segunda-feira, 14 de julho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Reação ao tarifaço deve proteger soberania e economia brasileiras

Valor Econômico

A resposta à agressão do presidente Trump deve, na medida do possível, sempre resguardando a nossa soberania, ser calibrada de forma a preservar nossas cadeias de valor

O Brasil é uma economia fechada, e nossas exportações para os Estados Unidos representam menos de 2% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas não há  engano: o conflito tarifário desencadeado pelo presidente Donald Trump pode ter repercussões negativas de curto, médio e longo prazos sobre nossa economia.

Por isso, as negociações e eventuais medidas de reciprocidade adotadas pelo Brasil devem ser, ao mesmo tempo, firmes na defesa da soberania nacional, diante da inaceitável carta do presidente dos EUA, Donald Trump, e inteligentes  para resguardar os interesses econômicos do país.

Reportagem publicada pelo Valor nesta sexta (11/7) mostra como, a essa altura, é difícil avaliar o prejuízo potencial ao Brasil. Do ponto de vista macroeconômico, as estimativas dos especialistas são muito amplas. De um lado,  indicam uma perda, em termos de crescimento do PIB, de até 0,3% em 2025 e de até 0,5% em 2026. De outro,  apontam  impacto mais moderado, de 0,05% do PIB em 2026.

STF: Barroso divulga carta sobre tarifaço de Trump e faz defesa da democracia

Guilherme Pimenta / Valor Econômico

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, divulgou uma carta na noite deste domingo sobre o tarifaço imposto pelo presidente Donald Trump ao Brasil, ao fazer uma longa defesa da democracia brasileira e do Poder Judiciário. Segundo ele, as sanções impostas "por um tradicional parceiro comercial" foram "fundadas em compreensão imprecisa dos fatos ocorridos no país nos últimos anos".

O republicano, ao anunciar a tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros importados pelos Estados Unidos, afirmou que o Brasil faz uma "caça às bruxas" ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que é réu no Supremo, acusado de tentativa de golpe de estado em 2022, quando perdeu as eleições para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O presidente americano também criticou decisões do Judiciário brasileiro contra big techs. Barroso afirma no início do documento que "cabia ao Executivo e, particularmente, à Diplomacia – não ao Judiciário – conduzir as respostas políticas imediatas, ainda no calor dos acontecimentos".

Passada a reação inicial, pontuou, "considero de meu dever, como chefe do Poder Judiciário, proceder à reconstituição serena dos fatos relevantes da história recente do Brasil e, sobretudo, da atuação do Supremo Tribunal Federal".

O fim dos honorários e o ajuste fiscal sem impostos - Bruno Carazza

Valor Econômico

Advogados públicos têm a receber fundo bilionário da União, e o fazem sem nenhuma transparência

Desde que a discussão sobre os supersalários ganhou manchetes e editorais na imprensa brasileira, muito se tem criticado juízes e membros do Ministério Público por estarem recebendo centenas de milhares de reais a mais do que estabelece a Constituição. Mas eles não estão sós.

Existem outras categorias que também burlam as regras constitucionais e estão ganhando tanto que chegam a provocar inveja dos togados do sistema judiciário.

Depois de uma intensa campanha de lobby, os advogados públicos conseguiram inserir no novo Código de Processo Civil (CPC) um dispositivo que lhes garantem, além do pagamento da remuneração básica, também honorários de sucumbência - uma verba paga pela parte derrotada numa ação judicial, até então restrita aos advogados privados.

BC precisa de socorro para lutar contra as fraudes - Alex Ribeiro

Valor Econômico

A realidade preocupante é que faltam ao Banco Central funcionários em número suficiente e o dinheiro necessário para investir em tecnologia, o que deixa o sistema vulnerável e sob risco de gerar crises bancárias

O delegado de crimes cibernéticos da Polícia Civil de São Paulo, Paulo Barbosa, disse ao repórter do Valor Álvaro Campos que algumas das fintechs envolvidas na fraude que permitiu o roubo de dinheiro em contas de reservas bancárias, que já chega a mais de R$ 1 bilhão, estão em nomes de laranjas, com os reais donos vivendo em outros países.

Isso significa que o Banco Central terá que fazer um saneamento nas instituições de pagamento que fazem parte do ecossistema do Pix, retirando de circulação aquelas que agiram diretamente em práticas criminosas ou que foram negligentes na aplicação dos controles legais.

Mais: será preciso uma revisão completa na regulação de pagamentos, que criou os incentivos errados ao privilegiar a competição em detrimento da segurança do sistema, abrindo flancos.

