sábado, 13 de novembro de 2010

UOL: PT não contribuiu para legalizar o comunismo, diz Freire

DEU NA TV UOL

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Após a derrota de Serra, uma nova transição:: Raimundo Santos

No segundo turno, a candidatura de Serra espelhou opinião pública de sentido democrático, tornando-se mais diferenciada ainda em relação a dois vetores do bloco vitorioso nas urnas que desejam ver o quadro político vindouro conduzido por completo pelo governo. Referimo-nos, de um lado, à poderosa figura de Lula, em vias de se retirar da Presidência da República para iniciar caravanas pelo país, temidas pela sua compulsão para dividir a população em duas partes; e, de outro, a setores hoje à frente de importantes estruturas (organizacionais, grupos e tendências partidários, ambientes intelectuais) reunidos em torno da candidatura de Dilma.

Com visão ainda referenciada pelo modelo de mudança social do Oitocentos, mas agora, em contexto de administração da economia realmente existente no país, esta vertente quer dar andamento a ações social-governistas, legitimada (acredita ela) por se considerar exclusiva defensora do popular. No plano político, além de se integrar à candidatura oficial, ainda não conhecemos quais são suas próximas iniciativas, mas se nota indiferença, no mínimo, quanto ao estilo de governar próprio do Presidente Lula, corrosivo do Estado democrático de direito.

Se, ao sair da cena governamental, o popularismo de Lula não vai se enfraquecer, isso não significa que estará livre para novos empreendimentos como o da vitória eleitoral, operação cuja base José Serra localizou na fusão Estado-partido em campanha. Mas há quem acredite, em áreas oposicionistas (e ainda quem assegure em alguns ambientes governistas mais intelectualizados), que, por ser uma formação complexa, o país conta com elementos suficientemente fortes para conter os passos do mito. Por certo, este condicionamento de tipo “estrutural” enseja um movimento favorável, que, no entanto, não se consuma por si mesmo, pois, como se sabe, terá que ser vivido por protagonistas; e estes, no caso da presente conjuntura pós-eleitoral, são chamados a dar vida a uma transição deste tempo de anomia política, que vivemos ultimamente, para o curso orientado por valores democráticos que vinha lentamente se afirmando entre nós desde a anistia de 1979.

Enfraquecida pela derrota — e ante a virtualidade de mais 12 anos de governo do PT —, a oposição se moverá com dificuldade, e não são numerosas suas correntes com habilidade para retomar a iniciativa política. A oposição tem pela frente o trabalho de criar condições favoráveis à retomada do reformismo indicado pela Constituição de 1988, ou seja, de um renovamento da vida nacional entendido como progressiva democratização do país e de suas oportunidades sob plena vigência do Estado democrático de direito. O mundo político (incluído o PMDB coligado com Dilma) logo se movimentará no Congresso e na opinião pública, abrindo à oposição a possibilidade de dinamizar o espaço de atuação política (e social), campo ampliado para o qual converge a movimentação dos novos governadores de oposição, alguns deles à frente de estados importantes, como São Paulo e Minas Gerais.

No que se refere ao social, hegemonizado pelas atuais formas organizativas, é pouco provável que — a curto e até a médio prazo — as correntes de esquerda e centro-esquerda da oposição construam cenário discursivo eficaz para disputar o mundo popular nesse terreno. Como já vem ocorrendo no tempo mais contemporâneo, é o campo da política que se dispõe ao tipo de oposição como a que aí está, agora investida da função crucial de dialogar com os setores organizados e não-organizados, inclusive com áreas não popularistas de dentro do governo Dilma.

O campo da oposição, pelo menos aquele que será estruturado por atores (os principais deles, o PSDB, o PPS e ambientes animados pela candidatura de Marina Silva) que não pensam em fazer “oposição pela oposição” nem cultivam a luta à morte pelo poder (aliás, com ela acabam de defrontar-se), têm quatro anos pela frente para interpelar um tipo de hegemonia popular consolidada nos últimos oito anos e certamente sobreposta ao futuro governo. Hegemonia popularista ainda a pairar sobre nosso sistema institucional, já combalido pelo enfraquecimento dos partidos e pela descrença na política e nos valores como meios asseguradores do desenvolvimento com oportunidades para o conjunto da população, diversos das clivagens cristalizadas pela retórica de Lula em consideráveis áreas da opinião pública.

Ao ator de esquerda oposicionista, agora posto diante de mundos organizacionais hegemonizados, se lhe exige desempenho em várias direções e múltiplos níveis, buscando retomar a iniciativa na ação e no plano do pensamento, em particular na esfera da difusão dos valores políticos, perspectiva considerada por muitos de escassa eficácia no jogo pelo poder de hoje (ver o peso e a qualidade do marketing nas eleições).

Deve-se recordar, no entanto, que esta procura de invenção no plano da política e do pensamento também pode ter êxito, como lembra o tempo de descrença e pesssimismo durante o regime de 1964, quando, justamente naquele plano, a resistência à ditadura se assentou para se desenvolver e tornar efetiva sua ação. E o mesmo ocorreu ainda agora na eleição, como vimos no segundo turno — isto se valorizarmos o que foi se acumulando em termos de interpelações ao discurso hegemônico, com a candidatura de Serra apresentando resultado que não é de se desprezar. As interpelações dessa mobilização sem ator individualizado — pois vêm de Serra e também da midia, de algumas instituições e personalidades, como Hélio Bicudo — podem ser aferidas nos compromissos que a candidata Dilma, pouco depois de proclamada eleita, se viu levada a anunciar (a quem ela repondia, se acabara de sair das urnas amplamente vitoriosa?) de forma um tanto diversa daquela que até ali vinha dizendo nos palanques com Lula.

Chama a atenção o fato de que, logo após a apuração dos votos que lhe confirmaram a vitória — e ainda a caminho da celebração no Palácio do Planalto, em discurso inesperado —, a candidata leu pronunciamento refletindo, em pontos cruciais, o sentido da opinião pública crítica à era Lula que se formara como um arco-íris sobre as águas revoltas da campanha eleitoral. Parecendo se mover em forma defensiva diante daquela opinião pública, a presidente eleita firmou compromissos, ainda que ambíguos, em relação às interpelações da campanha, considerando o que a própria candidata havia manifestado no mesmo dia da eleição em artigo publicado na Folha de S. Paulo pela manhã.

Enquanto no pronunciamento da noite, por ser pontual e rápido, não se vê toda a sua articulação interna, no texto escrito para o jornal a presidente, se não critica a dimensão formal da democracia, manifesta reticência em relação a ela. Democracia ora “substantivada”, diz a autora no artigo da Folha de S. Paulo, “pela ascensão de milhões após o crescimento econômico e os programas sociais”. Neste texto, Dilma se refere à democracia apreciando-a “como valor fundamental”, postura que, se não revela proposição de novo conceito (a respeito deste ponto especifico houve discussão na esquerda pecebista em meados dos anos 1970), encerra, naquela sua adjetivação (“fundamental”), sua não adesão plena ao Estado democrático de direito, diversamente de Serra e das áreas de esquerda e centro-esquerda mais próximas do candidato.

