quarta-feira, 25 de março de 2009

87 anos depois, o PPS comemora um longa história do PCB-PPS

Roberto Freire discursa durante campanha presidencial de 89.
Assessoria de imprensa do PPS

O Partido Popular Socialista (PPS) comemora, nesta quarta-feira, 87 anos de lutas pelo Brasil. É, sem dúvida, a força política mais resistente na história do país. Nascido no dia 25 de março de 1922, em Niterói, como PC-SBIC (Partido Comunista, Seção Brasileira da Internacional Comunista), mudou seu nome para PPS em seu X Congresso, em São Paulo, no dia 26 de janeiro de 1992. Legenda reconhecida por sua combatividade, atravessou a história política do país sempre lutando pelo direito dos trabalhadores e levantando a bandeira da justiça social. Foi perseguida duramente por isso. Militantes foram presos, torturados e assassinados por ditaduras. Na maior parte de sua história, teve que atuar na clandestinidade.

Nesse período, teve seu principal líder, Luiz Carlos Prestes, duramente perseguido por diversos governos autoritários. O Cavaleiro da Esperança passou anos na cadeia, mas nunca deixou de participar ativamente da vida política brasileira, comandando, mesmo do cárcere, a atuação do partido junto a movimentos populares. No decorrer da história, o PCB teve papel destacado nos principais acontecimentos políticos do país. (Confira mais sobre esse período)

Na década de 80, com a retomada da democracia no Brasil e a consequente legalização da legenda, o processo de renovação interna do partido ganha força. A queda do muro de Berlim, em 1989, e a derrocada do "socialismo real" no Leste europeu reforçam essa necessidade. Nesse período, o ainda PCB lançou pela primeira vez candidato próprio a presidente da República, nas primeiras eleições diretas após o fim da ditadura militar. Roberto Freire, presidente do partido, percorreu o país numa campanha histórica para os comunistas.

Em 1992 a mudança se concretiza. Freire, então presidente do PCB, convoca o X Congresso que altera o nome e a sigla de Partido Comunista Brasileiro - PCB para Partido Popular Socialista - PPS (leia o Manifesto de Fundação do PPS). O PCB se torna então o primeiro PC no continente a mudar radicalmente sua política, sua estrutura orgânica e sua simbologia.

De lá para cá, o PPS lançou mais duas vezes candidato próprio a presidente da República. O ex-governador do Ceará e atual deputado Ciro Gomes, que deixou a legenda em 2005, concorreu como candidato a presidente pelo PPS em 1998 e 2002. Em 2006, o partido apoiou a candidatura de Geraldo Alckmin (PSDB). Para 2010, o meta do PPS já está definida: integrar o bloco de oposição junto com PSDB e DEM e outras forças democráticas para enfrentar o candidato apoiado pelo presidente Lula e conquistar a Presidência da República.

O governo dos cupins

EDITORIAL
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acaba de acrescentar ao léxico político nacional um expressivo neologismo: cupinização. O termo é adequado para designar, como ele fez, as consequências do aparelhamento do Estado nacional sob o governo Lula. Aparelhamento, como se sabe, é uma modalidade do tradicional loteamento dos cargos estratégicos da administração pública pelos partidos (e caciques) que integram a fronda governante. A versão original combina uma forma de pagamento pelo ingresso das legendas no esquema de poder, com o incentivo, na mesma moeda, para a atração de novos parceiros, cujos votos no Congresso são caros - no duplo sentido da palavra - ao presidente da República. É a clássica fisiologia, aparentemente inseparável do presidencialismo de coalizão brasileiro. Já o aparelhamento é a ocupação do Estado pelo apparat do partido dominante - que, no caso específico do PT, se entrelaça com o baronato do sindicalismo, formando uma crosta na hierarquia federal.

Embora não haja separação estanque entre as duas coisas, a fisiologia é o portal por onde passam os recursos públicos desviados para os partidos, os clãs que os lideram e os interesses privados que a eles se agregam para manter relações de mútua conveniência. A rede se sustenta em dois pontos. Primeiro, na capacidade do donatário mais graduado na estrutura administrativa, nas estatais e nos fundos de pensão de distribuir à patota outros empregos valiosos, ampliando o círculo de lealdades ao seu redor. Segundo, no capital - de novo em duplo sentido - que isso lhe permite acumular para se sair bem na conquista de mandatos eletivos, do que ele depende para tudo mais. O aparelhamento, por sua vez, corrompe o governo de uma forma quem sabe ainda mais profunda, ao colocá-lo a serviço de uma ideologia e da ambição do partido que a encarna de nele se perpetuar, além, naturalmente, de consolidar, sob o teto do Estado, os laços entre as elites dirigentes e as dos setores sociais afins - no caso, a cúpula das burocracias sindicais.

O resultado é a silenciosa erosão interna da área estatal e da presumível aptidão de seus ocupantes para desempenhar as funções que as leis lhes conferem e a sociedade dela tem o direito de esperar em troca de seus impostos. É assim que "a substituição de técnicos por militantes vai minando a estrutura pública", argumenta Fernando Henrique para justificar a analogia com a deterioração das estruturas físicas pela ação do cupim. Isso por certo não ocorre da noite para o dia, mas a cupinização produz outro efeito, este sim imediato e visível a olho nu na era Lula: a desintegração da competência potencial do Estado. As peças dessa engrenagem se encaixam com naturalidade. De um lado, é o nexo entre aparelhamento e perda acentuada da capacidade de gestão da máquina, ainda mais com a conhecida inapetência de quem deveria conduzi-la para assegurar que os seus programas, quando exequíveis, se transformem em fatos, com um custo mínimo em tempo e dinheiro. De outro lado, o nexo entre o aparelhamento e a degradação da política.

Quando o partido que elege o presidente e se apropria do Estado não é hegemônico no sistema político, como é o caso do PT, que nem sequer tem as maiores bancadas na Câmara ou no Senado, a contrapartida do aparelhamento bem-sucedido é o acumpliciamento com a fisiologia no Executivo - a partilha dos despojos do poder - e com as piores práticas no Legislativo. A clique que desmanda no Senado, por exemplo, é toda ela lulista; não teria por que não ser, confortável que se encontra nesse ambiente de promiscuidade. E Lula, com a anuência obsequiosa da companheirada, é mais do que omisso: para "amarrar o Congresso" aos seus interesses, aponta Fernando Henrique, mostra-se indulgente com as malfeitorias que desmoralizam a instituição perante a sociedade, "passa a mão na cabeça de quem faz coisa errada". Ele considera "bambo" o sistema de representação e defende uma mudança nas regras eleitorais.

Mas a reengenharia eleitoral provavelmente pouca diferença fará enquanto o presidente da República e o seu partido tiverem da democracia a visão instrumental que os faz se sentir no direito de lotear o Estado e de confraternizar com os expoentes do que a política nacional tem de mais conspurcado.

Ética da conveniência

Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


No exato momento em que o presidente da República sugere ao PT que apresente como candidato ao governo de São Paulo um ex-ministro obrigado a deixar o cargo por impossibilidade de conciliar o comando da economia com a suspeita de crime de mando na quebra do sigilo bancário de um cidadão, o ex-tesoureiro do partido, símbolo do escândalo do mensalão, pede anistia partidária para se candidatar a deputado federal por Goiás.

Luiz Inácio da Silva conta com a absolvição de Antônio Palocci no Supremo Tribunal Federal, leva em consideração os votos recebidos por ele para deputado federal em pleno curso do processo, aposta no sucesso de Palocci na classe média e no trânsito que tem entre o empresariado.

São argumentos pragmáticos. Baseados na convicção de que os fatos se apagam se o STF não encontrar a digital do então ministro no extrato da conta do caseiro Francenildo Costa na Caixa Econômica Federal, exibido para desmoralizá-lo como testemunha de acusação ao ministro numa confusão relativa às suas andanças numa casa de lobby em Brasília.

A cúpula do PT se divide quanto ao pedido de anistia de Delúbio Soares. Há os que concordam com ele, acham a expulsão uma penalidade muito dura, injusta para quem por três anos já pagou os "erros" com o ostracismo.

Mas há os que discordam de uma reintegração, entre eles o presidente Lula, a esquerda do partido e mais o grupo do voto vencido, que sempre defendeu um processo mais rigoroso de revisão de procedimentos, integrado pelo ministro Tarso Genro e o secretário-geral do PT, deputado José Eduardo Cardozo.

Estes têm se mantido calados. Aqueles apresentam seus argumentos. Igualmente pragmáticos, como no caso de Palocci.

Para o presidente, a volta de Delúbio seria um "erro político", uma fonte de problemas para o PT, o governo e a ministra Dilma Rousseff; não por ser chefe da Casa Civil, guardiã da administração, mas por ser alegadamente a candidata à sucessão de Lula em 2010.

