador.
No início de seu governo, Serra era avaliado positivamente por 39% da população, em março de 2007. Ele alcançou a sua melhor marca em agosto de 2009, com 57% de índice de ótimo ou bom.
Em relação à pesquisa feita em dezembro, o percentual dos que avaliam o desempenho de Serra como regular se manteve em 32%, e dos que acham seu governo ruim ou péssimo, em 11%. Em uma escala de zero a dez, Serra alcança a nota média de 6,6.
Serra afirma que implantou 'bolsa transporte'
Prestes a deixar cargo, tucano faz balanço de gestão e cita gastos com trem e metrô como melhoria na renda do trabalhador
Sérgio Roxo
SÃO PAULO. A três dias de deixar o cargo para assumir a pré-candidatura à Presidência, o governador de São Paulo, José Serra (PSDB), teve ontem um domingo repleto de atividades oficiais: andou de trem e afirmou que a sua gestão implantou a bolsa transporte em São Paulo.
Vou passar o cargo de governador para o Alberto Goldman (seu vice) com um misto de chateação, de deixar o governo, deixar São Paulo; não vou ficar eufórico com isso.
Mas, por outro lado, com uma infinita alegria por ter perfeita consciência de que nós fizemos, e vamos continuar fazendo, coisas boas acontecerem no nosso estado e nosso país disse Serra, ao inaugurar um complexo viário de R$ 410 milhões para ligar a Rodovia Anhanguera à Marginal Tietê.
A maior encomenda da história do mundo de trens Apesar de a obra ser voltada ao transporte individual, o governador destacou que, em sua gestão, priorizou investimentos nos trens e no metrô.
Estamos investindo na área de trilhos três a quatro vezes mais do que nas obras viárias afirmou.
Segundo Serra, o gasto total com melhorias na rede ferroviária é de R$ 21 bilhões.
Nós fizemos a maior encomenda da história do mundo de trens, com exceção, meio óbvia e rotineira, da China. Isso é transporte para trabalhador. Isso é a bolsa transporte. Vamos ter isso claro: transporte é vital para a vida das pessoas. Ou é tempo para lazer ou é tempo para trabalhar e ganhar mais dinheiro.
Portanto, é um investimento eminentemente popular disse o tucano.
Ao ser perguntado sobre o bolsa transporte, Serra afirmou que um melhor sistema de transporte também significa melhoria na renda do povo. Há duas semanas, ele já havia dito que investir em transporte significava transferência de renda.
É como se fosse uma bolsa transporte, porque no fundo é um subsídio que você está dando à renda das pessoas indiretamente através do menor tempo (gasto nos deslocamentos).
Renda se distribui através da saúde, da educação, do bom transporte coletivo. É isso que configura o padrão de vida, junto com renda monetária.
Serra se disse frustrado por deixar o governo sem conseguir entregar obras. A quinta linha de metrô da capital paulista deveria ser aberta ao público amanhã, mas houve atraso nos testes da operação dos trens.
Tenho orgulho do que foi feito e um certa frustração de não estar presente nas várias coisas que vão ser entregues ao longo deste ano. Muita coisa vai sobrar para o Goldman, um sortudo disse ele.
Além do complexo viário, Serra inaugurou ontem, ao lado de Orestes Quércia (presidente do PMDB-SP) e do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM), três estações reformadas da Linha 9-Esmeralda da rede de trens. As estações de trem passarão a ter, segundo o governo estadual, padrão de metrô.
Na última semana, de imposto abatido a bônus a professor Serra vem mantendo uma intensa rotina de inaugurações em seus últimos dias no cargo. No sábado, o tucano abriu as novas pistas da Marginal Tietê. No mesmo dia, foi inaugurado um parque na Zona Leste da capital paulista. O governador também inaugurou, na última semana, unidades de saúde; anunciou o pagamento de bônus a professores; regulamentou uma lei para abater imposto de empresas que investirem no esporte; e chegou a realizar uma cerimônia para dar início à demolição de imóveis no local em que será construído um complexo cultural.
Restará ainda a Serra, nestes dois próximos dias, a abertura do Trecho Sul do Rodoanel, provavelmente na terça-feira.
Como a quinta linha de metrô da capital paulista não ficou pronta, o governador fará apenas uma vistoria técnica no local.
A ideia era incluir a obra no pacote de final de governo.
Serra entrega obra em tom de despedida
Silvia Amorim
Pré-candidato do PSDB à Presidência da República, o governador de São Paulo, José Serra, iniciou ontem a sua despedida do cargo. Ao participar de duas inaugurações na capital paulista, o tucano disse que deixará o governo estadual sentindo uma combinação de frustração e alegria.