Em todo caso, se aquele contexto eleitoral que ainda cercava o primeiro discurso da presidente eleita indica uma possibilidade promissora, a resistência democrática ao tempo de anomia política a que estamos nos referindo tem mais alento. Resistência democrática — entenda-se bem — no sentido daquilo que, certa vez, falando sobre o famoso “caminho democrático” ao socialismo defendido pelo PCI (exemplo para a esquerda brasileira clássica, inclusive na discussão anteriormente mencionada), Armênio Guedes dizia, de forma inconfundível, em um programa de TV chamado Roda Viva, que o que os comunistas italianos haviam trilhado era a rigor um caminho democrático para alcançar a democracia.

A oposição tem à sua frente um complexo trabalho de convencimento, em primeiro lugar, da opinião pública, na sua grande maioria eleitora de Dilma, e do mundo político-social organizado (partidos, associativismo, etc.). Deve cumprir um movimento em busca de hegemonia que tenha por referência a retomada programática — aqui o ponto de apoio para tal convencimento — da revolução democrática sintetizada na Constituição de 1988, como tem sido lembrado ultimamente a propósito da modernização mais contemporânea do país. Renovação cujo sentido e cujos caminhos a Carta Magna recolheu da luta pela redemocratização do país, a partir da larga jornada iniciada logo após 1964.

Depois de 1988, tal renovamento avançou no plano econômico com o Real e com os ajustes à globalização dos anos 1990, bem como com a remodelação da estrutura estatal; e nos últimos oito anos este mesmo processo renovador deu novos passos sob o governo Lula, com o alargamento do alcance da política social e dos apoios emergenciais aos contigentes menos favorecidos, ainda que os seus autores recusem descendência daquele campo da Constituição de 1988 como inspiração de um desenvolvimento sustentável.

Com áreas fortemente ligadas à tradição da resistência política ao regime de 1964 (parte delas continuam no PMDB oficialista), a oposição tem aquele marco de referência constitucional que confere à sua ação na conjuntura sentido construtivo e põe suas perspectivas fora da futurologia para a próxima eleição presidencial. O movimento oposicionista de agora visa prioritariamente garantir curso livre à vida política democrática, cabendo ainda considerar de modo positivo (porquanto aceita sem reservas o resultado das urnas, não obstante aponte a forma comprometedora da vitória de Dilma) que o novo governo, pressionado a partir de fora e também de dentro, ele próprio possa vir, se não a favorecer, ao menos a não se tornar obstáculo ainda maior ao tempo da política e da sua capacidade transformadora na plenitude do Estado democrático de direito. A oposição — chamada por Serra, no seu discurso na noite de dia 31 de outubro, de “campo da liberdade e da democracia” — não tem pela frente tarefas simples, e tampouco é certo que as forças da oposição convocadas para estruturar aquele campo sejam as únicas correntes lúcidas.

A candidata eleita reconheceu publicamente o sentido democrático de parcelas da opinião pública envolvidas na eleição, por ela acolhido como compromissos, como foi observado, na própria hora da apuração dos votos — em particular os compromissos, que assumiu, de “valorizar a democracia em toda a sua dimensão, desde o direito de opinião e expressão até os direitos essenciais básicos da alimentação, do emprego, da renda, da moradia digna e da paz social”; de “zelar pela mais ampla e irrestrita liberdade de imprensa” (mais de uma vez repetido nos dias seguintes); de “zelar pela observação criteriosa e permanente dos direitos humanos tão claramente consagrados pela nossa Constituição”; e , por fim, o de “zelar pela nossa Constituição, dever maior da Presidência da República” (O Globo, 01/11/10).


Raimundo Santos é professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ/CPDA).

Democracia virtual :: Merval Pereira

DEU EM O GLOBO

As iniciativas do poder público na construção de espaços virtuais ainda são reduzidas no Brasil e deixam o país na 55ª. posição no ranking mundial dos governo eletrônicos, junto com Índia e China, atrás de Argentina (44), México (39), Chile (18), Colômbia (9).

Os países no topo do ranking são: Coréia do Sul, Estados Unidos, Canadá, Reino Unido e Países Baixos.

A Macroplan, empresa de consultoria especializada em análises prospectivas, fez um levantamento inédito em parceria com pesquisadores do Instituto Universitário Europeu (Florença, Itália), sobre democracia eletrônica publicado pelo Centro Global de Tecnologia da Informação e Comunicação em Parlamentos, das Nações Unidas. O economista Gustavo Morelli e o cientista político Tobias Albuquerque, da Macroplan foram os representantes da empresa brasileira.

O estudo avaliou 92 sites de casas legislativas em países de sistema federativo (Brasil, Espanha e Estados Unidos), assim como 30 espaços virtuais de informação e deliberação que têm o potencial de tornar o processo político mais participativo, transparente e legítimo.

A pesquisa, que teve o objetivo de servir de referencial para políticas de inovação em matéria de democracia eletrônica aqui no Brasil, encomendada à Macroplan pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais, revelou que – quando bem empregadas - as tecnologias da informação e comunicação estão contribuindo, e muito, para aumentar a transparência do processo político, abrindo espaços novos de informação e deliberação e, principalmente, consolidando a democracia.

A nova e grande oferta de possibilidades tecnológicas está revolucionando as antigas práticas de comunicação não apenas nas empresas, que tem utilizado as novas configurações para melhorar os seus negócios, mas também na esfera do governo, com impactos diretos na forma de se fazer política, principalmente nos parlamentos.

As melhores práticas na categoria transparência da ação parlamentar foram desenvolvidas nos Estados Unidos - Open Congress, Capitol Words for you e Open legislation e, no Reino Unido, They work for us e BBC Democracy Live .

Na categoria interatividade e participação, o site da Câmara dos Deputados do Brasil (e-democracia) é citado como um dos destaques, ao lado do inglês No. 10 e-petitions e TID +,da Estônia.

O estudo, contudo, aponta que o Brasil ainda tem um longo caminho pela frente na construção da democracia eletrônica e não traz as melhores noticias para o país.

Por aqui, ainda há poucos exemplos do melhor aproveitamento das novas tecnologias no ambiente público.

No Brasil, ressalta o estudo, as iniciativas no âmbito do Executivo ainda se restringem à publicação de dados para fins de controle e acompanhamento dos gastos públicos.

Segundo o estudo da Macroplan, o problema no Brasil é mais acentuado nas casas legislativas, justamente onde deveria haver mais transparência e interação.

Os níveis de confiança do cidadão e sua disposição em participar de iniciativas levadas a cabo pelo Legislativo ainda são bastante baixos.

Além de expor o reduzido número de iniciativas no poder Legislativo que servem como exemplo de participação e transparência, o estudo sublinha um fato que se pode observar na maioria dos parlamentos estaduais e municipais brasileiros: o fornecimento de informações de utilidade questionável em seus sites.

Chamou a atenção na pesquisa voltada aos parlamentos brasileiros a ausência de informação sobre como a contribuição do cidadão é processada, quais são os destinatários finais das proposições e de informações relativas à situação orçamentária estadual e ao processo de elaboração orçamentária em si.

Há casos extremos de total ausência de informações sobre a atividade legislativa.

Outro problema recorrente é a falta de reatividade dos políticos. O estudo constatou que um grande número de contatos on-line realizados por cidadãos com deputados e seus respectivos gabinetes permanecem sem resposta ou são respondidos de maneira genérica.

