quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Reflexão do dia – Marco Aurélio Nogueira

{...} Lula não teve a grandeza fundacional e paradigmática de um Vargas, verdadeiro artífice do Brasil moderno, que ele forjou mediante um padrão de intervenção estatal e um “pacto” ainda hoje vigentes. Não trouxe o charme nem o dinamismo de JK, com sua fantasia industrializante de recriar o País, fazendo 50 anos em 5. Nem sequer seria justo aproximá-lo de Fernando Henrique Cardoso, cujo refinamento intelectual fazia com que conhecesse a estrutura do País que pretendeu administrar.{...}

{...} Exagera-se muito na avaliação que se faz de Lula. Na apreciação do que há de positivo em seu governo, nem sempre se dá o devido valor à equipe técnica e política que o assessorou. O bloco de sustentação e a amplíssima coalizão de interesses que montou não se deveram a uma incomum habilidade de negociador, mas sim à recuperação do Estado como agente, à disseminação de práticas generalizadas de composição parlamentar e a uma “racionalidade” dos próprios interesses, que pactuaram para ganhar um pouco mais ou perder um pouco menos. Uma “nova classe média” apareceu, impulsionada pelas facilidades do crediário, pelos programas de transferência de renda e pela impressionante mobilidade da sociedade. Mas não mudou a face do País. {...}


NOGUEIRA, Marco Aurélio. Nada será como antes. O Estado de S. Paulo, 26/12/2010.

Lula e a política do óbvio:: Rolf Kuntz

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anda repetindo uma nova frase de efeito, boa como propaganda e, como de costume, sem compromisso com os fatos. Ele se vangloria de ter feito somente o óbvio. Por isso, acrescenta, foi fácil governar e promover mudanças importantes. Se esse fosse o balanço de uma empresa aberta, a Comissão de Valores Mobiliários deveria impugná-lo. Os pontos verdadeiros são relevantes, mas escassos. Se fazer o óbvio é agir com bom senso, o presidente aderiu à obviedade ao manter o tripé da política macroeconômica - metas de inflação, câmbio flexível e superávit primário. Acertou também ao respeitar o acordo de autonomia do Banco Central, um dos poucos núcleos de competência da administração federal nos últimos oito anos.

Fez o óbvio, igualmente, ao ampliar os programas de transferência de renda, lançados com sucesso na administração anterior. Os demais acertos também foram construídos sobre alicerces amplamente renovados e reforçados na década anterior. E é sempre instrutivo repetir: o oposicionista Lula e seu partido combateram essas mudanças. Contestaram o Plano Real, a Lei de Responsabilidade Fiscal, o câmbio flexível e o plano de recuperação bancária, alardeado por Lula, anos depois, como exemplo para o mundo rico.

Mas, se o óbvio é o sensato, Lula fez o oposto do óbvio em boa parte de sua gestão. Na educação, deu prioridade à multiplicação de faculdades e à ampliação de matrículas em cursos universitários. Fez muito barulho com esse tipo de ação, realizável sem esforço e muito rentável politicamente. Mas deixou em plano inferior questões muito mais urgentes. A educação fundamental continua muito ruim, a taxa de analfabetismo funcional pouco variou (cerca de um quinto dos brasileiros com 15 anos ou mais) e o acesso ao nível médio permanece afunilado. Tudo isso tem sido confirmado pelo IBGE e pelo fracasso dos estudantes brasileiros nos testes internacionais.

Lula também não fez o óbvio em relação ao sistema político. A liberdade de imprensa é obviamente essencial à democracia, mas o governo petista várias vezes tentou restringi-la. No primeiro mandato, o presidente mandou ao Congresso um projeto de censura (essa palavra resume bem o propósito). A tentativa foi repelida e ele negou sua responsabilidade. O Executivo, segundo ele, apenas enviou ao Legislativo um projeto concebido fora do governo. Não haveria uma desculpa menos grotesca?

O ataque foi retomado nos anos seguintes. O impropriamente chamado Decreto dos Direitos Humanos continha novas ameaças à liberdade de informação e de opinião e foi apoiado por defensores do "controle social" dos meios de comunicação. Esse controle foi incluído no programa do PT, registrado pela candidata Dilma Rousseff e em seguida por ela renegado.

Milícias e movimentos atrelados ao governo são uma óbvia ameaça à democracia. Mas o presidente aceitou conversar com arruaceiros, como os invasores do Ministério da Fazenda, e promoveu o peleguismo sindical e estudantil. Pela primeira vez na história um dirigente da UNE se declarou estudante profissional e afirmou ser obrigação do governo dar dinheiro a entidades estudantis.

Seria óbvio valorizar a profissionalização do setor público. O governo preferiu o aparelhamento e o loteamento. Outra obviedade seria limitar a carga tributária para tornar a economia mais competitiva, mas a tributação cresceu sem parar, para sustentar uma administração ineficiente e gastadora.

Na política externa, o óbvio seria dar prioridade aos interesses do País. Mas a diplomacia petista resolveu apoiar tiranos e tiranetes e desprezar os acordos comerciais mais promissores. A escolha dos parceiros "estratégicos" nunca envolveu reciprocidade e os interesses nacionais foram sacrificados até na América do Sul. Compradores de manufaturados brasileiros, como os Estados Unidos, foram negligenciados.

A ascensão da China à condição de mercado número um foi celebrada como façanha diplomática. Mas para a China, o Brasil é uma fonte de commodities. Teria pelo menos o mesmo papel com outra diplomacia. Os chineses precisam desses produtos e os brasileiros podem fornecê-los. Na relação com os emergentes, não se ganhou nada mais do que se ganharia sem o carnaval terceiromundista. O País fez papel de bobo em troca de apoios irrelevantes à pretensão de integrar o Conselho de Segurança. Na relação com os Estados Unidos, oportunidades foram perdidas para países com políticas mais adultas - como a China e emergentes até da América do Sul.

Jornalista

Lula, democrata:: Fernando de Barros e Silva

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

SÃO PAULO - Faltam três dias para o fim da era Lula. O saldo da sua passagem pela Presidência é francamente positivo. Lula fez bem ao Brasil. Isso vale em especial para o que mais importa: o país hoje percebe melhor as suas desigualdades e a necessidade de combatê-las.

Se na área social houve avanço inequívoco (e se a consolidação da estabilidade com crescimento econômico foi outra grande conquista), o legado político de Lula é bem mais controverso. Já escrevi aqui, em mais de uma ocasião, sobre a capitulação do PT ao que existe de mais atrasado na política brasileira.

Em nome da governabilidade, ou usando-a como pretexto, o lulo-petismo sucumbiu às velhas formas de corrupção, fisiologia e compadrio que um dia teve a pretensão de combater ou reformar. Isso é verdade, mas não esgota a questão.

