Colegiado comandado por Andrea Neves, e não o marqueteiro, definirá estratégia de comunicação
Cristian Klein
SÃO PAULO - Pré-candidato ao Planalto e presidente nacional de seu partido, o senador mineiro Aécio Neves tem introduzido mudanças na organização do PSDB que tornam a legenda mais semelhante ao modelo centralizado do maior adversário dos tucanos, o PT.
Amanhã, a Executiva nacional do PSDB deve aprovar resolução que submeterá as políticas de alianças estaduais à cúpula da agremiação. O objetivo é garantir que a campanha de Aécio seja impulsionada por candidatos estaduais competitivos, sem que os caciques regionais atrapalhem o projeto presidencial.
Outros dois movimentos de Aécio Neves são a tentativa de unificar a área de comunicação dos 27 diretórios estaduais e o novo formato decisório para a equipe de propaganda política. No lugar da figura autônoma do marqueteiro-estrela, as estratégias em torno da imagem do senador serão compartilhadas por um colegiado presidido por Andrea Neves, irmã do senador.
A subordinação dos arranjos locais ao projeto nacional aproxima os tucanos dos petistas, que historicamente sempre põem a conquista da Presidência da República em primeiro lugar, mesmo que à custa de realizar intervenções traumáticas. Em 2010, a direção nacional do PT obrigou o apoio da seção estadual do Maranhão à reeleição de Roseana Sarney, contrariando a vontade da maioria do partido local de se aliar ao candidato do PCdoB ao governo, Flávio Dino.
Os tucanos, no entanto, evitam falar em intervenção. "Ela [a resolução] não deve ser interpretada como ato de força, de imposição, mas de integração do partido. Vamos ouvir, analisar, considerar e respeitar as realidades locais. É um mecanismo para a direção nacional do partido ter participação mais ativa na política local", afirma o senador da Paraíba Cássio Cunha Lima, um dos vice-presidentes do partido e integrante do núcleo da pré-campanha de Aécio.
Cunha Lima afirma ser o proponente da resolução e lembra que o acompanhamento das alianças estaduais pela direção nacional tucana sempre aconteceu, embora não houvesse um mecanismo explícito de controle. Outro dirigente, que prefere o anonimato, diz que resoluções similares já foram editadas e descumpridas.
"O partido não tinha unidade para impor isso. Era uma federação e cada um pensava de um jeito. Na hora do "vamos ver", o partido não fazia valer [o interesse da direção nacional]. Respeitava o dono do partido no Estado. Só em alguns casos contrariava um cacique municipal. Mas hoje há unidade e o partido fala uma linguagem só", afirma o tucano.
O dirigente afirma que a resolução só é possível porque o PSDB desfruta de uma unidade só experimentada na reeleição de Fernando Henrique Cardoso, em 1998. Em 1994, 2002, 2006 e 2010, aponta, faltou coesão e adesão à campanha presidencial nos Estados. Nas últimas três disputas, com José Serra e Geraldo Alckmin, teria sido "um desastre". "As candidaturas não resultaram de uma unidade. Cada seção fez o que quis. Nem houve tanta antecedência para se trabalhar quanto agora", diz.
De acordo com a mesma fonte, a candidatura Aécio também se favorece pelo fato de o presidenciável ser parlamentar e não chefe do Executivo, o que o teria impedido, de acordo com o estatuto do PSDB, que o senador também se elegesse presidente do partido. Isso não foi possível com Serra e Alckmin, que eram prefeito e governador antes de se candidatarem.
O dirigente diz que agora o PSDB nacional "tem força para tomar essas decisões" e poderá levar situações de impasse "à última consequência, quando necessário" e vetar arranjos indesejados.
A medida, no entanto, é vista mais como uma baliza do que uma arma com o propósito de dobrar alguma seção partidária. "Não vislumbramos intervenções. É uma vacina", diz o tucano.
O objetivo, de acordo com o dirigente, é evitar duas situações principais em que a candidatura presidencial fica "sem condições de se movimentar" no Estado.
A primeira é a dos candidatos "laranjas", ou seja, concorrentes fracos a governador lançados pelos caciques regionais. Neste caso, o interesse paroquial é tão arraigado que a prioridade pode ser o de apenas formar uma chapa proporcional a deputado para eleger o líder local e "mais um ou dois". Ou pode ser que o cacique, no fundo, esteja torcendo para que o adversário de um aliado ganhe a eleição. Ou prefira preservar seu status de oposição. De todo modo, o "laranja" serve de desculpa do dirigente regional em relação à cúpula nacional para não apoiar um nome mais competitivo de outros partidos que daria um palanque melhor à candidatura presidencial.
A segunda situação é a da aliança na qual a instância local entrega "tudo" - sobretudo o tempo de TV - para um grupo concorrente [no plano nacional] sem contrapartida à altura. Com isso, inibe a campanha do partido ao Planalto, já que o governador apoiado não faz campanha para o presidenciável da legenda.