Existe uma tendência global de universalização das tecnologias de informação e comunicação. No Brasil, por exemplo, o número de usuários de Internet passou de pouco mais de 5 milhões, em 2000, para 75 milhões, em 2010.

A população mundial, em breve, passará a ter 20% de penetração de banda larga. Com as novas tecnologias, os princípios da transparência, participação e abertura estão cada vez mais próximos da realidade social e política.

Os governos terão que lidar com a interferência direta de redes organizadas, redes que, por sua vez, irão facilitar a ação coletiva em busca de soluções para problemas comuns.

As redes de comunicação atuais fazem com que a participação esteja ao alcance de cada cidadão e não apenas da chamada sociedade organizada, que muitas vezes se forma em torno de grupos de interesse na defesa corporativa de posições de segmentos, em detrimento do coletivo.

Estamos diante de uma possibilidade concreta de aumentar o papel da sociedade na formulação, monitoramento e avaliação de políticas públicas, ressalta o estudo.
(Amanhã, “Os bons exemplos”)

Aluguel de partidos:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - A despeito de descrever uma verdade, a expressão "partido de aluguel" tem evidente conotação pejorativa. Em geral, designamos assim certas legendas nanicas. Mas como chamar um partido que apoia o governo Lula (ou Dilma) na esfera federal e ao mesmo dá seu apoio ao governo Serra (ou Alckmin) em São Paulo? Partido anfíbio? Partido oportunista? Partido Macunaíma? Partido ao meio?

Não estou me referindo apenas ao PMDB, verdadeiro partido de artistas, capaz de abocanhar a vice-presidência do governo Dilma, segurar com uma mão no governo Alckmin e com a outra fazer acenos para atrair Gilberto Kassab do DEM.

Pense no PSB, no PDT e no PV, três partidos que têm alguma pretensão de ser levados a sério ou possuir identidade programática. Na prática, pertencem à base do governo petista na esfera federal e à base do governo tucano em SP. Coerência? Basta invocar as "diferenças" regionais para justificar a adesão a A aqui e B ali e vice-versa.

É curioso o caso do PSB. O partido cresceu, elegeu ou reelegeu seis governadores (entre eles Eduardo Campos, em Pernambuco, com jeito de que pode ser uma liderança nacional). Mas o PSB, em São Paulo, serviu de barriga de aluguel para a candidatura quixotesca de Paulo Skaf, o empresário que liderou o "Xô, CPMF!", que os governadores do partido agora querem de volta. Afinal, que apito toca o PSB?

O DEM se tornou uma espécie de testemunha involuntária de como é difícil fazer oposição no Brasil. Isso também se aplica a São Paulo, onde os governos tucanos mandam e desmandam na Assembleia Legislativa usando os mesmos métodos de aliciamento do governo federal.

Como a Folha noticiou, Alckmin agora está empenhado em promover um arrastão nas legendas que também parasitam Lula/Dilma (o PR, o PRB e o PP, além das citadas). Quase todos estão na política para isso mesmo: fazer negócios. E todos querem ser do único partido que de fato importa -o partido do poder.

Primeiro teste:: Valdo Cruz

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - Dilma Rousseff está de volta ao Brasil. Após quase uma semana longe da guerra por espaço no seu futuro governo, ela terá de enfrentar a dura realidade que é montar uma equipe ministerial.

Dependesse apenas de sua vontade, o ministério já estaria escalado e pronto para entrar em campo. Inclusive com escolhas de nomes entre os partidos aliados.Só que Dilma, agora, não é mais a ministra da Casa Civil, quando se posicionava contra algumas indicações feitas ao presidente Lula e até apostava que conseguiria barrar esse e aquele nome.

Muitas vezes, descobriu que seu desejo, de ministra técnica, não prevalecia sobre as necessidades políticas de um presidente envolvido na montagem de uma maioria confiável no Congresso.

Amigos acreditam que Dilma vá ser mais rigorosa na triagem técnica dos nomes, mas reconhecem que ela já não é mais aquela técnica inflexível, que costumava dizer que tal político não seria nomeado nem sobre seu cadáver. E era.Seus coordenadores de campanha apostam ainda que a fase eleitoral foi um curso intensivo de negociação política, em que ela aprendeu a ter mais jogo de cintura para lidar com os aliados.

Nessa fase inicial, contudo, a maior dor de cabeça virá do seu próprio partido. A máquina petista sonha em ter mais poder num governo Dilma, depois de ser obrigada a seguir os desejos de Lula -o presidente que ficou bem maior que seu partido.

Até aqui, petistas se engalfinham em dois tipos de refregas. Com os aliados e entre si. Não por acaso, algumas alas do partido desejam aproveitar a crise do Enem para derrubar Fernando Haddad do Ministério da Educação. Tem muito mais a ver com ocupação política do que com competência.

A vantagem de Dilma é que, depois de tanto tempo de governo, já conhece muito bem essas briguinhas. Será, porém, seu primeiro teste como presidente eleita.

Lá vem o Patto! :: Urbano Patto

Dependência. Para combatê-la é importante cortar o fornecimento da droga.

Brasília, 04 de Novembro de 2010.

Prezad (…)

Dilma Rousseff foi eleita Presidente da República, a primeira mulher na história do Brasil.
[...]
O segundo turno da campanha eleitoral gerou novas despesas especialmente, com materiais de divulgação, que estamos buscando saldar ainda neste mês de novembro, de acordo com as normas da arrecadação eleitoral. Muitos empresários brasileiros já contribuíram, optando por exercer esse direito facultado pela lei eleitoral, que deixa o financiamento das campanhas a cargo das empresas, principalmente, e dos cidadãos.

A participação de sua empresa nesta eleição, como estabelece a lei brasileira, será muito bem vinda. Buscamos nesta eleição ampliar o número de empresas engajadas nessa prática de cidadania corporativa. Dentro deste espírito, tenho prazer de convidar sua empresa a dar uma contribuição para a campanha de Dilma Rousseff.


Trechos da carta de José de Filippi Jr., ex-prefeito de Diadema-SP, deputado federal eleito pelo PT-SP, Coordenador financeiro da Campanha Dilma Presidente 2010, encaminhada para inúmeras empresas após o 2º turno.

Felizmente a atividade política e eleitoral no país não pára. Já estamos acostumados de dois em dois anos em promover eleições, uma vez para os níveis federal e estadual e outra para o municipal.

Porém, o sistema de financiamento de campanhas é, com certeza, um dos mecanismos de distorção do processo eleitoral e seus resultados na medida em que permite a contribuição financeira de pessoas jurídicas para candidatos e partidos. Além dos trechos da carta acima transcritos, basta observar as doações dos bancos, das empreiteiras e outros grandes “mãos abertas” nessas eleições. As mesmas empresas financiaram os principais partidos, campanhas majoritárias e campanhas proporcionais, com quantias sempre muito parecidas, como que classificadas por cotas, de acordo com algum critério interno, que não vem ao caso aqui.

Ou seja, as empresas não expressam ou defendem posição política alguma, mas garantem sua influência sobre todas as principais candidaturas e os candidatos financiados por eles ganharam a Presidência da República, os Governos dos Estados e a maioria das vagas do Senado e da Câmara dos Deputados, sem distinção se eram ou serão da situação ou da oposição, ou vice-versa. O incrível é que, se os resultados eleitorais fossem diferentes, poderíamos fazer a mesma afirmação e estaríamos certos.