As lições do tarifaço - Diogo Schelp

O Estado de S. Paulo

Tarcísio demorou para entender o significado da medida de Trump e de suas motivações

Sempre existiu incompatibilidade entre a pretensão de se mostrar um gestor pragmático e o papel de fiel escudeiro de Jair Bolsonaro, mas Tarcísio de Freitas costumava agir como se fosse possível conciliar as duas coisas. Até que, na semana passada, a realidade cobrou o seu preço.

O “gestor pragmático” descobriu — surpresa! — que as empresas, os agropecuaristas e os trabalhadores de São Paulo, o Estado que ele tem a responsabilidade de governar, serão os mais afetados pelo tarifaço de Donald Trump, a punição coletiva aos brasileiros pela qual a família do seu padrinho vinha trabalhando ativamente.

Sanções para o Brasil “de Lula”, esse era o desejo declarado dos Bolsonaro, a ponto de um deles ter se instalado nos Estados Unidos para realizá-lo.

Trump e o Brasil - Denis Lerrer Rosenfield

O Estado de S. Paulo

O País não pode se curvar a tais mandamentos, seja por dignidade nacional, seja por suas próprias instituições

Agem os Estados politicamente em relação aos outros países, defendendo seus interesses econômicos, seus privilégios e suas posições geopolíticas, seja por meios diplomáticos, seja pela força militar. Não há anjos nesse meio, mas utilizando uma fórmula de Maquiavel, são centauros, metade homens, metade bestas, isto é, entidades racionais e selvagens, fazendo uso da força quando melhor lhes aprouver. Devem, portanto, medir suas palavras – que são modos da ação –, pois delas produzem consequências que podem ou não ser desejáveis. Seguem preceitos de ação que lhes assegurem posições estratégicas, que lhes parecem como defensáveis. Discursos mal colocados e narrativas ideológicas certamente suscitarão reações, frente às quais cada Estado deverá saber como agir. Se não o souber, será refém de suas impropriedades.

Três vias para fazer Trump recuar - Oliver Stuenkel

O Estado de S. Paulo

Incerteza decorrente da ameaça tarifária enfraquece presença americana no Brasil e fortalece a chinesa

A ameaça tarifária de Donald Trump representa o maior desafio da política externa do Brasil desde que Lula voltou ao poder. Tem o potencial de abalar a economia brasileira e a relação bilateral com os EUA, principal fonte de investimento estrangeiro direto no País.

Três fatores complicam qualquer possível resolução. Em primeiro lugar, duas demandas-chave da carta publicada por Trump, escrita em tom altamente ofensivo, não estão sujeitas a negociação com governos estrangeiros e não têm a mínima chance de avançar. Afinal, tanto o julgamento de Bolsonaro quanto os processos contra as plataformas digitais são decisões do Judiciário brasileiro. É impossível saber se assessores de Trump o alertaram de que, no Brasil, o presidente não controla o Judiciário. De qualquer forma, a ênfase na política interna brasileira reflete o estado precário da relação entre as administrações Trump e Lula.

O que aprender com as meninas do Texas – Fernando Gabeira

O Globo

Economia de fato é investir na prevenção. Perdas humanas e a destruição material são um preço muito mais alto

Escrevo sobre o que me impressiona e confesso que não consegui tirar da cabeça essa história das 27 meninas e monitoras que morreram no Rio Guadalupe, no Texas. As enchentes mataram mais de 120 pessoas. As meninas estavam num acampamento, algumas talvez tenham feito sua primeira viagem na vida. Os celulares estavam guardados para que interagissem melhor entre elas e com a natureza. Muitas devem ter morrido sem saber exatamente o que acontecia.

Parece que o Guadalupe enche muito rápido com as tempestades. Um sistema de alarme mais sofisticado poderia ter salvado mais gente. Leio nos jornais americanos que ele foi discutido, mas descartado por economia. Leio também que Trump fez inúmeros cortes de pessoal no serviço de meteorologia. Coisas que não compreendo: como economizar em sistemas de alarme no auge das mudanças climáticas? Como cortar pessoal da meteorologia? Como negar o aquecimento global num país com tanto acesso a informação de qualidade?

Vermelho de ódio – Miguel de Almeida

O Globo

Não lembro ao certo, mas acho que aprendi sobre ódio com Lula. Sob seus discursos, exercitei minha raiva contra o PSDB, contra o ex-presidente Fernando Henrique e vi o Brasil cindido em dois na grotesca oposição Nordeste x Sudeste. Com olhos ensandecidos, ouvi sobre a herança maldita dos tucanos.