Lula deixa a Presidência com mais de 80% de aprovação popular. E deixa porque recusou a tentação do terceiro mandato. Hoje isso parece trivial, assunto velho, pão amanhecido. Mas o respeito às regras do jogo e a aposta na democracia é o que de melhor Lula legou ao país em termos de cultura política.

Anteontem, na sua última coletiva, Lula disse: "Acredito muito na democracia e acredito na necessidade de alternância. Você pega o terceiro e quer o quarto. Aí você pega o quarto e por que não o quinto? Em vez de criar uma democracia, está criando uma ditadurazinha".

Basta pensar em Hugo Chávez para perceber que diferença isso faz. Não se trata de tomar obrigação por virtude, mas imagine que retrocesso não seria se o primeiro presidente operário do Brasil decidisse virar a mesa para se manter no poder. É óbvio que Lula, ao agir como deve, também zela pela imagem que vai legar ao mundo e à história. Uma figura como ele está condenada a ser escrava da sua biografia.

Virou um lugar-comum aproximar, pela importância histórica, Lula de Getúlio Vargas. Mas é sempre bom lembrar que Vargas foi um ditador. Lula é um democrata.

Orientação enxuta, cobrança forte:: Rosângela Bittar

DEU NO VALOR ECONÔMICO

Dilma reconhece que o governo ficou devendo na Saúde

Ao convidar ministros a integrar sua equipe de governo que toma posse este sábado, Dilma Rousseff deu indicações precisas sobre os rumos que pretende dar a determinadas áreas da administração. Algumas, já eram conhecidas como problemáticas mas, outras, nem tanto. A presidente eleita disse, por exemplo, a Paulo Bernardo, ministro do Planejamento no governo Lula e ministro das Comunicações no futuro governo, que é preciso dar atenção total a uma regulação que possa superar a briga surda e crescente entre as empresas de telecomunicações e as TVs. Lembrou que há projetos tramitando no Congresso, pediu que fossem acompanhados, mas que o ministério não deixasse de entrar no assunto. Todos creem que a interferência tem que ser mais que cuidadosa, mas precisa existir. No governo, não há dúvidas de que as telecomunicações devem participar desse mercado, mas, como são gigantes perto das TVs, se não houver cuidado podem entrar arrebentando quem estiver no caminho.

A presidente orientou seu ministro a coordenar o programa de inclusão digital, o de banda larga e pediu uma atenção especialíssima à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, os Correios de tantas e tão denunciadas irregularidades administrativas jamais superadas, nicho de corrupção entregue há anos a partidos políticos. O começo do saneamento dos Correios poderá ser negando suas diretorias e seus principais cargos a políticos, estabelecendo-se ali a profissionalização. Quer, também, a presidente, que o Ministério das Comunicações passe a ter boa equipe de formulação, pois vem de vários anos a seco, sem qualquer proposta de política. Não se imaginava que o setor estivesse tão à matroca, mas pelas preocupações demonstradas, estava. Outro Ministério que Dilma pretende acompanhar com lupa é o da Saúde. Em que pese a intensa propaganda, os palanques eleitorais que não permitem reconhecer falhas, e a transferência de culpa à oposição que derrubou o imposto sobre o cheque -, que todos sabem ter tido a participação dos partidos governistas e não essas verbas jamais sido destinadas à Saúde - a presidente reconhece que o governo petista ficou devendo, e muito, na área. Foi isso o que disse ao destinar o cargo ao ministro Alexandre Padilha. Em nenhum momento dessas avaliações sobrou culpa para o atual ministro José Gomes Temporão. Apenas considera-se que ele chegou ao governo como um formulador, alguém que colocaria a máquina para funcionar, mas não conseguiu vencer as barreiras. Por isso foi substituído. Com o volume de recursos que há para a Saúde no orçamento de 2011 - R$ 77 bilhões - ter mais dinheiro não é absolutamente a prioridade. É preciso fazer acontecer a gestão, ir a fundo na execução das políticas, que, é evidente, tiveram administração frouxa. O ministro Padilha será cobrado direta e permanentemente pela presidente, e foi avisado disso. Na conversa demorada que tiveram, Dilma falou também das Fundações de Direito Privado, que não saíram do papel, e dos problemas profundos dos hospitais federais.

Uma terceira orientação política que já se conhece da presidente Dilma Rousseff é a transmitida ao novo ministro do Desenvolvimento Agrário, Afonso Florence. O balanço informal e real do governo Lula nessa área é que não é preciso mais assentar, a demanda está atendida, mas há tudo por fazer nos assentamentos. Há convicção de que é preciso dar ênfase em programas para melhorar a vida nos assentamentos. Reduziu-se sensivelmente a demanda por terra, mas o assentado não tem estrada, saúde, escola, nada. A preocupação com a gestão é a constante na orientação da presidente. Desses três setores do governo sabe-se dos propósitos objetivos de Dilma mas há dois sobre os quais conhecem-se apenas as suas expectativas, e estas explicam um pouco os planos a serem executados e porque houve a troca de comando apesar do desejo de continuidade. Um, é a diplomacia, que passa da direção de oito anos de Celso Amorim para a de Antonio Patriota, braço direito do ministro que sai. No Palácio, permanece a assessoria firme nesta área de Marco Aurélio Garcia. Dilma espera, neste caso, porém, fazer algumas correções de rumo, estabelecer nuances, e preferiu, para que suas opções fiquem claras, estabelecer a nova política com outra equipe. Em direitos humanos, por exemplo, não há hipótese de negociação de princípios, e Amorim ficou muito identificado com a aliança ao governo do Irã. Quanto às relações com os Estados Unidos, a expectativa da presidente eleita é ir um pouco além da reafirmação de independência e autonomia: quer isto com aprofundamento das relações comerciais, vender e comprar, sem sombra de contradições. O outro caso, também simbólico, é o de Henrique Meirelles, cuja participação neste novo governo não foi ainda afastada de forma cabal, mas se for o será em outra área. Assim como Amorim, pelas histórias a respeito das razões pelas quais não ficou, dá para fazer conclusões a respeito da expectativa de Dilma Rousseff na política monetária.
O embate em torno da política monetária passa incólume do governo Lula para o de Dilma.
Assim, ao tirar Henrique Meirelles, a presidente quis dar sinais de redução do poder do mercado e ter ali um comando mais neutro. Meirelles, embora tenha feito tudo o que o governo quis, agradou também ao mercado, ou seja, fez tudo o que todo mundo quis. O governo Dilma, porém, tem um problema, baixar os juros. A troca de comando busca uma resposta a isto: como baixar os juros já que, para Dilma e sua equipe, o Brasil reduziu drasticamente a dívida pública líquida nos últimos anos, melhorou a situação fiscal e obteve grau de investimento das agências de risco sem resolver o problema. A mudança dá sinais desta expectativa da presidente. Embora ela saiba que não tem nada simples nessa seara e a contradição possa aparecer logo ali no primeiro mês de governo, com o aumento dos juros pelo Comitê de Política Monetária.


Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília. Escreve às quartas-feiras

Na despedida de Lula, lamento destoar do clima de louvação::Bolivar Lamounier

Na obrigação de escrever alguma coisa, tentarei dar uma arrumação nova a avaliações que vez por outra andei fazendo neste espaço.

Na área econômica, eu penso que Lula acertou em cheio ao jogar no lixo as idéias do PT e manter a política do governo anterior . De fato, ao assumir, em 2003, Lula não alterou o tripé de política econômica que encontrou : metas de inflação, câmbio flutuante e Banco Central livre de interferência política ; para presidir o BC, teve inclusive o cuidado de buscar um banqueiro acima de qualquer suspeita, com o que evitou prevenções nos mercados financeiros e conservou a estabilidade a duras penas alcançada no período anterior.

Por mais que falasse em “privataria” e em “auditoria”, Lula não moveu uma palha no sentido de reverter as privatizações efetuadas nos anos 90. Ao contrário, instruiu o PT a abortar no Congresso uma proposta do PSOL, que queria um plebiscito sobre a privatização (e eventual reestatização) da Vale. Nos últimos dois anos, já sob a influência de Dilma Rousseff e em conexão com o pré-sal, o espírito estatizante voltou forte; até onde irá, não sabemos.

Mas aí acabam os acertos, ou não-erros. Para começar, o legado de Lula para Dilma inclui índices de inflação já bastante incômodos e uma situação fiscal preocupante, necessitando de sério ajuste.

Na infra-estrutura – energia elétrica, rodovias, portos, aeroportos…-, a presidência Lula pode ser considerada desastrosa. Uma das causas do desastre foi a qualidade manifestamente deficitária da gestão, mas que dizer do financiamento?

Oito anos atrás, a inexistência de recursos públicos para os investimentos necessários era de conhecimento geral. Que foi feito das PPPs (Parcerias Público-Privadas), cuja lei foi aprovada no Congresso logo no inicio do primeiro mandato? No ambiente internacional favorável daquele período, por que não se tratou de atrair capital estrangeiro para essa área?

Estou falando do passado, mas o desastre ficará ainda maior se os trabalhos relacionados com a realização da Copa do Mundo e da Olimpíada se atrasarem – e por ora é difícil crer que isso não vá acontecer.

Chegando ao final de seus dois mandatos, Lula parece convencido – e isto é grave – de haver descoberto a pedra filosofal. Pensa que a economia brasileira cresceu vigorosamente nos últimos anos graças a méritos inexcedíveis de seu governo. Às vezes fala como se não se desse conta de que o motor do nosso crescimento é o progresso da Ásia, em especial o da China. Dir-se-á que o governo soube aproveitar tal oportunidade. Ora, espantoso seria se não tivesse sabido.Seria como não perceber um elefante entrando numa residência de dois cômodos.

Na área social, também, Lula acertou, e muito, ao manter e expandir programas iniciados pelo governo anterior. Foi rápido no gatilho quando se desfez do Fome Zero, que não iria a lugar nenhum, e adotou o Bolsa-Família. Não vem ao caso inquirir aqui por que Lula nunca deu o devido crédito ao governo Fernando Henrique – cálculo eleitoral, certa inclinação de personalidade, sabe-se lá.

Mas chega a ser desfrutável, convenhamos, a pretensão de elevar as políticas sociais do período Lula à condição de um “novo modelo de desenvolvimento”, como consta na tese de doutoramento em economia do senador petista Aloísio Mercadante, defendida dias atrás na Unicamp.

De corrupção, eu talvez nem precisasse falar, mas não posso passar batido sobre o que Lula disse anteontem numa entrevista. Segundo ele, pior que o mensalão teria sido o acidente com o avião da TAM em Congonhas. Eu não estou seguro de haver captado a mensagem que Lula pretendeu passar. Quereria ele talvez dizer que não houve corrupção em seu governo, ou que a corrupção, se aconteceu, foi desimportante, insuficiente para lhe causar algum abalo? Sem faltar ao respeito com S.Exa., atrevo-me a indagar se não haverá em sua fala um quê de autismo, considerando-se que a corrupção em seu governo começou com Valdomiro Diniz e culminou em Erenice : o mensalão foi o meio do caminho.

Na área propriamente política, as últimas declarações de Lula vêm sendo mais uma vez instrutivas. Um dia ele diz que não descarta voltar em 2014. No dia seguinte, diz que Dilma será sua candidata em 2014. A imprensa correrá atrás, tentando adivinhar quais são afinal as reais intenções de Luís Inácio.

Eu me limito a lembrar um ilustre comunicólogo de cujo nome não me lembro: “o meio é a mensagem”. Lula passará os próximos dois ou três anos propalando ambigüidades, disseminando contradições, afirmando uma coisa e seu contrário, com um único objetivo – manter sua imagem permanentemente associada a uma palavrinha de sete letras: eleição.

Para concluir, direi três ou quatro palavras sobre os desafios que Dilma irá enfrentar a partir de sábado. Inflação, ajuste fiscal, reformas, Congresso? Sim, isto é óbvio.

Mas o que me chamou a atenção esta semana foram dois números que apareceram na imprensa: no governo Lula, 83% dos cargos de livre nomeação foram preenchidos por petistas, e 49% por sindicalistas. São números eloqüentes. Eles mostram que Lula e o PT montaram no governo uma subestrutura – um aparelho – do qual Dilma dificilmente conseguirá se livrar.

Quer queira mesmo voltar em 2014 ou não, o ponto de referência e principal interessado nessa subestrutura é evidentemente Lula.

Os fatos mencionados sugerem duas hipóteses. Primeiro, como é óbvio, a presidente Dilma Rousseff corre o risco de ter um poder paralelo permanentemente nos calcanhares. O bom relacionamento dela com Lula pode atenuar, mas não elimina por completo os problemas a que essa situação pode levar.

Segundo, por aí se pode apreciar o amplo panorama histórico da evolução do PT. A fase da pureza ética e do discurso proto-revolucionário (“contra tudo o que aí está”) acabou. Era uma “doença infantil”. Sobrevive apenas nas margens, como uma canção de ninar ainda útil para embalar o sono dos ingênuos.

Na fase atual, o que há é um projeto de poder, um guarda-chuva remunerativo sob o qual militantes, sindicalistas, ONGs e apparatchiks de vários tipos e origens se acomodam. Para maior glória do lulismo e sob os auspícios do contribuinte.