E, não bastando isso, elas mesmas, e aquelas que ainda não contribuíram, poderão agora fazê-lo atendendo ao apelo singelo e desinteressado do coordenador financeiro da campanha da agora presidenta eleita Dilma Roussef. Por sinal uma carta muito educada, escrita com base na legislação de financiamento eleitoral vigente. Se alguém imaginar que tais contribuições poderão deixar a empresa “bem vista” pelo novo governo, só pode ser fruto de uma mentalidade depravada e distorcida, afinal a empresa só estará “engajada nessa prática de cidadania corporativa”.

Cá entre nós, “cidadania corporativa” é pura esculhambação da Democracia; é o supra-sumo do fetichismo, é o inanimado tomando vida. A continuar assim, não tardará haver alguém, ou “o mercado”, defendendo a escolha de representantes em pregão da bolsa de valores.

Cidadania, desde a origem do termo na antiga Grécia, serve para designar os direitos relativos ao cidadão, ou seja, ao indivíduo que vive na cidade sendo, portanto, atributo exclusivo de pessoas naturais, de seres humanos.

Em 2012, com os mesmos conceitos distorcidos e sob a mesma legislação, altruístas empresas ou “cidadãos corporativos”, como preferirem, se sacrificarão mais uma vez para financiar e eleger seus candidatos (porque não há como perder, já que apoiam todos que têm chance) às Prefeituras e às Câmaras de Vereadores das capitais e das maiores cidades. E, mutatis mutandis, nas respectivas escalas, aparecerão as empresas “cidadãs corporativas” regionais, municipais e até de bairro financiando campanhas para Prefeito e Vereador, país afora. Serão os velhos conhecidos: empreiteiras, empreendedores imobiliários, empresas de ônibus, coletoras de lixo e os mais diversos fornecedores: merenda, material escolar, uniformes e apostilas, remédios, ambulâncias, serviços de informática, etc etc etc

Falar de reforma política significa falar necessariamente da revisão das formas de custeio das campanhas eleitorais (substituindo aqui intencional e conceitualmente o termo financiamento, o qual deixa subentendido a existência de algum ressarcimento). A alocação de recursos públicos num valor de piso por candidatura, suficiente para uma campanha modelo padronizada, pode ser um caminho para diminuir a dependência. Talvez também seja interessante a definição de um teto (baixo) que para contribuições privadas, mas apenas de cidadãos pessoas físicas, (não corporativos), podendo doar para apenas uma candidatura para cada cargo ou para um único partido ou coligação.

Assim como o voto é único e uma opção de um indivíduo dotado de vontade e consciência, a contribuição para campanhas eleitorais também deveria ter as mesmas motivações e status.


Urbano Patto é Arquiteto Urbanista, Mestre em Gestão e Desenvolvimento Regional e membro do Conselho de Ética do Partido Popular Socialista - PPS - do Estado de São Paulo.

Frevos - Claudionor Germano

O músico Claudionor Germano da Hora nasceu em 1932, na capital de Pernambuco, Recife. É irmão de outro famoso pernambucano: o escultor Abelardo da Hora. A trajetória na música é praticamente voltada ao ritmo do frevo.

A carreira artística começou aos 15 anos de idade, época em que fazia parte do grupo Ases do Ritmo que se apresentava na Rádio Clube de Pernambuco.

Em 1948, Ases do Ritmo foi escolhido o melhor grupo vocal do ano em Pernambuco.

No ano seguinte, Germano lança o primeiro álbum (O que eu fiz... e você gostou - Carnaval cantado de Nelson Ferreira).

Na mesma época também foi contratado pelas rádios Jornal do Commercio e Tamandaré.

Em 1953, gravou com o frevo-canção "Boneca", de Aldemar Paiva e José Menezes, e "Come e Dorme", com a orquestra do compositor Nelson Ferreira.

Após o sucesso das gravações passou a ser convidado pelos músicos de frevo Capiba e Nelson Ferreira para ser intérprete das músicas carnavalescas.

A partir dessa nova parceira, Germano se tornaria o mais respeitado cantor de frevo em Pernambuco.

Ouça Pot-pourri de frevos com Claudionor Germano

Fenômeno

DEU EM O GLOBO - Panorama Político :: Ilimar Franco

O presidente do PPS, Roberto Freire, fez uma proeza ao eleger-se deputado federal por São Paulo. Ele volta à Câmara tendo mudado seu domicílio eleitoral, que antes era Pernambuco.

Poucos são os políticos que fizeram a mesma façanha: Nelson Carneiro, que trocou seu domicílio da Bahia para o Rio; Leonel Brizola, que se transferiu do Rio Grande do Sul para o Rio; José Sarney, que trocou o Maranhão pelo Amapá; e Juscelino Kubitschek, que mudou de Minas para Goiás.

A guerra cambial continua

DEU EM O GLOBO

A reunião das 20 maiores potências do mundo, no G-20, em Seul, na Coreia do Sul, terminou sem acordo capaz de evitar a guerra cambial entre os países. Estados Unidos e China, com suas moedas desvalorizadas, são hoje alvo de preocupação do resto do mundo. Com o câmbio depreciado, eles elevam suas exportações e acabam prejudicando outras nações. No embate entre Washington e Pequim, a China saiu ganhando, pois evitou que americanos colocassem no texto final teto de 4% do PIB para superávit ou déficit externo. Hoje, a China é das grandes exportadoras.

G-20 termina só com promessas e sem ações

Líderes reunidos na Coreia do Sul assumem compromissos vagos e adiam decisão sobre disputas cambiais

Fernando Duarte
Enviado especial

SEUL, Coreia do Sul. Como previsto, os líderes das 20 principais economias do mundo, o G-20, encerraram ontem sua reunião de cúpula em Seul com muita retórica e poucas decisões concretas.

Na prática, os países conseguiram ampliar por mais um ano o prazo para alcançar difíceis soluções para os desequilíbrios no comércio, no câmbio e na área fiscal que ameaçam a recuperação econômica mundial. No comunicado oficial, os países prometeram adotar medidas macroeconômicas que incluem políticas cambiais mais sintonizadas com as forças do mercado como forma de promover o equilíbrio econômico mundial.

O G-20 se comprometeu a estabelecer um cronograma com “parâmetros indicativos” sobre como lidar com desequilíbrios entre suas economias, sobretudo no que se refere a superávits e déficits nas contas externas. Os 20 líderes também prometeram submeter planos econômicos de médio prazo à análise do Fundo Monetário Internacional (FMI), mas os parâmetros só serão definidos nos próximos seis meses, possivelmente após a reunião de ministros da área econômica, na França, em fevereiro.

No duelo particular entre EUA e China, ponto para Pequim, que escapou de ficar na berlinda devido à insistência em manter desvalorizada sua moeda, o yuan, e ainda bloqueou no documento final uma proposta de Washington para que superávits ou déficits externos de grandes países não superassem 4% do Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos por um país ao longo de um ano). O plano sugerido na semana passada pelo secretário do Tesouro americano, Timothy Geithner, por pouco não provocou o colapso de um encontro de negociadores na noite de quintafeira, após um representante chinês ameaçar deixar a sala.

