sexta-feira, 25 de julho de 2014

Opinião do dia: Fernando Antônio de Azevedo

No Brasil, não temos uma eleição marcada por diferenças ideológicas. Os candidatos têm tradições partidárias distintas, mas as diferenças se explicitam por meio do programa de governo, não de ideologia.

Em contexto de crescimento do PIB, inflação controlada, aumento de renda e pleno emprego, a tendência é que o eleitor vote no governo. Se o contexto é contrário, o eleitor tende a votar novas propostas. Mas isso não é automático. A oposição tem que se qualificar para mostrar que é ela a resposta.

Fernando Antônio de Azevedo é cientista político da UFSCar. O Globo, 24 de julho de 2014.

Defesa de Cerveró vai responsabilizar Dilma no caso Pasadena

• Após decisão do TCU que determinou o bloqueio de bens do executivo, advogado afirma que presidente do conselho na época deveria ter solicitado mais informações sobre a compra

Fernanda Nunes - O Estado de S. Paulo

RIO - A presidente Dilma Rousseff será o alvo da defesa do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró em sua argumentação contra a decisão do Tribunal de Contas da União (TCU) de responsabilizar a antiga diretoria pela compra da refinaria de Pasadena em condições desfavoráveis à estatal.

Presidente do conselho de administração da empresa na época da decisão de compra da usina, Dilma foi inocentada de qualquer responsabilidade pelo Tribunal, que considerou que a presidente não teve o acesso devido às informações sobre as condições do contrato. Em contrapartida, o TCU responsabilizou, na quarta, os diretores pela aquisição e decidiu pelo bloqueio dos seus bens.

O argumento do advogado de Cerveró, Edson Ribeiro, é que, pelo estatuto da empresa, o conselho de administração é o único responsável por qualquer aquisição. Ele cita trechos do estatuto que exigem do presidente do conselho tomar conhecimento dos detalhes das negociações. "O presidente do conselho pode pedir esclarecimentos sobre os contratos. O resumo executivo é meramente uma apresentação, um suplemento ao que é obrigatório", afirmou.

Dilma, em resposta à reportagem do Estado de março deste ano, disse não ter sido informada de cláusulas do contrato consideradas inapropriadas. São elas a de Put Option, que prevê que, em caso de desentendimento entre os sócios, a Petrobrás seria obrigada a adquirir a totalidade das ações da refinaria; e a Marlim, que determina que a Astra Oil, então sócia da estatal na usina, teria a garantia de retorno financeiro de 6,9% ao ano.

"O ministro relator foi induzido ao erro. Ele partiu de um pressuposto falso, que inúmeras vezes repetido, passou como se fosse verdadeiro. É falsa a declaração de Dilma de que o resumo executivo das condições de compra de Pasadena era técnica e juridicamente falho. Essa argumentação acabou responsabilizando quem não deveria ser responsabilizado, os diretores", argumentou Ribeiro.

Ele diz que a diretoria, na época, encaminhou documentação sobre as condições do contrato à secretaria-geral da Petrobrás, que tem como obrigação encaminhá-la ao conselho para apreciação.

"Se a secretaria não encaminhou, os conselheiros não poderiam ter decidido pela compra", contestou.

Além de atacar o conselho de administração da estatal, o advogado de Cerveró focou também no ministro José Jorge, relator do processo no TCU. Por meio de petição apresentada nessa quarta, ele tentará invalidar a decisão do Tribunal de responsabilizar os diretores com o argumento de que o ministro não poderia ocupar a posição de relator por já ter sido membro do conselho da Petrobrás.

"Ele foi presidente do conselho de administração da Petrobrás em 2001 e 2002, tem interesses em sua decisão. Não basta o julgador ser um homem honesto e íntegro. Ele precisa parecer. Para isso, não deveria ser julgador", disse Ribeiro.

Ex-diretores cobram responsabilidade de Dilma e conselho por perdas de Pasadena

Após TCU atribuir à diretoria da Petrobrás o prejuízo de US$ 792 mi na compra da refinaria e isentar presidente, Nestor Cerveró e Ildo Sauer recorrem ao estatuto da companhia para cobrar colegiado

Fernanda Nunes - O Estado de S. Paulo

RIO - Incluídos na lista de 11 ex-diretores apontados pelo Tribunal de Contas da União como possíveis culpados pelos prejuízos da Petrobrás na operação de compra da refinaria de Pasadena, nos EUA, Nestor Cerveró e Ildo Sauer afirmaram nesta quinta-feira, 25, que a responsabilidade do negócio foi, na verdade, do conselho de administração da estatal, que, à época da aquisição, em 2006, era comandado pela hoje presidente da República, Dilma Rousseff.

Eles recorrem ao estatuto da companhia para argumentar que cabe unicamente ao conselho a responsabilidade por aquisição de ativos, e não aos diretores.

Além de responsabilizar a antiga diretoria da Petrobrás, o TCU determinou o congelamento dos bens dos 11 ex-dirigentes. A decisão, tomada na quarta, foi unânime.

O tribunal eximiu de culpa todo o conselho de administração da empresa utilizando o mesmo argumento apresentado publicamente pela presidente no início deste ano: o negócio só foi aprovado porque o resumo técnico que embasou a decisão estava incompleto.Cerveró foi o responsável por esse documento.

O advogado do ex-diretor da área internacional da Petrobrás, Edson Ribeiro, disse que o TCU partiu de falsos pressupostos ao considerar que o conselho poderia tomar decisões de investimento unicamente baseadas em relatórios resumidos das condições do negócio.

As cláusulas omitidas do resumo técnico determinavam que, em caso de desentendimento entre os sócios, a Petrobrás seria obrigada a adquirir a totalidade das ações da refinaria; e que a Astra Oil, então sócia da estatal no empreendimento, teria a garantia de retorno financeiro de 6,9% ao ano.

Após comprar 50% da refinaria em 2006, a Petrobrás foi obrigada a ficar com 100% da unidade após longo litígio concluído em 2012. A estatal admite prejuízo de US$ 530 milhões no negócio. O TCU apontou uma perda maior: US$ 792 milhões.

Toda a defesa de Cerveró será baseada no artigo 30.º do estatuto da empresa, que define que “o conselho de administração poderá determinar a realização de inspeções, auditagens ou tomadas de contas na companhia, bem como a contratação de especialistas, peritos ou auditores externos, para melhor instruírem as matérias sujeitas a sua deliberação”. Por esse ponto de vista, apenas a análise de um resumo das condições do contrato não é suficiente para balizar uma decisão de compra. “Só o conselho pode decidir sobre Pasadena e o conselho deveria ter examinado todas as questões que o estatuto determina”, disse o advogado.

Além de atacar o Conselho de Administração da Petrobrás, a defesa de Cerveró foca também no ministro José Jorge, relator do processo no TCU. Por meio de petição apresentada ontem, o advogado tentará invalidar a decisão judicial, sob o argumento de que Jorge não poderia ser o relator por já ter sido membro do conselho da Petrobrás. “Ele foi presidente do Conselho de Administração da Petrobrás em 2001 e 2002, tem interesses em sua decisão”, disse Ribeiro.

O TCU, por meio de sua assessoria de imprensa, respondeu que “qualquer petição nesse sentido que for apresentada ao TCU será devidamente analisada, e será dada publicidade à decisão que deliberar sobre ela”.Colaborou Vinícius Neder

Lula atuou para que decisão da corte isentasse presidente

Andreza Matais e Fábio Brandt - O Estado de S. Paulo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comandou a operação do governo para evitar que a presidente Dilma Rousseff fosse responsabilizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por sua participação na compra da refinaria de Pasadena pela Petrobrás. Lula recebeu o ministro do TCU José Múcio Monteiro em um encontro na segunda-feira, em São Paulo, dois dias antes de o assunto entrar na pauta da corte de contas.