Enfim, não sei se agradeço, mas Lula me instruiu no ódio. Não nasci assim, era apenas um rapaz que amava Noel Rosa e Tom Jobim. Com ele, tudo mudou: o ódio passou a ser valor moral. Meu pote de amargura agora é abastecido pela campanha de pobres x ricos. Consumo os posts, os vídeos do “BBB” e reenergizo o coração de negatividade com as mensagens assopradas pelo guru Sidônio. Infelizmente, não fui avisado pela galera do MST para invadir a sede do Itaú-BBA — embora, naquela hora, eu estivesse com o trabalho em atraso.

Uma aposta ruim - Irapuã Santana

O Globo

Tudo bem que o brasileiro gosta de fazer uma fezinha. Mas recentemente o país registrou salto muito além do histórico nas apostas

Um novo estudo surgiu sobre o desastre que tem ocorrido no Brasil em relação às bets: muita gente tem deixado de estudar por causa do vício em apostas esportivas on-line. Dos apostadores entrevistados na pesquisa O Impacto das Bets 2, da Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior, 34% dizem que precisarão parar de apostar para entrar na faculdade.

Ainda é cedo para servir o café frio a Lula - Lara Mesquita

Folha de S. Paulo

Faltando mais de um ano para a eleição, ninguém deveria se arriscar a vaticinar seu desfecho

Nas últimas semanas, tornou-se comum encontrar articulistas anunciando o fim da era Lula (PT).

Matérias sobre desempenho do governo na aprovação de sua agenda legislativa e sobre as disputas em torno do Orçamento da União corroboraram essa leitura, sugerindo que a carreira eleitoral do presidente estava próxima do fim, que Lula não teria chances de reeleição e, por isso, já seria tratado com certa desconsideração na corte política de Brasília. Chegou-se a dizer que o café do presidente já era servido frio.

Não sei se é ansiedade ou se, nesses casos, fala mais alto a simples aversão ao governo, mas a experiência e a prudência indicam que, faltando mais de um ano para a eleição presidencial, ninguém deveria se arriscar a vaticinar seu desfecho.

'Graças a Deus, o presidente é fraco!' - Marcus André Melo

Folha de S. Paulo

Para parlamentar que não é parte da base, o principal problema da democracia é o poder excessivo dos presidentes

Consistente com minha expectativa, a insatisfação com a democracia, entre eleitores, no Brasil subiu 5 pontos percentuais de um ano para cá (passou de 54% para 59% na nova pesquisa Pew). De 2023 para 2024, a insatisfação havia diminuído. Estamos abaixo de EUA (62%), França (66%), Espanha (69%) e Itália (67%) e acima de Alemanha (39%) e Suécia (25%). As evidências confirmam a importância do hiato vencedores x perdedores (o eleitorado que apoia o incumbente melhora sua avaliação, e vice-versa). Os dados para o Brasil não estão disponíveis, mas em 2024 o hiato era de 25%.

O verdadeiro inimigo do Brasil é a polarização - Lygia Maria

Folha de S. Paulo

Petistas e bolsonaristas tensionam o campo político e desviam o foco dos reais problemas do país com suas peripécias quixotescas

A política brasileira virou a paródia de um romance de cavalaria. Petistas e bolsonaristas se enfrentam a partir da criação de inimigos e paixões imaginárias. São como Dom Quixote, que luta contra moinhos de vento e vê numa camponesa rude, sem nenhum afeto por ele, sua amada e nobre dama Dulcinéia.

Por óbvio, o jogo do poder envolve embates entre opostos, mas a natureza fantasiosa dos objetos em disputa e a incitação ao medo tensionam ainda mais o campo político, desviam o foco dos verdadeiros problemas do país e implicam graves desvios éticos.

A Democracia, os Três Poderes e a Sociedade - Ricardo Marinho*

A crispação inesperada envolvendo Decretos do Poder Executivo (12.499, 12.467 e 12.466) e Decreto Legislativo (176) do Poder Legislativo (Congresso Nacional) pode ter muitas causas imediatas, mas elas não explicam completamente o desastre. Nenhuma dessas medidas possui qualquer condão carismático, como costuma ser dito de forma descuidada. Max Weber (1864-1920) nos ensinou que existem diferentes tipos de carisma. Em tempos de dificuldades para a razão democrática e de ascensão do populismo (como nos recordou a pouco Pierre Rosanvallon estaríamos no seu século), onde as decisões de voto tendem a ser moldadas muito mais por emoções, identificação e proximidade empática (positiva e/ou negativa), as medidas em tela clamam possuir essas adjetivações, juntamente com a liderança, a inteligência e o caráter para aspirar ser a liderança que as adotou em prol do Brasil.