Bomba-relógio:: Fernando Rodrigues

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

BRASÍLIA - É um sofisma o argumento usado pelo governo -e petistas em geral- a respeito da pulverização das verbas de publicidade. Eis a lógica: se a propaganda existe, então é melhor dividir o dinheiro entre o maior número possível de veículos de comunicação.

Quando Lula assumiu o Planalto, 499 jornais, revistas, TVs, rádios, portais e sites de internet, entre outros, recebiam verbas publicitárias federais. Hoje, oito anos depois, o número aumentou para 8.094. Um salto de 1.522%.

O raciocínio chapa-branca se sustenta no fato de Lula ter mantido os gastos no mesmo patamar do governo tucano de Fernando Henrique Cardoso: um pouco acima de R$ 1 bilhão por ano, descontados os custos com publicidade legal (balanços), produção dos comerciais e patrocínio.

Ou seja, sem ampliar os gastos, Lula "democratizou" (sic) o dinheiro entre mais veículos. Fez algo positivo, certo? Errado. Uma parte não fecha nessa conta. Trata-se da pergunta não respondida: por que o governo federal precisa, por exemplo, gastar R$ 20 milhões na atual campanha cujo slogan é "estamos vivendo o Brasil de todos"?

Nesta semana, TVs de várias partes do país também veicularam um comercial enaltecendo o Banco da Amazônia. Essa instituição federal tem as funções de uma agência de desenvolvimento. Não há razão para fazer propaganda.

Na oposição, Lula e o PT cansaram de malhar os gastos publicitários do PSDB. Uma vez no Planalto, aderiam à estratégia de maneira mais sofisticada. Milhares de rádios e blogs pelo país agora recebem de R$ 1.000 a R$ 3.000 por mês. Se um presidente ousar cortar tal despesa terá de encarar as imprecações incessantes dessa turba.

Publicidade estatal às vezes é uma forma de censura indireta. Vira um vício. Receber R$ 1.000 por mês no interior é uma benção. Lula criou uma bomba-relógio quase impossível de ser desarmada.

O PSDB está do lado certo:: Luiz Paulo Vellozo Lucas

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

Nosso partido não aceita a verdadeira herança maldita que o lulismo busca deixar ao país: a tese de que somos todos iguais nos malfeitos
Após as eleições, as discussões sobre o futuro do PSDB aumentaram. Como temos a obrigação de respeitar e representar os mais de 43 milhões de brasileiros que instaram o partido a manter a luta por um Brasil mais evoluído, vamos elencar argumentos que mostram o contrário: o vigor do PSDB.

Como, para nós, liberdade de expressão é cláusula pétrea, não somos nem nunca seremos como outros partidos, que interpretam críticas como campanhas de extermínio empreendidas pela mídia.

Isso não significa que admitamos ser desmoralizados, tripudiados ou difamados.

Nossos críticos perdem tempo achando que poderão dizimar a oposição. O apoio da população nos diz que devemos continuar a nos contrapor duramente ao projeto de poder do PT.

Nesse quesito, nestes 22 anos desde a nossa fundação, a história esteve do nosso lado. Sempre em busca do melhor para o país.

Assim, temos o direito de pedir calma aos que corretamente cobram um partido mais dinâmico, ou mais aguerrido, ou mais popular. A esses, afirmo que o PSDB está conversando muito internamente no intuito de superar nossas deficiências e nos organizarmos para aperfeiçoar nossa atuação.

O PSDB perdeu a eleição presidencial pela terceira vez, mas continua vivo como a coluna vertebral da oposição. O partido resiste e vai continuar reinventando o trabalho de se opor ao governo, recusando-se a abraçar a demagogia e a se comportar como sabotador do interesse nacional, como fazia o PT antes de chegar ao poder.

Nas últimas eleições, no Brasil inteiro, os candidatos do PSDB, vitoriosos ou não, ousaram desqualificar as mentiras contadas por nossos adversários. Contamos a verdadeira história das origens dos bons resultados econômicos e sociais obtidos em nosso país.

É a história dos que se colocaram, por vontade própria, fora do abrigo aconchegante representado pelo apoio político de um presidente fanfarrão, que fez da política um vale-tudo, que patrocinou o culto à sua personalidade, mitificada no imaginário do povo mais simples.

O PSDB confia na democracia, na conscientização crescente da população, aposta na política e nos processos eleitorais. Repudia espertezas e atalhos. Sabe que a enganação não prospera por muito tempo. Trabalha a partir de valores e convicções permanentes, que são régua e compasso para suas posições políticas e suas bandeiras.

O PSDB irá, sim, honrar o mandato que as urnas lhe delegaram: contrapor-se ao estado de coisas que aí está. Mais de 43 milhões de brasileiros deixaram claro que não concordam com os rumos que o governo do PT quer impor ao Brasil.

Querem mais: desenvolvimento sustentável, melhores perspectivas de vida e um país que não sobreviva de avanços espasmódicos.

Mais que isso, o PSDB não aceita a verdadeira herança maldita que o lulismo busca deixar ao país: a tese de que somos todos iguais nos malfeitos. Não, não somos e não admitimos que assim seja. O pior legado dessa triste era é a leniência com a roubalheira, a condescendência com quem dilapida o bem público e quer apenas locupletar-se.

Um mal que não se compara a nenhum dos tantos outros que o PT já impingiu ao país.Não estou aqui para negar fraquezas e conflitos. Como militante e dirigente partidário há 16 anos, luto por um PSDB mais organizado, mais aberto e interligado com a sociedade, mais ativo nos períodos de entressafra eleitoral.

Estou certo, no entanto, de que a verdade está do nosso lado e que estamos do lado certo na luta por um Brasil mais justo e desenvolvido. Essa é a nossa agenda, a agenda que o PSDB vai levar adiante, com o apoio de milhões de brasileiros.

Luiz Paulo Vellozo Lucas, deputado federal pelo PSDB-ES, é presidente do Instituto Teotônio Vilela (ITV).

A piora da Europa:: Míriam Leitão

DEU EM O GLOBO

O ano de 2010 ficará na história da Zona do Euro como um momento em que se pensou no impensável: desfazer a União Monetária. Quando economistas e governantes olharam para essa possibilidade se viu que ela é mais difícil de fazer do que se imaginava. Uma consulta mostrou que hoje há apoio na Alemanha para a volta ao marco. Se isso acontecer, será um enorme retrocesso no projeto de união. Esse debate não terminou na Europa, continuará no ano que vem.
Em dezembro de 2009, três agências rebaixaram a classificação de risco da Grécia. Parecia ser um problema apenas grego. Como o país continuava tendo grau de investimento e representa só 3% do PIB da Zona do Euro, o fato não preocupava. Um ano depois, gregos e irlandeses já foram socorridos; um fundo de estabilidade foi criado; Portugal e Espanha estão em crise de confiança. A Europa afunda o PIB mundial.