Múcio confirmou ao Estado o encontro, mas negou que tivesse tratado de Pasadena. "Eu estava em São Paulo, não via o ex-presidente Lula desde o ano passado e resolvi fazer uma visita a ele de cortesia. Somos amigos. Não falamos absolutamente em Pasadena, não sabia que estava em pauta. Se eu soubesse, era capaz até de eu ter tocado no assunto. Conversamos sobre política, eleição, Brasil, o governo dele, as perspectivas, blablabá, a vida dele, a minha... conversa de compadre, foi exatamente o que aconteceu", disse.

Após a conversa com Lula, porém, o ministro do TCU procurou os colegas e ponderou que responsabilizar Dilma neste momento eleitoral seria politizar demais o caso, além de repetir a defesa do governo de que a presidente votou a favor da compra da refinaria com base em resumo incompleto sobre o negócio.

Ex-ministro de Relações Institucionais no governo Lula e conterrâneo do ex-presidente, Múcio foi nomeado para o TCU pelo petista. Até o início da semana, havia a expectativa no governo e na campanha de Dilma de que o ministro José Jorge, um ex-pefelista que se transformou no ministro responsável por relatar o caso, iria indicar a responsabilidade dela por ter votado a favor da compra da refinaria como presidente do Conselho de Administração da Petrobrás. Ele responsabilizou o ex-presidente da Petrobrás José Sergio Gabrielli, amigo de Lula, e os demais diretores da petroleira, mas decidiu excluir Dilma.

A interlocutores justificou que foi avisado de que, se incluísse a presidente, seu relatório seria todo rejeitado pela corte. Como havia divergência na área técnica sobre responsabilizar o conselho de administração, seria a justificativa para os votos contrários. Neste caso, optou por "salvar" o relatório. Assim, o assunto se mantém na pauta do tribunal e da imprensa, uma vez que se inicia a fase de defesa e há a possibilidade de os "punidos" resolverem contar o que não veio à tona até agora.

Ex-diretor da Petrobras contesta decisão do TCU

• Ildo Sauer diz ter menos responsabilidade que Dilma na compra da refinaria de Pasadena

Eduardo Bresciani – O Globo

BRASÍLIA - O ex-diretor de gás e energia da Petrobras Ildo Sauer disse ao GLOBO ter menos responsabilidade na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, do que os integrantes do Conselho de Administração da empresa na época da aquisição, entre eles a presidente Dilma Rousseff. Sauer e outros ex-diretores foram incluídos pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no rol de responsáveis pelo prejuízo, enquanto os conselheiros ficaram de fora.

- O conselho tem responsabilidades maiores, até pelo que diz o estatuto da Petrobras. A ele cabe privativamente tomar a decisão, e deve fiscalizar os diretores. Eu não indiquei nenhum diretor que conduziu isso. Não participei da condução do negócio. Cabia a mim analisar a documentação e se o negócio estava de acordo com o plano estratégico e a política de governança - disse Sauer

Atualmente diretor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP), Sauer disse receber com "perplexidade" a inclusão de seu nome sem que tenha sido notificado ou ouvido previamente pelo TCU. Ressaltou que a negociação foi conduzida pela diretoria internacional, então comandada por Nestor Cerveró, teve a participação de outras áreas da companhia com a emissão de pareceres, mas que sua diretoria apenas participou da reunião da diretoria executiva em fevereiro de 2006 que referendou o acordo.

A Petrobras pagou, em duas parcelas, US$ 1,25 bilhão pela refinaria, que tinha sido comprada pela belga Astra Oil por US$ 42,5 milhões em 2005. O TCU abriu uma tomada de contas especial para debater a necessidade de ressarcimento de US$ 792,3 milhões pelo prejuízo. Além de Sauer e Cerveró, foram responsabilizados o ex-presidente da Petrobras José Sérgio Gabrielli, o ex-diretor Paulo Roberto Costa, além de funcionários da companhia. Os conselheiros foram excluídos porque os ministros do TCU concordaram com o argumento de Dilma sobre a fragilidade do resumo executivo, que omitiu cláusulas de compra pela Petrobras da segunda metade da refinaria.

Dilma se livra de Pasadena: O Estado de S. Paulo - Editorial

A história verdadeira pode ser outra, mas o fato é que deu certo o estratagema da presidente Dilma Rousseff de alegar que em 2006, quando chefiava o Conselho de Administração da Petrobrás, autorizara a estatal a comprar do grupo belga Astra Oil metade da Refinaria de Pasadena, no Texas, apenas com base em um resumo executivo "técnica e juridicamente falho", preparado pelo então diretor da área internacional da empresa, Nestor Cerveró. Em março passado, informada de que oEstado revelaria o seu papel na ruinosa transação, Dilma pediu à titular da estatal, Graça Foster, que preparasse uma nota explicativa. 

Insatisfeita com o que leu - o texto se limitava a dizer, burocraticamente, que o assunto era objeto de sindicância interna -, rasgou o papel que a amiga lhe trouxera e redigiu, de próprio punho, a versão a ser encaminhada ao jornal. Sabia o que fazia.

Afinal, no ano passado, depois de a Agência Estado levar a público o aberrante negócio, a Polícia Federal, o Ministério Público e o Tribunal de Contas da União (TCU) abriram investigações a respeito, por suspeita de superfaturamento e evasão de divisas. Dilma há de ter atinado que poderia ser acusada de crime de responsabilidade por não haver barrado no nascedouro a operação que custaria à petroleira US$ 1,245 bilhão, com um prejuízo confesso de US$ 530 milhões (US$ 792 milhões para o TCU) - e que, por sinal, foi aprovada pela unanimidade dos integrantes da mais alta instância decisória da companhia. O vexame começou com o desembolso de US$ 360 milhões por 50% da instalação e estoques - ou 8,5 vezes mais do que os belgas pagaram aos antigos donos, pelo empreendimento inteiro, apenas um ano antes.

Em 2007, a ainda desavisada Dilma achou que a Petrobrás podia recusar a compra da outra metade da refinaria, proposta pela Astra Oil. Diante disso, esta acionou a Justiça americana, invocando a cláusula contratual Put Option, segundo a qual, em caso de desavença entre os parceiros, um teria de vender a sua parte ao outro. A empresa ganhou a causa. A Petrobrás recorreu e tornou a perder. Os custos da pendência contribuíram para o maior rombo da história da empresa.

Na nota de março, a presidente assinalou que o resumo de página e meia recebido pelo Conselho omitia, além da Put Option, a condição chamada Merlin, que garantia à sócia uma renda anual de 6,9%, fosse qual fosse a situação do mercado de derivados de petróleo. Se fossem conhecidas, essas cláusulas "seguramente não seriam aprovadas", assegurou.

Nos meses seguintes, em entrevistas à imprensa e depoimentos no Congresso, o ex-presidente da Petrobrás José Sérgio Gabrielli, atual secretário de Planejamento do governador petista da Bahia, Jaques Wagner, não só insistiu que a compra de Pasadena valeu a pena, mas insinuou que o Conselho poderia perfeitamente tomar conhecimento da íntegra do contrato, cópias do qual, como de praxe, foram encaminhadas à secretaria do colegiado. Dominadas ou sabotadas pela bancadas governistas, as CPIs instaladas na Câmara e no Senado de nada serviram para esclarecer o suposto mistério. Ao público só resta intuir que a caixa-preta da Petrobrás tem sido sacudida por brigas de bastidores entre os seus potentados. De sua parte, Cerveró, o autor do tal resumo, volta e meia espalha que tem muito a contar.