O veto à anistia obedece sempre à mesma variante. Um diz que traria à baila uma pauta negativa, o outro pondera que seria um prato cheio para a "direita".

Não se ouve, porém, ninguém defender, senão a ética ou a legalidade, mas o programa do partido, cujos estatutos Delúbio violou.

Segundo o ato de expulsão, o ex-tesoureiro cometeu "infração grave às disposições legais e estatutárias" e "inobservância grave dos princípios partidários".

Tanto na visão dos defensores quanto na percepção dos detratores da anistia, o pragmático se sobrepõe ao programático.

Não há, pois, dilema pelo fato de Delúbio Soares ter feito tudo aquilo de que o acusaram para expulsá-lo, nem há reparo na circunstância de um processo em curso no Supremo por corrupção ativa e formação de quadrilha.

Não há desconforto aparente com a existência de outras nove ações contra ele; quatro por improbidade administrativa, uma de iniciativa popular motivada pelo mensalão, outra sob a acusação de participar de esquema de fraudes na compra de remédios no Ministério da Saúde, duas na Justiça de Goiás por abandono de emprego e receber da Secretaria de Educação sem trabalhar e, na derradeira, é acusado por fraudes em empréstimos contraídos junto ao BMG para o PT.

Uma folha corrida e tanto que, no entanto, a julgar pela argumentação dos petistas contrários à sua volta, não teria maior peso caso não fosse um potencial estorvo à campanha do partido nas próximas eleições.

Não é, note-se, o prontuário do cidadão o que constrange, mas o uso que a "direita" poderia fazer dele obrigando o partido a lembrar que seus dirigentes um dia foram acusados pelo procurador-geral da República de montar uma "quadrilha" no aparelho de Estado para financiar partidos aliados.

Há, ainda, a alegação de autoria do secretário de relações internacionais do PT, Valter Pomar.

Segundo ele, Delúbio não merece o perdão porque não "reconheceu seus erros", não se assume culpado.

Quer dizer, se clamasse "errei sim", não representasse um risco de dano eleitoral, não fosse um "contratempo para quem deseja manter o foco no objetivo principal: vencer em 2010", Delúbio estaria zerado, credenciado a entrar no Parlamento depois de sair burocracia partidária pela porta dos fundos.

Perna curta

O PMDB precisa escolher: ou dissemina a versão de que vai se dividir entre a candidatura do PSDB e o nome da preferência do Planalto ou espalha que Michel Temer poderá vir a ser o vice de Dilma Rousseff.

Uma exclui a outra. Se parte ficar com a oposição e parte se aliar ao governo, o PMDB não poderá integrar oficialmente nenhuma chapa, porque isso implica definição formal do partido com certidão registrada na Justiça Eleitoral.

É justo que o PMDB agora atire para todos os lados, a fim de firmar a imagem de parceiro imprescindível. Mas é conveniente também que o faça sem agredir os fatos.

Diálogo com sinais trocados

Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


Nada mais parecido com as declarações de um ex-presidente, especialmente do último, do que os discursos do presidente em exercício, além da metade do mandato, quando as saudades se antecipam ao calendário na amarga temporada da despedida do poder.

Ainda agora, com o tempero da coincidência, mas em cenários diferentes, o presidente Lula e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso trocaram farpas que, com pequenos ajustes, podem ser trocadas sem que o leitor perceba o truque. Não pretendo cair na brincadeira do faz-de-conta. Vou apenas transcrever frases da entrevista de Lula à Rádio Jornal de Pernambuco, quando comparou a crise a uma gripe que "num cabra muito fino, ele fica de cama, num cabra macho ele vai trabalhar e não perde uma hora de serviço". O papo fecha na comparação: "A crise é como uma gripe. Vamos enfrentar esta crise trabalhando".

O ex-presidente FHC deu muitas voltas para chegar ao objetivo, começando por analisar o nosso sistema de representação política que "não representa mais nada". Apenas o introito para as farpas lançadas contra o governo leniente com as denúncias de corrupção, muitas envolvendo o Congresso. Em linha reta: "Como ter democracia se não há respeito pelo Congresso? E como ter respeito ao Congresso se todo o dia a imprensa noticia coisas que não são corretas no Legislativo?".

Lula não conhecia o desabafo de FHC. Mas, a sua resposta parece direta e certeira: "Quando chegar a 2011 vou fazer outro PAC. Nem sei quem vai ser o presidente, mas quero que ele tome posse com uma prateleira de projetos aprovados". E, na mosca: "Vou deixar o Brasil muito mais preparado do que o Brasil que eu recebi".

FHC, como se estivesse com o ouvido colado no rádio devolve a bola, condenando as nomeações políticas para cargos estratégicos, qualificando de "cupins" os militantes que infestam diversas repartições do governo: "Há hoje um partidarismo, uma troca de técnicos por militantes, e o cupim vai minando. Estamos assistindo a uma cupinização do Estado brasileiro". Em recado ao pé do ouvido do seu sucessor: "A máquina tem que ser mais profissional, ela foi muito penetrada nos últimos anos por interesses partidários. Não só de um partido, mas de vários. É a chamada fisiologia".

A desmoralização do Congresso chegou a tal baixeza que já se credenciou como um tema da campanha eleitoral que só deve chegar às manchetes no próximo ano, quando os candidatos do governo e da oposição aprovados pelas convenções partidárias entrarem na briga para valer.

Não deveremos esperar tanto. Afinal, o governo já tem a sua candidata Dilma Rousseff escolhida e indicada pelo presidente Lula. E em plena pré-campanha, mistificada com as viagens semanais a pretexto de acompanhar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC de múltiplas serventias.

A oposição é a responsável pelo freio de mão que empaca a campanha, com o seu drama de indecisão entre dois candidatos que podem compor uma chapa de grande potencial eleitoral, mas que patinam na definição: José Serra e Aécio Neves ou Aécio Neves e José Serra. Se fugir da lógica para a aventura, o provável fracasso eleitoral explodirá a oposição por um longo inverno.

Nos últimos dias, as articulações para encontrar a saída do entendimento se não evoluíram para definições claras, pelo menos amenizaram a tormenta, com a troca de amabilidades e rapapés entre os governadores candidatos José Serra e Aécio Neves.

Não dá para esperar por muito tempo.

O mundo se move

Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


Lula é um bom parceiro para Obama em articulações delicadas, junto a países que veem os Estados Unidos como inimigo, mas têm excelentes relações com o Brasil
O Itamaraty tem bons motivos para comemorar o encontro do presidente Luiz Inácio lula da Silva com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Foi como se a nossa política externa, finalmente, encontrasse um porto seguro depois de navegar tortuosamente por mundo afora. Havia muita afinidade pessoal entre George Bush e o presidente Lula, essa é a verdade, mas os interesses americanos e os nossos estavam balizados por políticas antagônicas. As afinidades pessoais entre Lula e Obama nem de longe se parecem; em contrapartida, a nova política externa dos EUA abre mais espaço ao protagonismo que o Itamaraty buscou conquistar para o Brasil.

Grande irmão

Quando Juscelino Kubitschek assumiu a Presidência da República, o senador Ernani do Amaral Peixoto, grande raposa política, foi escalado para ser o embaixador brasileiro nos Estados Unidos. Artífice da aliança entre pessedistas, trabalhistas e comunistas que levou o fundador de Brasília ao poder, Amaral era um aliado incondicional dos Estados Unidos, pois foi o principal articulador, no Estado Novo, da campanha para o Brasil entrar na guerra contra o Eixo. Gois Monteiro, homem de confiança de Getúlio Vargas no Exército, era simpático à Alemanha. A presença de Amaral em Washington foi uma garantia de que os norte-americanos não apoiariam conspirações golpistas contra JK, apesar da aliança com os comunistas em plena guerra fria. No governo Jango, quando Amaral lançou a candidatura de JK à sucessão de Jango, prevista para 1966, trabalhistas e comunistas torceram o nariz e decidiram apoiar Leonel Brizola, pois julgavam um retrocesso a volta de Juscelino ao poder. Com isso, a conspiração de civis e militares golpistas contra Jango ganhou força, com apoio dos Estados Unidos. Seu desfecho foi o golpe de 1964, ao qual Amaral Peixoto se opôs, há 45 anos.