Na próxima quarta-feira, Serra faz um evento na sede do governo para anunciar oficialmente seu desligamento do cargo. Na prática, ele fará um balanço das realizações nesses três anos e três meses à frente do Estado. Simbolicamente, também transmitirá a administração ao vice, Alberto Goldman.
A previsão é que Serra encaminhe sua carta de renúncia à Assembleia Legislativa somente na sexta-feira. Já a posse de fato de Goldman está prevista para terça-feira da semana que vem, também no Legislativo.
"Vou passar o cargo para o Goldman com um misto de chateação, de deixar São Paulo. Não vou ficar eufórico com isso. Mas, do outro lado, com uma infinita alegria por ter perfeita consciência de que nós fizemos e vamos continuar fazendo as coisas boas acontecerem no nosso Estado e no nosso País", disse o tucano, ao discursar na cerimônia de entrega de cinco de pontes e viadutos do Complexo Anhanguera sobre a Marginal do Tietê.
Pelas regras eleitorais, Serra tem de se desincompatibilizar do cargo até 2 de abril. O mesmo prazo vale para a sua adversária, a ministra da Casa Civil e pré-candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, desembarcar do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O tom de despedida também apareceu em outro evento na mesma tarde. Ao entregar três estações de trem reformadas, Serra disse que uma "frustração" ficará quando se afastar do posto de governador. "É uma certa frustração de não estar presente quando várias coisas vão ser entregues ao longo deste ano."
Uma delas é a linha 4 do metrô. Vitrine da sua gestão, o projeto terá as primeiras estações inauguradas no fim deste ano. A linha virou notícia em todo o País por causa de um acidente, em 2007, que matou sete pessoas. Uma cratera surgiu no canteiro de obras, em Pinheiros, engolindo funcionários, equipamentos e pedestres.
Abertamente. Serra tem falado nos últimos dias mais abertamente sobre sua saída. Ontem, ele chegou a chamar o vice de "sortudo". "Muita coisa vai sobrar para o Goldman (inaugurar), que é um sortudo."
No dia anterior, Serra apresentou Goldman como futuro governador a moradores na periferia da capital. Desde sábado, o vice acompanha o governador em todas as inaugurações. A participação dele foi discreta. Goldman não fez discursos e, quando citado, manifestou-se com um aceno ou sorriso. Desde o ano passado, ele cumpre uma agenda intensa de inaugurações pelo interior, a maioria sem o chefe.
Ontem o governador também agradeceu a sua equipe e afirmou ter "orgulho" do que fez por São Paulo.
Bolsa-Transporte. Tendo a área de transporte sobre trilhos um dos carros-chefe da sua gestão, Serra disse ter criado em São Paulo a "Bolsa-Transporte" - numa analogia ao Bolsa-Família do governo Lula. "Estamos fazendo a maior encomenda de trens da história e do mundo, com exceção da China. É transporte para trabalhador. É a Bolsa-Transporte, um investimento eminentemente popular", explicou.
ÚLTIMA SEMANA
Agenda lotada na reta final
Hoje
Serra inspeciona obras da estação de metrô Vila Prudente, na zona leste, pela manhã. À tarde, inaugura uma escola técnica na favela Paraisópolis, assina convênio com universidades paulistas e entrega obra viária na interligação de Poá, Suzano e Itaquaquecetuba. À noite, anuncia redução de carga tributária para indústrias têxteis.
Amanhã
Quarta-feira
Sexta-feira
Dilma patina e Serra cresce entre os pró-Lula
José Roberto de Toledo
Do total do eleitorado, 76% avaliam que o governo Lula é bom ou ótimo, segundo o Datafolha. É o mesmo porcentual de dezembro de 2002, que dava a dimensão da expectativa em relação ao futuro governo. Se Lula está entregando o que a maioria dos eleitores esperava, não se pode dizer o mesmo de sua candidata à sucessão, Dilma Rousseff (PT).
A ministra patina no eleitorado-chave para sua candidatura: entre os 76% que aprovam o governo, ela oscilou de 35% para 33% no último mês. E está tecnicamente empatada com José Serra (PSDB), que cresceu de 27% para 32% nesse segmento. Se não ganhar os simpatizantes do governo, Dilma terá poucas chances de se eleger.