Dilma, porém, se livrou. Na quarta-feira, tanto o Ministério Público como o TCU desvincularam o Conselho de quaisquer erros ou malfeitos que produziram o escândalo da refinaria. Para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, as informações dadas pela presidente "afastam a acusação (de parlamentares oposicionistas) de conduta dolosa ou culposa", não cabendo imputar ao Conselho nenhuma espécie de delito que teria conduzido ao desastre.

Já o TCU aprovou o parecer do relator do processo, o ministro José Jorge, que isenta Dilma de qualquer responsabilidade no affair. Os suspeitos - a serem julgados em outra ação - são 11 diretores ou ex-diretores da Petrobrás, entre eles Gabrielli, Cerveró e Paulo Roberto Costa, antigo diretor de abastecimento da empresa, preso sob a acusação de lavagem de dinheiro. E a oposição pode ter perdido um argumento contra Dilma na campanha eleitoral.

Mesmo sem ser um partido, Rede tem 104 candidatos

Agência Estado

Mesmo sem ser um partido efetivamente, a Rede Sustentabilidade de Marina Silva divulgou uma contabilização de 104 candidatos nessas eleições ligados ao grupo, entre eles a própria Marina, candidata a vice-presidente na chapa com o pessebista Eduardo Campos.

Como a Rede não conseguiu realizar o trâmite para ser um partido na Justiça Eleitoral a tempo de participar como uma legenda no pleito de 2014, seus integrantes foram "abrigados" em outros partidos. Segundo o balanço divulgado no site, os candidatos estão nas legendas: PSB (73); PPS (8); PV (6); PEN (4); PDT (4); PHS (2); Solidariedade (2); PROS (1); PRP (1); PTN (1); PRB (1) e PSOL (1).

Os 104 são candidatos em 21 Estados e no Distrito Federal. Segundo a assessoria de imprensa da Rede, são todos ligados ao grupo e autorizaram que seus nomes constassem na lista. Além de Marina, constam os nomes dos candidatos ao Senado: Heloísa Helena (PSOL-AL), Eliana Calmon (PSB-BA), José Antônio Reguffe (PDT-DF) e Aguimar Jesuino da Silva (PSB-GO). A Rede tem também um candidato a vice-governador: Júnior Brasil (PSB-AM), que integra a chapa de Marcelo Ramos (PSB). Os demais são candidatos a deputados federais, estaduais e distritais.

Rio, um entrave para Dilma

• Petista intensifica agenda no estado em contraponto ao apoio do PMDB local, que não abre mão de ficar ao lado de Aécio Neves

Paulo de Tarso Lyra, Grasielle Castro – Correio Braziliense

A presidente Dilma Rousseff atuou ontem em duas frentes para tentar diminuir os problemas políticos que enfrenta nos estados e com os partidos aliados. Após participar do velório do escritor Ariano Suassuna, no Recife (leia mais na página 5), a petista voou para o Rio de Janeiro, onde se encontrou com o governador do estado, Luiz Fernando Pezão (PMDB), candidato à reeleição. Enquanto isso, em Brasília, o coordenador da agenda eleitoral de Dilma, Giles Azevedo, reuniu prefeitos aliados de mais de 20 cidades, incluindo algumas capitais, para medir a popularidade da presidente e planejar agendas locais a partir de agosto.
Dilma e os coordenadores de campanha sabem que a situação não está fácil. Mesmo líder nas pesquisas de intenção de voto, a presidente enfrenta problemas em grandes colégios eleitorais do Sudeste e em outras cidades espalhadas pelo país. O caso do Rio é emblemático: Pezão declarou apoio a Dilma, mas a máquina eleitoral do PMDB fluminense apropriou-se da candidatura do atual governador para montar uma aliança em torno do candidato do PSDB ao Planalto, Aécio Neves. A parceria foi batizada de "Aezão", em referência a Aécio e Pezão. Para dificultar ainda mais a possibilidade de trégua, o PT lançou candidato próprio ao governo fluminense: o senador Lindbergh Farias.

Segundo peemedebistas, o apoio de Pezão a Dilma é sincero, já que a relação entre ambos é boa. No entanto, eles reconhecem que o governador não tem qualquer controle sobre a máquina partidária local, comandada pelo deputado estadual Jorge Picciani, com influência do ex-governador Sérgio Cabral e do líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha. Cabral sonha em presidir nacionalmente o partido caso Aécio seja eleito presidente, enquanto Cunha quer suceder Henrique Eduardo Alves (PMDB-AL) no comando da Câmara. "Nem o melhor dos psicanalistas explica a situação do PMDB do Rio", resumiu um integrante da legenda.

Participação
O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), admite que é preciso acelerar esse processo de palanques. Para ele, muitas coisas ainda estão incipientes, sobretudo em termos de organização da campanha, material e garantias de infraestrutura para os estados. Ele considera fundamental uma participação mais efetiva de Dilma nesse processo. "Ela própria precisa começar a fazer a agenda de rua, acertar as alianças", defendeu. A conversa de Giles ontem com os aliados também teve esse intuito. Ainda não está previsto, contudo, quando uma conversa de Dilma com os administradores municipais. Ela quer ter a certeza de como será o terreno antes de subir nos palanques estaduais.

Outra encrenca para a presidente é São Paulo, onde o candidato do PT ao governo estadual, Alexandre Padilha, patina nas pesquisas. No estado, Dilma terá participação mais ativa, e marcou para o dia 9, em Osasco (SP), agenda ao do ex-ministro. O prefeito da capital, Fernando Haddad (PT), sofre com altos índices de rejeição, e o candidato do PMDB, Paulo Skaf, reluta em abrir espaço no palanque para a campanha dilmista. O responsável por contornar esse incêndio é o vice presidente da República, Michel Temer, que marcou encontros, a partir de 23 de agosto, com lideranças políticas do PMDB paulista.

Em ato com Pezão na Baixada, Dilma diz que fez uma ‘parceria consolidada’ com o PMDB no Rio

• Presidente lembrou ‘tempos difíceis’, criticou opositores e destacou amizade com governador fluminense

Marcelo Remígio e Cássio Bruno – O Globo

SÃO JOÃO DE MERITI (RJ) — A presidente Dilma Rousseff (PT) participou na noite desta quinta-feira de seu primeiro ato de campanha à reeleição no Rio de Janeiro, um jantar com prefeitos e ex-prefeitos promovido em uma churrascaria em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, acompanhada do vice-presidente Michel Temer e do governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, que concorre à reeleição pelo PMDB. O evento faz parte do chamado “Dilmão”, com o objetivo de mostrar ter força entre os prefeitos flumineses, já que, no início de junho o “Aezão”, reuniu 60 prefeitos em um almoço no Rio com 1.800 convidados.

Para garantir a participação do maior número possível de presenças, o próprio Pezão e o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), que esteve no encontro, ligaram para os prefeitos fluminenses. A lista com o total de prefeitos presentes, no entanto, não foi divulgada. Foram anunciados pelo locutor os nomes de apenas três prefeitos, quatro deputados federais e seis estaduais. Já Pezão afirmou, ao discursar, estarem ali 62 prefeitos e 46 ex-prefeitos. Dez dos 11 prefeitos do PT no estado estiveram presentes, segundo o prefeito de Niterói, Rodrigo Neves (PT). Apenas o de Maricá, Washington Quaquá, presidente estadual do PT e coordenador da campanha petista ao governo do estado, faltou.

Tentando inibir a presença de prefeitos no jantar do “Dilmão”, o líder do movimento “Aezão” e presidente estadual do PMDB, Jorge Picciani, ligou para aliados e simpatizantes à candidatura de Aécio e pediu para que não comparecessem ao encontro. O mesmo foi feito por outros integrantes do “Aezão”.