No dia 17, a Irlanda caiu cinco pontos na classificação da Moody"s. Mesmo assim, ficou dois degraus à frente do Brasil. Mas, evidentemente, a situação brasileira é melhor.

A criação de um fundo permanente de socorro é uma mudança profunda na Zona do Euro. Significa o reconhecimento pelo bloco de que seus países podem ter problemas de solvência. Mais do que isso: eles poderão descumprir as metas do tratado de Maastricht - de déficit de 3% e dívida de 60% do PIB - e não só permanecer no bloco como também ser socorridos. Uma mudança que é resultado dos estragos provocados pela crise de 2008.

- Hoje, há um risco financeiro importante na Europa como um todo. Os bancos dos países grandes podem ter problemas caso os países periféricos não consigam pagar suas dívidas. E não há garantia de que haverá dinheiro para mais um socorro ao sistema financeiro, caso ele aconteça, como foi na crise de 2008 - afirmou Raphael Martello, da Tendências consultoria.

Até a crise, os spreads na Zona do Euro - diferença entre os juros cobrados para a rolagem da dívida dos países - eram iguais, no mesmo nível da Alemanha. Todos eram vistos da mesma forma; governos austeros e gastadores conseguiam crédito com a mesma taxa. Em 2010, o mercado começou a mudar e tratar de forma diferente o subgrupo problemático. Essa turma da encrenca ficou conhecida por uma sigla: os chamados PIGS (Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha).

- A percepção era que a economia ia se recuperar forte em 2010. Esse cenário foi por água abaixo a partir do segundo trimestre, quando o problema da Grécia veio à tona. Todo mundo caiu na real: o endividamento era geral. Depois que a Grécia foi socorrida, inclusive com recursos do FMI, o problema Europa saiu do radar por seis meses. No final do ano, foi a vez da Irlanda, que também precisou receber dinheiro do FMI e da União Europeia - disse Monica de Bolle, da Galanto consultoria.

Dos quatro países do PIGS, dois já precisaram de socorro. A dúvida é se os outros, Portugal e Espanha, conseguirão escapar em 2011.

Parte da desconfiança sobre os portugueses é reflexo de uma artimanha fiscal, que também foi usada no Brasil. O governo contabilizou receitas extraordinárias para cumprir a promessa de redução do déficit deste ano, de 9,3% para 7,3%. Os investidores refizeram as contas e perceberam que ele caiu muito menos, para 9%. Com isso, o esforço para cumprir o prometido em 2011, de chegar a 4,3%, será muito grande e quase impossível de ser cumprido. Os problemas portugueses se completam com uma dívida pública de 80% do PIB, baixa perspectiva de crescimento e a dificuldade que o governo teve para a aprovação do Orçamento do ano que vem. Não há garantia política de que os cortes de gastos serão feitos.

- O próximo da fila é Portugal, que tem 10% do PIB em dívida para rolar no início de 2011 - afirmou Monica.

Em efeito dominó, o risco português chega à Espanha pela exposição dos bancos espanhóis, que carregam US$100 bilhões de títulos da dívida de Portugal. O país ainda tenta se recuperar do estouro da crise imobiliária, que elevou a taxa de desemprego para acima de 20%. Nos próximos dois anos, a Espanha terá que rolar 251 bilhões de euros em dívida. Pelo tamanho de sua economia, que é o dobro da soma de Grécia, Irlanda e Portugal, um problema na Espanha teria efeitos mais sérios para a economia mundial:

- Se Portugal e Espanha precisarem de socorro, os recursos que estão disponíveis ficarão escassos. Se a crise bater na Espanha, teremos um problema grego potencializado - comentou Martello.

Quem ainda assiste de longe - mas com cautela - ao aumento do risco é a Itália, que tem uma das maiores dívidas públicas dos países com grau de investimento, medidos pela Standard & Poors: 116%. A vantagem da Itália é que sua economia é maior, mais diversificada e sua dívida de vencimento mais longo. O setor financeiro também resistiu bem à crise de 2008, e o governo não deve ter que se endividar para socorrer os bancos do país. Por outro lado, a governabilidade é fraca. O governo Sílvio Berlusconi se sustenta em parte pelo temor de que uma troca possa piorar a crise.

O euro deve fechar o ano com desvalorização de 7,4% em relação ao dólar, e isso depois de toda a enxurrada de dólares promovida pelo governo americano. O ano de 2010 não foi, definitivamente, um bom tempo para a Europa. O gelo que castigou o continente não é apenas dos termômetros baixíssimos. A economia continuará fria em 2011.

Uma trégua e um debate medíocre:: Vinicius Torres Freire

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

"Governo de transição" passa recibo de que será prudente na área fiscal e de que o BC será "normal"

2011 será um ano de "contenção fiscal", disse ontem o secretário do Tesouro, Arno Augustin, de Lula e de Dilma Rousseff. Mais cedo, o ministro da Fazenda de Lula e também de Dilma, Guido Mantega, disse que no ano que vem o governo cumprirá a "meta cheia" de superavit primário (isto é, a parcela dos impostos que o governo deixa de gastar).

Neste ano, o governo federal ainda promete cumprir a "meta cheia", embora os economistas de Lula tenham dito ontem também que a meta inteira para o conjunto do setor público pode não ser cumprida devido a gastos excessivos de Estados e de municípios. Mas, enfim, como nos últimos dias o governo faz mágicas e milagres contábeis para fechar sua "meta cheia", não sabemos exatamente qual a qualidade e a credibilidade das contas federais.

Os economistas do governo ainda não explicaram como serão feitos os cortes de despesa de 2011, coisa difícil de fazer, pois a despesa está bem engessada com compromissos firmes. Ainda assim, aos trancos e barrancos, de modo confuso e nebuloso, o governo Dilma vai se comprometendo com a ideia de que em 2011 o governo tem de jogar mais na defesa, depois de dois anos de relaxamento de gastos, embora não tão estapafúrdios como diz a oposição sistêmica ao lulismo-petismo.

Trata-se, pois, do segundo calmante que o governo administra nesta transição aos povos dos mercados. O primeiro foi o ritual meio destrambelhado de "purificação" do novo Banco Central. Os povos dos mercados duvidavam do compromisso de Dilma com a "autonomia" do BC, além de desconfiar das credenciais "ortodoxas" da nova direção. A fofoca foi dirimida com declarações do novo presidente do BC, Alexandre Tombini, com recados da "equipe de transição" e, enfim, com o recente "Relatório de Inflação" do BC, que dançou conforme a música. Se o BC é de fato algo diferente do que o foi na primeira metade dos anos Lula, não o é o bastante para causar rebuliço nas finanças.