Esse é exatamente o caso que se desenha no Mato Grosso do Sul, Piauí e, possivelmente, Ceará e na Bahia. No Estado do Centro-Oeste, o deputado federal tucano Reinaldo Azambuja planeja apoiar o senador petista Delcídio Amaral e ficar com a vaga do Senado na chapa majoritária. O arranjo, no entanto, já encontra resistência na direção do PT, que proíbe alianças com partidos que fazem oposição ao governo federal.
No Piauí, por outro lado, o acordo está adiantado e cria uma situação desfavorável a Aécio, que ficaria sem um palanque forte. Pela costura, o ex-prefeito tucano de Teresina, Silvio Mendes, seria vice na chapa do deputado federal Marcelo Castro, do PMDB, e que teria como candidato ao Senado o atual governador Wilson Martins (PSB).
Pela legislação, Castro poderá usar sua propaganda eleitoral no rádio e TV como palanque eletrônico à reeleição de Dilma Rousseff - já que o PMDB é aliado nacional do PT. Mas não poderá fazer o mesmo, se quiser defender Aécio. Pelo arranjo, o presidenciável tucano dependerá mais da campanha de rua e na internet, enquanto seus prováveis adversários, Dilma e Eduardo Campos (PSB), poderão ocupar espaços na TV. A presidente contará com candidatura própria do PT, o senador Wellington Dias, que lidera as pesquisas, e o governador de Pernambuco terá à disposição a propaganda de Wilson Martins ao Senado.
Silvio Mendes afirma que a situação do PSDB no Estado é muito difícil e bem pior do que, em 2010, quando ele mesmo concorreu ao governo estadual e perdeu no segundo turno. Há quatro anos, lembra, a aliança foi com o DEM, que praticamente desapareceu no Piauí depois da criação do PSD, em 2011, e com o PPS, que agora planeja participar de uma aliança com 12 pequenos partidos, encabeçada pelo ex-prefeito de Paulistana, Luís Coelho (PRP). Os tucanos também perderam os dois deputados federais que tinham.
"Abriram espaço para nós, na [vaga de] vice. O PSDB conseguiu um espaço e não terá outro, porque não tem como construir. Já tentamos", diz Silvio Mendes.
O ex-prefeito afirma que chegou a chamar o ex-senador Freitas Neto para concorrer, mas o convite foi recusado. "Eu já fui em 2010. [O candidato] pode passar vexame. Quem aceitaria?", argumenta. O tucano conta que já expôs a dificuldade a Aécio e sabe que a direção nacional aprovará a resolução para controlar as alianças estaduais. "Se houver, seremos cumpridores da resolução. Executiva nacional é para isso. Senão, seria anarquia. Mas estaremos fora do espaço que poderíamos ter", diz.
No Ceará e na Bahia, onde o PSDB também cogita se coligar com o PMDB, a situação é diferente, porque a expectativa é que os pré-candidatos aliados, respectivamente o senador Eunício Oliveira e o ex-ministro Geddel Vieira Lima, teriam o compromisso de não fazer campanha para Dilma Rousseff e dariam palanque a Aécio.
Na Paraíba, o PSDB também tende a não lançar um nome próprio e pode apoiar a reeleição do governador Ricardo Coutinho (PSB), que pedirá votos para Eduardo Campos. O pré-candidato tucano é o senador Cássio Cunha Lima, ironicamente, o mesmo que propõe a resolução para controlar as alianças estaduais. A medida, no entanto, pode facilitar o trabalho do senador, cotado para assumir a coordenação-geral da campanha de Aécio Neves.
Para Cunha Lima, até a situação no Piauí pode ser aceita pela direção nacional, pois "depende de como isso se operacionalizará no dia a dia da eleição". O parlamentar diz que políticos e analistas partem de uma "lenda urbana da política brasileira" de que palanques só se formam da maneira tradicional, com candidatura própria.
"Não sou dono da verdade, mas isso está errado. Aqui, na própria Paraíba, por exemplo. Em 2010, eu fui candidato a senador, apoiava Serra, e o Ricardo Coutinho apoiava Dilma. Nem por isso deixamos cada um de fazer campanha para o seu candidato. Serra teve um dos melhores desempenhos do Nordeste, na Paraíba", diz o tucano.
O colega de partido, que prefere não ser identificado, discorda de Cunha Lima. Diz que já é difícil operar a campanha quando o governador não é do partido e ainda mais quando o candidato a governador da aliança faz campanha para outro concorrente ao Planalto. Em sua palavras, a campanha à Presidência, neste caso, "não rende", pois os integrantes da chapa proporcional do partido tendem a associar suas imagens ao candidato a governador defensor do outro presidenciável. Por outro lado, o tucano relativiza a importância, em sua opinião, exagerada à necessidade de se aparecer no horário eleitoral da TV. "Só a TV não resolve. A batalha aérea é a televisão. Mas embaixo tem que ter a infantaria, distribuir papel e fazer reuniões", afirma o dirigente.
Fonte: Valor Econômico