O tom dos discursos foram as parcerias firmadas por Dilma, Pezão, o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Sérgio Cabral.

Dilma chegou acompanhada de Pezão e do senador senador Carlos Lupi (PDT). Ao discursar, destacou a amizade com o governador e a importância da parceria:

— Conheci o Pezão e, ao longo do tempo, descobri uma grande humanidade. Ele olha as pessoas com carinho e vê seres humanos. Ele olha para os mais pobres — destacou Dilma, que depois ressaltou a parceria realizada entre ela, Lula, Cabral e Pezão:

— Fizemos uma escolha consciente pela parceria, uma parceria consolidada. Fomos parceiros nas horas fáceis e nas difícieis — disse Dilma, lembrando da tragédia na Região Serrana em 2011.

Sem citar nomes, Dilma criticou os opositores e o pessimismo:

— A campanha do Lula foi marcada pela esperança, que venceu o medo. Esperamos vencer as eleições com a verdade vencendo o pessimismo. A Copa foi um momento especial . Diziam que nós não tínhamos capacidade de realizar a Copa, que seria um inferno com as manifestações. Mas tivemos a capacidade de provar que o Brasil tinha a capacidade.

A presidente disse ainda “estar entre amigos” no evento:

— Eu olho para as pessoas e sinto que estamos numa luta do bem. Não respondemos as agressões com agressões. Respondemos com a verdade de nossas convicções — afirmou fazendo um balanço de seu governo.

Na saída do evento, Dilma disse apenas que está “muito animada” para a campanha e que vai participar dos quatro palanques no estado.

Pezão, que integra uma aliança de 17 partidos e que também apoia os candidatos a presidente Aécio Neves e Pastor Everaldo (PSC), reafirmou que vai pedir votos para Dilma e que questões partidárias não vão interferir em sua boa relação com a presidente. Nacionalmente, o PMDB apoia a reeleição da petista.

— Nossa aliança está acima dessas questões partidárias — afirmou Pezão a Dilma, numa referência às candidaturas ao Palácio Guanabara de Lindbergh Farias (PT), Marcelo Crivella (PRB) e Anthony Garotinho (PR). — A senhora (Dilma) foi uma das maiores amizades que eu fiz na política e nada vai nos separar — acrescentou.

Paes reforça apoio a Lupi no senado
Ao discursar, o prefeito do Rio Eduardo Paes declarou voto ao candidato Carlos Lupi ao Senado, lembrou de parcerias entre os governos federal, estadual e municipal, além de ironizar as alianças feitas por candidaturas no estado. Na chapa de Pezão, a vaga para o Senado é ocupada pelo vereador e desafeto de Paes, o ex-prefeito Cesar Maia.

— É a única química, a única mistura que pode dar certo.

Já o prefeito de Duque de Caxias, Alexandre Cardoso (sem partido), um dos articuladores do movimento "Dilmão", lembrou da parceria firmada entre Dilma, Lula, Cabral e Pezão em programas e obras no estado. Antes da chegada da presidente, Alexandre ressaltou que Dilma conta com o apoio de nove dos dez prefeitos que governam as maiores cidades fluminenses em população. Cardoso desconversou quando foi indagado se a campanha petista não via problemas em Pezão ter anunciado que também abrirá seu palanque para Aécio Neves.

— O Pezão me disse que vota em Dilma — disse Cardoso que, depois afirmou que alguns prefeitos das regiões Norte e Noroeste (reduto eleitoral do ex-governador e candidato ao Palácio Guanabara Anthony Garotinho) justificaram a ausência no jantar em função da distância do mau tempo, que dificultaram o deslocamento.

Prefeito petista declara apoio a pezão
Prefeito petista de Niterói, Rodrigo Neves, ao discursar, fez comparações dos 12 anos dos governos Dilma e Lula com oito anos da gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Rodrigo ainda chamou Pezão de “nosso governador”. O prefeito foi um dos petistas que não abraçaram a campanha do senador Lindbergh Farias, candidato do PT ao governo do Rio.

Um dos prefeitos aguardados, Nelson Bornier (PMDB), de Nova Iguaçu, não compareceu. Ele alegou outro compromisso. Bornier, que esteve no lançamento da candidatura de Aécio no Rio, tem afirmado que apoia Dilma a pedido de Pezão e que aguarda uma contrapartida de Dilma para se manter na campanha. O prefeito cobra liberação de verbas e convênios por parte do governo federal.

Lupi, ex-ministro do Trabalho do governo Dilma que foi afastado do governo em meio a denúncias de irregularidades em sua pasta, foi o causador da mudança na composição da chapa de Pezão. Com o lançamento de sua candidatura independente, o PDT deixou a aliança e o senador Francisco Dornelles (PP) assumiu a vaga de vice, no lugar do pedetista Felipe Peixoto. Dilma, que demitiu Lupi, fez elogios ao candidato ao Senado durante seu discurso.

Crise no PT fluminense
O lançamento da campanha de Dilma no Rio, ao lado do peemedebista Pezão, provocou uma crise no PT fluminense, que tem como candidato ao Palácio Guanabara o senador Lindbergh Farias. Além de Pezão e Lindbergh, a base aliada da presidente ainda possui como candidatos o deputado federal Anthony Garotinho (PR) e o senador Marcelo Crivella (PRB).

— No caso de Lindbergh, Garotinho e Crivella, propomos eventos públicos. Aqui (no jantar), de todas as propostas, foi o mais rápido para ser organizado. Eu diria que, se eu fosse candidato a governador, optaria por fazer o último evento, que talvez aconteça em um momento mais intenso da campanha. Temos que saber administrar. Uma campanha no estado em que a presidenta tem quatro candidatos, sempre vai ter algum tipo de reclamação. Faz parte do processo — afirmou o coordenador de campanha de Dilma no Estado do Rio, o vice-prefeito do Rio Adilson Pires (PT).

Para conter o mal-estar provocado pelo primeiro ato de campanha da petistas e por agendas frequentes com Pezão, o núcleo político de Dilma acertou a realização de eventos de rua com os três aliados. Nesta sexta-feira, o presidente nacional do PT e coordenador nacional da campanha de Dilma, Rui Falcão, se encontrará com Lindbergh, Garotinho e Crivella. No entanto, a prioridade de Lindbergh é pedir votos na rua ao lado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

O evento de Dilma com os prefeitos aconteceu no município governado pelo prefeito Sandro Mattos (PDT), principal aliado de Lindbergh e onde fica o maior comitê eleitoral do petista. Para receber o jantar do movimento “Dilmão”, a churrascaria foi isolada por um forte esquema de segurança da Presidência da República. No interior do salão da churrascaria foram colocados painéis de Dilma com Pezão. Na trilha sonora, jingles de Dilma e Pezão e um samba criado por compositores da escola de samba Grande Rio sobre o Arco Rodoviário, inaugurado pela presidente. Na tentativa de ver Dilma, moradores da região se concentraram em um posto de gasolina próximo à entrada da churrascaria, assim como cabos eleitorais do candidato Pezão. O jantar custou cerca de R$ 15 mil — sem incluir a bebida — e foi pago pelos prefeitos Cardoso, Paes e Rodrigo Neves, de Niterói.

