terça-feira, 31 de maio de 2022

Opinião do dia - Karl Marx*: Poder das ideais (2)

“Ao adquirir a ideia da igualdade humana a consistência de uma crença popular e que se pode decifrar o segredo da expressão do valor, a igualdade e a equivalência de todos os trabalhos, porque são e enquanto são trabalho humano em geral”.

*K. Marx, O Capital. Crítica da economia política, Livro 1, vol. 1, p. 81-82, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,1998.

Merval Pereira: Machadiano

O Globo

À falta de coisa melhor na política, num momento em que a radicalização leva a situações surreais no país, dedico este espaço a um encontro acontecido no leito de morte de Machado de Assis em sua casa no Cosme Velho, que não existe mais pela incúria de nossa política cultural. Um encontro entre um jovem estudante, que se tornaria importante figura da política nacional, e o maior escritor brasileiro.

Foi assim que Euclides da Cunha descreveu o encontro, no Jornal do Commercio de 30 de setembro de 1908:

“Neste momento, precisamente ao anunciar-se esse juízo desalentado, ouviram-se umas tímidas pancadas na porta principal da entrada. Abriram-na. Apareceu um desconhecido: um adolescente, de 16 ou 18 anos, no máximo.

Perguntaram-lhe o nome. Declarou ser desnecessário dizê-lo: ninguém ali o conhecia; não conhecia por sua vez ninguém; não conhecia o próprio dono da casa, a não ser pela leitura de seus livros, que o encantavam. Por isso, ao ler nos jornais da tarde que o escritor se achava em estado gravíssimo, tivera o pensamento de visitá-lo. Relutara contra essa ideia, não tendo quem o apresentasse: mas não lograva vencê-la. Que o desculpassem, portanto. Se lhe não era dado ver o enfermo, dessem-lhe ao menos notícias certas de seu estado.

E o anônimo juvenil — vindo da noite — foi conduzido ao quarto do doente. Chegou. Não disse uma palavra. Ajoelhou-se. Tomou a mão do mestre, beijou-a num belo gesto de carinho filial. Aconchegou-o depois por algum tempo ao peito. Levantou-se e, sem dizer palavra, saiu.

À porta, José Veríssimo perguntou-lhe o nome. Disse-lho.

Mas deve ficar anônimo. Qualquer que seja o destino desta criança, ela nunca mais subirá tanto na vida. Naquele momento o seu coração bateu sozinho pela alma de uma nacionalidade. Naquele meio segundo — no meio segundo em que ele estreitou o peito moribundo de Machado de Assis, aquele menino foi o maior homem de sua terra.

Ele saiu — e houve na sala, há pouco invadida de desalentos, uma transfiguração.”

Estavam reunidos na casa, relata Euclides, grandes intelectuais como Coelho Neto, Graça Aranha, Mário de Alencar, José Veríssimo, Raimundo Correia e Rodrigo Otávio. O nome ficou guardado durante muitos anos, até que a escritora Lúcia Miguel Pereira revelou, em 1936, ser Astrojildo Pereira, que viria a se tornar escritor, jornalista, crítico literário e entraria na História do Brasil como fundador do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que completa 100 anos.

Míriam Leitão: Riscos rondam o presidente

O Globo

Nunca um presidente concorreu à reeleição no Brasil com um quadro tão adverso na economia. A inflação estava baixa e em alguns casos cadente nos anos em que Fernando Henrique, Lula e Dilma disputaram seus segundos mandatos. A inflação é o dado mais sensível para os eleitores. Em 2022, existem outros complicadores, como o risco de falta de diesel se houver congelamento de preços. O PIB do primeiro trimestre, que será divulgado na quinta-feira, vai surpreender positivamente, mas os economistas alertam para o risco de recessão técnica no segundo semestre, momento em que o eleitor irá às urnas. A pesquisa do Datafolha mostra um salto na percepção negativa dos entrevistados. Saiu de 31%, em 2019, para 66%, agora, a fatia dos que acham que a situação econômica do país piorou nos últimos meses.

Em maio de 1998, quando Fernando Henrique disputou o segundo mandato, o país tinha uma inflação acumulada em 12 meses de apenas 3,95%. Em outubro, na hora do voto, havia caído para 2%. A economia estava recessiva e havia uma enorme pressão sobre o câmbio, que explodiu em 1999, mas a inflação estava baixa. Em maio de 2006, quando Lula concorreu ao segundo mandato, a taxa estava em 4,2% e caindo. Em outubro, bateu em 3,26%. Entre maio e outubro de 2014, quando Dilma Rousseff concorreu, a inflação ficou entre 6,37% a 6,59%. Agora, o índice está em dois dígitos desde setembro do ano passado.

Carlos Andreazza: Guedes fortalecido

O Globo

Paulo Guedes não chega fortalecido à reta final do governo Bolsonaro por haver imposto suas ideias — na hipótese de que as palestras motivacionais contivessem algo de programa econômico. Nem no mercado o levam a sério. Guedes vai ora forte porque, na hipótese de que houvesse alguma resistência sua à entrega do Orçamento para Ciro Nogueira e Lira Boys, aderiu absolutamente — ou melhor, sem mais fingimento — ao projeto gastador pela reeleição do chefe.