Casta Intocável - Manfredo Oliveira*

O Povo (CE)

A desigualdade persistirá enquanto deixarmos de taxar, adequadamente, o topo da pirâmide subtributada

O anúncio da elevação do Imposto sobre Operações Financeiras foi acompanhado por protestos generalizados e por acusações de que a única preocupação do governo atual é aumentar os tributos. Isso já é costume no Brasil e, como afirma M. Solano, escancara um fato extremamente preocupante: o setor financeiro e alguns segmentos da elite de nosso país continuam a exigir que sejam tratados como uma "casta intocável".

Nossa situação tributária é uma das piores do mundo: enquanto a maioria da população paga impostos, regressivamente, sobre consumo e renda, o grande capital e as operações financeiras, de altíssimo valor, gozam de privilégios escandalosos. Procura-se, através da mídia, convencer a população de que se trata de uma tentativa, por parte do governo, de cobrir gastos descontrolados e de interesses políticos em função das eleições do próximo ano_ mentiras propagadas, justamente, pelos setores interessados em manter seus benefícios. Escondem da população que se trata, acima de tudo, de um problema ético gravíssimo: problema da Justiça Tributária.

Poesia | Carlos Pena Filho - Circuito da Poesia do Recife

 

Música | Carlos Lyra - Sabe você? com Miúcha

 

domingo, 13 de julho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Corrupção com emendas corrói Orçamento

O Globo

Estão em curso no Supremo 80 investigações para apurar suspeitas de desvio de recursos por parlamentares

A explosão das emendas parlamentares nos últimos anos veio acompanhada de uma consequência nefasta: investigações e denúncias de corrupção. Há cerca de 80 inquéritos e procedimentos em curso com o objetivo de apurar suspeitas de desvio das emendas, conduzidos sob sigilo por nove ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) — pois os parlamentares desfrutam a prerrogativa de ser julgados lá.

A dimensão do escândalo é proporcional às cifras distribuídas pelo Parlamento, em patamar inédito entre as democracias. Em 2015, as emendas somavam R$ 5,4 bilhões (em valores atualizados). De 2019 a 2025, saltaram de R$ 18,5 bilhões para R$ 50,4 bilhões, mais de 170%. Em participação na Receita Líquida da União, cresceram de menos de 1% para cerca de 2,5%, aumentando mais que a arrecadação.

O fortalecimento do Congresso como definidor de despesas já seria problemático pelas distorções intrínsecas (ganham o dinheiro localidades com melhor relacionamento no Congresso, não as que mais precisam). Torna-se ainda mais preocupante com as evidências crescentes de que recursos têm sido desviados ao caixa dois de campanhas eleitorais. Degrada-se, assim, a qualidade da democracia.

Governadores aliados de Bolsonaro são os mais prejudicados pelo tarifaço - Luiz Carlos Azedo

Correio Braziliense

A crise diplomática e comercial entre o Brasil e os EUA alimenta a polarização entre Lula e o ex-presidente, porém, agora, com a balança pendendo a favor do governo e contra a oposição

A decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor tarifas de 50% sobre produtos brasileiros é uma sanção política sem precedentes, que viola não apenas as regras do jogo do comércio mundial, mas também as leis norte-americanas, como apontou o prêmio Nobel Paul Krugman. Politicamente, está sendo um tiro pela culatra, porque desestabiliza e divide internamente as forças de direita e prejudica sobretudo a economia dos principais estados governados por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Mais do que uma represália econômica, houve uma intervenção explícita na política interna do Brasil, conforme admitido na própria carta do republicano ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao condicionar a suspensão das tarifas ao arquivamento dos processos contra o ex-presidente Jair Bolsonaro.

Justiça tributária na hora do debate - Míriam Leitão

O Globo

Cobrar mais de quem ganha mais não é dividir o país, mas sim elevar a justiça tributária e a qualidade da democracia

Em um país profunda e historicamente desigual é um bálsamo ouvir no discurso do cineasta Walter Salles que a democracia exige justiça, e parte desse objetivo se atinge buscando a justiça tributária. Houve uma distorção deste debate recentemente. O tema foi tratado como, se de um lado, houvesse um Congresso virtuoso, a favor de todos os contribuintes e, do outro lado, a sanha de um governo cobrador de impostos de todos os cidadãos. Cobrar mais impostos de quem tem renda maior não é dividir o país.