Lançamento da candidatura de Dilma Rousseff no Rio terá 60 prefeitos

• Ato na Baixada com presença de Pezão é resposta aos eventos pró-Aécio. Outros aliados também terão agenda com a presidente

Carina Bacelar, Cássio Bruno, Fernanda Krakovics, Leticia Fernandes e Marcelo Remígio - O Globo

BRASÍLIA e RIO — Nove dos dez prefeitos dos municípios fluminenses com o maior número de eleitores declararam apoio ao movimento “Dilmão”, que defende no Rio as candidaturas à reeleição da presidente Dilma Rousseff (PT) e do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB). O “Dilmão” promoverá hoje um jantar com cerca de 300 convidados em uma churrascaria em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, como resposta ao lançamento no estado da candidatura a presidente do tucano Aécio Neves, semana passada, em Queimados, também na Baixada. Além de Dilma e Pezão, os organizadores esperam reunir 60 prefeitos — muitos deles estiveram em eventos do “Aezão” —, lideranças políticas, deputados federais e estaduais. O evento será o pontapé inicial da campanha de Dilma no Rio.
De acordo com o prefeito de Duque de Caxias, Alexandre Cardoso (sem partido), um dos coordenadores do movimento “Dilmão”, as nove cidades com prefeitos que apoiam Dilma — Rio, São Gonçalo, Caxias, Nova Iguaçu, Niterói, Campos, Belford Roxo, São João de Meriti e Volta Redonda — respondem por 65% do eleitorado:

— Não estamos preocupados em lotar a churrascaria, queremos mostrar a adesão de prefeitos. Vamos apresentar uma prestação de contas de Dilma no estado e mostrar a importância de apoiar a reeleição — disse Cardoso, em referência ao almoço promovido pelo movimento “Aezão”, de apoio a Aécio, que reuniu cerca de 1.800 pessoas no Rio.

Para evitar problemas com os demais candidatos ao Palácio Guanabara da base aliada da presidente, a coordenação da campanha de Dilma promoverá eventos com Lindbergh Farias (PT), Marcelo Crivella (PRB) e Anthony Garotinho (PR). Depois de Pezão, o próximo a dividir o palanque com Dilma deverá ser Garotinho, já na próxima semana.

Na tentativa de minimizar a insatisfação com a participação de Dilma em um ato político com Pezão, os demais candidatos foram avisados do jantar com antecedência pela coordenação da campanha. O presidente do PT, Rui Falcão, coordenador-geral, virá amanhã ao Rio e terá reuniões com Garotinho, Crivella e com o prefeito Eduardo Paes (PMDB). À noite, ele participará de plenária do PT com Lindbergh. No encontro com Garotinho, Falcão deve dizer que a campanha de Dilma está cumprindo o acordo feito com ele em fevereiro. Na ocasião, Garotinho pediu reciprocidade e ressaltou que não exigiria exclusividade. Ou seja, apoiaria a reeleição de Dilma desde que ela fosse também a seu palanque e não privilegiasse nenhum candidato.

Durante carreata ontem no Complexo da Maré, o ex-governador Garotinho disse que Dilma deverá visitar um conjunto habitacional na Zona Oeste ou na Baixada entregue durante sua gestão.

— Fui comunicado do encontro (“Dilmão”) pelo ministro (Ricardo) Berzoini (Relações Institucionais), que pediu para eu fazer uma agenda. Eu deixei que ela viesse primeiro com o Pezão para ele explicar a posição dos prefeitos que foram no almoço com o Aécio e, agora, vão num jantar com ela. Precisam dizer com quem estão — ironizou.

Lindbergh evita polêmica
Já Lindbergh, visivelmente constrangido com o início da campanha de Dilma no Rio ao lado de Pezão, desejou “sorte” à presidente, durante corpo a corpo em São Gonçalo, na Região Metropolitana. Sem polemizar, o petista afirmou que Dilma “sabe o que faz” e disse que não “ficará com picuinha política” em relação ao encontro com Pezão. Para o senador petista, a atitude de Dilma “é natural”:

— Vamos esperar o momento certo para fazer uma agenda com ela. Não vou ficar nessa picuinha política. Sei ganhar a eleição no meio da rua, conversando com as pessoas. Acho que nossa candidatura pode contribuir com a Dilma. Desejo sorte a ela. Sempre estarei à disposição.
Pezão negou possíveis tensões no partido com o comparecimento de prefeitos do PMDB que participaram de eventos do “Aezão”.

— É natural que todos os prefeitos ouçam os candidatos agora. É uma oportunidade única de estar pessoalmente com ela, numa agenda que é difícil qualquer prefeito ter. Os prefeitos que foram lá ouvir o senador Aécio vão ouvir a presidente Dilma e, se precisar, vão ouvir o Pastor Everaldo (PSC).

O jantar do “Dilmão” custará R$ 15 mil e será pago pelos prefeitos Cardoso (sem partido), Paes e Rodrigo Neves (PT-Niterói). Bebidas serão servidas à parte. No cardápio, salmão na brasa e churrasco. Alguns candidatos a deputado de partidos da aliança de Pezão que aderiram ao “Aezão” deverão comparecer como forma de protesto contra o PMDB, que ainda não honrou a entrega de material de campanha.

Coordenador de Aécio no Rio, Picciani ironiza ato do 'Dilmão'

• Presidente do PMDB no estado diz que prefeito de Caxias não sabe fazer contas

Juliana Castro – O Globo

RIO — Coordenador da campanha do presidenciável Aécio Neves (PSDB) no estado, o presidente do PMDB-RJ Jorge Picciani, ironizou o primeiro ato de campanha da presidente Dilma Rousseff (PT) no Rio. Dilma participa nesta quinta-feira de jantar com prefeitos promovido por aqueles que integram o movimento "Dilmão", de apoio a Dilma e ao governador Luiz Fernando Pezão (PMDB).

Picciani disse que o prefeito de Duque de Caxias, Alexandre Cardoso (sem partido), um dos principais articuladores do "Dilmão, é médico e erra quando se mete a fazer contas. O peemedebista deu a declaração ao comentar a informação repassada pelos dilmistas de que haverá 60 prefeitos no evento.

— Toda vez que ele quer fazer conta ele se ferra. O problema é que esses prefeitos não estão com ela (Dilma) — afirmou Picciani.

Ele disse que, com a exceção do prefeito Eduardo Paes (PMDB), os outros prefeitos que integram o "Dilmão" são mal avaliados.

O peemedebista declarou que alguns prefeitos que participaram do ato de lançamento do "Aezão", de apoio a Aécio e Pezão, devem ir ao evento do "Dilmão".

— Prefeito vai em tudo, mas tem uma diferença entre ir e estar com ela — afirmou.

No Rio, Aécio retoma agenda pública

Pedro Venceslau - O Estado de S Paulo

Após quase uma semana sem participar de eventos públicos, o senador Aécio Neves, candidato do PSDB à Presidência, vai retomar hoje sua agenda de campanha na favela do Vidigal, no Rio.

O tucano cancelou diversas agendas desde domingo, quando o jornal Folha de S.Paulo publicou uma reportagem sobre a construção de um aeroporto em um terreno que pertenceu ao tio-avô de Aécio, Múcio Guimarães Tolentino. Ontem, o Estado revelou que o local já havia recebido dinheiro do governo de Minas também em 1983, quando o governador era Tancredo Neves, avô de Aécio - na época, o Estado pagou a construção de uma pista de terra para pousos e decolagens no local.

Nos últimos cinco dias, o candidato participou de apenas um evento, em Minas. Na terça-feira, reuniu-se no comitê com pessoas com deficiência e na sequência fez uma declaração à imprensa, mas não respondeu perguntas dos jornalistas.

Ontem, Aécio era esperado no "Ano Profético", principal atividade da igreja evangélica Sara Nossa Terra, mas viajou para o Rio e enviou seu candidato à vice, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), para representá-lo. O governador Geraldo Alckmin (PSDB), candidato à reeleição, e o ex-governador José Serra (PSDB), que disputa o Senado, participaram do ato.

Aécio tem feito sua defesa por meio das redes sociais e por notas divulgadas no site da campanha. Ele alega que o terreno onde está o aeroporto foi desapropriado e classifica como ação "puramente eleitoreira" o pedido do PT para que o procurador-geral da República apure prática de ato de improbidade administrativa em sua gestão no governo mineiro.