Outro ansiolítico ministrado pelo "governo de transição Lula-Dilma" foi o pacote de medidas de incentivo ao mercado de capitais. A grande finança do país agradeceu e aplaudiu o projeto, revelador da capacidade e do interesse do governo em realizar algumas reformas inteligentes e baratas, habilidade, no entanto, pouco exercida entre 2005 e até o final da administração Lula.

Assim, parece estabelecida uma trégua nas escaramuças entre finança, "mercado" e governo. Isto posto, o debate econômico ainda parece medíocre. Não se tem ideia do programa de médio prazo (quatro anos) de Dilma para a política macroeconômica. Menos ainda se sabe se a presidente eleita tem algum projeto de limpar a poeira em áreas como a administração da dívida pública, indexações, poupança pública forçada, taxação e regulações primitivas sobre o mercado financeiro, papel do BNDES etc.

Do lado privado, porém, também é espantosa a falta de imaginação e movimentação política. Financistas em geral não gostam de aparecer, ainda mais na foto política. Mas está na hora de deixar o lobby silencioso apenas e apresentar projetos além da arenga ideológica de muitos de seus porta-vozes. O setor privado sabe muito reclamar de excessos do governo, mas sua capacidade empreendedora na política de reformas está abaixo da crítica.

O que pensa a mídia

Editoriais dos principais jornais do Brasil
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Governo só investiu 26% do previsto no ano todo

DEU EM O GLOBO

Embora tenha aumentado a verba prevista para investimentos no país e livrado de cortes obras do PAC, o governo não consegue efetivamente tirar esses projetos do papel. Levantamento feito no Siafi pelo site Contas Abertas, a pedido do Globo, mostra que, até 25 de dezembro, apenas 26% do total de investimentos previstos no Orçamento da União para este ano foram executados. Com os restos a pagar – despesas de anos anteriores liquidadas estge ano -, chega a 58,6%. Entre os ministérios que menos investiram estão Esporte e turismo, responsáveis por projetos da copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

Investimento a conta-gotas

Apenas 26% do total previsto no Orçamento para 2010 foram executados até agora

Regina Alvarez

Poucos dias antes de acabar o ano, a execução dos investimentos da União está muito aquém do montante previsto no Orçamento de 2010. Levantamento realizado no Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi) pelo site Contas Abertas, a pedido do GLOBO, mostra que até 25 de dezembro foram executados apenas 26% do total de investimentos aprovados pelo Congresso para o ano. Com os restos a pagar - despesas de anos anteriores liquidadas este ano -, a execução dos investimentos chega a 58,6%. Entre os ministérios com execução mais baixa, na faixa de 20%, estão Esporte e Turismo, responsáveis por obras e projetos da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016.

Do total de R$69,5 bilhões de investimentos aprovados para 2010, só R$18,4 bilhões foram efetivamente concluídos e pagos até o dia 25. Com os R$22,3 bilhões de despesas contratadas em anos anteriores e pagas em 2010, chega-se a R$40,7 bilhões (ou 58,6% do total). Nesse valor estão computados os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Embora tenha elevado nos últimos anos a parcela de recursos destinada a investimentos e livrado do contingenciamento as obras do PAC, o governo tem dificuldades para executar essas despesas. A cada ano, amplia o volume de investimentos contratados (mas não pagos), cuja execução é transferida para o ano seguinte, os chamados "restos a pagar".

Pendências emperram contas

Esse estoque de investimentos a ser transferido para 2011 seria de R$58 bilhões, se considerada a execução até 25 de dezembro. O acúmulo de pagamentos pendentes acaba comprometendo a execução das despesas do ano. Isso aconteceu em 2010 e deve se repetir em 2011.

- Como há um limite financeiro condicionado à arrecadação de tributos, o gestor precisa fazer uma escolha de Sofia: ou executa os restos a pagar ou o Orçamento do ano - explica o economista Gil Castelo Branco, diretor do Contas Abertas.

Essa prática recorrente do governo, de ampliar a cada ano os restos a pagar, tem provocado distorções na execução do Orçamento.

- O princípio da anualidade foi perdido no caso dos investimentos. Chegamos ao final do ano com uma execução de restos a pagar maior do que as despesas do próprio ano - destaca Gil Castelo Branco.

Pelo levantamento do Contas Abertas, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior tem a mais baixa execução de investimentos até o dia 25: 11,7%. A seguir, aparecem os ministérios da Pesca, com 18,2%; do Esporte, com 20,2%; do Turismo, com 20,4%; e da Cultura, com 22,3%. Em todos os casos estão computados as despesas do ano e os restos a pagar.

Os ministérios do Turismo, do Esporte e da Cultura concentram a maior parte das emendas dos parlamentares, que estão sujeitas ao contingenciamento realizado pela área econômica todos os anos para assegurar o superávit primário. Isso explica em parte a baixa execução orçamentária nessas pastas.

Os ministérios da área de infraestrutura estão no grupo com execução mais elevada, embora nenhuma pasta tenha superado 73% do total da dotação autorizada para o ano, mesmo considerando os restos a pagar. No Ministério dos Transportes, a execução chegava a 71,3% até o dia 25. No Ministério da Integração Nacional, 58,8%. No Transportes estão as obras em rodovias. E o carro-chefe da Integração Nacional é a obra de transposição do Rio São Francisco.

Em segundo lugar no ranking de execução dos investimentos está o Ministério da Educação, com 70,9% da dotação do Orçamento de 2010 - obras em escolas técnicas e universidades federais alavancam os gastos no setor. Em seguida aparecem o Ministério da Defesa, com 70,5%, e o Desenvolvimento Agrário, com 59%. A Defesa está executando amplo plano de reestruturação das Forças Armadas.

O Ministério do Turismo informou que parte dos recursos destinados a investimentos ainda está contingenciada. Com relação à Copa do Mundo e às Olimpíadas, garante não haver comprometimento. Em nota, detalhou o andamento dos programas:

"O Ministério do Turismo trabalha com quatro eixos principais: qualificação de mão de obra (o programa Bem Receber Copa está em andamento com cursos para profissionais do setor turístico em todas as regiões brasileiras); infraestrutura turística (há projetos para os próximos quatro anos, também em andamento, com destaque para obras do Prodetur); promoção internacional (a campanha "O Brasil te chama - celebre a vida aqui" foi lançada durante a Copa da África do Sul, na Casa Brasil); e hotelaria (há linhas de crédito desenvolvidas em parceria com o Ministério do Turismo para reforma e ampliação do parque hoteleiro, disponíveis no BNDES e nos bancos que administram os fundos constitucionais do Norte, Nordeste e Centro-Oeste)."

Os ministérios do Esporte e do Planejamento foram procurados, mas não se manifestaram.