Serra lidera por ampla margem entre os que julgam o governo Lula regular. Desde dezembro, o tucano subiu de 46% para 51% nesse grupo, que representa 20% do eleitorado. Nesse campo, Dilma tem tão poucas possibilidades (9%) quanto Ciro Gomes (10%) e Marina Silva (10%). Os 4% que desaprovam o governo Lula também têm preferência por Serra (48%).
Logo, ou Dilma reverte a atual tendência entre os que aprovam o governo, ou pode morrer na praia. Nada menos do que 25 pontos dos 27% de sua intenção vêm desses eleitores. Serra, por sua vez, conta com 10 pontos de seus 36% de intenção de voto entre os que dizem que o governo é "regular".
Mantida a alta aprovação de Lula, a única possibilidade de sua candidata vir a lhe suceder é "roubar" de Serra eleitores pró-governo. Para ultrapassar o tucano além da margem de erro, Dilma precisaria tirar 10 pontos de Serra nesse segmento e chegar a pelo menos 43% dos pró-Lula. Aí o placar geral ficaria 35% a 29% em favor da petista.
Mas não é fácil chegar a 43% entre os eleitores governistas. Nem mesmo Lula conseguiu a totalidade dos votos de quem o aprovava. Em 2006, quando disputava a reeleição, o presidente chegou, no final do 1º turno, a 80% da preferência entre os que apoiavam seu governo.
Isso porque há gradações na aprovação. Quanto mais enfático o apoio, maior a transferência de voto. Os eleitores que mais tendem a votar no candidato governista são os que avaliam o governo como "ótimo" ou que dão nota 8 ou superior à administração.
Infelizmente, na maioria das vezes os institutos de pesquisa agregam as respostas "ótimo" e "bom" em um só porcentual e perde-se a informação sobre a intensidade da aprovação.
O preço da submissão :: Luiz Paulo Corrêa da Rocha
A cultura do pensar a curto prazo, a política do olhar para o próprio umbigo e não para o interesse maior, a prioridade das alianças políticas acima da defesa do Estado do Rio estas são as verdadeiras raízes da atuação do governo estadual no emaranhado em que se transformou a desastrosa ideia do Executivo federal de alterar o modelo regulatório para exploração e produção de petróleo no país.
O projeto de lei original enviado pelo Executivo federal foi assimilado de forma submissa. Nele as perdas do Estado são enormes, mas são de longo prazo. A emenda Ibsen, que aumenta drasticamente os prejuízos do Estado do Rio, tem efeito no curto prazo e foi rechaçada pelo governo estadual com veemência, aquela que faltou para rechaçar o projeto de lei original, devido ao privilégio da manutenção dos acordos políticos.
Não se trata de discutir a importância da mobilização de todas as forças do Estado contra a emenda Ibsen, mas sim da necessidade de reproduzi-la, de maneira ainda mais forte, contra o previsto no projeto aprovado para as áreas do pré-sal.
O Estado do Rio e seus municípios receberam nos últimos dez anos mais de R$ 50 bilhões em royalties e participação especial pela produção de petróleo e gás.
Este valor seria menos da metade caso os critérios de distribuição fossem os previstos no projeto de lei enviado ao Congresso, causando perdas de mais de 50% aos cofres do Estado. A emenda Ibsen tratou de nos retirar a outra metade.
Os municípios fluminenses sofrerão consequências ainda maiores, uma vez que os royalties têm peso mais relevante nos seus orçamentos.
A Confederação Nacional dos Municípios (CNM), dominada pelos municípios não produtores, a maioria deles na categoria de inadimplentes, faz o mesmo jogo de todos os outros, governo federal e Câmara, inclusive Ibsen, isto é, buscar recursos adicionais em fontes cujas receitas já têm atribuições federativas estabelecidas.
A sociedade fluminense está sendo ludibriada por meio de informações parciais, articuladas e que escondem toda a verdadeira perda do nosso Estado. Perdemos recursos com a emenda Ibsen, perdemos recursos com o projeto de capitalização da Petrobras e perdemos recursos com o projeto de lei que introduz a partilha de produção.
Os números são gigantescos e podem atingir mais de R$ 100 bilhões nos próximos dez anos.
Lutar por apenas parte das perdas, e em caso de vitória comemorar a solução que traz prejuízos menores, parece se preparar para uma Vitória de Pirro.
Luiz Paulo Corrêa da Rocha foi vice-governador do Estado do Rio de Janeiro e é deputado estadual (PSDB-RJ).