Veja-se a Petrobras. O que se faz ali expressa esse movimento. Bolsonaro não está preocupado com a maneira como a empresa forma preço. Quer que o preço não suba até a eleição. Quer um jeito. Jeitinho. Ponto. E então ascende Guedes, de súbito prestigiado. Clara Nunes cantaria que, para subir, o ministro desceu. Desceu mais. Guedes como agente interventor numa companhia de capital aberto. Suas crias liberais vêm para segurar o preço dos combustíveis. Não mexerão no estatuto da petroleira nem no PPI. A mão grande pesa na figura de um puxadinho.

Enrolar, ganhar tempo; explorando até, esticando ao máximo, o prazo para formalização do novo presidente da Petrobras. Quarenta e cinco, talvez 60 dias. Tudo paralisado, Conselho atual deslegitimado, diretoria pendurada. Nada ocorre. Não se bole em preço. E depois, posto o Caio da vez, empurrar: represar preço — mais 100, 120 dias — para que a correção só bata nas bombas, aí como enchente, depois das eleições. Essa é a ideia.

Apesar do apoio oficial a Tebet, MDB faz acenos a Lula ou Bolsonaro em metade dos estados

Para interlocutores da cúpula emedebista, candidatura da senadora blinda postulantes que evitam polarização

Por Bernardo Mello e Eduardo Gonçalves  / O Globo

Rio e Brasília - Com apoio formal da maioria dos diretórios regionais do MDB, a pré-candidatura da senadora Simone Tebet (MDB-MS) à Presidência convive com acenos de correligionários ao ex-presidente Lula (PT) ou ao presidente Jair Bolsonaro (PL) em pelo menos 13 estados. Reservadamente, lideranças partidárias dizem que o desempenho tímido de Tebet nas pesquisas, sem passar de 2% até aqui, faz com que parte dos pré-candidatos a cargos majoritários e ao Legislativo busquem se associar aos nomes mais competitivos por ora no cenário nacional.

Apesar desses acenos e de admitirem possíveis traições na campanha, os caciques emedebistas mantêm o discurso pró-Tebet para seguir a linha defendida pelo presidente nacional do MDB, Baleia Rossi. Segundo interlocutores de Baleia, a estratégia de lançar chapa própria ao Planalto ajuda candidatos que, por circunstâncias locais, preferem evitar tomar lado entre Lula e Bolsonaro — caso do próprio presidente emedebista, que tem como reduto o interior de São Paulo.

Levantamento do GLOBO apontou que 22 dos 27 diretórios do MDB externaram apoio a Tebet. Cinco estados evitam endossá-la. Em Rondônia, o diretório é comandado por Lúcio Mosquini, vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara, que avalia compor um palanque bolsonarista. Nos outros quatro — Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Alagoas —, o partido defende apoio a Lula.

Em outros estados do Nordeste, como Bahia e Piauí, o MDB formará chapas com candidatos do PT ao governo e pretende estar no palanque do ex-presidente.

Cristina Serra: Pauta-bomba na Câmara para a mata atlântica

Folha de S. Paulo

Deter a pilhagem ecológica secular não é pauta exclusiva de ambientalistas

Tom Jobim dizia que "a coisa mais bonita" que já vira era a mata atlântica e que sua obra fora inspirada pelo esplendor de vida de bichos e plantas. Num tempo em que poucos sabiam o que era ecologia, Tom já falava da urgência de conter o desmatamento e de "plantar floresta".

Imagino a tristeza do Tom se soubesse que hoje ocorre exatamente o contrário. O monitoramento feito pela SOS Mata Atlântica e pelo Inpe revelou um alarmante aumento de 66% na derrubada da floresta em 2021 (sobre 2020).

Tesouro de extraordinária biodiversidade, a mata atlântica é um dos biomas mais ameaçados do planeta, tendo apenas 12% da floresta original preservada. O desmatamento atual deve-se principalmente à agropecuária e à especulação imobiliária. Pressões favorecidas pelo estímulo permanente do vândalo do Planalto ao crime ambiental.

Joel Pinheiro da Fonseca: A politização da Lei Rouanet

Folha de S. Paulo

Condenar um enquanto se ganha quantias superiores é uma grande hipocrisia

Todos as estrelas do sertanejo —e não só elas— devem estar secretamente furiosas com o cantor Zé Neto (da dupla Zé Neto & Cristiano) por ter, numa fala completamente gratuita durante um show, desmerecido artistas que captam recursos via Lei Rouanet (como se fossem menos dignos do que ele) e ainda, a cereja do bolo, feito uma indireta contra Anitta por ter, como todo mundo sabe, feito tatuagem em uma parte bem íntima do corpo.

Em pouco tempo, começaram as investigações. O mesmo artista que desmerece a Lei Rouanet ganha cachês de centenas de milhares de Reais de municípios espalhados pelo país. Se isso não é mamata, o que é?

Outro sertanejo de direita, Sergio Reis, se saiu com esse malabarismo: quando a prefeitura gasta para contratar um show "é dinheiro para o público, não é dinheiro público". Então o mesmo vale para o dinheiro captado por Lei Rouanet! Ele também retorna ao público.