Os números da execução orçamentária de 2010 terão alguma alteração na última semana do ano, mas os investimentos não devem aumentar substancialmente, pois dependem da liberação de recursos do Tesouro Nacional, que se preocupa no momento em fechar as contas do ano, para garantir o cumprimento da meta de superávit.

Os investimentos que forem empenhados e não executados no ano serão transformados em restos a pagar e terão que ser executados com recursos do Orçamento de 2011 pelo próximo governo.

Parentes de vítimas de acidente da TAM reagem a Lula

DEU EM O GLOBO

Presidente de associação de familiares diz que governo tem, sim, responsabilidade e cobra apuração mais rápida

Adauri Antunes Barbosa

SÃO PAULO. O presidente da Associação dos Familiares e Amigos das Vítimas do Voo JJ-3054 da TAM, Dário Scott, reagiu ontem às declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e afirmou que há, sim, responsabilidade do governo federal no acidente com o Airbus A 320. Em julho de 2007, morreram 199 pessoas no acidente, entre elas Thaís, filha de Dário:

- Para mim, como pai de uma das vítimas do acidente, existe, sim, responsabilidade do governo federal. Lula, no papel de chefe do nosso Executivo, foi o responsável pelas indicações das pessoas que ocuparam cargos na Anac e na Infraero, entidades já responsabilizadas pelo acidente.

Na segunda-feira Lula afirmou que "a mágoa mais profunda" que teve, durante seus oito anos de governo, foi no caso do acidente com o avião da TAM porque o governo, na visão dele, foi responsabilizado:

- Nós fomos condenados à forca e à prisão perpétua em 24 horas. Jogaram a culpa do acidente nas costas do governo e depois ninguém teve sequer a sensibilidade de pedir desculpas. Ali foi o momento mais difícil - disse o presidente, ao fazer o balanço de seu governo.

Dário, ontem, procurou separar Lula, como pessoa, da figura do presidente:

- Não colocaria (a responsabilidade em) Lula como pessoa, mas como presidente. Afinal, é papel do presidente mandar apurar os fatos com rapidez.

Dário também cobrou do presidente, assim como de outras autoridades do país, empenho maior para que as responsabilidades sobre o acidente com o voo 3054 da TAM sejam apuradas.

Viúva de Antonio Gualberto Filho, uma das vítimas do acidente, Malu Gualberto se manifestou há pouco mais de um mês, quando Lula afirmara nunca ter visto "tanta leviandade" da imprensa quanto na cobertura do acidente. Ela lembrou que Anac e Infraero estão subordinadas ao Ministério da Defesa, "então, ao governo".

"Leviandade por leviandade, foi o senhor Marco Aurélio Garcia, numa atitude leviana e afrontosa, enviar-me aquele gesto obsceno pela imprensa (...). Leviano por excelência! Expert em leviandade ! Afronta! Leviandade por leviandade, foi a então ministra do Turismo, senhora Marta Suplicy, ter encontrado a solução mágica para o caos aéreo com a célebre, inesquecível e indecorosa frase: "Relaxa e goza". Outra leviandade! Outra afronta!", afirmou a viúva.

"Leviandade por leviandade, foi o presidente do meu país (...) não ter vindo a São Paulo naquele triste dia prestar solidariedade a todos nós, cidadãos brasileiros e familiares das vítimas, fazendo-o só 72 horas após a tragédia. Protocolar", manifestou-se ainda Malu Gualberto, segundo carta publicada ontem na "Folha de S. Paulo".

Malu ainda contestou Lula, que disse ter sofrido com o acidente. "Quanto à afirmação de V.Exa. na matéria em tela: "O dia em que mais sofri foi no acidente do avião da TAM em Congonhas", quero dizer que, graças a Deus, V.Exa. sofreu, enquanto eu e minha família sofreremos até a eternidade".

Relatório do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), divulgado em novembro de 2009, não conseguiu confirmar se os pilotos do Airbus A 320 da TAM cometeram algum erro que tenha causado a tragédia.

Segundo Dário Scott, o documento do Cenipa enfraquece o relatório anterior divulgado pela Polícia Federal, que apontou os comandantes da aeronave, Kleyber Lima e Henrique di Sacco, como principais culpados pelo acidente. A PF indicava erro no manuseio das manetes, instrumento utilizado para dar direção ao avião e regular a aceleração da aeronave.

Superávit cai e governo deve recorrer a manobra

DEU EM O ESTADO DE S. PAULO

O superávit primário (economia para abater a dívida pública) do governo federal caiu 86% em novembro na comparação com outubro. O resultado levou integrantes da equipe econômica a jogarem a toalha quanto ao cumprimento, sm artifícios contábeis, da meta fiscal da União, de Estados e municípios, que é economizar 3,1% do Produto Interno Bruto. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu pela primeira vez a possibilidade de descontar investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do cálculo do superávit. “Estamos trabalhando para o governo cumprir a meta cheia, mas há dificuldades para Estados e municípios. A União vai cumprir os 2,15% (objetivo definido para o governo central), mas não sei se serão atingidos os 3,1%.” Até a semana passada, Mantega garantia que a meta cheia seria alcançada por todas as esferas de governo.

Governo já admite que terá de abater obras do PAC para cumprir meta fiscal

Superávit do governo central cai 86% e leva equipe econômica a reconhecer que poderá ter de abater o PAC para cumprir a meta

Fabio Graner e Adriana Fernandes

O superávit primário (economia para abater a dívida pública) do governo central despencou em novembro e levou os principais integrantes da equipe econômica a praticamente jogarem a toalha em relação ao cumprimento da meta fiscal do setor público (que inclui Estados e Municípios), de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB) sem o uso de abatimentos contábeis.

O governo central é composto pelo Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central. No mês passado, seu resultado foi positivo em R$ 1,09 bilhão, apenas um décimo do superávit do governo central verificado em novembro de 2009 e também muito abaixo (-86%) do resultado de outubro de 2010, de R$ 7,79 bilhões.

Ontem, antes de o Tesouro divulgar os dados do governo central, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, pela primeira vez admitiu a possibilidade de o governo descontar os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para cumprir o esforço previsto em lei. Mantega tentou jogar a fatura para os Estados e municípios, que estão com desempenho abaixo do previsto (o resultado ainda não foi divulgado).

"Estamos trabalhando para o governo (central) cumprir a meta cheia, mas há algumas dificuldades para Estados e municípios. A União vai cumprir os 2,15% (definidos para o governo central), mas não sei se serão atingidos os 3,1%", afirmou.

Até a semana passada, Mantega bateu pé que a meta cheia (incluindo essas esferas de governo) seria cumprida. Ou seja, em caso de resultado abaixo do previsto dos Estados e municípios, o governo central faria um esforço maior para compensar. Ele chegou a dizer que analistas que consideravam a hipótese de uso dos abatimentos previstos não entendiam nada de contas públicas. E teve que, a contragosto, passar pelo embaraço de desmentir um ano de declarações.