PAC-2 vai ser lançado hoje, mesmo com PAC-1 atrasado
Governo só pagou, em 3 anos, 16,4% das obras anunciadas em estradas
Rodovias empacadas
União pagou apenas 16,41% dos investimentos do PAC no setor nos últimos três anos
Marcelo Portela
BELO HORIZONTE - Principal projeto para alavancar a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à Presidência da República, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) está longe de cumprir os investimentos previstos para o período entre 2007 e 2010. Um exemplo é o que foi previsto no orçamento para obras em rodovias. Apesar de os balanços do PAC preverem investimentos em rodovias de R$ 45,5 bilhões em quatro anos, nos últimos três as Leis Orçamentárias Anuais (Loas) tinham autorizado somente R$ 21,6 bilhões para o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), o que equivale a 47,6% do previsto.
Apenas R$ 7,4 bilhões foram efetivamente pagos. Esse valor representa 16,41% dos recursos anunciados pela União para construção, adequação, duplicação e recuperação de trechos de rodovias em todo o país, e 34,58% dos recursos autorizados no orçamento para os projetos.
Esses dados foram obtidos em consultas ao Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) do governo federal e aos portais Transparência Pública e Portal da Transparência criados pela União também para divulgação dos gastos públicos. Os dados são relativos a investimentos exclusivos da União e estão disponíveis nos relatórios de execução de despesas do PAC no Siga Brasil, sistema do Senado que reúne informações do Siafi e de outras bases de dados do governo federal.
E contestam os investimentos contidos no balanço dos três anos do PAC, publicado em fevereiro, com previsão de investimentos em obras rodoviárias entre 2007 e 2010.
No relatório com o balanço de três anos do programa, o governo afirma ter investido R$ 20,8 bilhões em obras já concluídas e outros R$ 16,5 bilhões em projetos ainda em andamento. Somados, os valores representam 82,8% dos R$ 45,5 bilhões previstos para investimentos em rodovias em 24 estados e no Distrito Federal nos quatro anos, segundo o relatório com o balanço de três anos do PAC. Os dados de Goiás, Piauí e Rondônia não estão disponíveis nos documentos.
Rio foi o estado com o pior resultado
Pelos relatórios, o estado com maior defasagem entre os investimentos previstos no PAC, autorizados nas Loas e efetivamente pagos é o Rio de Janeiro. Nos balanços do PAC, o governo prevê, para o estado, investimentos de R$ 9,6 bilhões em logística, sendo R$ 4,8 bilhões em rodovias. No entanto, as leis orçamentárias de 2007 a 2009 tinham autorizado R$ 659,3 milhões para o Dnit investir em obras no estado. E apenas R$ 36,4 milhões foram desembolsados no período, o que corresponde a 5,52% dos recursos autorizados e a 0,74% do previsto no PAC para ser investido até o fim de 2010 no território fluminense.
Não tenho dúvida de que o PAC existe só para alavancar a candidatura da ministra Dilma. É um projeto de marketing para enganar a população.
Há várias obras que o governo afirma que estão em execução e nunca aconteceram diz o presidente do DEM, deputado federal Rodrigo Maia (RJ).
É literalmente uma encheção de linguiça. O governo põe coisas no balanço do PAC que não estão previstas no orçamento para dar mais volume. É desrespeito ao cidadão ou desespero para fazer campanha política emenda o relator da subcomissão do PAC da Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara, deputado federal Duarte Nogueira (PSDB-SP).
O estado com maior índice de investimento nos últimos três anos foi o Acre, para o qual o PAC previu R$ 1 bilhão em obras rodoviárias. Pelas Loas, R$ 612,1 milhões foram autorizados para serem investidos entre 2007 e 2009. No período, R$ 524,1 milhões foram pagos pelo governo, equivalentes a 85,63% dos recursos autorizados no orçamento e 51,92% do previsto no balanço do PAC.
O diretor-geral do Dnit, Luiz Antônio Pagot, negou que haja atraso nos projetos e atribuiu aos procedimentos burocráticos necessários à realização das obras o baixo índice de investimentos, sobretudo em 2007 e 2008.
O PAC foi criado em 2007 e não é de uma hora para outra que se resolvem os projetos. Superamos a inércia.
O Brasil ficou muitos anos sem investimentos e havia uma falta de projetos.
Nos dois primeiros anos, cuidamos de projetos executivos, licitações, licenças ambientais. Agora que esses processos estão terminando, e desde o ano passado, começou a execução real das obras.
Segundo Pagot, somente ano passado foram licitados projetos no valor de R$ 16 bilhões, mas as obras devem ser concluídas apenas este ano ou em 2011: Há 579 contratos em execução no momento, mas eles só serão faturados em 2010, alguns em 2011.