Alvaro Costa e Silva: Graciliano Ramos analisa o bolsonarismo

Folha de S. Paulo

'Psicografados' por Silviano Santiago, diários do escritor revelam fragilidade da democracia

Em 1937, depois de passar dez meses e dez dias na prisão e quase morrer, Graciliano Ramos foi solto: "Não sinto o meu corpo". Assim começa "Em Liberdade", de Silviano Santiago, publicado pela primeira vez em 1981 e que está de volta às livrarias. Uma obra inclassificável —ficção, autobiografia, relato histórico, ensaio, pastiche—, que tem o dom (ou a desgraça) da atualidade eterna.

O Brasil que Graciliano encontrou ao deixar o presídio da Ilha Grande às vésperas da instauração do Estado Novo, o de Silviano enquanto escrevia o livro ainda no período da ditadura militar e o de agora, com Bolsonaro e seus generais conspirando para dar um golpe durante as eleições, revelam quão frágil é a nossa realidade democrática.

"Em Liberdade" é um falso diário íntimo, que cobre dois meses da nova vida fora das grades. O leitor acompanha o romancista alagoano na casa do amigo José Lins do Rego, jantando bife à milanesa no Lamas, morando numa pensão do Catete, ganhando o sustento com frilas, seguindo uma garota na praia de Botafogo e tendo de esconder a ereção.

Eliane Cantanhêde: ‘Catástrofes acontecem...’

O Estado de S. Paulo

Em vez de passear de jet ski em Santa Catarina, Bolsonaro fez sobrevoo e comício no Recife

Nada poderia ser mais sarcástico e irritante, neste momento de horrores, do que o sanguinário Vladimir Putin enviar mensagem para o presidente Jair Bolsonaro lamentando a tragédia em Pernambuco. Qual o sentido de quem massacra milhares de ucranianos lastimar a morte de dezenas de brasileiros?

“A Rússia compartilha o pesar daqueles que perderam seus parentes e entes queridos como resultado do desastre natural desenfreado e espera uma rápida recuperação de todas as vítimas”, diz a mensagem de Putin a Bolsonaro, depois postada no Telegram.

Putin não está nem aí para mortes no Brasil e fica claro o namoro com Bolsonaro desde a ida do presidente brasileiro a Moscou, com o filho especialista em internet e toda a cúpula militar, às vésperas da invasão da Ucrânia. Os objetivos, os interesses e as intenções nunca foram devidamente explicados.

As reações do próprio Bolsonaro a dor, morte e destruição em Pernambuco, sobretudo no Recife, não são de um presidente preocupado com seu povo e de um ser humano com empatia e coração. São de um candidato que só pensa na reeleição.

Andrea Jubé: Sem “cavalo de pau”, Bolsonaro derrapa

Valor Econômico

Bolsonaro pode virar o jogo com pauta de costumes

”Era infinitamente maio” (com a licença poética de Guimarães Rosa), e mais uma vez, na história recente das eleições, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva despontou como líder na rodada de pesquisas sobre a sucessão presidencial realizadas a quatro meses do pleito. Um favoritismo que, nem sempre, perdurou, ou se confirmou nas urnas.

O levantamento mais recente do instituto Datafolha mostrou que o petista, com 48% das intenções de votos, abriu uma vantagem de 21 pontos sobre o presidente Jair Bolsonaro, que aparece com 27% da preferência dos entrevistados.

Lula celebrou, fustigando o principal adversário: "vocês viram a pesquisa... Ô [Geraldo] Alckmin, eu imagino que o Bolsonaro não dormiu ontem à noite”, provocou, dirigindo-se ao seu provável vice na chapa.

Mas, logo desautorizou o “salto alto”, até por ser gato escaldado. "A gente não vai poder parar, porque se a gente parar, a gente pode ter dificuldade de ganhar", alertou, voltando-se à militância.

Há 20 anos, no levantamento divulgado pelo mesmo Datafolha em 14 de maio, Lula emergia como favorito, com 43% das intenções de votos, enquanto o ex-ministro da Saúde José Serra (PSDB) despontava com 17%. Na véspera do pleito, Lula chegou a 48% dos votos válidos, e Serra bateu em 21%. O embate acabou definido no segundo turno, com a vitória do petista.

Maria Cristina Fernandes: Presidente monta palanque em cima da tragédia em PE

Valor Econômico

Presidente faz campanha para seus candidatos e para sim mesmo, aparelha ministério e ataca governador

O presidente Jair Bolsonaro transformou sua visita a Pernambuco - que registrou, até a manhã de ontem, 91 mortes, 26 desaparecidos e cinco mil desabrigados em decorrência das chuvas - num palanque eleitoral em defesa de seu grupo político no Estado e de sua própria reeleição. Valeu-se ainda de sua presença na cidade para tentar remediar a imagem negativa de sua atuação na pandemia. Não faltou nem mesmo a associação da morte de Genivaldo Santos, motociclista morto em Sergipe pela Polícia Rodoviária Federal, à “bandidagem” ao lado de quem, disse ele, a “mídia sempre está”.