PSDB reage ao 'Dilmão' para não perder aliados do RJ

Débora Bergamasco - Agência Estado

O PSDB preparou um contra-ataque às investidas da presidente Dilma Rousseff, que tenta recuperar o apoio de partidos da base governista rachados nos estados e que agora estão pedindo votos para a oposição. A ordem do candidato a presidente Aécio Neves (PSDB) é reforçar os chamados "contatos de convivência" com todos os novo aliados, em todo o Brasil. "Estamos travando um eterno abrir e fechar de portas com os aliados da base governista. Os petistas fecham, a gente abre, os petistas tentam entrar, a gente fecha", metaforizou um dos coordenadores do núcleo político da campanha tucana.

Contra a ofensiva da presidente Dilma Rousseff, que tinha marcado um jantar na noite de hoje com prefeitos do PMDB no Rio, com a intenção de conter o movimento "Aezão", Aécio pediu para o presidente estadual da legenda no estado, Jorge Picciani, ligasse para todos os prefeitos fluminenses da legenda para marcar posição e reforçar os benefícios do apoio informal ao PSDB.

Coordenador nacional da campanha de Aécio, o senador José Agripino (DEM-RN) acredita que a petista pode tentar, mas não influenciará os dissidentes. "Não será um almoço que vai inverter uma situação criada com três anos de maus tratos. Pode até conseguir algum convencimento na cúpula, mas a relação com a base do partido, que é quem está na rua, essa é irrecuperável. Ela pode fazer mil almoços."

Integrante da equipe de campanha tucana, o ex-vice governador de São Paulo Alberto Goldman questiona: 

"Quais são os argumentos que a Dilma tem para usar com os prefeitos? Liberação de recursos já não pode mais. Eles vão achar que ela é simpática agora?"

Na segunda-feira, 28, haverá em São Paulo uma reunião com todos os coordenadores regionais da campanha em que será reforçada a orientação de manter os apoios bem costurados.

Aécio visitará o AfroReggae

- Correio Braziliense

Depois de uma sequência de reuniões internas, o candidato do PSDB na disputa pelo Palácio do Planalto, senador Aécio Neves (MG), faz hoje o primeiro corpo a corpo da semana. Ele participa de uma caminhada em Vigário Geral, no Rio de Janeiro, com liderança do AfroReggae, até chegar à sede do movimento, no Centro Cultural Waly Salomão. A intenção é conquistar o apoio da juventude. O responsável pelas propostas nessa área da campanha do presidenciável é o coordenador do movimento, José Júnior.

Aécio se reuniu em São Paulo, na quarta-feira, com o candidato ao governo do Espírito Santo Paulo Hartung (PMDB), o vice Cesar Colnago (PSDB) e o coordenador da campanha presidencial no estado, o senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), para unificar as campanhas. "Se eu pudesse resumir a intenção desse nosso projeto, dessa nossa aliança, eu diria que é resgatar o Espírito Santo do isolamento a que foi submetido pelo governo da presidente Dilma", disse.

Esta semana, o tucano ainda participou de um encontro para debater políticas de acessibilidade com a deputada federal Mara Gabrilli (PSDB-SP). Na reunião, ele defendeu o projeto que cria a Lei Brasileira de Inclusão (LBI) e pediu ajuda da deputada, que é cadeirante, para apresentar pontos da proposta que possam ser incluídos no programa de governo. "Se vencermos as eleições, vamos dar um extraordinário salto na busca da inserção na sociedade, na superação de qualquer tipo de discriminação, na garantia da acessibilidade", afirmou Aécio.

Norte e Nordeste terão disputas polarizadas na TV

Cristian Klein – Valor Econômico

SÃO PAULO - O Norte e o Nordeste são as regiões que concentrarão a maior proporção de disputas a governador polarizadas na eleição deste ano. Em 12 das 16 corridas estaduais destas regiões (75%), a maioria dos principais partidos se agrupou em torno de apenas dois candidatos, de acordo com levantamento do Valor Data que prevê o tempo dos programas eleitorais no rádio e TV dos 171 candidatos a governador, com base nos registros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A taxa pode aumentar para 81% caso o PSDB de Alagoas se retire da disputa com a desistência, ontem, de seu candidato, Eduardo Tavares.

No Ceará, haverá a maior concentração nos programas de 20 minutos no rádio e TV. O deputado estadual Camilo Santana (PT), escolhido pelo clã do governador Cid Gomes (Pros) à sucessão, e seu principal adversário, o senador Eunício Oliveira (PMDB), terão juntos 80% (16 minutos) do horário eleitoral gratuito. O petista ocupará 46% do espaço de propaganda contra 34% do pemedebista - o que deixa pouco espaço para uma terceira via. Palanque do presidenciável e correligionário Eduardo Campos no Estado (PSB), Eliane Novais lançou-se sem coligação e terá apenas 11% (2 minutos).

Por outro lado, o campeão de tempo de TV entre os 171 candidatos a governador também é do PSB e está no Nordeste. É o ex-secretário de Fazenda de Pernambuco, Paulo Câmara, escolhido por Campos para a sucessão em seu Estado. Câmara, que é sustentado pela maior coligação a governador - com 21 partidos dos 32 do país -, disporá de mais da metade (52%) do horário eleitoral. Ele polarizará com o senador Armando Monteiro (PTB) e que terá 24% do tempo de TV. Pernambuco registra a sexta maior concentração de propaganda eleitoral nos dois principais candidatos.

Depois do líder Ceará, Sergipe (PMDB x PSC) e Rio Grande do Norte (PMDB x PSD) despontam com os maiores latifúndios no tempo de TV - respectivamente, 79% e 78% - a serem ocupados pelos dois polos da disputa. Em seguida vêm Maranhão (PMDB x PCdoB) e Acre (PSDB x PT), com 77%.

No Norte, mais quatro Estados têm alta concentração na propaganda eleitoral: Pará (PMDB x PSDB), Amazonas (PMDB x Pros), Roraima (PSB x PT) e Tocantins (SD x PMDB), totalizando cinco das sete unidades da Federação da região. Ou seja, 71% estão no topo da tabela. No Nordeste, a taxa é ainda maior: sete entre os nove Estados (78%) terão confrontos polarizados, ao menos quanto ao tempo de TV. Bahia (PT x DEM) e Piauí (PMDB x PT) completam a lista. Das 12 unidades da Federação com maior concentração de tempo de TV nos dois principais candidatos, todas são da região Norte ou Nordeste. Acima do limiar de 70% de concentração, figuram ainda Minas Gerais (PSDB x PT) e Mato Grosso (PT x PDT).

Na outra ponta, aparece um Estado nortista, que terá a maior fragmentação entre os 27. É o Amapá, onde cinco candidatos se acotovelarão no horário eleitoral e os dois maiores tempos de TV corresponderão a apenas 44%. Lucas Barreto (PSD) terá 23% e Waldez Góes (PDT), 21,3%. Serão seguidos de perto pelo governador Camilo Capiberibe (PSB), com 21%, Bruno Mineiro (PTdoB), 14%, e Jorge Amanajás (PPS), 10%.

Em 2010, o Amapá teve o processo eleitoral mais tumultuado do país, quando Góes, então governador, foi preso em operação da Polícia Federal, e Capiberibe, que largou em quarto lugar nas pesquisas, elegeu-se no segundo turno.

O segundo Estado com propaganda menos concentrada (50%) será o Rio Grande do Sul, onde a reeleição do petista Tarso Genro é ameaçada por três blocos: o liderado pela senadora Ana Amélia (PP), atrás de quem o governador aparece nas pesquisas de opinião; o do pemedebista José Ivo Sartori; e o do deputado federal Vieira da Cunha (PDT).

O caso gaúcho, no entanto, mostra como nos cenários fragmentados a correlação entre tempo de TV e intenção de voto nem sempre é direta. Outros recursos políticos podem catapultar o candidato. Ana Amélia, que foi apresentadora de TV e disputou eleição majoritária em 2010, tem imagem amplamente conhecida no Estado. Lidera a corrida e é favorita, ao lado do governador, embora terá o terceiro maior programa eleitoral (19%), atrás de Genro (26%) e Sartori (24%). Cunha contará com 12% do espaço.

Em contraste ainda maior aparece o senador Marcelo Crivella (PRB), que está à frente da disputa no Rio, ao lado do ex-governador Anthony Garotinho (PR), ambos com 24%, de acordo com pesquisa Datafolha deste mês.

Crivella tem reduto entre os evangélicos e participou de várias eleições majoritárias. Mas concorre sem coligação e contará com cerca de 6% do horário eleitoral - pouco mais de um minuto de programa. O governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), com 44%, terá propaganda sete vezes e meia maior. O senador petista Lindbergh Farias, com 22%, terá quase quatro vezes mais espaço e Garotinho, com 12%, um pouco mais do que o dobro.

Crivella é o concorrente considerado competitivo com o pior tempo de TV no país. Não consta entre os cem maiores programas eleitorais. Nas últimas três eleições no país, só seis (5%) de 108 candidatos a governador que dispunham do quarto maior tempo se elegeram no primeiro turno ou chegaram à segunda etapa. "A correlação entre propaganda eleitoral e o resultado das urnas é muito alta. Se o candidato tem o maior tempo, a maior probabilidade (70%) é que fique em primeiro lugar; se tem o segundo, a maior chance é que fique em segundo lugar; e assim por diante", afirma o cientista político Felipe Borba, do Iesp/Uerj.

Em São Paulo, haverá relativamente pouca concentração e a disputa orbitará em torno de três nomes: o presidente licenciado da Fiesp, Paulo Skaf (PMDB), e o governador Geraldo Alckmin (PSDB), que ocuparão 53%, além de Alexandre Padilha (PT). Será pouca a diferença entre os três: 29% (Skaf), 24% (Alckmin) e 21% (Padilha).

Em nove Estados, programa eleitoral da oposição será maior que o da situação

Cristian Klein – Valor Econômico

SÃO PAULO - Assim como Alckmin terá menos tempo que Skaf em São Paulo, vários governadores ou candidatos da situação largarão em desvantagem na propaganda eleitoral de rádio e TV, que começará em 19 de agosto. Ao todo, nove de 26 candidatos governistas (34%) terão espaço no horário eleitoral inferior a pelo menos um adversário.

Em dois Estados, o candidato governista disporá de menos tempo de propaganda do que dois concorrentes da oposição. É o caso de Nelsinho Trad (PMDB), em Mato Grosso do Sul; e o governador Camilo Capiberibe (PSB), no Amapá. Nesta mesma situação, Eduardo Tavares (PSDB), em Alagoas, desistiu ontem de concorrer.

Seis governadores também estão em desvantagem, embora para apenas um adversário. Entre eles, o petista Tião Viana (31%) em relação ao tucano Márcio Bittar (46%), no Acre; o tucano Simão Jatene (35%) diante do pemedebista Helder Barbalho (40%), no Pará; o pessebista Ricardo Coutinho (25%) contra o tucano Cássio Cunha Lima (33%) na Paraíba; o pemedebista Confúcio Moura (24%) versus o tucano Expedito Júnior (28%), em Rondônia; e Geraldo Alckmin (24%) para Skaf (29%).

Alckmin é o único entre os sete governistas das regiões Sul e Sudeste nesta condição desfavorável. A maioria dos que estão em desvantagem para adversários da oposição - cinco dos nove (55%) - é formada por situacionistas da região Norte. Como a região tem sete Estados, a vantagem da oposição será em 71% deles - o que indica uma possível fonte de mudanças políticas na região.

É o caso do Amazonas, onde o governador José Melo (Pros) é ameaçado pelo senador e ex-governador Eduardo Braga (PMDB), com quem rompeu e foi obrigado a mudar de partido para se candidatar à reeleição. Dos sete governadores em desvantagem quanto ao tempo de TV, Melo é o único que não foi eleito em 2010 e está há menos de quatro meses no cargo, depois que Omar Aziz (PSD) se desincompatibilizou para concorrer ao Senado.

Ao todo, 18 governadores buscarão a reeleição neste ano. Dos 11 com propaganda superior à dos adversários, o único incumbente a igualar o espaço que terá a presidente Dilma Rousseff, na eleição ao Planalto, é Chico Rodrigues (PSB), de Roraima. Ambos contarão com 47% do espaço disponível - embora, em minutos, o programa da petista será maior porque o horário eleitoral dos candidatos à Presidência dura 25 minutos. Além dele, mais dois candidatos de situação vão igualar ou superar Dilma, proporcionalmente: Lobão Filho (PMDB), que também tem 47% no Maranhão, e Paulo Câmara (PSB), com seus 52% em Pernambuco.

Isso mostra que a vida de governistas nas eleições estaduais tende a ser menos confortável do que na corrida presidencial. Enquanto na disputa ao Planalto, Campos, o tucano Aécio Neves e os demais oito adversários de Dilma ocuparão 53% da propaganda eleitoral, os candidatos a governador oposicionistas terão, em média, 66%.

Num caso atípico, no Rio Grande do Norte esse índice sobe para 100%, pois, a rigor, não há um defensor do status quo. Com baixíssima popularidade, a governadora Rosalba Ciarlini (DEM) não conseguiu legenda para concorrer à reeleição e foi politicamente isolada.

Beneficiário do desmantelamento da administração Rosalba, o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB) - entre os que adotam o discurso de mudança - é o que terá o maior tempo de TV nas disputas estaduais (46,6%). Em seguida, os oposicionistas com mais munição na propaganda eleitoral - que inclui ainda as inserções ao longo da programação das emissoras - são o tucano Márcio Bittar (46,2%), no Acre, uma dupla de herdeiros políticos de caciques pemedebistas, Renan Filho (43%), em Alagoas, e Helder Barbalho (40%), no Pará; além do senador Eduardo Braga (38%), que tenta retomar o governo do Amazonas.

A oposição também terá boas oportunidades no Nordeste, que apresenta a menor taxa de governadores em busca de reeleição: em três dos nove Estados (33%).

Alvo de fogo amigo, ministro fica no governo Dilma após pedido de Lula

• Chefe da Casa Civil, Mercadante chegou a sondar possíveis substitutos para Secretaria-Geral

• Principal aliado de Lula no Planalto, Carvalho reclamou por tentarem jogá-lo na campanha como "bagaço usado"

Natuza Nery, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff decidiu manter o ministro Gilberto Carvalho (Secretaria-Geral) no governo após recomendação do ex-presidente Lula para que o aliado seguisse no cargo.

Segundo a Folha apurou, Lula transmitiu, na última sexta-feira (18), ao ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) seu incômodo com a "fritura" de Carvalho por meio de críticas a ele vazadas à imprensa por integrantes do Palácio do Planalto.

Conforme interlocutores, o ex-presidente explicou que defendera a ida de Carvalho para a campanha no início do ano, mas que o Planalto preferiu esperar o término da Copa. Ocorre que, de lá para cá, o ministro da Secretaria-Geral passou a ser alvo do chamado "fogo amigo".

A própria presidente Dilma Rousseff se irritou com declarações recentes do ministro sobre as vaias dirigidas a ela na abertura da Copa. Para ele, era um erro achar que xingamentos dirigidos à chefe no evento em São Paulo partiram apenas da elite.