Desde então, não houve presidente da República no Brasil que não levasse em conta a mão peluda dos Estados Unidos . O único a desafiá-la foi o presidente Ernesto Geisel, no regime militar, ao fazer o acordo nuclear com a Alemanha. O troco veio com sinal trocado, no governo Jimmy Carter, com sua política de direitos humanos, que enfunou as velas da resistência democrática no Brasil. No governo de Fernando Henrique Cardoso, as relações políticas viveram glamourosos momentos, graças à amizade com o presidente Bill Clinton. Quando Lula foi eleito em 2002, a trombada com Bush parecia inevitável, mas os dois se entenderam muito bem, para surpresa geral. Pode-se dizer, em parte graças a isso, que existem duas esquerdas na América Latina; uma radical e antiamericana, representada por Hugo Chávez; outra, moderada, que não vê os Estados Unidos como inimigo, representada por Lula.

Protagonismo

“Obama parece com a gente”, avaliou Lula, exultante, depois de ser o primeiro chefe de estado latino-americano e o terceiro do mundo com o novo presidente dos Estados Unidos. Quem quiser que se iluda, a reunião não foi só importante apenas pelo simbolismo. Não se pode ignorar as contradições entre o Brasil e os EUA, não houve mudança de interesses comerciais. Mas, na política, houve e muita. No plano internacional, com a facilidade de locomoção e a mídia globalizada, a diplomacia presidencial ganha cada vez mais relevância. O encontro fortaleceu o protagonismo do Brasil, dos nossos interesses globais e diferenciados em relação ao restante do continente. A projeção externa do Brasil ganhou muito com convergência “ideológica” entre Lula e Obama, pois a eleição do primeiro presidente negro dos EUA representou uma guinada democrática da maior potência do planeta.

Comércio, energia, meio ambiente , a agenda global não mudou com a crise, mas ganhou dramaticidade. A estabilidade da economia brasileira e o peso regional do Brasil reforçam nosso papel na discussão desses e outros temas. Alguns preocupam os Estados Unidos no nosso continente, como o tráfico de drogas e a estabilidade democrática. A agenda vai das restrições ao etanol brasileiro ao Haiti, da Venezuela à Cuba.

A prioridade de Obama, porém, é outra: tirar seu país do buraco. Por isso, Lula é um bom parceiro em articulações delicadas junto a países que veem os Estados Unidos como inimigo, mas têm excelentes relações com o Brasil. Amanhã, por exemplo, o ministro dos Negócios Estrangeiros do Irã, Manouchehr Mottaki, estará com Lula. Eis uma oportunidade para exercer o novo protagonismo em linha de passe com Obama. O Irã é um grande pepino dos EUA na política internacional.

Populismo

Merval Pereira
DEU EM O GLOBO


O presidente Lula continua na firme disposição de passar otimismo para a população, negando a gravidade da crise econômica, como se essa atitude pudesse mudar as coisas. No mesmo dia em que a pesquisa Focus realizada pelo Banco Central com os agentes econômicos reduzia a expectativa de crescimento do PIB no ano para pouco mais que zero, o presidente fazia uma de suas famosas metáforas, dizendo que "cabra macho" não deixa de trabalhar por causa de uma gripe qualquer.

O problema é que a crise não é uma simples gripe, e o diagnóstico do presidente pode levar o "cabra macho" a não se cuidar adequadamente.

Talvez o presidente Lula imagine que a economia voltará a crescer no segundo semestre, como, aliás, preveem os economistas, e esteja jogando com isso.

Essa parece ser a maldição dos presidentes, e mesmo Barack Obama, que começou o governo disposto a mudar a maneira de fazer política em Washington e teve a coragem de avisar ao eleitorado que a situação "iria piorar antes de melhorar", agora está anunciando, sem que nada indique isso, que já vê uma luz no fim do túnel e que o pior já passou.

Talvez os dois sejam apenas políticos populistas, cada qual a seu modo.

Uma parte da edição de ontem circulou sem a coluna em que registrei minha viagem à Antártica, que motivou o interesse dos leitores como poucos assuntos ultimamente.

Por problemas climáticos, nosso regresso da Estação Comandante Ferraz a Punta Arenas, no Chile, na segunda-feira à noite, foi atrasado, nada que saia da rotina daquela parte do mundo, onde o tempo muda em questão de minutos.

Mas foi uma aventura inesquecível, em que deu para avaliar a dificuldade em que vivem e trabalham os 15 membros permanentes da base brasileira e os pesquisadores de diversas universidades que lá estão, em períodos que podem levar até um ano.

Devido aos ventos fortes foi impossível, num primeiro momento, deslocarmo-nos de helicóptero da base brasileira até a base chilena, a única com pista de pouso e decolagem, onde nos esperava o Hércules da FAB.

Fomos para o navio oceanográfico Ary Rongel, à espera de uma "janela de tempo" para a viagem de helicóptero até a base Presidente Eduardo Frei.

Os ventos fortíssimos, que chegavam a 40 nós, impediam o voo dos helicópteros e faziam com que a temperatura, em torno de 3 graus positivos - afinal, ainda estamos no verão lá - se transformasse numa sensação térmica de 13 graus negativos.

Em compensação, a viagem de navio nos proporcionou assistir a um pôr do sol dos mais belos, o céu cor de rosa contrastando com as imensas geleiras azuis de tão brancas.

É provável que o relato de uma saga brasileira vitoriosa seja mais interessante para a média dos leitores do que os constantes desmazelos de nossa vida política e institucional.

E a história brasileira na Antártica é sem dúvida um exemplo de sucesso, a tal ponto que, ao regressar lá, depois de 20 anos, o almirante de esquadra Álvaro Luiz Pinto, comandante de Operações Navais, caiu no choro feito criança, na sua própria descrição.

Ver de perto a força desse projeto já é emocionante para qualquer brasileiro, e muito mais para quem, como ele, pode comparar a evolução de um programa que a Marinha brasileira coordena desde 1983, quando foi criado o Programa Antártico Brasileiro (Proantar).

O Brasil só ratificou o Tratado da Antártica em 1975, 14 anos depois de vigorar, e a primeira expedição científica foi realizada em 1982-83, no navio de apoio oceanográfico Barão de Teffé. Também o Navio Oceanográfico Prof. Wladimir Besnard, do Instituto Oceanográfico da USP, teve participação de vital importância nas primeiras expedições.

A Estação Comandante Ferraz foi inaugurada no ano seguinte e, da instalação pioneira, com 120 metros quadrados em oito contêineres, surgiu o complexo atual que ocupa 2.300 metros quadrados com nove laboratórios, três de múltiplo emprego e outros dedicados a pesquisas em campos específicos: dois à biologia, um à química, três de ciências da atmosfera.

A comemoração dos 25 anos da estação Comandante Ferraz coincide com o final do quarto ano polar internacional, que teve a participação de 50 mil pesquisadores de todo o mundo, representando 63 países.

Dos 227 projetos conjuntos que estão sendo realizados, dez são coordenados por pesquisadores brasileiros, seis dos quais estão sendo realizados nos laboratórios da estação brasileira.

Além das universidades federais do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul, que citei ontem, também a Universidade Federal Fluminense está patrocinando uma pesquisa, através de seu departamento de geologia, sobre as implicações geológicas e biológicas da separação entre a Antártica e a América do Sul, e de que maneira essa separação afetou o comportamento climático global.

A viagem à Antártica nos permitiu também tomar contato com uma rara história humana de dedicação à profissão e a um projeto.

O personagem dessa história é uma senhora de 85 anos conhecida por todos como Tia Alice, que coordena os serviços de bordo das aeronaves brasileiras desde 1989.

Como aeromoça da Varig, ela foi designada para fazer os voos da FAB para a Antártica como parte da parceria da empresa brasileira no Projeto Antártico.

Ela hoje dá graças a Deus que seu pedido de treinar taifeiros e sargentos da Marinha e da Aeronáutica para o serviço não tenha sido nunca atendido.

Com o fim da Varig e a aposentadoria, Tia Alice continuou fazendo o serviço como voluntária, e é conhecida por todos pelo boné em que prega orgulhosamente um pinguim para cada voo que faz. Já tem mais de 160.

FH diz que corrupção é endêmica, mas que Lula passa a mão na cabeça de corrupto

Tatiana Farah;
DEU NA AGÊNCIA BRASIL / GLOBO ONLINE


SÃO PAULO - Um dia depois de criticar a leniência do governo diante dos casos de corrupção , o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso voltou ao ataque nesta terça-feira e acusou o governo de permitir que "cupins" corroam a política brasileira. Em seminário promovido pela Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio) sobre os 15 anos de Plano Real, FH disse, que a corrupção é "endêmica" nos governos, mas, sem citar o nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acusou o petista de "passar a mão na cabeça" de pessoas corruptas.

- Você reduz a corrupção botando na cadeia quem é corrupto, se não, não tem condição. Não sou vingativo, mas não dá para continuar no país uma situação em que a população toda sente que a lei não é igual para todos e que alguns transgridem a lei e não acontece nada. Pior que às vezes o presidente da República vem à pessoa e diz: "não foi nada". Não dá, é uma questão de valores. Você tem de dar nome aos bois - disse Fernando Henrique a uma plateia formada por empresários, intelectuais e estudantes.

" Pelo menos quem foi preso no meu tempo foi o NicoLau. Talvez seja o único preso até hoje. Até hoje. Então é patético "

Mais tarde, em entrevista coletiva, o ex-presidente admitiu que houvesse casos de corrupção em seu governo, mas voltou a criticar Lula:

- A corrupção é uma coisa endêmica. Tinha no meu (governo), teve nos anteriores. Não tem uma palavra minha de passar a mão na cabeça de corrupto. Nenhuma. Não há um momento em que a alusão à corrupção não tenha acabado em demissão. A diferença é de atitude. Não posso garantir que não tenha havido corrupção. Posso garantir que nunca compactuei com ela. Mesmo pessoa que eventualmente eu pudesse ter alguma relação, se foi acusado, estava afastado. A atitude que é o problema. É muito mais uma questão de conduta. Porque isso tem influência sobre o comportamento dos demais.

Fernando Henrique não quis dar nome às pessoas que, segundo ele, deveriam estar presas por corrupção:

- Eu não preciso nominar ninguém, o Ministério Público nominou vários. Quem tem de cuidar da corrupção é o Ministério Público. Não houve condenação nenhuma. A Justiça é lenta.

O ex-presidente estendeu as críticas ao sistema judiciário:

- E você precisa efetivamente acelerar os processos judiciais. Isso não é um problema deste governo. É um problema do Brasil. Sem dúvida alguma, você tem o sentimento de impunidade. O que garante a continuidade da corrupção é o sentimento de impunidade.

" Graças à sagacidade do presidente Lula, o Brasil está melhor do que estava "


Perguntado se alguém havia sido preso por corrupção durante seu governo, o ex-presidente lembrou-se apenas do juiz federal paulista Nicolau dos Santos Neto, apelidado de Lalau, condenado a 26 anos de prisão pelo desvio de R$ 169,5 milhões.

- Pelo menos quem foi preso no meu tempo foi o NicoLau. Talvez seja o único preso até hoje. Até hoje. Então é patético.

Fernando Henrique ainda ironizou uma crítica feita a ele por Lula, que teria dito que ex-presidente deve ficar calado.

- Ai que saudade do regime militar, em que eu podia falar - brincou o ex-presidente.

Citando Lula diretamente, Fernando Henrique disse que o presidente está dando passos para trás ao não separar interesses partidários do interesse público. E afirmou, mais uma vez, que a máquina pública está cheia de cupins.

Ao ser indagado por um cidadão presente ao evento qual seria o inseticida para combater os cupins que o ex-presidente afirma estarem tomando conta da máquina pública, FH respondeu:

- O inseticida vai depender do voto popular.

A apresentação de Fernando Henrique sobre o Plano Real, que contou com os economistas Pedro Malan e Gustavo Franco, não foi só de críticas a Lula. Depois de chamar o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) de Programa de Aceleração da Comunicação e dizer que o ´programa não tem nem 1% de investimento do Produto Interno Bruto (PIB), afirmou que Lula melhorou o Brasil.

- Graças à sagacidade do presidente Lula, o Brasil está melhor do que estava - disse ele.

Segundo Fernando Henrique, o país vive um momento em que precisa de "grandeza". Nos mesmos moldes em que o presidente americano Barack Obama apresentou-se aos Estados Unidos com o slogan "Yes, we can" (Sim, nós podemos), Fernado Henrique avalia que o Brasil pede algo semelhante.

- O presidente Lula fez isso também (como Obama), e nós com o Plano Real. O Brasil precisa de grandeza. Nós precisamos de um governo que inspire cuidado nas pessoas, que as pessoas sintam que é verdade. E cuidado desde a segurança, até a creche, educação, saúde, emprego. Mas como estou aposentado, é a opinião de quem está de fora.

'Congresso não representa mais nada', diz FH

Na segunda-feira, FH disse que o atual sistema de representação política do país está "bambo" e, por isso, "não representa mais nada".

- Isso é visível, e provoca um efeito de desmoralização extraordinário. Como ter democracia se não há respeito pelo Congresso? E como ter respeito ao Congresso se todo dia a imprensa noticia coisas que não são corretas no Congresso?

Provocado a dizer se na oposição o PSDB ficou sem discurso pelo fato de o governo do presidente Lula ter dado continuidade à política macroeconômica adotada no Plano Real - com os regimes de meta de inflação, câmbio flutuante e meta de superávit primário -, FHC saiu pela tangente.

Enfatizou que a Carta aos Brasileiros, divulgada durante a corrida presidencial de 2002, "foi o ato de penitência do PT, dizendo que não ia fazer nada do que sempre pregou", concluiu.

A crise e as pesquisas

Marcos Coimbra
Sociólogo
DEU NO ESTADO DE MINAS


O que parece mais possível é que o governo continue em queda por algum tempo, pois tendências como as que estamos vendo não se desfazem da noite para o dia

As recentes pesquisas do Ibope e do Datafolha têm muitos resultados interessantes e devem ser objeto de discussão nos meios políticos durante as próximas semanas. Certos números chegam, até, a ser surpreendentes, como os relativos às eleições para governador em alguns estados.

Em uma coisa, no entanto, elas não deveriam ter causado espantos maiores. A queda na avaliação do governo federal é apenas a confirmação de uma mudança antecipada, que todos esperavam que as novas pesquisas constatassem.

Seu primeiro sinal foi dado na pesquisa Sensus de janeiro, onde se via que a aprovação do governo havia parado de crescer. Entre dezembro de 2008 e o início deste ano, os números permanecerem iguais, com 71% e 72% dos entrevistados, respectivamente, dizendo que o governo era “ótimo” ou “bom”.

Para qualquer um dos nossos presidentes modernos, essa seria uma excelente notícia. Para Lula, no entanto, ela continha um presságio preocupante.

A pesquisa registrava o que parecia ser uma mudança de tendência, que contrariava o que tínhamos visto desde o reinício do governo, depois das eleições de 2006. Se ela viesse sozinha, se nada a justificasse na situação do país, aquela estabilidade talvez não quisesse dizer nada. Mas não era esse o caso, pois a piora do cenário econômico, provocada pela crise internacional, a explicava.

Olhando a série histórica do Datafolha, vemos que, entre março de 2007 e março de 2008, a avaliação positiva do governo passou de 48% a 55% e continuou subindo, até alcançar 70% no final de novembro do ano passado. Em outras palavras, nos dois últimos anos, a proporção de pessoas que aprovava de maneira enfática o governo aumentou quase 50%.

Isso foi verdade até janeiro de 2009, quando aconteceu uma interrupção nesse crescimento. Primeiro, a avaliação positiva parou de aumentar e ficou no mesmo lugar, sustentada por uma inércia residual. Depois, de fevereiro para março, conforme indicam essas pesquisas mais recentes, tivemos uma inflexão na trajetória, seguida de uma queda. No Datafolha, a avaliação positiva ficou em 65%, 5 pontos abaixo dos 70% de novembro.

Todas as pesquisas feitas ao longo de 2008 mostraram, também, um fenômeno que se poderia considerar intrigante: enquanto crescia a avaliação positiva do governo, em geral, seu desempenho médio, área por área, teimava em ficar aquém do todo. A nota do governo, considerado em seu conjunto, era maior que a nota média das partes.

A explicação desse paradoxo é que havia algo no ambiente que impulsionava para cima os sentimentos da opinião pública. Algo que não necessariamente decorria dele ou de sua ação, mas que melhorava as percepções da sociedade sobre o país, a economia, o emprego, o desenvolvimento.

Essa satisfação difusa beneficiava o governo, ao fazer com que as pessoas se sentissem bem com ele. Mais favoráveis que quando tinham que pensar de maneira objetiva, julgando suas ações em áreas vitais como a política econômica, a saúde, a educação, a segurança pública.

Lula surfou com competência a boa onda que a economia brasileira viveu nos últimos anos. É arriscado dizer que os indicadores de qualquer presidente, governando em um cenário de crescimento, também melhorariam, mas é provável que sim.

Quando terminou o segundo turno da eleição de 2006, Lula estava grande. Foi muito bom, para ele, que, logo a seguir, o ritmo de crescimento da economia mundial se acelerasse, ajudando o Brasil a crescer com o mundo. Seu governo contribuiu para isso, mas foi igualmente responsável pelo pouco que se fez para que superássemos entraves crônicos para o desenvolvimento sustentável.

O que virá pela frente, ninguém sabe. O que parece mais possível é que o governo continue em queda por algum tempo, pois tendências como as que estamos vendo não se desfazem da noite para o dia. Como Lula tem muita gordura para queimar, pode ser que caia ainda, mas que termine ficando acima de seus antecessores.

Em qualquer hipótese, continuará a ser um ator crucial no jogo da eleição de 2010.

Centro de governo e governabilidade

Rosângela Bittar
DEU NO VALOR ECONÔMICO


A ministra Dilma Rousseff vem adquirindo traquejo político de candidata a presidente da República e encontra-se, no momento, em estágio posterior à figuração em cenas de propaganda preparatórias para a grande campanha eleitoral sucessória. A chefe da Casa Civil já participa de reuniões partidárias, nas quais esboça modelos políticos que está formulando para seu governo, caso seja eleita. Na quinta-feira, 5 de março, convidou para um café da manhã dois integrantes da cúpula do PCdoB, o presidente Renato Rabello e o ministro do Esporte, Orlando Silva. E com eles teve uma conversa abrangente, em que expôs um desenho político e administrativo para o futuro, além das bases sobre as quais traçar um plano econômico.

A ministra combinou manter com eles, e outras direções partidárias, conversa constante, sistemática, uma troca de ideias sobre a montagem e sustentação política de um possível governo. Neste encontro de março, chamou a atenção dos convidados a formulação teórica da ministra sobre a necessidade de se criar um "centro de governo", a ser integrado por determinados partidos que guardem identidade política com a Presidência da República, e uma estruturação da "governabilidade", em que teriam assento outras legendas.

Evidentemente que tudo isto foi acompanhado das devidas ressalvas - "se eu for mesmo candidata", "se eu for eleita"... A ministra usou sua experiência nos dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para se inspirar e fazer aos seus interlocutores uma explanação sobre o modelo que procura. Lembrou que, na primeira eleição, o centro do governo foi formado por um grupo de ministros fortes, importantes, todos do mesmo partido, estrelas, afinados com o projeto do presidente, mas, após 2005, quando houve a crise do mensalão (ela, claro, não pronunciou esta palavra) o centro do governo, onde tinham lugar José Dirceu, Luiz Gushiken, Antonio Palocci, Luiz Dulci, derreteu, deixou de existir.

A partir de então, e durante todo o segundo mandato, até agora, formou-se espontaneamente outro centro, mas absolutamente com espaço exclusivo para o presidente Lula. Sua parceria com a ministra chefe da Casa Civil é inquestionável, ele respeita, confia e é bastante próximo, mas gostou de decidir ouvindo um aqui, outro ali, e determinando em seguida o rumo a seguir.

Dilma Rousseff disse à cúpula do PCdoB que, no caso de uma Presidência da República sem a presença de Lula, será muito importante ter um centro de governo de que participariam os partidos que se identificam com os propósitos, os objetivos mais explícitos do governo, legendas que, elas próprias, tenham identidade política e formem, com o presidente, a força tarefa para comandar o governo. Neste ponto a ministra disse que, pela razão exposta, no centro deveriam estar partidos como o PCdoB e o PSB.

Conceito diferente foi dado à questão da governabilidade que, segundo avaliou, é impossível conquistar sem ter um partido grande, como o PMDB, entre os aliados. Para ser uma política hábil, termo utilizado por Dilma aos seus interlocutores, seria necessário construir uma ampla frente, mas com destaque para o papel do PMDB, dada a sua dimensão, explicou.

Ao expor suas ideias sobre um futuro governo, a ministra deixou claro que administrar o país, ou mesmo enfrentar uma campanha presidencial com possibilidade de êxito, são tarefas impossíveis sem o PMDB. A governabilidade, comentou, depende da ação do centro de governo, mas depende também da capacidade do presidente, de sua habilidade em construir uma frente política mais ampla para governar, em função da heterogeneidade do pais, ensinou.

Nesta reunião a ministra conversava com um partido que, integrante do bloco de esquerda, ainda não tem decisão sobre qual candidatura acompanhar em 2010, pois Ciro Gomes (do aliado PSB) ainda não definiu se será ou não candidato a presidente. Dilma afirmou a Renato Rabello e Orlando Silva seu apreço por Ciro, destacou a contribuição por ele dada ao núcleo do governo Lula, quando ainda existia, na época da crise política mais importante, de 2005, mas não avançou em considerações sobre o cargo de vice-presidente na sua chapa, pelo que se entendeu reservado ao PMDB, ou sobre a expectativa criada por Lula de ter um só candidato a presidente da base aliada, o que os partidos do bloco, Ciro incluído, consideram um erro.

Outro aspecto da agenda deste encontro que chamou a atenção de Renato Rabello foi o empenho da ministra em expressar seu pensamento sobre um projeto econômico, evitando, porém, o futuro muito distante. Falando de agora, Dilma enfatizou a importância de o Brasil crescer pelo menos 2,5% em 2009, o que considera vital para um bom resultado do governo.

Mesmo assim, tem convicção que é uma previsão negativa com relação aos níveis de desenvolvimento que o Brasil vinha apresentando até outubro do ano passado. Mas, hoje, diante da realidade de crise, se for possível evitar cair a zero, ou 1%, e ficar no patamar de 2,5%, será registrado vitória, avaliou.

Por mais básicas que sejam as ideias contidas nesta conversa, a iniciativa é um eloquente flagrante da movimentação política inicial da candidata do PT à sucessão de Lula.

Juros eleitorais

Voltou a ganhar força no governo a antiga conjectura, que novamente assume caráter de informação, sobre a volta de Henrique Meirelles, presidente do BC, à política partidária, para disputar, em 2010, um mandato por Goiás. A decisão ocorreria no final do ciclo de redução dos juros, taxa selic que, se de baixa estatura, se tornará bálsamo às campanhas eleitorais governistas. Desta vez, o destino de Meirelles seria o governo do Estado.

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

No lançamento do Congresso do PPS, oposição mostra união e diz que vai vencer pleito de 2010

Assessoria imprensa do PPS
DEU NO PORTAL DO PPS

O lançamento do XVI Congresso Nacional do PPS, nesta terça-feira, em Brasília, mostrou que a oposição está coesa para a disputa pela presidência da República. Presidentes do PPS, do PSDB e do DEM afirmaram que o país precisa passar por uma mudança profunda e frisaram que estão firmes para a disputa em 2010, mesmo enfrentando um conjuntos de forças governistas que não tem escrúpulos.

"Estamos completamente envolvidos nesse processo de organização das oposições. Tenho certeza que a nossa união e o nosso projeto conjunto nos levará a vitória em 2010", disse o presidente nacional do PPS, ex-senador Roberto Freite, ao abrir o encontro, que contou com a presença do presidente da Câmara dos Deputados, Michel Temer (PMDB-SP); do senador Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE); do presidente do PSBD, senador Sérgio Guerra (PE); do presidente do DEM, Rodrigo Mais (RJ); do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM-DF); o deputado Federal Fernando Gabeira (PV-RJ); do deputado federal Sérgio Petecão (AC); dirigente nacional do PMN; além do secretário geral do PPS, Rubens Bueno; e do líder do PPS na Câmara, Fernando Coruja (SC).

Ao falar sobre o PPS, Sérgio Guerra ressaltou que o partido é um grande parceiro do PSDB e que será de fundamental importância na aliança para as eleições de 2010. Destacou ainda a coragem de Freire na busca pela renovação da política brasileira. "Nunca lhe faltou coragem política", destacou. Disse ainda que a disputa pela Presidência da República não será fácil. "Por isso estamos nos unindo para enfrentar um adversário podereso e que não tem escrúpulos", disse.

Lula e a prática de coronéis

Ao falar sobre a maneira como o Bolsa família é implementado nos bolsões de miséria, o presidente do PSDB afirmou que o governo Lula tem práticas dos velhos coronéis do interior do Nordeste "de forçar o povo, de comprar o povo". "Não se trata de falar mal do programa, até porque não foi o presidente Lula nem o Brasil que inventaram a transferência de renda; mas não há limite par se usar esse instrumento (como moeda eleitoral)".

Da mesma forma que antes os coronéis trocavam água por votos no sertão, disse Guerra, agora se troca o dinheiro. "É uma luta duríssima a que enfrentamos; precisamos de unidade e clareza de propósito para resolver esse problema, porque nosso adversário não tem escrúpulo, não respeita a lei nem a cidadania".

Já o presidente do DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ) afirmou que o atual governo é o mais corrupto da história do Brasil, mas lamentou que as pessoas estejam anestesiadas e não reajam, mesmo às "maiores barbaridades" que vêm sendo feitas durante a crise econômica mundial. "A compra do Banco Votorantim é inaceitável, assim como é escandalosa a compra da Brasil Telecom pela Oi", protestou. "Agora, parece que é o Banco Panamericano, do Sívio Santos, que está na fila para receber ajuda oficial", acrescentou.

Quebra de paradigmas

O governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, ressaltou que o PPS enfrenta, junto com ele, o "grande desafio de quebrar paradigmas e oferecer à população um serviço de saúde eficiente", referindo-se ao fato de o deputado Augusto Carvalho ocupar a Secretaria de Saúde.

Ele destacou ainda que o PPS tem um papel de extrema importância para mudar o conceitos na política brasileira num momento em que há extrema falta de credibilidade do homem público junto a população. "É preciso rever o papel do Estado", disse. Para ele, o PPS dá um grande passo ao propor, em seu XVI Congresso, um amplo debate sobre o país que desejamos, a sociedade que queremos e a política que pretendemos ver aplicada no país. "É preciso uma reforma do Estado para que possamos enfrentar esse mundo do futuro, completou Freire, que lembrou a aniversário de 87 anos do PCB/PPS, que serão completados na quarta-feira (25).

Fortalecimento dos partidos

O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP) defendeu o fortalecimento dos partidos, que representam "parcelas" da sociedade e enalteceu o PPS, que tem uma longa história na política do país. Durante o lançamento do congresso da legenda, ele afirmou também que "se todos os partidos caminharem nessa direção, teremos partidos representando parcelas políticas do país".

Crise

O líder do PPS, Fernando Coruja (SC), afirmou que as pessoas não acreditam que a política possa promover as mudanças necessárias para debelar a crise, mas advertiu que é ela a indutora de dessas transformações. Após ouvir alguns oradores que se confessaram pessimistas, o parlamentar pediu que esse pessimismo seja "ardente, para que produza a busca de fórmulas que solucionem os problemas".

O líder defendeu a unidade das oposições em 2010 para a conquista da vitória e a implementação de um governo democrático e reformista. "Precisamos ter sempre em mente o objetivo de melhorar o mundo, o país; não podemos perder a esperança e acho que vamos sair do nosso congresso mais fortes para buscar as melhores propostas para o Brasil".

O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) salientou que o mundo enfrenta atualmente crises ambiental e econômica, mas também necessita encarar o problema de políticos desacreditados. "Dificilmente a recuperação do político vai se dar em um curto espaço de tempo; com a denúncia dos sangessugas, conseguimos fazer com que um bom número de parlamentares ligados àquele esquema não se reelegesse, mas o Congresso continua ruim", constatou.

Gabeira rechaçou a nova avaliação do presidente Lula sobre a crise econômica. "Primeiro, ele disse que era uma marolinha; agora chama de gripe. Mas essa crise não é uma gripe; é uma pneumonia".

Prévias

O PPS também anunciou que vai realizar prévias para escolher qual será o candidato a ser apoiado pelo partido nas eleições presidenciais de 2010. Os filiados terão três alternativas para votar: os governadores do PSDB José Serra, de São Paulo, e Aécio Neves, de Minas Gerais, e a opção "outros", para aqueles que não concordarem com nenhum dos dois.

A consulta entre os filiados estava prevista para iniciar ainda neste mês, mas em virtude de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sinalizar várias restrições contra a realização de prévias, o partido vai aguardar a decisão final da corte sobre o assunto. "Nós vamos realizar a consulta, até porque consideramos um instrumento democrático, mas vamos aguardar a decisão do TSE sobre o assunto", disse o presidente nacional do PPS, ex-senador Roberto Freire, que não descarta entrar com nova consulta (o PSDB já fez uma) sobre o tema no tribunal.

Congresso

O XVI Congresso, que acontecerá nos dias 7, 8 e 9 de agosto, no Rio de Janeiro, vai discutir a crise econômica mundial, buscando apontar alternativas ao estatismo e ao keynesianismo. "Não podemos buscar nos modelos do passado a resposta para os desafios deste mundo globalizados; é preciso olhar para o futuro", disse Freire. O momento, analisa, é de enfrentar desafios "e não de olhar pelo retrovisor". Na avaliação de Roberto Freire, a política não acompanhou o processo de globalização e agora se dá conta de que é preciso propor soluções. As reformas necessárias para o Brasil, a ampliação e o aprofundamento da democracia e as eleições de 2010 também fazem parte da pauta mínima do Congresso.

Precedem o evento nacional os congressos municipais (entre os dias 26 de março e 10 de maio) e estaduais (de 16 de maio a 14 de junho).

Abertura do Partido

Um eleitor chega no congresso de um partido político e tem espaço garantido para expor suas opiniões sobre os rumos da legenda e até votar para definir qual será o futuro da agremiação. Esse cenário pode até parecer um absurdo para quem está acostumado com as tradicionais estruturas decisórias das forças políticas brasileiras. Mas está começando a mudar.

O PPS deu o primeiro passo nesse sentido. Nos próximos congressos municipais, estaduais e no evento nacional da legenda, centenas de não filiados à legenda terão esse direito. Eles serão “convidados” pelas diversas instâncias de direção. Só não poderão, por enquanto, votar para a escolha de dirigentes. Esses convidados, na visão do partido, poderão, ao participar dos eventos, se tornar novos filiados e até dirigentes.

“Temos que nos preparar para não ser um partido do passado. É preciso implantar desde já a consciência do futuro. Abrir o partido”, diz o presidente nacional do PPS, Roberto Freire. Segundo ele, manter as estruturas atuais é condenar os partidos ao desaparecimento.

“Com isso, vamos abrir as discussões, oxigenar o partido e trazer algo muito concreto: o convite não é apenas para ser candidato. É para discutir política e programa do partido, algo que é muito mais importante porque cria maior relação e compromisso”, justificou o presidente nacional do PPS, Roberto Freire, lembrando que essa experiência foi adotada com sucesso na Conferência Caio Prado Júnior, realizada em 2007.

Reuniões preparatórias

O secretário-geral do PPS, Rubens Bueno, ressalta que, 15 dias antes dos congressos, as direções do partido deverão fazer uma "chamada geral" dos filiados. "Esse encontro é de fundamental importância para que todos conheçam, com antencedência e profundidade, as regras dessas reuniões partidárias. É uma oportunidade para o militante tomar conhecimento dos documentos da pauta mínima elaborada pela direção nacional", frisou.

Ferramentas

A Direção do PPS também criará e colocará à disposição dos filiados um hotsite para facilitar a troca de informações e discussões dos temas que poderão ser levadas ao debate no Congresso Nacional. A Tribuna de Debates funcionará no Portal Nacional, nos sites estaduais, blogs, redes sociais e outros espaços que serão abertos pela legenda e seus filiados.

CALENDÁRIO

Congresso Municipais - Entre 26 de março e 10 de maio.
Congressos Estaduais - Entre 16 de maio e 14 de junho.
XVI Congresso Nacional - Entre 07 e 09 de agosto - Rio de Janeiro.

TSE diz que prévia é legal, mas o que vale é a convenção

Mariângela Gallucci e Luciana Nunes Leal, Brasília
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO


Ministros concluem que consulta a filiados é assunto interno das legendas, no entanto não substitui rito atual

Os ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) concluíram ontem que os partidos políticos têm o direito de realizar prévias para consultar seus filiados sobre os candidatos que devem ser lançados pela legenda. Ao analisar uma consulta feita pelo PSDB, os ministros do TSE afirmaram que esse é um assunto interno dos partidos, que têm autonomia para decidir se querem ou não fazer as prévias.

Apesar disso, o tribunal deixou claro que as prévias não substituem as convenções, nas quais os partidos lançam seus candidatos e que devem ser realizadas até 30 de junho do ano da eleição. "O que se decidir nas prévias não vincula futuro resultado das convenções. São elas que definem os candidatos", resumiu o presidente do TSE, Carlos Ayres Britto. "As prévias não substituem as convenções partidárias."

A conclusão do TSE beneficia a pré-candidatura à Presidência do governador José Serra (PSDB). Serra disputa a candidatura ao Palácio do Planalto com o governador de Minas, Aécio Neves. O mineiro era totalmente a favor da realização de uma consulta ampla.

Como nunca disputou a Presidência, ele é menos conhecido no País do que Serra, que foi candidato ao Planalto em 2002, e lidera todas as pesquisas de intenção de voto realizadas por diferentes institutos.

AUTONOMIA

Os ministros do TSE optaram por não fixar prazos para a realização das prévias. Segundo eles, os partidos têm autonomia para decidir quando querem fazer essas consultas. Mas, durante a discussão, mostram-se preocupados em evitar que essas consultas internas aos filiados permitam a divulgação de uma propaganda eleitoral fora de época.

Por esse motivo, os ministros decidiram proibir os partidos de fazer propaganda das prévias na internet. Segundo eles, se fosse permitida a propaganda aberta na internet, o conteúdo poderia ser facilmente acessado por todo o eleitorado, antecipando a campanha.

Segundo a decisão de ontem do TSE, apenas é permitida a propaganda interna, dirigida aos filiados à legenda, por meio do envio, por exemplo, de e-mails com informações sobre as prévias.

O TSE também decidiu que os eleitores sem filiação estão impedidos de participar das prévias. Caso contrário, ocorreria uma espécie de antecipação da campanha eleitoral. O tribunal também resolveu que o partido pode usar verbas do fundo partidário para o pagamento de gastos com a propaganda interna sobre as prévias e pode receber doações para financiar essa publicidade. A Justiça poderá fornecer as urnas eletrônicas a serem usadas na consulta aos filiados.

DATA

Ontem, o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), afirmou que o partido fará prévias no segundo semestre, se Serra e Aécio não chegarem a um acordo. "Não havendo entendimento de Serra com Aécio e de Aécio com Serra, faremos prévias", declarou o senador.

Guerra participou, na Câmara, da solenidade de abertura dos congressos municipais do PPS, que integra o bloco de oposição, ao lado dos tucanos e do DEM. O presidente do PPS, ex-deputado Roberto Freire, decidiu adiar por enquanto a iniciativa de fazer prévias no partido para escolher entre Aécio e Serra. "Pretendemos fazer, provavelmente em agosto, ao fim do congresso nacional", disse Freire.

De Abreu.e.Lima@edu para Lula@gov

Elio Gaspari
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Como a maioria dos brasileiros, o senhor deve ter se surpreendido quando soube que os venezuelanos queriam dar o nome do general Abreu e Lima à refinaria que a Petrobras constrói em Pernambuco. Pudera, eu morri em 1869, aos 72 anos, e a História do nosso país está mal contada. Melhor dizendo, está bem contada pelos que gostam de esconder os feitos do povo.

Meus inimigos tentaram ridicularizar-me com o apelido de "general das massas". Vi o fuzilamento de meu pai em 1817.

Combati ao lado de Simon Bolívar na guerra pela independência da América Espanhola. Fui de capitão a general e voltei ao Brasil só com algumas condecorações, que acabaram roubadas. Os colegas enricaram.

Minha última batalha deu-se com o bispo do Recife, Dom Cardoso Ayres, que me negou sepultura no cemitério de Santo Amaro. (Outro dia, D. Helder Câmara disse que, por causa da invasão dos protestantes, de vez em quando o Padre Eterno manda para Recife um bispo com parafuso solto.)

Escrevo-lhe esta carta a pedido do Barbosa Lima Sobrinho, que sempre fala bem do senhor.

Por favor, não deixe que meu nome seja associado a uma obra que contraria minha fé no progresso e no gênero humano. A refinaria Abreu e Lima foi projetada para custar R$9 bilhões.

Os fornecedores de obras e equipamentos já estão pedindo R$23 bilhões. Uma unidade de coque foi orçada em R$15 bilhões. Não vale a quinta parte disso.

Felizmente vocês cancelaram essa licitação. Espero que levem adiante a faxina. As grandes empreiteiras engoliram as empresas de engenharia que operavam no setor, juntaram-se e fizeram um cartel, como faziam no Recife os comerciantes portugueses.

Ao contrário do que se presume, não gosto desse coronel Hugo Chávez.

Ele acha que porque escrevi um livrinho intitulado "O Socialismo", eu sou aquilo que vocês denominam de socialista. Isso é coisa de quem fala sem ler. Meu socialismo é a visão de uma sociedade de congraçamento, não é ciência, doutrina, religião, seita ou sistema.

Tenho horror a confisco de propriedades e abomino os comunistas, gente odiosa. Aliás, nunca li nada desse Karl Marx e acho-o um chato, intratável. Aqui ele só tem um amigo, o Luiz Carlos Prestes.

Quando a Petrobras concordou em me homenagear, interessei-me pelos seus assuntos e tenho conversado com o Getulio Vargas, que criou a empresa. É um homem discreto, mas outro dia deixou escapar que estão fazendo coisas tão agressivas e primitivas que lhe parecem ideias do Gregório Fortunato, um negro enorme que sempre o acompanha mas não me parece muito inteligente. Vargas me contou alguns casos de fúria arrecadadora durante a campanha eleitoral em que o senhor se reelegeu.

Assustei-me ao saber de presidente de empresa telefonando para fornecedor e ministro pedindo hora. Já lhe contaram que a Petrobras quer o investimento venezuelano, mas não quer dar ao Chávez uma rede de distribuição? Acho até que faz muito bem, mas o coronel não é bobo, haverá de segurar o dinheiro.

Não falo de seus colaboradores, mas devo chamar sua atenção para o grau de exposição a que estão submetendo nosso governo. Daqui podemos ver a campanha presidencial do ano que vem e, pelo que me recordo das baixezas de 2002, ela vai além.

Como pernambucano e meio xará, subscrevo-me,

José Ignácio de Abreu e Lima

ELIO GASPARI é jornalista.

Raposa Serra do Sol 10 X 1 Arrozeiros

Mercio Gomes
Antropólogo e ex- Presidente da Funai

O dilatado placar em favor da legitimidade da homologação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, dado neste dia de São José, 19 de março de 2009, consagra o respeito que o povo brasileiro sente pelos povos indígenas do Brasil. Não foi um ato espúrio, mas o resultado simbólico de toda a história do indigenismo brasileiro, que vem de José Bonifácio e Rondon, e que conta com o apoio do sentimento nacional mais profundo. Já o disse isso por ocasião do ato de homologação do presidente Lula, aos 15 de abril de 2005, conforme o artigo abaixo.

Saúdo e parabenizo os índios Makuxi, Wapixana, Ingarikó, Taurepang e Patamona por esse evento tão bom e tão auspicioso!

Não poderia estar mais emocionado por isso. Quero homenagear toda a luta que ocorreu para que esse feito acontecesse. A luta dos índios daquela região que, após dois séculos de domínio absoluto dos brancos, estavam tomando pé, de suas vidas, ressurgindo para a história. Agora a história se desenlaça com sua vitória.

Caíram por terra todos os argumentos contrários ao respeito ao ato de homologação do presidente Lula.

Caiu por terra o medo da ameaça à soberania nacional pela terra indígena estar localizada na fronteira com dois países da América do Sul.

Caiu por terra o medo da presença de Ongs e da Igreja Católica e sua influência sobre os índios.

Caiu por terra o argumento de que são poucos os índios para o tamanho da terra.

Caiu por terra o argumento de que os índios não se manteriam isolados pela ausência de arrozeiros em suas terras.

Caiu por terra o argumento de que o Estudo de Identificação feito pela Funai estava viciado em erros formais e substantivos.

Caiu por terra o argumento de que o estado de Roraima iria perder receitas e desenvolvimento econômico.

Caiu por terra o argumento de que os arrozeiros são os modernos bandeirantes que podem tudo e fazem o que querem.

Caiu por terra toda a pressão feita por políticos e ideólogos anti-indigenistas contra a homologação dessa terra indígena.

Os índios do lavrado de Roraima devem se orgulhar de sua história de resistência, muitas vezes calada, nos tempos de dominação, e agora de recuperação e reafirmação de sua dignidade. Reconquistaram sua autonomia pelos seus méritos, mas também pelo ato iniciatório da demarcação feito no governo Fernando Henrique Cardoso, pelo ato homologatório assinado pelo presidente Lula e agora por esse gesto magnânimo do STF, mesmo que após tantas indecisões, idas e voltas, e tantos aperreios por parte dos índios. Mesmo com tantas restrições específicas ao domínio pleno dessa terra indígena, as quais, entretanto, afetarão mais contundentemente outros povos indígenas no presente e no futuro. (Sobre isso escreverei em outra ocasião!)

A vitória dos índios de Raposa Serra do Sol é a vitória dos índios brasileiros, do indigenismo nascido do republicanismo rondoniano, e teve o apoio de muita gente ao longo de mais de 30 anos de lutas. Em sua primeira festa de comemoração, em outubro de 2005, esses nomes foram lembrados.

Agora é preciso muita sabedoria para que a Terra Indígena Raposa Serra do Sol seja a mãe de todos os índios, mesmo daqueles que foram contrários à sua condição de terra exclusiva para os índios.

Os arrozeiros vão se retirados ou serão retirados à força. Não pode haver mais vacilações. O estado de Roraima vai buscar suas próprias fontes de desenvolvimento, mas não mais às custas dos índios. Os políticos vão baixar a crista e aceitar a decisão do STF.

Um novo começo desponta para os índios de Raposa Serra do Sol.

HISTÓRIAS DE PESCADOR


Não é gripe

Panorama Econômico :: Míriam Leitão
DEU EM O GLOBO


O economista José Márcio Camargo acha que o cenário com que parte do mercado trabalha é otimista demais. Pelos cálculos que fez, concluiu que há um grande risco de o desemprego subir muito neste ano e de haver forte queda da demanda, o que levará o Brasil a uma queda do PIB de 1%. "É uma pena, mas a crise econômica mundial é muito forte e não será revertida este ano."
Os indicadores econômicos têm mostrado sinais contraditórios, a produção industrial despencou, mas o varejo ficou positivo. Alguns setores estão falando de quedas fortes, outros estão se mantendo. José Márcio, economista da Opus Gestão de Recursos e professor da PUC-Rio de Janeiro, acha que isso é apenas fruto da defasagem entre os dados da produção e do varejo, porque as vendas são muito afetadas pelo desemprego, que é um indicador que reage mais tardiamente.

A demanda doméstica tem uma grande correlação com o volume de importações, e elas estão despencando e terão repercussão na economia

- A questão é que o quantum de importações está mostrando uma queda muito forte, tendo caído 22% em janeiro e 32% em fevereiro em relação aos mesmos meses de 2008. Se a queda de março for similar à média dos dois meses anteriores, o exercício que fizemos na Opus mostra que a queda da demanda doméstica no PIB no primeiro trimestre poderá ser da ordem de -6% - disse José Márcio.

Com a queda da demanda interna e a redução da produção industrial, a taxa de desemprego vai subir.

- Um exercício simples que fizemos aqui na Opus mostra que os dados de geração de emprego formal do Caged são um importante indicador antecedente da evolução da taxa de desemprego no Brasil. Supondo que a geração de emprego formal se comporte no restante deste ano como se comportou na média entre 2000 e 2008, a taxa de desemprego aberto atingiria 13% da força de trabalho em meados de 2009 e fecharia o ano em 12%. Se for similar a 2005-2008, a taxa de desemprego chegaria a 12% em meados de 2009 e terminaria o ano em 11% - calculou o economista.

Em qualquer cenário para o desemprego, mesmo no melhor, é bem acima do nível atual, que está em 8%. Isso afetaria diretamente os salários. José Márcio Camargo acredita que, com o aumento do desemprego, o crescimento da massa salarial vai cair ao longo do ano, podendo ficar negativo.

- O resultado será uma redução das vendas do varejo, que será, provavelmente, o último mercado a mostrar os efeitos da recessão.

Ele lembra que os dados não podem ser levados ao pé da letra, porque são exercícios que não têm o respaldo acadêmico.

- O objetivo é tentar chegar o mais perto possível dos números com uma metodologia que seja fácil de entender e rápida de implementar. Porém, os resultados não dão margem a sermos muito otimistas em relação ao desempenho da economia brasileira em 2009.

Por isso, José Márcio Camargo diz que entende a cautela do Banco Central na ata do Copom, mas acredita que o choque negativo de demanda vivido pelo país no fim do ano foi forte o suficiente para contrabalançar o choque decorrente da desvalorização cambial.

- Vamos ter uma forte queda da demanda e um aumento do desemprego, e a economia vai ter queda de 1% em 2009 - calcula.

Diante disso, a grande questão é qual deve ser a resposta do governo, o quanto ele pode aumentar os gastos para tentar reverter um cenário mais negativo. A queda dos juros abrirá espaço para que o governo reduza o superávit primário, desde que, diz José Márcio Camargo, a relação dívida/PIB continue em queda. Com o custo da dívida sendo reduzido, o superávit, hoje em 3,8%, poderia cair para 3%, calcula. O ponto, diz ele, não é a quantidade do gasto, mas a qualidade.

Até agora, o governo tem feito programas setoriais, como a redução do IPI para os automóveis, o pacote habitacional, que sai hoje, ou o aumento do dinheiro do BNDES.

- O governo foi surpreendido pelo tamanho da recessão e está tendo uma reação confusa e pouco racional - diz Camargo.

O exemplo é a renúncia fiscal para o setor automobilístico. O aumento da demanda, que ocorreu depois da queda do imposto, ele acha que é mais antecipação de consumo. E tudo o que se consegue é aumentar os lucros das montadoras, para que elas remetam mais lucros para tentar apagar os incêndios em suas sedes.

De fato, o governo vai reagindo ao sabor de cada lobby, sem ter uma visão geral, como tenho dito aqui, de um plano para tentar reverter o quadro econômico. Indo caso a caso, ele fica ao sabor dos lobbies empresariais. Quem for mais forte, leva. Para José Márcio Camargo, o remédio continua sendo aquele prescrito em velhas receitas.

- Existe um consenso na literatura de que, nas atuais condições, o melhor a fazer é uma redução generalizada de impostos. Como no Brasil os impostos sobre a folha de pagamentos correspondem a 45%, reduzir esse imposto é a melhor política. Diminuiria a redução do salário do trabalhador, ou evitaria a queda, reduziria o custo da mão de obra, reduziria o aumento do desemprego e da informalidade. O ideal seria isso: concentrar os recursos em redução do imposto sobre a folha salarial.

Enfim, o que atingiu a economia não foi uma gripe. O diagnóstico do governo está errado. Os remédios também.

Duas no cravo, uma na canela

Vinicius Torres Freire
DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Apesar das previsões, déficit externo está contido, não houve "inflação do dólar" e é possível evitar o Pibinho zero

TEMOS UM problema a menos, parece. Talvez dois. Num período de deflação financeira e inflação de encrencas, não é de jogar fora. No início da nossa crise, no final de 2008, imaginava-se que o Brasil corria o risco de ficar com as contas externas ainda mais no vermelho e que a desvalorização do real ameaçaria inflar os preços.

Tais hipóteses parecem agora bem remotas. Mas era comum ouvir economistas de peso incluí-las nas primeiras linhas dos seus "balanços de riscos". Isso até vir a notícia da catástrofe de dezembro, o naufrágio da indústria, sabido em janeiro. Faz dois meses. Parece que foi no pré-cambriano. Imaginava-se então que o país cresceria demais para um ambiente mundial de crise, gastaria demais e não teria como financiar suas despesas em moeda "forte" (dólar).

Diga-se de passagem que tanto o Banco Central como a Fazenda acreditavam mais ou menos nessa hipótese: o BC vendo riscos, Fazenda e Lula vendo fortalezas. No ar.

A julgar pelos dados divulgados ontem pelo BC, o déficit externo parece comportado (trata-se da diferença entre o que o país gasta e recebe na compra e venda de bens e serviços no exterior). O déficit por ora previsível está sendo coberto pela entrada do investimento dito "produtivo".

Quanto mais déficit, mais risco de alta do dólar, por exemplo.

Em outras crises, a aversão do capital ao Brasil era tão grande que em geral quebrávamos e/ou vivíamos grandes desvalorizações. Havia ainda aumentos brutais do custo da dívida pública interna. Não desta vez.

O desagradável é que a baixa dos riscos de inflação e déficit externo se deveu a uma encrenca maior do que a esperada: o afundamento brusco e inédito da atividade econômica. Importamos menos, viajamos menos, há menos remessas de lucros porque a atividade caiu etc. Mas também vamos vender 20% menos para o exterior, neste ano.

Foram duas no cravo e uma forte na canela, para não dizer ferradura. Não ficamos sem gasolina no tanque porque o carro passou a andar devagar, quase parando. Ainda assim, poderíamos ter tido alguma inflação derivada do real fraco, mesmo com o PIB baixo, e os investidores poderiam ter desistido do país (no caso de aplicações financeiras, ainda há fuga de dinheiro, mas, no caso do investimento dito "produtivo", os resultados são surpreendentemente bons).

Isto posto, a média dos economistas mais ligados à finança acredita em crescimento zero da economia em 2009; o governo sonha com alta de 2% do PIB. Mas, como o demonstra a volatilidade de previsões e análises econômicas, o futuro não está dado, embora um tanto prejudicado.

Há meios de evitar que o PIB cresça menos que a população, ao menos. O governo vai anunciar um pacote de construção de casas. Talvez até menos importante que a tralha de números será o modus operandi. O governo opera muito mal quando se trata de investir, como esta Folha o demonstrou no caso do conserto das estradas, coisa até simples de fazer. Outra medida é suspender o aumento dos servidores -ninguém vai ter aumento neste ano, se é que vai ter emprego. Por fim, o talho dos juros deve continuar. Para tanto, o governo terá de tomar mais medidas impopulares, como mexer na poupança. Não tem jeito.

Trenzinho Caipira

Heitor Villa Lobos
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