Depois de sobrevoar as áreas alagadas, sem pousar em nenhuma delas, o presidente deu entrevista na Base Aérea do Recife antes de voltar a Brasília. Estava acompanhado de seis ministros (Defesa, Saúde, Desenvolvimento Regional, Cidadania, Turismo e GSI) e o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, todos de colete para dar a imagem de equipe em operação. No Recife, integraram-se à comitiva o comandante militar do Nordeste, general Richard Nunes, o prefeito de Jaboatão dos Guararapes, Luiz Medeiros, que assumiu a gestão com a desincompatibilização do titular, Anderson Ferreira (PL), candidato do bolsonarismo ao governo do Estado, além do deputado federal Pastor Eurico (PL-PE), candidato à reeleição e integrante do núcleo político local do presidente.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Educação precisa de um plano para recuperar perdas

O Globo

São preocupantes os números revelados pelo Censo Escolar 2021. Principal levantamento estatístico da educação básica no Brasil, feito por estados e municípios sob coordenação do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ele traduz o estrago provocado no ensino brasileiro por gestores ineptos, além de expor o tamanho do desafio que se impõe para recuperar o prejuízo. O resultado era previsível, diante do absurdo perpetrado pelo Ministério da Educação e por secretarias estaduais e municipais, ao prolongar o tempo em que escolas permaneceram fechadas durante a pandemia — enquanto quase tudo estava aberto.

Como mostrou o Jornal Nacional, uma das conclusões desconcertantes da pesquisa é que mais da metade dos estudantes (54%) chegou ao terceiro ano do ensino fundamental sem habilidades básicas de leitura, e 13% assim permaneceram até o sexto ano. Um terço dos alunos terminou o ensino fundamental, depois de nove anos, sem conseguir ler fluentemente. É uma situação inadmissível.

Poesia | João Cabral de Melo Neto: O Rio

 

Música | Paulinho da Viola: Vai dizer ao vento

 

segunda-feira, 30 de maio de 2022

Opinião do dia - K. Marx*: poder das ideias

“É certo que a arma da crítica não pode substituir a crítica das armas, que o poder material tem de ser derrocado pelo poder material, mas também a teoria transforma-se em poder material logo que se apodera das massas. A teoria é capaz de se apossar das massas ao demonstrar-se ad hominem, e demonstra-se ad hominem logo que se torna radical. Ser radical é agarrar as coisas pela raiz. Mas, para o homem, a raiz é o próprio homem.”

*K. Marx, “Critica da filosofia do direito de Hegel – Introdução (1843)”, p. 151. Boitempo Editorial, São Paulo, 2005.

Marcus André Melo: Eleição e moderação

Folha de S. Paulo

Se os candidatos alterassem radicalmente seus programas, o voto não seria afetado

Muitos esperavam que a disputa eleitoral produzisse um deslocamento centrípeto por parte dos dois principais contendores do pleito. Assim, Lula e Bolsonaro tenderiam à moderação e abandonariam os pontos mais radicais de suas agendas. Isto pode ser observado no passado, mas não no presente. Os candidatos têm falado para seus públicos internos.

A escolha de Alckmin para vice parece exceção; mas na realidade representa um seguro político —um compromisso crível— para cenário de eventual crise institucional, não concessão programática. A aproximação com o centrão é estratégia de sobrevivência política, não abandono de questões controversas da agenda pública.

O modelo analítico que informa a conjetura de convergência é clássico: a preferência do eleitor mediano baterá as demais, em escolhas binárias, o que criaria incentivos centrípetos para as candidaturas.

Celso Rocha de Barros: A fome do ‘Bolsocaro’

Folha de S. Paulo

Tragédia da fome bolsonarista é uma tragédia feminina

Na semana passada, foi publicado um estudo da Fundação Getúlio Vargas sobre insegurança alimentar no final de 2021 ao redor do mundo.

A porcentagem de brasileiros que relatou não ter tido dinheiro para alimentar a si mesmo ou a seus familiares em algum momento dos últimos 12 meses subiu de 30% para 36%.

Pela primeira vez desde que a pesquisa é feita, o percentual brasileiro é maior do que a média mundial (35%).

Como se pode imaginar, o problema foi muito pior entre os brasileiros mais pobres. Em 2021, 75% dos cidadãos que compõem os 20% mais pobres da população brasileira ficaram sem dinheiro para comer ou para alimentar suas famílias em algum momento. Três quartos.

Carlos Pereira: Roteiro do golpe está pronto; e agora?

O Estado de S. Paulo.

Erros do passado e experiências de outros países capacitam instituições contra iliberalismos

Seis meses antes do golpe ocorrido no Chile em 11/09/1973, apenas 27% dos chilenos acreditavam que o golpe aconteceria (Navia e Osório 2017). Por outro lado, de acordo com o Datafolha (15/09/2021), mais da metade dos brasileiros (51%) creem que Bolsonaro pode tentar um golpe, especialmente em caso de derrota nas eleições de 2022.

Há quem acredite, inclusive, que o roteiro do golpe contra a democracia brasileira já estaria traçado.

O primeiro passo seria incutir desconfiança sobre a lisura do processo eleitoral por meio de questionamentos sobre a segurança das urnas eletrônicas, comprometendo a sua confiabilidade perante os eleitores ao afirmar que “a urna não é inviolável, é penetrável, sim”.

