III. O PARTIDO DE ORGANIZAÇÃO DE MASSA. — Nos decênios que precederam e se seguiram aos fins do século XIX a situação começou a mudar após o desenvolvimento do movimento operário. As transformações econômicas e sociais produzidas pelo processo de industrialização levaram à ribalta política as massas populares cujas reivindicações se expressam inicialmente em movimentos espontâneos de protesto, encontrando depois canais organizativos sempre mais complexos até à criação dos partidos dos trabalhadores. É precisamente com o aparecimento dos partidos socialistas — na Alemanha em 1875, na Itália em 1892, na Inglaterra em 1900 e na França em 1905 — que os partidos assumem conotações completamente novas: um séquito de massa, uma organização difusa, e estável com um corpo de funcionários pagos especialmente para desenvolver uma atividade política e um programa político-sistemático.
Estas características correspondiam a exigências específicas dos partidos dos trabalhadores, quer pelos objetivos políticos que se propunham quer pelas condições sociais e econômicas das massas a que se dirigiam. Os movimentos socialistas haviam surgido com o programa de promover um novo modo de convivência civil, de que seriam artífices as classes subalternas política e socialmente emancipadas. Para tal fim, era necessário educar as massas, torná-las politicamente ativas e conscientes do próprio papel. Para fazer isto não era suficiente uma genérica agitação política por ocasião das eleições nem tinha grande importância a atividade parlamentar. Ao contrário, era essencial que no país se desenvolvesse uma estrutura organizativa estável e articulada, capaz de enfrentar uma ação política contínua que envolvesse o maior número possível de trabalhadores e que atingisse toda a esfera de sua vida social, que acolhesse as suas demandas e exigências específicas e as transformasse num programa geral.
Além disso, era necessário que à atividade de educação e propaganda e ao trabalho organizativo se dedicassem, em tempo integral, pessoas qualificadas e especialmente pagas para isto, não sendo possível que os trabalhadores, com pesados horários de trabalho e baixos salários, dedicassem à atividade política mais do que um pouco do seu escasso tempo livre, nem que abandonassem o trabalho para se dedicarem à política a simples título de honra. Havia, enfim, o problema do financiamento do partido: faltando os "Notáveis" que financiassem a atividade e a organização política foi introduzido o sistema das "quotas", isto é, as contribuições periódicas que cada membro devia pagar ao partido. A estrutura que assim se desenvolveu teve uma configuração de tipo piramidal. Na base havia as uniões locais — círculos ou seções — com a finalidade de enquadrar todos os membros do partido pertencentes a um dado espaço territorial (bairro, cidade, país). As seções tinham reuniões periódicas e discutiam os principais problemas políticos e organizacionais do momento. Ocupavam-se da atividade de propaganda e proselitismo e elegiam os próprios órgãos de direção internos e os seus representantes de nível superior no partido. Por sua vez, as seções estavam organizadas a nível de circunscrição eleitoral ou a nível provincial ou regional, em federações, que constituíam os órgãos intermediários do partido com funções prevalentemente de coordenação.
Enfim, a cúpula era constituída pela direção central, eleita pelos delegados enviados pelas seções ao Congresso Nacional que era o órgão máximo de deliberação dentro do partido, o qual estabelecia a linha política a que deviam sujeitar-se todas as instâncias do partido, desde as seções até à direção central. Todas as posições de responsabilidade eram de caráter eletivo e era também função das assembleias do partido escolher os candidatos às eleições. Estes últimos, uma vez eleitos, tinham um mandato imperativo e eram obrigados a uma rígida disciplina de partido na sua atividade parlamentar.
Juntamente com a verdadeira estrutura partidária, os partidos socialistas podiam contar com uma densa rede de organizações econômicas, sociais e culturais, sindicatos, cooperativas, organizações de assistência para os trabalhadores e suas famílias, jornais e tipografias — que agiam como instrumentos de integração social e contribuíam para reforçar a identidade política e os valores que o partido propunha. Tais organizações, de um modo geral, tinham nascido antes do partido e haviam contribuído para sua fundação. Apesar de tudo, o partido se preocupava em reforçá-las e em criar outras novas com o fim de ampliar a própria presença social.
A extensão e a complexidade desta rede organizativa indica como os partidos socialistas, pelo menos nos primeiros decênios de sua história, se preocupavam sobretudo com a mobilização permanente dos seguidores e pela conquista de espaços de influência cada vez mais amplos dentro da sociedade civil, na tentativa de aumentar o espaço e a intensidade da adesão ao seu projeto de gestão da sociedade. O momento eleitoral e a conquista de cadeiras no Parlamento era sobretudo importante para a etapa posterior de marcar presença entre as massas e como instrumento para a própria batalha política posterior, mas não constituía o objetivo principal do partido. Bem pelo contrário, muitas vezes o
Parlamento era considerado com uma certa desconfiança e o grupo parlamentar do partido estava sujeito a uma vigilância particular a fim de que seu comportamento correspondesse à linha política decidida pelos congressos nacionais e mandada respeitar pela direção.
Este modelo, denominado "partido de aparelho" ou "partido de organização de massa", se aplica sobretudo ao partido social-democrático alemão no período da sua linha revolucionária, mas caracteriza, de uma certa maneira, também, os partidos socialistas francês e italiano. Este último, embora contando com uma estrutura organizacional espalhada por quase todo o país e com uma série de organizações de sustentação como são as câmaras de trabalho, as cooperativas e as caixas rurais, tinha laços organizativos verticais mais frágeis e o seu grupo parlamentar era dotado de uma notável autonomia.
Isto devia-se ao fato de que o partido socialista italiano era expressão de setores heterogêneos das classes subalternas, faltava-lhe um forte núcleo operário, estando o desenvolvimento capitalista italiano apenas em seus inícios e por consequência nele coexistiam linhas políticas diversas que impediam a construção de uma "máquina" partidária racionalmente organizada e politicamente homogênea.
Nos primeiros decênios do século XX, o partido socialista italiano acentuou as suas características de partido organizativo de massa, mas, na Itália, o modelo mais completo de tal partido surgirá só depois da Segunda Guerra Mundial com o desenvolvimento do partido comunista.
IV. O PARTIDO ELEITORAL DE MASSA. — A introdução do sufrágio universal ou de um sufrágio muito generalizado, a rápida expansão dos partidos operários nos países em que estes estavam radicados e sua parcial ou total integração no sistema político, estava destinada a produzir mudanças graduais até nos partidos da burguesia. No início, os notáveis não se mostraram muito favoráveis à formação dos partidos de massa. Tinha havido progressiva ampliação da participação nos círculos e nos comitês eleitorais, e tinha-se procurado unificar, a nível nacional, o trabalho eleitoral, e potenciá-lo através da admissão de pessoal político remunerado. Todavia, o medo de ver ameaçada a própria posição de preeminência de uma democratização dos seus partidos ou de ver colocada em discussão a própria concepção da política ou os próprios critérios de gestão do poder produziram nos notáveis uma acentuada hostilidade em relação aos partidos de massa. Além disso, tendo em mãos as principais levas do poder político e podendo contar com a ação do exército e da burocracia, os partidos da burguesia puderam impedir, durante um certo período, a integração política dos partidos dos trabalhadores e neutralizar, portanto, a concorrência no mercado político. Só na Inglaterra, onde o Governo trabalhista foi aceito rapidamente como legítimo aspirante ao poder governativo, o partido conservador iniciou, desde o fim da Primeira Grande Guerra Mundial, a própria transformação em partido com a participação de massa. Na Europa continental, este processo aconteceu, de um modo geral, depois da Segunda Guerra Mundial quando a maior parte dos partidos de comitê foi obrigada a criar um aparelho estável para uma eficaz propaganda, procurando uma clientela de massa e coligações com grupos e associações da sociedade civil capaz de dar ao partido uma base estável de consenso.