A assessoria do Dnit também contesta os dados contidos no Siafi e afirma que, entre 2007 e 2010, a execução orçamentária de obras do PAC chega a R$ 17,5 bilhões. O valor, no entanto, ainda bem abaixo do previsto nos balanços do PAC, também inclui restos a pagar, conta que será deixada para o próximo governo.
A reportagem procurou a Casa Civil para falar sobre o assunto, mas não houve retorno.
Opinião pública e política externa:: Fábio Wanderley Reis
Em artigo na "Folha de S. Paulo" de 22 de março, Hélio Schwartsman examina trabalhos recentes de especialistas estadunidenses em psicologia e ciência cognitiva (especialmente George Lakoff, de quem me ocupei aqui há algum tempo, a propósito de conselhos dados à campanha de Obama), os quais demonstrariam que, na escolha dos candidatos pelos eleitores, "emoções são significativamente mais importantes que a razão". A ideia de metáforas ou de "framing" ou "enquadramento" (esta última devida, na verdade, ao trabalho anterior de outros estudiosos), com seu substrato de conexões neuronais, envolvem a percepção dos mesmos objetos com sentimentos positivos ou negativos que condicionariam fortemente as decisões, e a possibilidade de racionalidade na política seria posta em xeque, bem como, eventualmente, a viabilidade da própria democracia.
A discussão de Schwartsman, de maneira afim às ênfases de Lakoff, não considera as ramificações sociológicas do tema. A questão da "racionalidade" do eleitor, vista em ligação com as informações de que dispõe ou sua sofisticação intelectual geral e com o condicionamento por fatores de estratificação social, é há muito tomada por especialistas de ciência política ou sociologia dedicados ao processo político-eleitoral. Provavelmente o nome de maior destaque a ser associado a uma posição restritiva a respeito do assunto é o de Philip Converse: desde os anos 1960, Converse aponta as deficiências de "estruturação ideológica", e a dificuldade de situar-se diante de rótulos como "progressista" e "conservador" ou "esquerda" e "direita", em parcelas substanciais não apenas do eleitorado dos Estados Unidos, país com respeito ao qual isso talvez soe menos surpreendente, mas mesmo do eleitorado francês. E sua perspectiva básica, como revelam balanços de que ele mesmo participa em publicações recentes (como o "Oxford Handbook of Political Behavior", de 2007, editado por R. J. Dalton e H.-D. Klingemann), resiste bem a revisões de seu trabalho que outros têm procurado fazer.
Uma área específica em que surge o tema da informação e da racionalidade do eleitorado diz respeito à política externa, que me tem interessado aqui. No mesmo volume de Dalton e Klingemann, R. Eichenberg trata de avaliar, em perspectiva transnacional, os embaraços e avanços no estudo da opinião dos cidadãos sobre a política externa. Sua avaliação mostra "disposições" gerais da opinião pública ("moods", como as chama J. Stimson) que surgiriam em diferentes contextos nacionais e internacionais e cujos vaivéns podem ser relacionados de forma significativa a considerações relevantes em qualquer momento dado. Esse padrão de "movimentos estáveis e sensatos" da opinião dos cidadãos servem de base à tese central de Eichenberg: enquanto haveria, até os anos 1980, um consenso entre os estudiosos segundo o qual um público desinformado e desinteressado seria "quase por definição incapaz de produzir uma opinião pública ´racional´ em questões de política externa", estudos mais recentes em vários países, com métodos supostamente mais apropriados, permitiram falar agora de uma opinião pública não só racional por sua estabilidade e coerência, mas também plausível, isto é, cujas variações seriam respostas razoáveis a ocorrências no ambiente global ou a políticas governamentais.
Apesar dos supostos avanços metodológicos mencionados, em particular o empenho das pesquisas em diversificar tanto quanto possível as questões com referência às quais se procuraria apreender a "opinião pública", o balanço de Eichenberg tampouco destaca, bem como os estudos de que trata, a provável importância da dimensão relativa à estratificação social para o tema geral da "racionalidade". É notável, por exemplo, que haja a assimilação tranquila entre a ideia de "opinião pública" e o que resulta de pesquisas com amostras do eleitorado em geral, sem que qualquer informação seja dada sobre possíveis variações na "racionalidade" de diferentes categorias socioeconômicas (ou educacionais) de eleitores. Em síntese, qual será a contribuição do eleitorado mais pobre e sabidamente mais politicamente desatento, em particular quanto aos temas de política internacional e política externa, na conformação dessa "nova" opinião pública vista como sensata e racional? No caso do Brasil da atualidade, por exemplo, é patente o contraste entre as disposições do eleitorado popular majoritário e o que costumamos designar por "opinião pública", conformada amplamente pela elite de maior interesse político e informação e pela imprensa que politicamente se dirige sobretudo a ela.