Argumento central desse roteiro é a crítica a uma hipotética “sala secreta ou escura” que contabilizaria os votos chegados ao TSE, o que afetaria a transparência do processo de apuração. Também contribuiria nessa trama o confronto direto com ministros do STF, como a recente alegação de abuso de autoridade do ministro Alexandre de Moraes por sua condução no inquérito das fake news.

Entrevista | José Aníbal: ‘Tebet é qualificada, mas PSDB precisa ter candidato’

Membro histórico do partido evita se contrapor a declarações de endosso ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT)

Por Gustavo Schmitt / O Globo

Integrante da ala “histórica” do PSDB, partido ao qual se filiou há mais de 30 anos, o ex-senador José Aníbal defende que a sigla retome o debate sobre a candidatura própria — e lista no horizonte os nomes do ex-governador Eduardo Leite e do senador Tasso Jereissati. Ele, no entanto, reconhece a tendência interna de apoio à senadora Simone Tebet (MDB-MS) e evita se contrapor a declarações de endosso ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), como já fez o ex-ministro Aloysio Nunes: “Não tenho restrições a essas manifestações”.

A saída do ex-governador João Doria da disputa presidencial após vencer as prévias macula a imagem do PSDB?

Lamentamos muito, porque fizemos um movimento inovador na política brasileira com as prévias. Infelizmente, o Doria ganhou, mas não levou. Ele não levou o partido a ampliar o seu espaço em meio à polarização. Não foi possível, mesmo com os méritos que ele (Doria) teve ao viabilizar a Coronavac.

O PSDB gastou R$ 12 milhões com as prévias. Os advogados de Doria afirmaram que isso poderia levar à rejeição das contas do PSDB pelo TSE...

Ele usou todos os argumento (para ser candidato). Mas, se estiver tudo de acordo com o permitido pela lei, não tem preocupação.

O grupo de Doria disse que houve “golpe”. O senhor concorda?

Nem ele (Doria) acreditava mais nisso quando decidiu abrir mão da candidatura. Ele observou que havia dificuldade, especialmente dos candidatos aos governos estaduais e deputados, de estarem associados à candidatura presidencial dele. Doria conseguiu ter uma rejeição alta e uma intenção de votos muito baixa. É muito difícil resolver essa equação.

Mathias Alencastro*: A ameaça populista

Folha de S. Paulo

Diante da vitória iminente da esquerda, direita se rebela e troca moderado por populista

A história da última semana da eleição colombiana soa como a repetição de um enredo cada vez mais comum nas democracias liberais. Diante da vitória iminente da esquerda, liderada pelo moderado Gustavo Petro, a direita se rebela e troca um opositor moderado por um populista.

Quem desempenha esse papel é o oligarca-bufão Rodolfo Hernández. Ele ultrapassou Federico "Fico" Gutiérrez, o jovem liberal apoiado por todos os partidos da direita tradicional, e chegou ao segundo turno contra Petro com uma campanha relâmpago que retoma a receita original dos populistas: demagogia anticorrupção, anticomunismo enfurecido e uso exclusivo das redes sociais.

A passagem para a segunda volta eleva a tensão das presidenciais. Todos os candidatos circulam pelo país acompanhados de escoltas militares, e ameaças de assassinatos são denunciadas cotidianamente.

Petro sabe que toda a tensão gira em torno da sua candidatura. Sua biografia reflete o longo caminho da Colômbia em direção à paz. O ex-membro da guerrilha M-19 teve uma passagem bem-sucedida pela política institucional, servindo como senador e prefeito, antes de construir a primeira plataforma de partidos progressistas com condições de vencer as presidenciais.

Ana Cristina Rosa: Até quando vamos aturar a barbárie?

Folha de S. Paulo

Mais de 79% dos mortos pela polícia no Brasil são negros

Até quando vamos aturar a violação de direitos humanos e seguir convivendo com a barbárie institucionalizada no país? Mais de 79% dos mortos pela polícia no Brasil são negros. Um caso mais estarrecedor que o outro.

Condolências e promessas de investigação são gestos de civilidade importantes e necessários, mas absolutamente insuficientes diante da realidade macabra. É hora de agir em prol de resultados que coloquem algum freio nessa sanha pelo extermínio da população negra.

O assassinato de George Floyd, asfixiado por um policial branco nos EUA, causou comoção global. Passados dois anos, culpados foram punidos e uma reforma da polícia federal foi anunciada pelo presidente americano. "A mensagem das ruas foi clara: basta!", disse Joe Biden.

Lygia Maria: Polícia etimológica

Folha de S. Paulo

Obsessão por palavras está criando uma sociedade paranoica

"Praga". Esse é o termo que a pesquisadora Camille Paglia usa para se referir ao politicamente correto. A busca constante por preconceitos nos mais ínfimos detalhes do cotidiano, segundo ela, se assemelha a um transtorno mental, uma alucinação coletiva. O que aconteceu no programa "Em Pauta", do canal Globo News, é prova disso.

Uma jornalista foi repreendida porque falou a palavra "denegrir". Segundo o apresentador que passou o pito, "não se usa mais essa palavra". Pelo visto, há por aí uma polícia etimológica. Fato é que a jornalista pediu perdão e, provavelmente, nenhum outro jornalista da emissora se atreverá a cometer tal pecado novamente. Se a moda pega, capaz de a censura atingir outros veículos —o que faz com que esse problema não seja algo banal.

Ruy Castro: Lá vamos nós de novo

Folha de S. Paulo

Uma exposição em Nova York tem barquinhos com dinheiro brasileiro

Se você já se perguntou onde foi parar todo o dinheiro velho que trocou pelo novo nas antigas mudanças de moeda no Brasil, sabe que boa parte dele foi incinerada pelos governos de então. Mas outra parte sobreviveu e circula hoje como ectoplasma pelos sites de leilões e compras, disputado por colecionadores de velharias exóticas —e poucas velharias são mais exóticas do que dinheiro brasileiro. De anos em anos, devorado pela inflação, cortavam-se três zeros do seu valor e pespegavam-lhe um novo nome, o que obrigava à destruição de bilhões de cédulas e sua substituição por outras tantas.

Daí, de 1942 para cá, tivemos as notas de cruzeiro, cruzeiro novo, mais uma vez cruzeiro, cruzado, cruzado novo, novamente cruzeiro, cruzeiro real e, por fim, o real. As cédulas novas mal chegavam a ficar velhas e nojentas, porque a inflação fazia com que fossem logo renomeadas e trocadas. Em 1993, a inflação no Brasil foi de, pode crer, 2.708,55%.

Fernando Gabeira: A violência como linguagem

O Globo

O mês de maio é muito bonito no Rio. Desfruto as manhãs e, no restante do dia, mergulho nos livros. Ensaios, romances, biografias, tudo que consigo ler antes que o cansaço me derrube.

Coincidência ou não, apesar da beleza dos dias de maio, preparava um texto sobre violência, das chacinas às agressões verbais de nossos tempos.

É mais fácil explicar por que o velho Santiago do livro de Ernest Hemingway pesca um imenso peixe e o perde no caminho da praia do que entender as razões do jovem Salvador  Ramos, que matou 19 crianças e duas professoras em Uvalde, no Texas.

Também é muito difícil entender por que uma operação de inteligência resulta na morte de 23 pessoas, na Vila Cruzeiro, no Rio.

Será que estamos falando da mesma palavra quando dizemos inteligência?

No fundo, é possível dizer que políticas públicas estão por trás dessas mortes: a que coloca nas mãos do jovem Salvador dois fuzis; ou a que antevê no fuzilamento em grande escala um trunfo eleitoral.

O que estava preparando para explicar não trata diretamente de massacres, mas sim das condições que tornaram nossas vidas tão expostas à violência.

Demétrio Magnoli: Ucrânia, encruzilhada da Europa

O Globo

‘Seria uma falência moral, que a História condenaria.’ O ministro do Exterior ucraniano, Dmytro Kuleba, referia-se à hipótese de rejeição da candidatura de seu país ao ingresso na União Europeia (UE). Seus alvos implícitos eram o presidente francês, Emmanuel Macron, e o primeiro-ministro alemão, Olaf Scholz, núcleos da resistência à pretensão da Ucrânia. Kuleba tem razão — e interpreta melhor a história da UE que os governantes das duas nações líderes do projeto europeu.

Segundo Macron, “todos nós sabemos que o processo de adesão da Ucrânia exigiria vários anos, provavelmente várias décadas”. Scholz seguiu a mesma linha ao declarar que a Ucrânia não pode se beneficiar de “um atalho”. Os argumentos franceses e alemães embutem uma visão econômico-burocrática sobre a integração europeia.

Scholz apontou a “injustiça” de acelerar o ingresso ucraniano à frente das candidaturas de seis países balcânicos. Para Macron, o “atalho” ucraniano implicaria “reduzir os padrões de acesso” e “repensar a unidade da Europa”.

— Podemos abrir procedimento de acesso para um país em guerra? — indagou o francês, oferecendo sua resposta:

— Acho que não.

Dessa posição, improvisou a proposta de criar uma “Comunidade Política Europeia”, algo como um pátio de espera destinado a candidato como a própria Ucrânia, os países dos Bálcãs ocidentais, a Moldávia e a Geórgia.

Bruno Carazza*: Bolhas de desconfiança de lulistas e bolsonaristas

Valor Econômico

Datafolha indica elevação de risco de questionamento do resultado das urnas

O resultado da última pesquisa Datafolha agitou a política brasileira. Apontando uma vitória de Lula já no primeiro turno, com 54% dos votos válidos, ela enfureceu os apoiadores de Jair Bolsonaro, que passaram a desacreditar o instituto e acusá-lo de manipulação dos dados, que seriam incompatíveis com o “DataRua” das aparições públicas do presidente.

Não é a primeira vez que isso ocorre, e há poucas semanas as críticas tiveram outro alvo e origem oposta. Publicado em 13 de abril, levantamento do PoderData mostrou a diferença de Lula sobre Bolsonaro caindo para apenas cinco pontos percentuais, o que gerou uma avalanche de acusações vindas da esquerda sobre a lisura da pesquisa e supostos interesses escusos nos números indicados.

Vivemos um tempo em que a credibilidade das pesquisas está abalada, e isso se deve a uma série de fatores. Para começar, a ausência de um censo demográfico desde 2010 prejudica o planejamento da amostragem. Diferentes metodologias e tecnologias de coleta também produzem resultados muitas vezes divergentes, deixando muitas dúvidas no ar.

Sergio Lamucci: Contratando problemas fiscais para o futuro

Valor Econômico

Aumentar gastos e reduzir impostos com base em melhora temporária de indicadores fiscais é perigoso para as contas públicas

O governo e o Congresso passaram a tomar uma série de medidas com potencial de fragilizar as contas públicas, num cenário marcado pela melhora dos indicadores fiscais de curto prazo e pela disposição do presidente Jair Bolsonaro de tentar reverter a qualquer custo a sua baixa popularidade, causada pela inflação acima de dois dígitos e pelo desemprego elevado. O exemplo da vez é a aprovação pela Câmara dos Deputados, na semana passada, de um teto para as alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre energia elétrica, combustíveis, gás natural, comunicações e transporte urbano.

Ao mesmo tempo em que pode reduzir um pouco a inflação num ano em que os índices de preços ao consumidor rodam na casa de 12% em 12 meses, a iniciativa deve provocar uma perda bilionária de receitas, que pode chegar a R$ 83,5 bilhões, nas contas do Comsefaz, o comitê que reúne os secretários estaduais da Fazenda. Além disso, a medida deverá ser judicializada, caso o Senado a aprove sem modificações importantes. Na esfera federal, há uma série de iniciativas para reduzir impostos e elevar alguns gastos. No curto prazo, elas não causam problemas para as contas públicas porque há fatores circunstanciais que tornaram mais benigna a situação fiscal. Não se trata, porém, de uma melhora estrutural.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

Gargalo econômico

Folha de São Paulo

Percepção de piora da situação pessoal tende a elevar má vontade com Bolsonaro

Entre os muitos fatores que contribuem para o mau desempenho de Jair Bolsonaro (PL) na mais recente pesquisa Datafolha, a situação da economia tem lugar de destaque.

Dois de cada três brasileiros aptos a votar consideram que o quadro econômico piorou nos últimos meses, mesmo resultado da pesquisa anterior, em março. Entretanto a parcela dos que consideram que sua situação pessoal teve deterioração subiu de 46% no levantamento de março para 52% agora.

Dado o quadro de inflação e desemprego elevados, sem grande perspectiva de melhora rápida, é ainda mais danoso para o presidente que 77% dos brasileiros declarem que a economia vai ter muita influência (53%) ou alguma influência (24%) em sua decisão de voto.

Embora 7 de cada 10 eleitores digam que não pretendem mais alterar seu voto se a economia piorar, a possibilidade de mudança é quase 10 pontos percentuais maior entre os eleitores de Bolsonaro (32%) do que entre os do petista Luiz Inácio Lula da Silva (23%).

Poesia | Manuel Bandeira: Evocação do Recife

 

Música | Bloco da Saudade: Recife, cidade lendária (Capiba)

 

domingo, 29 de maio de 2022

Paulo Fábio Dantas Neto*: Os institutos de pesquisa e o jogo das preferências

O Datafolha divulgou, no último 27 de maio, nova pesquisa de intenção de voto para Presidente. Passaram-se dois meses desde a divulgação da pesquisa imediatamente anterior desse mesmo instituto, datada de 22 de março. A nova pesquisa trouxe, como primeira novidade, um aumento da diferença entre as intenções de voto em Lula e em Bolsonaro, favorável ao primeiro. De março para cá essa diferença terá passado, segundo o Datafolha, de 17 pontos percentuais (43x26) para 21 pontos (48x27). Enquanto as intenções de voto no atual presidente oscilaram minimamente para cima, dentro da margem de erro, as do ex-presidente excedem essa margem, fazendo com que a diferença entre ambos também a exceda.  Uma segunda novidade, talvez mais significativa, é que a fotografia numérica de maio aponta a uma vitória de Lula já no primeiro turno, o que não havia sido fotografado em março.

As duas boas notícias foram suficientes para que um clima de vitória antecipada tomasse conta, pelo menos daquelas franjas da campanha de Lula que se percebe nas redes sociais, nos humores da militância em geral e até mesmo em declarações e postagens dos seus quadros políticos mais afoitos. O próprio candidato - no pleno e atento exercício do seu ofício de injetar otimismo para elevar ainda mais o moral da tropa – não escondeu o bom humor, dizendo que Bolsonaro não dormiu após a divulgação.

A recepção à citada pesquisa assume ares de uma onda reforçadora do argumento em favor de um “voto útil” à esquerda, que consume a eleição no primeiro turno, não só para assegurar a vitória de Lula, como para ajudar a desativar manobras e atos golpistas de Bolsonaro que intentem inibir, constranger e/ou desacreditar as eleições. Manobras e atos que, com razão, se supõe mais difíceis de terem êxito no primeiro turno, dada a grande quantidade de candidatos aos diversos cargos eletivos em disputa nos pleitos simultâneos, todos eles, a princípio, interessados diretos no respeito ao resultado das urnas. Penso que essa onda tem tido o poder de influenciar de modo importante as dimensões subjetivas do noticiário da imprensa e até o colunismo especializado, seja de jornalistas ou de estudiosos da área, a ponto de outros aspectos serem ofuscados pela virtual ordem de grandeza do movimento mencionado.

Luiz Carlos Azedo: De quando as ofensas levam à ruína política

Correio Braziliense

Em desvantagem nas pesquisas, declarações de Bolsonaro reforçam as suspeitas de que prepara um golpe de estado para se manter no poder, caso perca as eleições. É um momento perigoso

No embalo das pesquisas e dando sequência à coluna de sexta-feira (Quando a fortuna governa a política, e a virtude, não), voltamos ao clássico dos clássicos da política, O Príncipe, de Nicolau Maquiavel, para falar do governo Bolsonaro e das próximas eleições. O astuto florentino foi associado ao vale tudo na política por uma frase que lhe é atribuída, mas que nunca dissera: “Os fins justificam os meios”. Essa interpretação errônea (ou de má-fé) é fruto do seu realismo, ao desvincular o Estado do Direito Divino.

É lugar comum o conselho atribuído a Maquiavel de que o mal deve ser feito de uma só vez. “Por isso, é de notar-se que, ao ocupar um Estado, deve o conquistador exercer todas aquelas ofensas que se lhe tornem necessárias, fazendo-as todas a um tempo só para não precisar renová-las a cada dia e poder, assim, dar segurança aos homens e conquistá-los com benefícios. Quem age diversamente, ou por timidez ou por mau conselho, tem sempre necessidade de conservar a faca na mão, não podendo nunca confiar em seus súditos, pois que estes nele também não podem ter confiança diante das novas e contínuas injúrias”.

Eliane Cantanhêde: Bolsonaro e pesquisas na berlinda

O Estado de S. Paulo

Bolsonaro parou de crescer, com rejeição alta, confiança baixa e pouca margem para reagir

O ex-presidente Lula já previa o resultado muito favorável a ele na pesquisa Datafolha, mas o presidente Jair Bolsonaro não tinha ideia das más notícias que estavam a caminho. Lula tem chance de vencer no primeiro turno e Bolsonaro, que parou de crescer, empacou com rejeição alta, nível de confiança baixo e pouca margem para reagir.

Lula já esperava bons dados porque Marcos Coimbra, do Vox Populi, tinha feito um cruzamento das diferentes pesquisas, com tendência favorável ao petista na intenção de voto geral e em praticamente todos os recortes: regional, gênero, rejeição… Bolsonaro, que insiste em pregar para convertidos, foi pego de surpresa. Os petistas ocuparam a internet nas 24 horas seguintes e os bolsonaristas, sempre ativos e agressivos, se recolheram. Não tinham o que dizer.

No cruzamento do Vox Populi, o petista só perdia em três pequenos Estados no Norte, mais Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, Santa Catarina e Distrito Federal. E veio o Datafolha: em 2018, Bolsonaro ganhou do PT em todas as regiões, menos no Nordeste, e agora está perdendo em todas, exceto o CentroOeste, onde tem uma vantagem de apenas dois pontos.

Bruno Boghossian: Mapa da migração eleitoral

Folha de S. Paulo

Números do Datafolha apontam possíveis eleitores dispostos a trocar de candidato

O movimento acelerado de eleitores em direção a Lula e Jair Bolsonaro redesenhou um dos mapas desta fase inicial da campanha. A consolidação precoce de apoiadores fiéis e o crescimento registrado pelo petista na última pesquisa do Datafolha indicam que a corrida presidencial pode se dar num terreno com rotas limitadas de migração.

Mesmo antes do início oficial da disputa, a quantidade de indecisos é uma das menores das últimas décadas, e os eleitores demonstram uma lealdade considerável aos principais nomes da disputa. Embora um contingente razoável de pessoas esteja disposto a trocar de candidato, ainda não há sinais de que essas mudanças possam transformar o jogo.

Sete de cada dez eleitores dizem estar totalmente decididos a votar em seus candidatos a presidente –um patamar de convicção alto a esta altura da campanha. Isso significa, por outro lado, que 30% ainda pensam em mudar de campo.

Janio de Freitas: As pesquisas dizem e não dizem

Folha de S. Paulo

Tapeação de Bolsonaro dá sinais de esgotamento com estresse de truques e farsas

Natureza do presidente só pode acirrar sua desinteligência golpista com avanço de Lula como na pesquisa Datafolha

O impacto sísmico do recente Datafolha eleitoral deveu-se, além dos números em si, à contradição neles implícita com quase todas as outras pesquisas das últimas semanas.

A simplicidade aparente das divergências percentuais aumenta, porém, os problemas para o eleitorado orientar-se, para a contenção do golpismo e ainda para o acompanhamento, pela Justiça Eleitoral, dos procedimentos de pesquisa.

Os 56% do eleitorado conscientes da ação antidemocrática de Bolsonaro são um alento.

Em proporção aos respectivos totais, esse segmento é muito maior do que a parcela dos que se contrapõem de fato, no alto dos Três Poderes, ao golpismo projetado pela Presidência da República sobre o país e, em especial, sobre as Forças Armadas.

O caminho legal afunila-se para a recandidatura de Bolsonaro. Suas possibilidades de uso eleitoral das verbas e concessões são imensas, mas levariam a efeitos econômicos e políticos condenatórios do candidato.