Os fatos estão bem distantes das mistificações feitas na guerra política. É preciso ter sempre em mente que o peso dos impostos é distribuído desigualmente no Brasil e de forma meio anárquica. Os grupos de interesses conquistaram ao longo do tempo o direito de que setores, áreas, produtos, aplicações, atividades pagassem menos impostos do que a maior parte da sociedade. Os pesos da carga tributária são mal distribuídos.

Patriotas contra a pátria - Bernardo Mello Franco

O Globo

Governador usou tarifaço de Trump como pretexto para viabilizar ida de aliado para os EUA, mas ministros da Corte não nasceram ontem

Na quarta-feira, Donald Trump anunciou uma sobretaxa de 50% sobre produtos do Brasil. Em nota lida nas redes sociais, Eduardo Bolsonaro agradeceu e comemorou. “A carta do presidente dos Estados Unidos apenas confirma o sucesso na transmissão daquilo que viemos apresentando”, gabou-se.

Eleito por brasileiros, o deputado reivindicou participação numa medida que causará prejuízo e desemprego no país. “Thank you, president Trump”, tuitou, no idioma do Pateta. O Zero Três já havia provado não ter medo do ridículo. No governo do pai, tentou atropelar a diplomacia profissional para ser embaixador em Washington. Questionado sobre as credenciais para o cargo, disse que fez intercâmbio e fritou hambúrgueres “no frio do Maine”.

A roda da sorte - Merval Pereira

O Globo

Abre-se espaço para a famosa terceira via que quebre essa polarização que nos leva a um beco sem saída

Não fossem Trump e Bolsonaro quem são, seriam surpreendentes os erros que cometem, um atrás do outro, na tentativa de evitar a punição deste último, que parece inevitável. Teria também o mesmo fim Trump, mas uma questão de prazo técnico, não de culpabilidade, o livrou da cadeia, pois foi eleito presidente, e com isso suspendeu o processo que pende sobre ele pelo mesmo crime, o de tentativa de golpe para impedir a posse do seu sucessor.

A Justiça brasileira, vejam só, foi mais ágil e mais eficaz que a americana, e Bolsonaro perdeu o direito de se candidatar por outro crime, cometido com a intenção de justificar perante os embaixadores dos principais países do mundo o golpe que se preparava para dar. O timing político-eleitoral não foi favorável a Bolsonaro, pois ele foi condenado à inelegibilidade pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em junho de 2023, enquanto Trump ainda não vencera a eleição americana, o que só veio a acontecer em janeiro de 2025.

Trump sabe o que quer - Elio Gaspari

O Globo

A sanção de 50% contra o Brasil, atingindo todas as exportações nacionais foi geral, ampla e irrestrita

Desde 2005, quando Bush II impôs sanções específicas contra a ditadura venezuelana não se via coisa igual. A sanção de 50% contra o Brasil, atingindo todas as exportações nacionais foi geral, ampla e irrestrita. As primeiras sanções contra a Venezuela foram pontuais, contra pessoas.

carta de Trump tem 496 palavras e as 65 do primeiro parágrafo tratam de Jair Bolsonaro com clareza cristalina: “A forma como o Brasil tem tratado o ex-Presidente Bolsonaro é uma vergonha internacional. Esse julgamento não deveria estar ocorrendo. É uma Caça às Bruxas que deve acabar IMEDIATAMENTE! (Ênfase dele.)”

Segue-se o anúncio e a defesa das sobretaxas. Valendo-se de mais uma realidade paralela, Trump disse que elas compensarão políticas comerciais que “causaram (...) déficits comerciais insustentáveis contra os Estados Unidos. Esse déficit é uma grande ameaça à nossa economia e, de fato, à nossa segurança nacional!”.

Palavras não bastam– Dorrit Harazim

O Globo

Por ora, prosseguem sem trégua as duas guerras que o presidente americano prometera encerrar em 24 horas

Benjamin Netanyahu retornou como queria de sua terceira visita a Donald Trump: de mãos vazias, sem cessar-fogo nem precisar interromper o esmagamento do que resta de vida possível em Gaza. Como mimo de consolação ao anfitrião, entregou-lhe apenas uma estapafúrdia indicação ao Nobel da Paz, honraria que Trump persegue há anos com cobiça obsessiva. É torcer para Trump não conseguir comprar a honraria num futuro distópico, quando integridade pessoal e valores universais tiverem se tornado sucata.