Seja como for, uma constatação particular produzida em pesquisas do próprio Eichenberg me parece de grande interesse. Fechei minha última coluna com a menção ao imperativo de construção de uma legalidade transnacional e mundial, eventualmente capaz de mitigar o peso das meras assimetrias de poder nacional no terreno baldio em que as relações internacionais sempre se desenrolam. O exemplo mais dramático da importância desse aspecto na história recente pode ter sido a Guerra do Golfo, talvez a guerra mais "legal" jamais ocorrida, em que, não obstante os elemenos de "realkpolitik" certamente presentes, o respaldo legimitador da ONU permitiu aos Estados Unidos exercerem poder de polícia diante da flagrante violação das normas internacionais pelo Iraque de Saddam Hussein. Pois os dados de Eichenberg mostram os níveis inéditos de aprovação com que a ação militar contou então em populações de países muçulmanos (Barein, Oman, Arábia Saudita, Turquia e Emirados Árabes Unidos): o nível de aprovação oscila entre 50% e 60% em média, contra médias correspondentes que não vão além de 25% em outras circunstâncias. "Enquadramento", sem dúvida. Mas não parece haver por que contrapor, nele, a adesão a normas, e seu necessário componente emocional, à racionalidade.
Fábio Wanderley Reis é cientista político e professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais. Escreve às segundas-feiras
A crise estrutural do euro e a Alemanha:: Luiz Carlos Bresser-Pereira
Embora possa ajudar, a criação de um FMI europeu não resolverá o problema dos países da eurozona
O euro está enfrentando uma crise estrutural que não põe em jogo a União Europeia, mas põe em risco sua própria existência. Dependendo de como se desenrolar a crise, alguns países poderão voltar a suas moedas nacionais ou, o que é mais grave, o euro poderá se tornar inviável para todos. A UE, depois de algumas hesitações, sinalizou o apoio necessário à Grécia para que esta continue a cumprir seus compromissos financeiros, mas o problema mais geral do seu desequilíbrio interno não está resolvido e não tem solução fácil.
Qual a razão estrutural da crise?
Seria a irresponsabilidade fiscal de alguns governos, a começar pela Grécia? Ou então a expansão fiscal ocorrida em 2009 para enfrentar a crise financeira global? Essas são duas boas razões, mas, se fossem suficientes para explicar a crise europeia, bastaria que os governos gastadores apertassem os cintos e o problema seria resolvido. O verdadeiro e grande problema é o desequilíbrio das contas-correntes entre os países europeus, é o endividamento crescente do setor privado de um grande número de países e o crédito de outros, principalmente da Alemanha.
É um desequilíbrio que pode decorrer de gastos excessivos de outros países, mas é principalmente consequência da poupança alemã: da estagnação dos salários, não obstante o aumento da produtividade, e, em consequência, da redução do custo unitário da mão de obra em cerca de 20% nos últimos dez anos, enquanto nos outros países europeus esse custo unitário permanecia constante ou mesmo aumentava.
Os trabalhadores alemães aceitaram a redução relativa de seus salários para enfrentar a concorrência do trabalho barato da Ásia e assim salvar seus empregos. O governo alemão, por sua vez, implementou uma série de reformas reduzindo direitos trabalhistas que contribuíram para que essa redução relativa de salários fosse possível. Enquanto isso, os demais países europeus não lograram replicar essa política. O que é, aliás, compreensível; é preciso um povo disciplinado e austero como é o povo alemão para aceitar uma política econômica.
O problema não seria estrutural se não existisse o euro. Se cada país continuasse com sua moeda nacional, a desvalorização cambial seria uma solução para os países deficitários. Foi o que aconteceu com o Reino Unido, que não está no euro. Através da desvalorização em relação ao marco alemão, cada país reduziria seus salários reais, e assim recuperaria sua competitividade de um dia para o outro.
Naturalmente neste caso a redução de salários não seria relativa ao aumento da produtividade, como aconteceu na Alemanha, mas seria real. Esta, entretanto, é uma forma de redução de salários e de resolução do endividamento dos países mais simples e muito mais rápida do que aquela baseada em acordos salariais.
Já que a alternativa da desvalorização não existe, o que acontecerá com o euro? É difícil dizer. Embora possa ajudar, a criação de um FMI europeu não resolverá o problema.
Como também é inútil acusar os parceiros por uma situação da qual a Alemanha é também responsável ao ter agido unilateralmente. Resolveria a questão uma política de aumento do salário real e de estímulo ao aumento do consumo na Alemanha? Creio que sim, mas essa é uma questão que dependerá da decisão do povo alemão de preservar o euro mesmo que seja à custa de alguma perda de competitividade internacional.
Definitivamente, não é uma decisão fácil, porque nela estão envolvidas mais perdas do que ganhos.
Luiz Carlos Bresser-Pereira , 75, professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro da Fazenda (governo Sarney), da Administração e Reforma do Estado (primeiro governo FHC) e da Ciência e Tecnologia (segundo governo FHC), é autor de "Globalização e Competição".
Morte e vida Severina (Auto de Natal Pernambucano) – 6 ::João Cabral de Melo Neto
— Muito bom dia, senhora,
que nessa janela está;
sabe dizer se é possível
algum trabalho encontrar?
— Trabalho aqui nunca falta
a quem sabe trabalhar;
o que fazia o compadre
na sua terra de lá?
— Pois fui sempre lavrador,
lavrador de terra má;
não há espécie de terra
que eu não possa cultivar.
— Isso aqui de nada adianta,
pouco existe o que lavrar;
mas diga-me, retirante,
que mais fazia por lá?
— Também lá na minha terra
de terra mesmo pouco há;
mas até a calva da pedra
sinto-me capaz de arar.
— Também de pouco adianta,
nem pedra há aqui que amassar;
diga-me ainda, compadre,
que mais fazia por lá?
— Conheço todas as roças
que nesta chã podem dar:
o algodão, a mamona,
a pita, o milho, o caroá.
— Esses roçados o banco
já não quer financiar;
mas diga-me, retirante,
o que mais fazia lá?
— Melhor do que eu ninguém
sei combater, quiçá,
tanta planta de rapina
que tenho visto por cá.
— Essas plantas de rapina
são tudo o que a terra dá;
diga-me ainda, compadre;
que mais fazia por lá?
— Tirei mandioca de chãs
que o vento vive a esfolar
e de outras escalavradas
pela seca faca solar.
— Isto aqui não é Vitória
nem é Glória do Goitá;
e além da terra, me diga,
que mais sabe trabalhar?
— Sei também tratar de gado,
entre urtigas pastorear:
gado de comer do chão
ou de comer ramas no ar.
— Aqui não é Surubim
nem Limoeiro, oxalá!
mas diga-me, retirante,
que mais fazia por lá?
— Em qualquer das cinco tachas
de um banguê sei cozinhar;
sei cuidar de uma moenda,
de uma casa de purgar.
— Com a vinda das usinas
há poucos engenhos já;
nada mais o retirante
aprendeu a fazer lá?
— Ali ninguém aprendeu
outro ofício, ou aprenderá:
mas o sol, de sol a sol,
bem se aprende a suportar.
— Mas isso então será tudo
em que sabe trabalhar?
vamos, diga, retirante,
outras coisas saberá.
— Deseja mesmo saber
o que eu fazia por lá?
comer quando havia o quê
e, havendo ou não, trabalhar.
— Essa vida por aqui
é coisa familiar;
mas diga-me retirante,
sabe benditos rezar?
sabe cantar excelências,
defuntos encomendar?
sabe tirar ladainhas,
sabe mortos enterrar?
— Já velei muitos defuntos,
na serra é coisa vulgar;
mas nunca aprendi as rezas,
sei somente acompanhar.
— Pois se o compadre soubesse
rezar ou mesmo cantar,
trabalhávamos a meias,
que a freguesia bem dá.
— Agora se me permite
minha vez de perguntar:
como senhora, comadre,
pode manter o seu lar?
— Vou explicar rapidamente,
logo compreenderá:
como aqui a morte é tanta,
vivo de a morte ajudar.
— E ainda se me permite
que volte a perguntar:
é aqui uma profissão
trabalho tão singular?
— É, sim, uma profissão,
e a melhor de quantas há:
sou de toda a região
rezadora titular.
— E ainda se me permite
mais outra vez indagar:
é boa essa profissão
em que a comadre ora está?
— De um raio de muitas léguas
vem gente aqui me chamar;
a verdade é que não pude
queixar-me ainda de azar.
— E se pela última vez
me permite perguntar:
não existe outro trabalho
para mim nesse lugar?
— Como aqui a morte é tanta,
só é possível trabalhar
nessas profissões que fazem
da morte ofício ou bazar.
Imagine que outra gente
de profissão similar,
farmacêuticos, coveiros,
doutor de anel no anular,
remando contra a corrente
da gente que baixa ao mar,
retirantes às avessas,
sobem do mar para cá.
Só os roçados da morte
compensam aqui cultivar,
e cultivá-los é fácil:
simples questão de plantar;
não se precisa de limpa,
de adubar nem de regar;
as estiagens e as pragas
fazem-nos mais prosperar;
e dão lucro imediato;
nem é preciso esperar
pela colheita: recebe-se
na hora mesma de semear.
La música del régimen entona la necesidad del cambio en Cuba
La voz de Silvio Rodríguez es la última de una lista que pide la apertura
MAURICIO VICENT - La Habana - 29/03/2010
Corrió en el mundo artístico e intelectual, entre académicos de izquierda y de centro; repercutió también entre opositores y disconformes y entre los que defienden el sistema socialista desde dentro, pero sin dejar de ser realistas. De nuevo, quedó en evidencia que la necesidad de un cambio en Cuba está en el centro de todos los debates, y que muchos en la isla, seguramente la mayoría, piensan que no debe postergarse.
Lo dicho el viernes por el cantautor Silvio Rodríguez, voz nada sospechosa de mercenaria, tocó el corazón de la parte de la sociedad cubana que desde hace tiempo pide cambios pero sin rupturas dramáticas. Silvio dijo que hay que superar la "erre" de revolución y que el país pide a gritos "evolución". Añadió que es momento de "revisar montones de cosas, montones de conceptos, hasta instituciones".
El compromiso de Rodríguez con la revolución de Fidel Castro es conocido, por eso sus declaraciones han tenido impacto especial en estos instantes, cuando Cuba está en el centro de atención mundial tras la muerte del opositor Orlando Zapata, después de 85 días en huelga de hambre. El trovador, que siempre ha defendido la revolución como un todo -sin dejar de criticar cosas que no le gustan- entró de lleno en la discusión sobre qué hacer para "reinventar" la revolución y que Cuba tenga futuro.
Desde hace años este debate tiene lugar en la isla, tanto en medios académicos como entre determinada gente que es parte del establishment. Otra cosa es que la prensa oficial cubana haya silenciado estas inquietudes, como el propio Silvio Rodríguez lamentaba el viernes.
Pero que no se publiquen las diferencias, no significa que no existan. En páginas digitales de izquierdas como Kaosenlared o Rebelión, los cubanos hacen catarsis y abogan por transformaciones del modelo económico y político desde "posiciones revolucionarias". La mayoría tienen un denominador común: quieren un "nuevo socialismo", no rupturas ni un regreso al pasado capitalista, pero lo quieren ya.
Pablo Milanés, otro músico de fama internacional, desde hace tiempo interviene en este debate con opiniones muy francas. Las últimas, este propio mes, desde España, fueron especialmente directas, al reclamar que su país "avance con ideas y hombres nuevos" y haga "otra revolución", ya que "el sol enorme que nació en el 59" se llenó de manchas al "ponerse viejo".
"Pero Pablo es Pablo y Silvio es Silvio. Los dos han sido voces emblemáticas de la revolución, pero Pablo es muy crítico y Silvio representa el compromiso militante", al decir de un escritor, que se declara indignado porque la prensa oficial no difundió las declaraciones de Rodríguez, ya conocidas en el resto del mundo.
Al presentar su disco Segunda Cita, en presencia del ministro de Cultura, Abel Prieto, el autor de Ojalá pidió ser honestos y no achacar todos los problemas de Cuba al "bloqueo norteamericano", uno de los argumentos de la ortodoxia para justificar todas las intolerancias. "Hay responsabilidad en parte por el hostigamiento sufrido", dijo, "pero no podemos echarle toda la culpa a ellos porque es mentira". "Nosotros sabemos que tenemos culpa también y creo que vamos a ser mejores y vamos a ser más grandes si lo reconocemos y las enfrentamos sin miedo".
Por supuesto, ni una coma de esto en la prensa o en la televisión cubana, pero aún así el debate dentro del sistema se aviva.
El director de la revista católica Palabra Nueva, Orlando Márquez, escribía en su último número que es la "hora del consenso y puesta en común, de cambios graduales y no de continuidad, de escucha mutua y soluciones compartidas". Y añadía: "El momento es ahora, porque es mejor actuar y equivocarse a tiempo, que tener la respuesta perfecta cuando sea demasiado tarde". Un buen resumen y una frase con la que deberían estar de acuerdo católicos, izquierdistas, exiliados, disidentes y comunistas.