— Os chineses aguaram o comunicado, e dá para perceber pela linguagem do documento final como houve divergências — disse ao GLOBO uma fonte brasileira presente à sessão.

Mantega vê sanções morais para manipulação no câmbio O presidente dos EUA, Barack Obama, admitiu que o resultado do encontro em Seul não parecerá significativo aos olhos do público. No entanto, acrescentou, representa um avanço, especialmente diante dos temores de um impasse mais acentuado.

— Nosso trabalho no G-20 não vai mudar o mundo imediatamente, mas estamos passo a passo estabelecendo mecanismos internacionais e instituições mais fortes que vão nos ajudar na tarefa de estabilizar a economia mundial, assegurar o crescimento e reduzir algumas tensões — afirmou Obama.

O premier do Reino Unido, David Cameron — que nas reuniões fechadas fez um discurso inflamado cobrando mais empenho do G-20 na viabilização de acordos comerciais globais —, ressaltou a importância de os problemas estarem sendo discutidos num fórum multilateral.

Já o presidente francês, Nicolas Sarkozy, disse que os ânimos foram arrefecidos em Seul.

O ministro da Fazenda do Brasil, Guido Mantega, falou no encerramento em nome do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Lula voltou ao Brasil mais cedo para visitar o vice-presidente, José Alencar, que sofreu um infarto na quinta-feira. Mantega se disse satisfeito com a criação do que chamou de sanções morais contra países que manipulem o câmbio, mas também adotou um tom exageradamente otimista em função do que se viu e leu na capital sul-coreana.

— Os conflitos foram reconhecidos, mas houve um amplo entendimento entre os países, mesmo entre os mais reticentes.

Absolutamente não acabou a guerra cambial, mas pelo menos ela passou a ser discutida e, com isso, poderemos usar instrumentos para mitigar seus efeitos — disse o ministro. — Haverá uma cautela da maioria dos países.

Os que insistirem (em medidas anticompetitivas) serão constrangidos pelo novo acordo.

A exemplo do que fizera Lula na véspera, Mantega defendeu a relevância do G-20, sobretudo por seu potencial de acelerar a solução de questões internacionais como a reorganização do FMI. O documento final ratificou o aumento na participação dos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) nas cotas do conselho consultivo do Fundo, bem como o papel do grupo na aprovação da reforma do sistema financeiro — o plano Basileia III, que eleva de 8% para 13% o capital mínimo livre de risco que os bancos devem ter.

— O G-20 é um foro de compromissos, e os países querem que ele permaneça — disse Mantega.

— Mostramos eficiência ao lidar com a crise em 2008 e não estamos perdendo tempo agora.

Não há vilões nem mocinhos, e certamente conseguimos bons resultados. Basileia II, por exemplo, demorou quase dez anos para ser aprovado, enquanto Basileia III levou apenas um.

Mas o ministro não espera a mesma velocidade no debate sobre a substituição do dólar por uma cesta de moedas nas trocas internacionais: — É uma tendência natural, mas nada rápido ou fácil.

Rio aciona União no STF por R$ 25 bi do pré-sal

DEU EM O GLOBO

O governo do Rio entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) com ação direta de inconstitucionalidade contra a Lei de Capitalização da Petrobras, informa Ancelmo Gois. A medida é uma reação às sucessivas tentativas do Congresso de retirar do Rio os royalties do petróleo. O estado pleiteia sua cota de participações especiais (PEs) sobre os 5 bilhões de barris do pré-sal que a União cedeu a Petrobras e que serviram de base para a capitalização da empresa, contabilizada em R$ 72 bi. Boa parte desse óleo está em seis campos no litoral fluminense e poderia render R$ 25 bi em participações especiais ao estado, como diz a Constituição. Quando fez a capitalização, a União previu o pagamento de royalties, mas deixou de lado as PEs. O relator da ação será Gilmar Mendes.


Cabral x Lula

O governo fluminense entrou esta semana no STF com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) da lei da capitalização da Petrobras.

O Rio deseja receber a parte de lhe cabe em participação especial na venda do governo para a Petrobras de 5 bilhões de barris de petróleo de seis campos no estado.

Segue...

A lei da capitalização da Petrobras, sancionada por Lula em 30 de junho, faz referência aos royalties, mas não menciona a participação especial, outra fonte de recursos dos estados produtores de óleo.

A Adin, cuja relatoria já está com o ministro Gilmar Mendes, pede que a lei inclua na cessão a participação prevista na Constituição.

A parte do Rio...

Como essa cessão dos 5 bilhões de barris foi contabilizada em uns R$ 72 bi, o Rio se sente credor de uns R$ 25 bi.

No mais...

O desfecho dessa Adin é, naturalmente, imprevisível.

Mas o Rio mostra, com a ação, que não ficou parado diante das constantes tentativas do Congresso de tungar os royalties fluminenses.

Flerte reforça crise no PMDB

DEU NO ESTADO DE MINAS

Anúncio de que parte dos deputados peemedebistas eleitos pretende integrar a base aliada do governador Anastasia na Assembleia provoca reações contrárias no partido

Isabella Souto

O PMDB mineiro vive mais uma crise interna. A causa, desta vez, é o anúncio de que alguns dos oito deputados estaduais eleitos poderão integrar a base aliada do governador Antonio Augusto Anastasia (PSDB) a partir de fevereiro do ano que vem. Atualmente, os peemedebistas formam um grupo independente. Nas últimas eleições, fizeram oposição ao tucano, com o lançamento da candidatura do senador Hélio Costa para o Palácio da Liberdade. Já há manifestações na legenda contra a proposta de mudança na postura do grupo.

O primeiro a reclamar foi Hélio Costa, que, em seu twitter, postou: “O ‘líder’ do PMDB na Assembleia/MG não vê incoerência no apoio ao governo. Ele não apoiou o candidato do seu partido. Prova que é coerente.” O presidente do PMDB mineiro, deputado federal Antônio Andrade, disse que, institucionalmente, a legenda continua na oposição. “A bancada é um segmento do partido. E é meio esquisito, até mesquinho, se oferecer para ser situação. Se os deputados foram fiéis a Hélio Costa nas eleições, não poderiam agora apoiar Anastasia”, reclamou.

Antônio Andrade afirmou ainda que não vai discutir internamente qualquer tipo de punição aos “infiéis”, mas lamentou a declaração do líder da atual bancada, Vanderlei Miranda, de que os deputados estariam “conjugando o verbo eleição no passado”. Os deputados estaduais terão um encontro com o governador Antonio Anastasia na semana que vem para discutir um possível apoio da legenda, a convite do próprio tucano, segundo informou Miranda na quinta-feira.

O deputado Antônio Júlio já avisou que não vai participar da reunião e que continuará no grupo de oposição “independente, construtiva e responsável”. “Os deputados do PMDB têm liberdade de caminhar com quem quiserem. Eu não vou ficar na base de governo, porque não sou um homem de duas caras”, argumentou. Segundo ele, o partido está rachado desde antes das eleições, quando Adalclever Lopes e Antonio Andrade disputaram a presidência da legenda, após a morte do então presidente Fernando Diniz, em julho do ano passado.