Por ora, prosseguem sem trégua as duas guerras que o presidente americano prometera encerrar em 24 horas. Se alteração houve nestes sete primeiros meses da era Trump 2, foi para pior, tanto na Ucrânia quanto, sobretudo, no inferno a céu aberto de Gaza.

Rendição impossível - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Jogar fora a soberania, a Constituição, a bandeira e os brios nacionais para salvar Bolsonaro?

O que Donald Trump exige, e o clã Bolsonaro defende, despudoradamente, ao vivo e em cores, é que o Brasil se renda à sua chantagem, cale o Supremo Tribunal Federal, rasgue a Constituição e a bandeira verde e amarela e jogue sua soberania no lixo com um único objetivo: livrar o ex-presidente Jair Bolsonaro da cadeia.

Isso já era claro e agora está sendo assumido até pelo senador Flávio Bolsonaro, o mais sensato da família, que diz em entrevistas, com todas as letras, que basta “o Brasil voltar à normalidade” para que Trump recue da taxação de 50% em todos os produtos brasileiros que cheguem nos EUA. O que seria essa “volta à normalidade”? Segundo o senador, na GloboNews, “uma anistia ampla, geral e irrestrita”.

Ambição imperial - Rolf Kuntz

O Estado de S. Paulo

Mais do que uma agressão comercial, a decisão de Trump foi uma tentativa de interferência nas instituições brasileiras

Pode-se duvidar e tomar como piada, mas de fato existe na Câmara dos Deputados uma Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional – sim, Defesa Nacional. Muito bem remunerados pelos cidadãos brasileiros, 23 integrantes dessa comissão aprovaram, nesta semana, moção de “louvor e regozijo” dirigida ao presidente americano Donald Trump. Mais tarde, no mesmo dia, o homenageado assinaria, na Casa Branca, a imposição de uma tarifa de 50% a produtos originários do Brasil.

Crise é oportunidade - Lourival Sant’Anna

O Estado de S. Paulo

Governo brasileiro pode, se quiser, lidar com crise de forma digna, pragmática e profissional

O governo brasileiro pode, se quiser, lidar com a crise deflagrada pela tarifa de 50% de Donald Trump de forma digna, pragmática e profissional, visando os interesses nacionais.

Trump deixou claro, na carta a Lula, sua identificação com o ex-presidente Jair Bolsonaro. Esse aspecto deve ser ignorado pelo governo. Ele não é determinante. Reflete apenas o desejo de Trump de se projetar como líder da direita internacional.

O governo, empresas e a Justiça dos EUA acusam o STF de extrapolar sua jurisdição e prejudicar companhias americanas ao impor a retirada, das redes sociais, de conteúdos considerados ilegais no Brasil.

O STF não pode ceder nisso. Mas, como sugeriu o ex-diretor-geral da OMC Roberto Azevedo, o governo brasileiro pode propor a criação de comissão binacional para discutir a regulação das redes sociais e inteligência artificial. Se Lula convidou um consultor da ditadura chinesa para assistir o Brasil nessa área, não deveria ferir a soberania discutir o tema com os EUA.

O tarifaço, o lobo e o cordeiro – Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Esopo, escravo grego do século 6º antes de Cristo, foi quem escreveu as fábulas e, entre elas, a do Lobo e o Cordeiro, que se aplica ao tarifaço do presidente Trump ao Brasil.

A fábula teve muitas traduções e versões que não se afastam do argumento central. Eis aí. O lobo e o cordeiro encontraram-se num regato, onde foram beber água. Salivando, o lobo disse: “Vou te comer, porque há um ano falaste mal de mim.” O cordeiro respondeu que isso não era possível, porque ainda não tinha um ano de idade. O lobão, então, se apegou a outra narrativa: “Vou te comer porque estás sujando minha água.” “Não é possível, porque estás acima da correnteza e eu abaixo.” Mas o lobão não aceitou as razões do cordeiro e, crau!, o abocanhou.

O desgaste de Tarcísio com ministros do STF após tarifaço de Trump - Bela Megale

O Globo

Os movimentos de Tarcísio de Freitas após o tarifaço contra o Brasil anunciado por Donald Trump não foram bem recebidos por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

O primeiro erro do governador de São Paulo, na avaliação de três magistrados ouvidos pela coluna, foi endossar, no início da semana, uma postagem de Trump de que haveria uma “caça às bruxas”contra Jair Bolsonaro no Brasil. Ao compartilhar a mensagem do presidente americano, Tarcísio escreveu que o ex-presidente “deve ser julgado somente pelo povo brasileiro, durante as eleições”.