Sem garantia. Outro que teve de mudar o discurso foi o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, responsável pelo gerenciamento do caixa. Logo no início da entrevista coletiva, mesmo informando que em dezembro o superávit do governo central será muito forte, Augustin admitiu pela primeira vez a possibilidade de abater o PAC para cobrir o resultado abaixo do previsto para Estados e municípios. E tentou convencer os jornalistas que tinha seu foco voltado para o governo central, embora tenha sempre falado de cumprir a meta do setor público sem o uso do PAC.

Mesmo o alcance da meta cheia do governo central, prometido por Mantega pela manhã, não foi garantido por Augustin, que alegou que se o fizesse estaria antecipando o resultado de dezembro - que ele disse poder chegar à casa de dois dígitos. De acordo com os números divulgados ontem, faltam R$ 13,5 bilhões para que o governo central cumpra a sua meta. O resultado de dezembro terá que ser fenomenal para que isso ocorra. No último mês de 2009, com o Tesouro valendo-se de questionáveis manobras contábeis, o resultado do governo central foi positivo em R$ 1,92 bilhão.

Lula anuncia hoje concessão de refúgio a Battisti

DEU NA FOLHA DE S. PAULO

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva anuncia hoje a concessão de refúgio ao terrorista italiano Cesare Battisti.

Lula recebeu ontem pela manhã parecer da AGU (Advocacia-Geral da União) recomendando a permanência no Brasil de Battisti, acusado na Itália de quatro assassinatos na década de 1970, quando era militante de um grupo extremista de esquerda.

Anteontem, o presidente havia afirmado que acataria "prontamente" a decisão do advogado-geral, Luís Inácio Adams. A AGU já havia apresentado parecer favorável à permanência de Battisti.

Ao decidir pela concessão, Lula arrisca ferir o tratado de extradição do Brasil com a Itália, o que poderia levar até a pedido de impeachment.

Índice que reajusta contratos de aluguel teve alta de 11,32% em 2010

DEU O GLOBO REUTERS/ BRASIL ONLINE

SÃO PAULO (Reuters) - O Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), adotado para reajustar contratos de aluguel e tarifas de energia elétrica, subiu 0,69% em dezembro, em uma forte desaceleração após a alta de 1,45% em novembro, informou a Fundação Getúlio Vargas (FGV) nesta quarta-feira. Em 2010, o IGP-M registrou alta de 11,32%. Em 2009, o IGP-M ficou negativo em -1,71%.

Analistas consultados pela Reuters esperavam avanço de 0,78%, segundo a mediana de projeções que oscilaram de 0,55% a 0,89%. O IGP-M é calculado com base nos preços coletados entre os dias 21 do mês anterior e 20 do mês de referência.

O Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) teve alta de 0,63%. No mês anterior, a taxa foi de 1,84%. O índice relativo aos Bens Finais caiu 0,46% em dezembro, frente a uma alta de 1,34% em novembro. Contribuiu para a desaceleração do índice o subgrupo alimentos processados, cuja taxa de variação passou de 5,58% para 0,63%. O índice referente ao grupo Bens Intermediários variou 0,83%, frente a 0,76% em novembro, puxado pela alta de preços de materiais e componentes para a manufatura, que passou de 0,92% para 1,18%. Já o índice de Matérias-Primas Brutas subiu 1,66% em dezembro, contra uma aceleração de 3,92% em novembro. Os principais responsáveis pela desaceleração do grupo foram os itens: bovinos (11,42% para -1,62%), soja (em grão) (9,72% para 2,58%) e milho (em grão) (9,54% para 4,41%). Ao mesmo tempo, registraram-se acelerações em itens como: minério de ferro (-8,13% para -2,24%), aves (0,97% para 8,02%) e mandioca (aipim) (0,64% para 1,86%).

O Índice de Preços ao Consumidor (IPC) registrou alta de 0,92% em dezembro, contra 0,81% em novembro. Cinco dos sete grupos componentes do índice apresentaram acréscimos em suas taxas de variação, com destaque para Habitação (0,27% para 0,43%). Nesta classe de despesa, vale mencionar os itens: aluguel residencial (0,49% para 1,03%) e condomínio residencial (0,11% para 1,10%). Também apresentaram aceleração os grupos Saúde e Cuidados Pessoais (0,19% para 0,48%), Educação, Leitura e Recreação (0,20% para 0,42%), Despesas Diversas (0,25% para 0,44%) e Alimentação (1,91% para 1,96%). As maiores contribuições foram dos itens artigos de higiene e cuidado pessoal (-0,35% para 0,58%), passagem aérea (-0,20% para 15,00%), cerveja (2,18% para 3,48%) e frutas (2,04% para 3,84%), respectivamente. Na outra ponta, apresentaram desaceleração os grupos Transportes (0,72% para 0,57%) e Vestuário (0,96% para 0,87%), com queda nos preços da gasolina (1,59% para 0,61%) e dos calçados (1,17% para 0,33%).

O Índice Nacional de Custo da Construção (INCC) registrou, em dezembro, variação de 0,59%, acima do resultado de novembro, de 0,36%. Dois dos três grupos componentes do índice apresentaram aceleração: Materiais e Equipamentos, de 0,07% para 0,09%, e Mão de Obra, de 0,59% para 1,08%. Já o índice relativo ao grupo Serviços passou de 0,48%, no mês anterior, para 0,25%, nesta apuração.

Opinião:: Cabe esclarecer

DEU EM O GLOBO

NA VISÃO tosca do presidente Lula sobre como funciona a imprensa independente e profissional, “ dono de jornal e revista fazer a matéria que ele quer e contar a mentira que quer é liberdade de imprensa”.

NÃO É. Trata-se de calúnia, injúria, difamação, e o atingido deve ir à Justiça em busca de seus direitos. Crítica à imprensa também não é censura, como imagina o quase ex-presidente. Aliás, a própria imprensa divulga as críticas que recebe. Crítica é uma coisa; controle, outra.

TENTATIVA DE censura é utilizar o legítimo e necessário direito à crítica como biombo para criar mecanismos de interferência do Estado na produção de qualquer conteúdo jornalístico e artístico, como ocorreu na Era Lula, nas malfadadas iniciativas de instituição da Ancinav, do Conselho Federal de Jornalismo e, mais recentemente, de conselhos de “controle social” da mídia.

REDAÇÃO DE imprensa profissional não é sindicato, onde o “capo” tudo pode.

Clara Nunes - Portela na avenida

A rosa de Hiroxima::Vinicius de Moraes

Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas oh não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroxima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada.