quarta-feira, 16 de agosto de 2023

Vera Magalhães - Governo se arrisca a perder bom momento

O Globo

Elogiado com razão pela condução da negociação econômica, Haddad errou ao criticar superpoderes de Lira antes da votação do marco fiscal

Agosto, até aqui, vem sendo um mês de indefinições e bateção de cabeça na relação entre o governo e seus interlocutores, notadamente o Congresso. O risco, real, é que o excesso de confiança e a falta de clareza nos objetivos e na tática levem o bom momento configurado com as notícias da virada do primeiro semestre a se esvair sem que se concluam as votações e as definições que levariam a uma melhora mais concreta das perspectivas econômicas para o país.

A euforia com o ritmo de votações da Câmara no início de julho parecia prenunciar dias ensolarados na relação com o Parlamento. Bastava uma reforma ministerial pontual para agregar o Centrão ao projeto governista.

O mês começou com o vento das boas notícias continuando a soprar, com a decisão do Copom de baixar em 0,5 ponto percentual a taxa básica de juros da economia, dando, enfim, aval para a política econômica praticada a partir da Fazenda.

Bernardo Mello Franco - Millôr Fernandes foi comentarista mordaz da política brasileira

O Globo

"Livre como um táxi", humorista criticou poderosos, desafiou a censura e deixou lições para o jornalismo

“Fiquem tranquilos os poderosos que têm medo de nós: nenhum humorista atira para matar.”

O aviso é de Millôr Fernandes, o genial guru do Méier. Mas vá perguntar aos poderosos que viveram a desventura de entrar em sua mira.

Millôr faria cem anos hoje. A imprensa gosta de efemérides e já celebrou seu talento como frasista, desenhista, dramaturgo, tradutor e poeta. Faltou lembrar o comentarista mordaz da política brasileira.

Prefeitos, governadores, deputados: ninguém escapava ao risco de uma pedrada. “Política é a mais antiga das profissões”, dizia.

Suas tiradas revelam um espírito insubmisso a qualquer regime: “As principais formas de governo são as ruins e as muito piores”; “A diferença entre a galinha e o político é que o político cacareja e não bota o ovo”; “Todo governante se compõe de 3% de Lincoln e 97% de Pinochet”.

Elio Gaspari - O efeito Milei e o Itamaraty

O Globo

Trata-se de tirar os sapatos sem tirar as meias

O anarcocapitalista Javier Milei surpreendeu arrebatando 30% dos votos nas primárias presidenciais argentinas. A eleição será em outubro, e muita água passará debaixo da ponte. Mesmo assim, num país com 115% de inflação anual, o Banco Central (que ele promete fechar) subiu os juros para 118%; em poucos dias, o dólar disparou, e os títulos da dívida argentina despencaram.

A encrenca argentina é séria, mas não é inédita. Lá, o general Jorge Rafael Videla, ditador deposto em 1981, morreu num banheiro da cadeia em 2013. Em 2001, o presidente civil Fernando de la Rúa fugiu da Casa Rosada, e em duas semanas o país teve cinco presidentes.

O governo do presidente Alberto Fernández está bichado. Cumpriu-se parcialmente uma profecia de Jair Bolsonaro, impropriamente enunciada durante a campanha eleitoral de los hermanos. Fernández e Lula aproximaram-se. Javier Milei, por sua vez, aproximou-se de Bolsonaro.

Zeina Latif - Ah se fosse fácil assim

O Globo

A extensa lista de obras do PAC não chega a constituir um programa estruturado. Faltam diagnósticos para definir prioridades

O estado como indutor direto do crescimento teve seus dias de glória. O Brasil estava em um outro estágio de desenvolvimento. Com reduzido estoque de capital, o país se beneficiou do ativismo estatal e saiu da pobreza, mas não sem grandes custos, como inflação descontrolada e crises frequentes, e grandes erros — exemplo emblemático é a Transamazônica.

Tornar o país rico demanda outro desenho, com protagonismo do setor privado, investindo e inovando, e colhendo ganhos de produtividade — é o que mostra a experiência internacional. O dinamismo do setor privado demanda, porém, um estado forte, que oferte serviços públicos de qualidade e marcos jurídicos que propiciem um ambiente de negócios saudável e de competição entre os players.

É nesse caminho que o Brasil precisa insistir. E há bons exemplos de políticas públicas bem-sucedidas que precisam ser replicadas (como a educação em alguns estados) e aprimoradas (como o SUS). Não se justifica um plano grandioso, como o Novo PAC. Pelo contrário, cabe eliminar gastos que não entregam o prometido, causam distorções e injustiças, e pesam na carga tributária.

Luiz Carlos Azedo - Apagão reabre polêmica sobre a privatização da Eletrobras

Correio Braziliense

A hipótese da falta de planejamento é a que mais preocupa o governo. Quando o sistema entra em colapso, os prejuízos econômicos são enormes e o desgaste político é maior ainda

O apagão que atingiu todas as regiões do Brasil na manhã desta terça-feira, politicamente, deve gerar uma guerra de narrativas entre o governo Lula e governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PR), principal gestor do processo de privatização da Eletrobras. O apagão começou a ser registrado nos sistemas do ONS às 8h31, no horário de Brasília, quando é interrompido o tradicional aumento da carga do sistema elétrico. Em 10 minutos, a carga do sistema elétrico brasileiro caiu 25,9%.

A interrupção ocorreu devido à abertura da interligação Norte-Sudeste, supostamente por uma falha no circuito de Imperatriz, no Maranhão, e outra no Ceará. As causas da ocorrência ainda estão sendo apuradas. Há três hipóteses: colapso do sistema, falha humana ou sabotagem. O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou que vai solicitar à Polícia Federal (PF) e à Agência Brasileira de Inteligência (Abin) a apuração das causas do apagão, para saber se houve “eventuais dolos”.

Hélio Schwartsman - Invulneráveis à realidade

Folha de S. Paulo

Revelações sobre joias não devem afetar apoio de bolsonaristas raiz ao ex-presidente

A cada nova manchete, Jair Bolsonaro parece mais enrolado no caso de venda e recompra de joias que deveriam pertencer ao Estado brasileiro, mas que ele tomou para si. O que eu ainda não sei é se a legião de militares que o auxiliou nos malfeitos ficaria com uma parte do butim ou se agia só por amor à causa.

Outra questão interessante diz respeito ao impacto que as revelações terão sobre o público bolsonarista.

Bruno Boghossian – O apagão e a gasolina

Folha de S. Paulo

Queda de energia parece pontual, enquanto reajuste nas bombas indica dificuldade precoce em nova política de preços

A terça-feira não foi um dia de boas notícias para Lula. O petista assistiu do Paraguai ao apagão em quase todo o país, ao anúncio de um aumento salgado nos preços dos combustíveis e a mais um adiamento da votação do arcabouço fiscal na Câmara.

Qualquer queda nacional de energia incomoda o presidente de turno, mas a dor de cabeça de Lula deve ser passageira. Apagões despertam questionamentos sobre a estrutura do país e alguma desconfiança sobre quem gerencia a máquina. Governos recém-instalados, porém, recebem um bom desconto, principalmente se a falha parece pontual.

Fernando Exman - Mitos e personagens da trajetória bolsonarista

Valor Econômico

Recém-eleito presidente da República, Jair Bolsonaro foi naquela manhã de domingo até a Urca, no Rio de Janeiro, para participar de um tradicional encontro anual nas instalações da Escola de Educação Física do Exército. Era 25 de novembro de 2018. O então deputado federal acabara de vencer as eleições com um inflamado discurso antipetista e anticorrupção, momento bem distinto do vivido por ele e seu entorno atualmente.

Bolsonaro passara a campanha fazendo de tudo para construir a imagem de austero. Manteve o esforço nos anos seguintes, aparecendo frequentemente em público como homem de hábitos simples, apreciador de pão com leite condensado e portador de relógios ou canetas que nem de longe lembram os modelos supostamente dados ao Estado brasileiro e depois incorporados ao seu patrimônio pessoal.

Lu Aiko Otta - PAC aposta em investimento privado

Valor Econômico

Anúncio do programa mostra que o governo foi pragmático

Criadas há quase 20 anos, no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva, as Parcerias Público-Privadas (PPPs) estão pipocando pelo país. Nos últimos 90 dias, foram lançados 120 novos editais de licitação de PPPs ou de concessões. Outros 43 estão numa etapa anterior de elaboração, a consulta pública. Praticamente a cada dois dias, um novo contrato é assinado no Brasil.

Os números são listados por Guilherme Naves, sócio da consultoria Radar PPP, que monitora esse mercado desde 2014. O movimento é largamente liderado pelos municípios, responsáveis por 3.293 contratos de um total de 4.888.

Marcelo Godoy - Quer dizer que não era ideologia?

O Estado de S. Paulo

‘Militares envolvidos no escândalo das joias estão sujeitos a punições severas’, diz brigadeiro

A graça irresistível revelava antes o ceticismo de quem não se deixa conduzir por grupos ou arautos da salvação. Despir o rei e exibi-lo é uma das mais velhas funções da crônica política. Gregório de Matos escolheu a poesia, Millôr Fernandes, a frase lapidar. Nesta quarta-feira, o escritor que golpeou como poucos o mundo político brasileiro completaria cem anos.

É impossível não lembrar dele diante do escândalo da venda de joias da Presidência. É já sabido o impacto do caso na caserna. E continuará tendo a partir dos desdobramentos do que foi apreendido com o general Mauro Cesar Lourena Cid.

Nicolau da Rocha Cavalcanti* - A presunção de inocência nos protege da barbárie

O Estado de S. Paulo

Tolerar a violação do princípio da presunção de inocência é permitir que o Estado tire direitos de quem ele quiser, porque assim o quer

A recente operação policial no Guarujá desvelou uma vez mais não apenas a brutalidade da ação estatal, mas quem nós somos enquanto sociedade: o nosso real estado civilizatório. Todos os muitos indícios de execução sumária de cidadãos foram insuficientes. Parcela significativa da população, incluindo autoridades públicas, considerou adequada e bem sucedida a atuação policial no litoral paulista sob o argumento de que os mortos eram bandidos, eram criminosos.

Há muitos problemas e contradições na legitimação das operações policiais com altíssima taxa de letalidade; por exemplo, a pena de morte é proibida no Brasil e essas operações contrariam a própria ideia de segurança pública. Aqui, destaco um fator específico, que contribui para a aceitação da barbárie: a rejeição do princípio da presunção de inocência.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

STF deve consagrar liberdade com responsabilidade

O Globo

Caso do Diário de Pernambuco dirá quando um veículo de comunicação pode ser condenado pelo que publica

Está em julgamento no plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) um caso que afeta a liberdade de informação e expressão na imprensa brasileira. Trata-se de um recurso do Diário de Pernambuco, condenado a pagar indenização pela publicação de uma entrevista. O jornal não endossou as afirmações do entrevistado, tampouco atacou quem quer que fosse. Apenas divulgou uma entrevista. O caso tem repercussão geral e será paradigma para os futuros julgamentos da Corte. Noutras palavras, definirá em que hipóteses um veículo de comunicação poderá ser condenado pelas informações que publica.

Poesia | Carlos Drummond de Andrade - A máquina do mundo

 

Música | Xande Canta Caetano - Luz do Sol