A tarifa como chantagem política – Juliana Diniz*

O Povo (CE)

Na prática, o Brasil recebeu uma carta-chantagem de Trump, que condiciona a redução da tarifa imposta à interrupção de um processo judicial em que é réu Jair Bolsonaro, em curso no Supremo Tribunal Federal

O que acontece quando líderes populistas usam a economia como arma política? Donald Trump pode nos demonstrar. Embora o americano venha utilizando seu jogo de tarifas para ameaçar parceiros comerciais há meses, foi a decisão de sobretaxar o Brasil que expôs com mais clareza a falta de racionalidade econômica da política tarifária de Trump. As tarifas não seguem uma lógica econômica, são antes usadas como sanções políticas aplicadas por um presidente imprevisível e irracional.

O caso brasileiro é mais grave também pelo ataque direto à soberania do país. Na prática, o Brasil recebeu uma carta-chantagem, que condiciona a redução da tarifa imposta à interrupção de um processo judicial em que é réu Jair Bolsonaro, em curso no Supremo Tribunal Federal. A condição é uma exigência de rendição. Nenhuma democracia livre pode submeter a autonomia de seu Poder Judiciário aos desejos de uma liderança externa.

Tarcísio rasteja para Trump, rasga fantasia e se queima de todos os lados - Marcos Augusto Gonçalves

Folha de S. Paulo

Reação servil do governador paulista lembra canção de Raul Seixas sobre alugar o país e não funciona nem entre bolsonaristas

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, parece perdido. Dá lições de servilismo diante dos impactos do terrorismo tarifário de Donald Trump a serviço de Jair Bolsonaro e seu séquito golpista. Ao mesmo tempo, vendo a água subir, tenta buscar saídas estapafúrdias.

Como todos sabem, Trump determinou nova taxação de 50% sobre as exportações brasileiras sem nenhuma base econômica ou racional, alegando perseguição judicial ao capitão —alimento para a família do inelegível oferecer pública e descaradamente a soberania do país ao papai do Norte em troca de anistia ao papai enrolado daqui. Bem, só para lembrar, Trump é amigo da ditadura monárquica assassina da Arábia Saudita e brother de Putin.

Jair Bolsonaro organizou novo 8 de Janeiro contra carteira dos brasileiros- Celso Rocha de Barros

Folha S. Paulo

Trump esfrega o que o bolsonarismo sempre foi: um movimento violento, criminoso e que agora se revela como tropa avançada de fascistas estrangeiros mais poderosos

Jair Bolsonaro é o único presidente brasileiro que conseguiu aumentar impostos depois de deixar o cargo. O imposto Bolsonaro é bem maior e bem menos justo do que qualquer coisa proposta por Fernando Haddad e contribui para reduzir o déficit público americano, não o brasileiro.

A turma que destruiu a praça dos Três Poderes agora quer fazer um 8 de Janeiro na sua carteira, leitor.

Desta vez as "Déboras" querem assinar com batom a sua demissão. Ao invés de roubarem a toga do Alexandre de Moraes, querem roubar a mensalidade da escola do seu filho. Ao invés de esfaquearem o quadro do Portinari, querem esfaquear seu plano de saúde. Ao invés de quebrarem o vaso chinês ou o relógio antigo do Planalto, querem quebrar sua empresa.

Crise testa astúcia de Lula – Dora Kramer

Folha de S. Paulo

O governo assume a dianteira, mas pode perder a vantagem se desdenhar da força dos adversários

Até então acuado e sem discurso capaz de atrair o conjunto dos brasileiros, o governo viu na mão estendida involuntariamente por Donald Trump a chance de se reerguer. Precisa agora tratar de aproveitar o benefício e administrar a vantagem.

O presidente Luiz Inácio da Silva (PT) assumiu a dianteira na chamada batalha da comunicação, mas para perder essa condição não custa, caso se deixe levar pela onipotência e cometa a imprudência de menosprezar a capacidade de reação dos adversários. Internos e externos.

Imagem justa e veríssima do Congresso - Muniz Sodré

Folha de S. Paulo

Cada deputado, um Justo Veríssimo de Chico Anysio, embolsa por mês R$ 341.297, e ao pobre eleitor é dado salário mínimo de R$ 1.518

Muito já se escreveu sobre humor, mas nada sobre seu poder antecipatório. Quando Freud diz que se trata de "um dom precioso e raro" (em "O Chiste e suas Relações com o Inconsciente"), adianta que pode ser também álibi para uma verdade que não podia ser expressa. No psiquismo, o inconsciente abre caminho pelo riso, sem o sofrimento dos sintomas, para uma realidade recalcada. Mas antecipar é virtude desconhecida ou deixada de lado.

Oportuno, assim, evocar Justo Veríssimo, personagem do saudoso Chico Anysio nos anos 90, prefiguração hilária de um deputado que abominava desprovidos da sorte, trabalhadores, o povo em geral. "Eu quero que o pobre se exploda!", seu bordão. A criação televisiva ia ao encontro de uma ácida denominação, recorrente na coluna de Stanislaw Ponte Preta (pseudônimo de Sérgio Porto), década de 60: "Depufede".

Poesia | Clarice Lispector - Circuito da Poesia do Recife

 

Música | João Bosco e Orquestra Ouro Preto - De frente pro crime

 

sábado, 12 de julho de 2025

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

É deplorável celebrar tarifas para ganho político

O Globo

Direita brasileira, que brande a bandeira do patriotismo, tem o dever de repudiar a chantagem de Trump

Em entrevista ao Jornal Nacional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva demonstrou sensatez na reação à tarifa de 50% imposta pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, às importações do Brasil, caso não seja suspenso o processo judicial contra o ex-presidente Jair Bolsonaro. Em tom comedido, Lula afirmou que procurará negociar com os americanos, chamará para discussão empresários dos setores afetados, apelará à Organização Mundial do Comércio e, caso nada dê resultado, retaliará. “O Brasil utilizará a Lei da Reciprocidade quando necessário”, afirmou. Uma eventual retaliação, que poderia deflagrar guerra tarifária, deve mesmo ser o último recurso.

Num país polarizado, a chantagem de Trump suscitou uma batalha política que em nada favorece o Brasil. É hora de o país se mostrar unido na defesa da democracia, do Judiciário independente e da soberania. Agiu bem o Congresso ao não hesitar sobre que lado escolher na contenda. Em meio à queda de braço com o Planalto em torno do aumento do IOF, os presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), se disseram “prontos para agir com equilíbrio e firmeza”.

Por que não direto ao ponto? - Bolívar Lamounier

O Estado de S. Paulo

Entra uma legislatura, sai outra, e o nível médio do Legislativo continua deixando a desejar

Sobre o recente aumento do número de deputados, direi apenas o que aprendi na juventude: entre as virtudes de um homem público, vergonha e caráter são tão importantes quanto a cultura.

Em 1985-86, quando fazia parte da Comissão Presidencial Pré-Constituinte (Comissão Afonso Arinos), coube-me elaborar a proposta inicial sobre a Câmara. Propus que se mantivesse simplesmente o número de deputados federais então existente – 420 –, que poderia ser aumentado ao longo do tempo, à medida que a proporcionalidade das bancadas estaduais em relação às relativas populações fosse também ajustada. Já não sendo ingênuo, não imaginei que tal proposta fosse aprovada em Brasília. E o que ocorreu, de fato, foi um incremento par a 513 representantes na Câmara. Quinhentos e treze, vejam só!

Estratégia perigosa - Pablo Ortellado

O Globo

Foi bastante arrojada a estratégia de Eduardo Bolsonaro de fazer gestões junto ao Partido Republicano e à Casa Branca para conseguir que os Estados Unidos interviessem na política brasileira e reequilibrassem o jogo de poder institucional, que hoje parece desfavorável aos bolsonaristas.

Quando os frutos desse trabalho se expressaram na forma não de sanções individuais contra ministros do Supremo, mas de duríssimas tarifas contra os produtos brasileiros, os bolsonaristas se viram com um problema: a reação americana não atingia apenas os atores que prejudicam a direita, mas um número grande de empresários e trabalhadores brasileiros.

As razões do tarifaço – Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

Trump mirou Lula por declarações mais duras nos encontros do Brics contra o império do dólar, dizem jornal e site

O presidente Donald Trump já manifestou seu desconforto com o Brics e, sobretudo, com a proposta do grupo de usar moedas locais — e não o dólar — em suas transações comerciais. Quando o Brics estava reunido no Rio de Janeiro, ameaçou aplicar tarifas de 10% sobre os países que de algum modo desafiassem a posição do “poderoso dólar”. Na última quarta-feira, a ameaça se concretizou, mas só contra o Brasil. Ele impôs uma tarifa absurda de 50% sobre todas as exportações brasileiras aos Estados Unidos, aplicada a partir de 1º de agosto.

Por que a sanção não foi imposta, pelo menos não ainda, a outros integrantes do Brics, como China e Índia, as duas maiores economias do grupo?