Embora tenha feito campanha para Hélio Costa nas eleições de outubro, o deputado Ivair Nogueira admitiu a possibilidade de migrar para o grupo da situação. “Não podemos ser oposição por oposição; isso é burrice”, justificou. Ele lembrou que uma ala do PMDB chegou a apoiar Anastasia na disputa pelo governo de Minas Gerais e, portanto, não seria nenhum constrangimento o partido integrar a base aliada. No entanto, ressaltou que é preciso discutir o assunto também com a direção da legenda no estado.

Até então um dos maiores críticos do governo Aécio Neves (PSDB) na Assembleia Legislativa, o deputado Sávio Souza Cruz não descarta a possibilidade de integrar o grupo da situação, mas também ressaltou a importância de debater o assunto com a direção do PMDB. “Uma discussão como essa não deve ficar restrita à bancada”, argumentou. Segundo ele, embora Vanderlei Miranda tenha anunciado a nova postura do partido, o assunto não chegou a ser discutido entre os integrantes da bancada, e a decisão não será assim “tão simples.

Panamericano teve desvio de dinheiro de cartões

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

A investigação do rombo no Banco Panamericano apontou, além de fraudes contábeis, a suspeita de que pode ter havido desvio de dinheiro nas operações com cartões de crédito. Diretores já demitidos disseram que financiavam o saldo de devedores dos cartões em valores superiores a dívida real - ou seja, o dinheiro que saía do caixa do banco ultrapassava o que os clientes financiavam. A Polícia Federal informou que abriu investigação. Ao menos cinco bancos demonstraram interesse em comprar a participação de 51% do Grupo Silvio Santos no Panamericano.

Investigação indica desvio de dinheiro no Panamericano

Além da fraude contábil para esconder prejuízos, funcionários fizeram operações suspeitas na área de cartões de crédito

David Friedlander e Leandro Modé

A investigação do rombo no Panamericano aponta para o desvio de recursos por funcionários do banco. O foco está na área de cartões de crédito. Durante a investigação, diretores já demitidos admitiram que financiavam o saldo de devedores dos cartões em valores superiores à dívida real.

Assim, o dinheiro que saía do caixa do banco era superior ao que os clientes financiavam. Do rombo total de R$ 2,5 bilhões do Panamericano, R$ 400 milhões tiveram origem nos cartões.

Se a suspeita for confirmada, como acreditam pessoas envolvidas na investigação, serão ao menos duas as causas do rombo: desvio, provavelmente para o bolso de funcionários, e maquiagem dos balanços para esconder os maus resultados do banco.

Ao contrário do que ocorreu na venda de carteiras de crédito para outros bancos, nos cartões houve efetiva saída de dinheiro. "Os recursos saíram do banco. O trabalho agora é descobrir onde foram parar", afirma uma fonte a par do assunto. "Ainda está tudo muito nebuloso."

Para fazer financiamentos a mais, os executivos usavam as procurações que os clientes no Brasil concedem à administradora quando aderem ao cartão. Com elas, a administradora ia ao banco para contratar financiamento em nome do cliente quando este parcelava o saldo devedor.

Ontem, o Ministério Público Federal em São Paulo recebeu a notificação do Banco Central (BC) para investigar o caso. Também ontem, a Polícia Federal (PF) informou que abriu investigação.

Internamente, as irregularidades serão apuradas pela nova diretoria e pela PriceWaterhouseCoopers, auditoria indicada pelo Fundo Garantidor de Crédito (FGC), que emprestou R$ 2,5 bilhões para Silvio Santos salvar o Panamericano.

Um dos obstáculos que os investigadores vão encontrar é que o setor de cartões de crédito no Brasil vive uma espécie de "limbo jurídico". Nenhum órgão de governo é responsável pela fiscalização da área. Além disso, a administradora de cartões do Panamericano não está subordinada ao banco.

A hipótese de que os antigos diretores forjaram os balanços para engordar os bônus perdeu força porque o Panamericano não tinha essa política de remuneração. Segundo um documento enviado pelo banco à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), os diretores ganhariam este ano R$ 4,542 milhões entre salários e benefícios diretos ou indiretos. Não havia previsão para remuneração variável.

Crivos. A contabilidade do Panamericano passou por vários crivos ao longo dos últimos anos. Nenhum deles detectou as fraudes. Segundo o BC, a maquiagem dos números começou em 2006. Em novembro do ano seguinte, o Panamericano emitiu ações na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Com a operação, arrecadou quase R$ 777 milhões. "Abrir capital na bolsa é muito chato", afirma um banqueiro. "Envolve advogados, auditores, investidores. Como é que ninguém viu?"

No fim do ano passado, os auditores e negociadores da Caixa Econômica Federal também mergulharam nas contas do Panamericano quando o banco estatal comprou 49% do capital votante do banco de Silvio Santos por R$ 739 milhões. Mais uma vez, ninguém viu.

Saúde diz que investigará Farmácia Popular

DEU EM O GLOBO

TCE descobre venda de remédios até para mortos; estabelecimentos que cometem fraudes serão descredenciados

BRASÍLIA. O Ministério da Saúde anunciou ontem que fará uma investigação rigorosa nas irregularidades apontadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no programa Aqui Tem Farmácia Popular, reveladas ontem pelo GLOBO. Em nota, o ministério informou que as farmácias que cometem ilegalidades, como vender remédios para mortos, serão descredenciadas.

De 2006 a 2010, foram “vendidos” medicamentos para 17.258 pessoas já falecidas. No total, a auditoria do TCU detectou 57.683 transações em nome de pessoas com registro de óbito. A soma dessas vendas fraudulentas totalizou R$ 1,7 milhão.

O ministério informou ainda que tem um acordo de cooperação com o Ministério da Previdência.

O objetivo é ter acesso à base do Sistema de Óbitos (Sisobi), que permitirá o cruzamento do cadastro dos clientes do Aqui Tem Farmácia Popular com a relação de pessoas mortas. Foi com base no Sisobi que o TCU identificou as irregularidades.

Mas, na informação prestada ao GLOBO, anteontem, o Ministério da Saúde considerou que o Sisobi não foi criado para ser usado como mecanismo de controle e que o sistema não tem todos os CPFs dos mortos. Ontem, o ministério disse que pretende transformar o cruzamento desses dados uma rotina na fiscalização do programa. A revelação de irregularidades no programa também provocou reação do Palácio do Planalto. O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que as denúncias serão investigadas.

— Certamente o ministério vai apurar o que tiver de apurar.

Esse é um grande programa que garante medicamentos em todo o Brasil. O programa tem de continuar e aprimorar os instrumentos de acompanhamento — disse Alexandre Padilha.

O Conselho Federal de Farmácia aponta participação e envolvimento de médicos no esquema, ao criar uma relação fictícia de usuários do Aqui Tem Farmácia Popular. O presidente do conselho, Jaldo Santos, lamentou a ocorrência dessas fraudes: — É uma sociedade criminosa entre médicos e farmácias que atua para desviar recursos do programa.

Para o dirigente do conselho, as farmácias precisam voltar a atuar apenas na oferta de serviços de saúde e deixar de serem um estabelecimento que “vende de tudo”, até alimento. Santos afirmou que, cada vez menos, as farmácias estão fiscalizando se, de fato, uma pessoa que chega com uma receita de um remédio para diabete é portadora dessa doença, o que facilita o desvio.

— Um paciente, ou suposto, chega com uma receita que garantirá desconto de 90% do remédio não é fiscalizado?! O medicamento não pode ser entregue aleatoriamente. Tem que ter um farmacêutico para aferir se o cliente é diabético ou hipertenso, o que for. Pode ser receita falsa, de paciente que nem existe.

A Associação Brasileira das Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma) divulgou nota em que isenta as 28 grandes redes associadas à entidade de envolvimento nas fraudes. Segundo a entidade, as irregularidades estão concentradas em pequenas cidades no interior do país. Para a entidade, o Aqui tem Farmácia popular é “uma conquista da sociedade brasileira”.

Lobby do remédio contribui para petista

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Newton Lima, padrinho de diretor da Anvisa, pediu ajuda a laboratórios; setor quer rever portaria da agência

Deputado recebeu do setor R$ 279 mil; norma polêmica cria selo para caixas de remédio, o que eleva custo da indústria

Ricardo Balthazar

SÃO PAULO - Laboratórios farmacêuticos contribuíram com doações de R$ 140 mil para ajudar a quitar dívidas de campanha do deputado eleito Newton Lima Neto (PT), ex-prefeito de São Carlos (SP).

A ajuda foi pedida no dia 26 de outubro, durante almoço com representantes do setor em seminário organizado pelo Sindusfarma (Sindicato da Indústria Farmacêutica do Estado de São Paulo).

No almoço também estava o diretor da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) Dirceu Barbano, que trabalhou com o petista Lima na Prefeitura de São Carlos e chegou à agência por indicação do amigo, há um ano.

Os R$ 140 mil doados pelos laboratórios pingaram na última semana de outubro, após o almoço. Somadas doações feitas antes, Lima recebeu R$ 279 mil do setor.Newton Lima não tem ligação histórica com a indústria. Sua principal base eleitoral é a área de educação.

As doações de outubro foram feitas dias depois de os laboratórios receberem sinais de que uma decisão que causara grande contrariedade na indústria entre o primeiro e o segundo turno da eleição presidencial poderia ser reavaliada pelo governo.

Um dos empresários que conversaram com Lima no dia 26 disse à Folha que o ex-prefeito mencionou um rombo de R$ 400 mil que precisava cobrir e pediu ajuda para contatar outros doadores.

A pressa do petista em angariar o que faltava para quitar a campanha se explicava pelo prazo final para prestação de contas fixado pela legislação eleitoral, que acabava em 2 de novembro.

QUEDA DE BRAÇO

Representantes da indústria que falaram com Barbano nas últimas semanas disseram à Folha que ele prometeu ajudá-los numa queda de braço que as empresas travam há meses com a agência, principal órgão responsável pela fiscalização do setor.

Com o objetivo de combater a falsificação de remédios e outras fraudes, a Anvisa criou um selo de segurança que precisará ser afixado em todas as caixas de medicamentos vendidas no país.

A indústria é contra a iniciativa, por considerar os custos envolvidos em sua implantação muito altos. Associações que representam o setor estão estudando a possibilidade de ir à Justiça para tentar derrubar a medida.

Logo depois do primeiro turno, o presidente da Anvisa, Dirceu Raposo de Mello, anunciou que publicaria uma instrução normativa definindo prazos para adoção do novo selo, mas a publicação só ocorreu no último dia 3, após o segundo turno.

Nas semanas que separaram o anúncio e a publicação, executivos da indústria pediram ajuda a autoridades e falaram com Barbano.

O diretor indicado por Newton Lima é visto no setor como forte candidato a ocupar a presidência da Anvisa depois que o mandato de Raposo terminar, em janeiro.

Segundo representantes do setor ouvidos pela Folha, no dia do seminário Barbano disse que também estava preocupado com os custos criados pelo novo selo e sugeriu que a indústria esperasse o fim da eleição para que a questão pudesse ser reexaminada.

Nos dias seguintes ao encontro, Lima recebeu doações do presidente do Sindusfarma, Omilton Visconde Júnior (que doou como pessoa física e cuja empresa já havia contribuído), e de quatro laboratórios, Biolab, Cristália, Eurofarma e Hebron, todos de capital nacional.

A instrução normativa foi publicada uma semana depois, sem sofrer revisões.

O ex-prefeito tivera apenas um contato com as empresas do setor antes disso. Em junho, ele visitou o Sindusfarma com o senador Aloizio Mercadante (PT), que concorreu ao governo estadual neste ano e também recebeu doações de laboratórios.

Em setembro, Lima convidou vários executivos do setor para um jantar de arrecadação de fundos em São Paulo. Seis fizeram contribuições na ocasião, no valor total de R$ 39 mil. Barbano também foi ao jantar e deixou na mesa um cheque de R$ 500.

O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), visto no setor como responsável pela indicação de Raposo para a presidência da Anvisa, recebeu R$ 825 mil em doações da indústria farmacêutica. A maior parte dos recursos entrou em sua conta em setembro.

TSE libera deputado barrado na Ficha Limpa

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Com a decisão em favor de Beto Mansur (PP-SP), PT perde vaga na Câmara conquistada por votação de Tiririca

Ainda faltam outros casos no TSE que podem modificar a composição da Câmara, como os de Maluf e Pedro Henry

Flávio Ferreira e Paulo Gama

SÃO PAULO - O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) liberou a candidatura à reeleição do deputado federal Beto Mansur (PP-SP), que havia sido enquadrado na Lei da Ficha Limpa. A decisão dá a Mansur uma cadeira na Câmara dos Deputados e tira uma vaga do petista Vanderlei Siraque.

A medida faz com que os 65 mil votos recebidos por Mansur em 3 de outubro sejam considerados válidos. A bancada paulista do PP na Câmara passa a ter três deputados, e a do PT cai para 23.

Siraque havia obtido a cadeira por conta da expressiva votação recebida pelo humorista Francisco Everardo Oliveira Silva (PR-SP), o Tiririca.

Ao obter 1,3 milhão de votos para a coligação que reuniu, entre outras siglas, o PR e o PT, Tiririca permitiu a eleição de Siraque, que atualmente é deputado estadual.

Em setembro, o TRE (Tribunal Regional Eleitoral) de São Paulo considerou Mansur "ficha-suja", pois em 2004 o deputado foi condenado pelo TJ (Tribunal de Justiça) de São Paulo por abuso de poder político nas eleições de 2000.

Segundo a decisão de 2004, Mansur usou dinheiro público para imprimir e distribuir panfletos para promover sua reeleição à Prefeitura de Santos em 2000.

O TRE-SP declarou que essa condenação tornava o deputado inelegível até 2012 e indeferiu a candidatura dele. Mansur recorreu ao TSE.

Na corte, o ministro Arnaldo Versiani, relator do processo, fez uma interpretação da Lei da Ficha Limpa diferente daquela do TRE-SP.

Para Versiani, pelo texto da lei, a condenação do TJ paulista tornou o deputado inelegível até 2008, e assim liberou a candidatura dele.

O Ministério Público Eleitoral e Nobel Soares (PSOL-SP), autor da impugnação contra Mansur, ainda podem recorrer contra a decisão de Versiani ao plenário do TSE.

Após 3 de outubro, a Justiça Eleitoral já havia liberado dois barrados por TREs com base na Lei da Ficha Limpa, provocando uma "dança das cadeiras" na Câmara.

Decisão da semana passada do TSE concedeu uma vaga na Casa Legislativa a Augusto Maia (PTB-PE), que havia sido enquadrado com "ficha-suja" pelo TRE-PE.

Já o TRE do Ceará, na semana seguinte à eleição, revogou sua própria decisão e deferiu a candidatura a deputado federal de Manoel Salviano (PSDB-CE).

Ainda há no TSE casos de considerados "fichas-sujas", como Paulo Maluf (PP-SP) e Pedro Henry (PP-MT), que poderão alterar as bancadas na Câmara dos Deputados.

Farc: Dilma terá importante papel na paz na região

DEU EM O GLOBO

Flávio Freire

SÃO PAULO. As Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) divulgaram ontem comunicado em que afirmam que a eleição de Dilma Rousseff (PT) à Presidência aumentou a esperança do grupo de alcançar a paz pelo diálogo e a Justiça social. Divulgada no site da Agência de Notícia Nova Colômbia (Anncol), a mensagem saúda a eleição de Dilma, “uma mulher sempre ligada à luta pela Justiça”. As Farc salientam que a paz na América Latina ganhou reforço com a eleição da petista, que tem “pública convicção” da necessidade de uma saída política ao conflito interno da Colômbia. Não há, no comunicado, declaração de apoio ao governo eleito no Brasil.

“Sua exaltação à Presidência, somada à sua pública convicção da necessidade de uma saída política ao conflito interno da Colômbia, centuplicou nossa esperança na possibilidade de alcançar a paz por intermédio do diálogo e da Justiça social”, diz o comunicado, que tem como procedência “as montanhas da Colômbia” e é atribuído ao secretário do Estado-Maior Central das Farc, mas sem nome ou assinatura.

Ainda segundo o texto, Dilma terá “papel determinante na aclimatação da paz regional e na irmandade dos povos do continente”.

A relação do PT com as Farc foi explorada na campanha eleitoral. Indio da Costa (DEM), candidato a vice na chapa de José Serra (PSDB), ligou o PT ao grupo rebelde e ao narcotráfico. Na ocasião, declarou: “Todo mundo sabe que o PT é ligado às Farc, ligado ao narcotráfico, ligado ao que há de pior. Não tenho dúvida nenhuma disso”.

Vaccarezza: 'Não concordo com métodos das Farc'

DEU EM O GLOBO

Flávio Freire

Líder petista diz que o certo é que, para ele, eleição foi avanço

SÃO PAULO. Ao comentar a nota divulgada pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) elogiando a eleição de Dilma Rousseff para a Presidência, dirigentes do PT reafirmaram ontem que não concordam ou partilham os métodos utilizados pelo grupo guerrilheiro: — Estou tendo informação sobre esse comunicado pelo GLOBO, por isso não posso tratar de seu conteúdo. O que posso dizer é que não concordo nem partilho dos métodos usados pelas Farc. Agora, considerar a eleição da Dilma como um avanço é um ponto pacífico, seja manifestado pelas Farc ou até por ditaduras de direita — disse o líder do governo na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza (SP).

Os Estados Unidos consideram as Farc um grupo terrorista.

O governo colombiano, por sua vez, chegou a manter relações com o grupo, mas hoje prefere o distanciamento. Há dois meses, o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, disse acreditar na perda de forças das Farc no país por conta da morte de um de seus líderes militares, conhecido por Mono Jojoy.

Durante a campanha deste ano, a direção do PT reagiu às acusações de que teria ligações com as Farc e entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal contra o candidato a vice de Serra, Indio da Costa.

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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"Rosa amarela" Heitor Villa-Lobos

A palo seco :: João Cabral de Melo Neto

1.1.
Se diz a palo seco
o cante sem guitarra;
o cante sem; o cante;
o cante sem mais nada;
se diz a palo seco
a esse cante despido:
ao cante que se canta
sob o silêncio a pino.

1.2.
O cante a palo seco
é o cante mais só:
é cantar num deserto
devassado de sol;
é o mesmo que cantar
num deserto sem sombra
em que a voz só dispõe
do que ela mesma ponha.

1.3.
O cante a palo seco
é um cante desarmado:
só a lâmina da voz
sem a arma do braço;
que o cante a palo seco
sem tempero ou ajuda
tem de abrir o silêncio
com sua chama nua.

1.4.
O cante a palo seco
não é um cante a esmo:
exige ser cantado
com todo o ser aberto;
é um cante que exige
o ser-se ao meio-dia,
que é quando a sombra foge
e não medra a magia.

2.1.
O silêncio é um metal
de epiderme gelada,
sempre incapaz das ondas
imediatas da água;
A pele do silêncio
pouca coisa arrepia:
o cante a palo seco
de diamante precisa.

2.2.
Ou o silêncio é pesado,
é um líquido denso,
que jamais colabora
nem ajuda com ecos;
mais bem, esmaga o cante
e afoga-o, se indefeso:
a palo seco é um cante
submarino ao silêncio.

2.3.
Ou o silêncio é levíssimo,
é líquido e sutil
que se ecoa nas frestas
que no cante sentiu;
o silêncio paciente
vagaroso se infiltra,
apodrecendo o cante
de dentro, pela espinha.

2.4.
Ou o silêncio é uma tela
que difícil se rasga
e que quando se rasga
não demora rasgada;
quando a voz cessa, a tela
se apressa em se emendar:
tela que fosse de água,
ou como tela de ar.

3.1.
A palo seco é o cante
de todos mais lacônico,
mesmo quando pareça
estirar-se um quilômetro:
enfrentar o silêncio
assim despido e pouco
tem de forçosamente
deixar mais curto o fôlego.

3.2.
A palo seco é o cante
de grito mais extremo:
tem de subir mais alto
que onde sobe o silêncio;
é cantar contra a queda,
é um cante para cima,
em que se há de subir
cortando, e contra a fibra.

3.3.
A palo seco é o cante
de caminhar mais lento:
por ser a contra-pelo,
por ser a contra-vento;
é cante que caminha
com passo paciente:
o vento do silêncio
tem a fibra de dente.

3.4.
A palo seco é o cante
que mostra mais soberba;
e que não se oferece:
que se toma ou se deixa;
cante que não se enfeita,
que tanto se lhe dá;
é cante que não canta,
cante que aí está.

4.1.
A palo seco canta
o pássaro sem bosque,
por exemplo: pousado
sobre um fio de cobre;
a palo seco canta
ainda melhor esse fio
quando sem qualquer pássaro
dá o seu assovio.

4.2.
A palo seco cantam
a bigorna e o martelo,
o ferro sobre a pedra
o ferro contra o ferro;
a palo seco canta
aquele outro ferreiro:
o pássaro araponga
que inventa o próprio ferro.

4.3.
A palo seco existem
situações e objetos:
Graciliano Ramos,
desenho de arquiteto,
as paredes caiadas,
a elegância dos pregos,
a cidade de Córdoba,
o arame dos insetos.

4.4
Eis uns poucos exemplos
de ser a palo seco,
dos quais se retirar
higiene ou conselho:
não o de aceitar o seco
por resignadamente,
mas de empregar o seco
porque é mais contundente.


(Quaderna. In: Poesias Completas,1975, p.160)