Algumas das críticas que circularam pelos jornais contra Carvalho foram atribuídas por petistas ao próprio Mercadante. Auxiliares do chefe da Casa Civil negam a versão.

Na segunda (21), Carvalho e Mercadante tiveram uma dura discussão e o ministro da Secretaria-Geral, segundo a Folha apurou, reclamou que estavam querendo jogá-lo na campanha feito "um bagaço usado".

Alguns dias atrás, chegou ao Instituto Lula a informação de que Mercadante chegara a indicar um nome de sua confiança para a pasta.

Assessores da Casa Civil relataram que ele sondou para o cargo Laís Abramo, representante da OIT (Organização Internacional do Trabalho) e filha do sociólogo Perseu Abramo, antes mesmo de Gilberto Carvalho ser informado oficialmente sobre sua saída. Até segunda-feira, sua exoneração era dada como certa.

O ministro Miguel Rossetto (Desenvolvimento Agrário) também foi sondado para a vaga de Carvalho.

Desde o começo, Carvalho não escondeu sua intenção de seguir na pasta, comprometendo-se a ajudar na corrida sucessória após o expediente sob argumento de que teria mais força e melhor acesso à candidata de dentro do Palácio do Planalto.

"Minha disposição é de seguir fazendo meu trabalho no governo,", disse o ministro à Folha na semana passada.

Procurada, a assessoria de Carvalho negou que tenha havido interferência de Lula no episódio e que ele tenha discutido com Mercadante.

No PT, a avaliação é de que as negociações para a substituição foram mal conduzidas pela Casa Civil. A articulação frustrou a expectativa da campanha de ter, em tempo integral, um porta-voz próximo aos movimentos sociais.

Com a sua manutenção no governo, Carvalho passa a integrar o grupo de ministros que atuam como uma espécie de "agente duplo". Mercadante e o titular das Relações Institucionais, Ricardo Berzoini, também participam das articulações da campanha.

Merval Pereira: AGU e Lula pressionam TCU

- O Globo

Houve uma articulação do governo, que envolveu o advogado-geral da União (AGU), Luís Adams, e até mesmo o ex-presidente Lula, para tentar engavetar o processo do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos. A decisão do tribunal acabou isentando o Conselho de Administração, presidido na ocasião da compra pela hoje presidente Dilma Rousseff, de culpa pelo prejuízo causado à Petrobras, mas condenou os 11 diretores da estatal brasileira a ressarcirem os cofres públicos em quase US$ 1 bilhão.

O primeiro relato sobre essa manobra governamental, que se assemelha em tudo às pressões que o ex-presidente Lula fez sobre os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para que o processo do mensalão não fosse a julgamento, foi feito pelo jornalista Reinaldo Azevedo, ontem, em seu blog na "Veja". Fui a campo para esmiuçar o caso e descobri que na terça-feira, dia 22, véspera da análise do processo, às 17h, o advogado-geral da União foi ao TCU para uma audiência com o relator, ministro José Jorge (ex-senador do DEM e ex-candidato a vice-presidente da República na chapa tucana em 2006) e pediu para tirá-lo de pauta.

Não é um procedimento incomum, e normalmente os pedidos são atendidos para dar mais tempo aos advogados de se prepararem. Mas, como esse é um caso muito complexo e com delicadezas políticas, o ministro José Jorge tomou a precaução de publicar seu voto na intranet do TCU na véspera. Adams alegava querer fazer uma defesa oral, e não tivera tempo suficiente de analisar o relatório, divulgado no dia anterior.

Mas como o relatório fazia parte do processo, que já era público há muito tempo, o ministro José Jorge não viu razão para adiar o julgamento. Nessa conversa, José Jorge perguntou a Adams: "Você vai fazer a defesa de quem? Nós estamos aqui defendendo a Petrobras, condenando as pessoas a devolverem o dinheiro à Petrobras". Ao mesmo tempo, o ministro do TCU José Múcio, que foi ministro de Articulação Política de Lula, foi chamado pelo ex-presidente para uma conversa em São Paulo.

No relato que fez a seus pares, disse que encontrou o ex-presidente muito preocupado, relatou que nunca vira antes Lula de moral tão baixa. O ex-presidente criticou a campanha de reeleição de Dilma, a indefinição do ministro Gilberto Carvalho, que não sabe se fica no Planalto ou se vai para a campanha. E se mostrou especialmente preocupado com a repercussão do processo do TCU sobre a Refinaria de Pasadena na campanha.

A preocupação era tão grande que Adams não fez a defesa oral e articulou com alguns ministros para que um deles, Benjamin Zymler, pedisse vista do processo. Quando José Jorge terminou de ler seu voto, Zymler alegou que a estimativa dos prejuízos precisava ser revista e pediu vista. O relator esclareceu então que seu voto ficaria computado, o que significava que o pedido de vista seria na votação já começada.

Imediatamente, o ministro Weder de Oliveira anunciou que votaria com o relator, alegando que aquela era uma etapa intermediária do processo, que a decisão definitiva só sairá mais adiante, quando fossem ouvidas as partes. Vários ministros, entre eles Ana Arraes, mãe do candidato do PSB Eduardo Campos, deram o voto a favor do relator, que ficou com a maioria.

Foi então que o ministro José Múcio pediu que o assunto fosse logo à votação "já que a presidenta não está colocada", e Zymler retirou o pedido de vista, tendo o relatório sido aprovado por unanimidade. Nos contatos mantidos por emissários do governo com ministros do TCU, houve um momento em que foi jogada na mesa a carta da nomeação para o STF, cargo a que Adams aspira e também o ministro Benjamin Zymler.

Por isso, a decisão de excluir os membros do Conselho Administrativo da Petrobras do rol dos culpados foi tão comemorada pelo Palácio do Planalto. Mas é preciso compreender que esse processo vai por etapas. Neste momento, o relator entendeu que seria mais útil concentrar a investigação e a responsabilização na Diretoria Executiva, que foi quem realmente operou o negócio. Se abrisse muito o leque, alega José Jorge, perderia o foco nas investigações.

Nada impede, porém, que, ao abrir a Tomada de Contas Especial (TCE) e ao ouvir os envolvidos no caso, membros do Conselho de Administração, inclusive a própria presidente da República, sejam convocados a depor e eventualmente incluídos no rol dos culpados.

Dora Kramer: Devagar com o andor

- O Estado de S. Paulo

Se o Tribunal de Contas da União tivesse incluído o Conselho de Administração da Petrobrás entre os responsáveis pelos prejuízos (US$ 792 milhões) causados à empresa com a compra da refinaria de Pasadena, a oposição teria recebido a decisão como um presente.

Faria um tremendo carnaval caso Dilma Rousseff, presidente do conselho à época (2006) em que foi feito o negócio, integrasse a lista da qual acabaram fazendo parte apenas os 11 diretores executivos da estatal.

Levantaria esse estandarte a fim de pregar na testa da presidente candidata à reeleição a marca da suspeita no campo da malversação. Uma sombra que persegue o PT, mas uma pecha que Dilma Rousseff não tem; estaria criada aí a oportunidade aos adversários para abrir nova frente de ataque, ressuscitando o assunto já meio morto nas duas CPIs do Congresso.

Nesse sentido, o líder do PT no Senado, Humberto Costa, tem razão quando diz que a aprovação do relatório do TCU foi uma "ducha de água fria" para a oposição. Mas digamos que a correção de sua análise se encerra por aí. O tom de regozijo não se justifica.

O fato de os oposicionistas não terem um trunfo eleitoral à disposição não elimina o dado de realidade exposto pelo Tribunal de Contas no julgamento ainda não conclusivo, pois haverá uma nova e mais aprofundada fase de investigações até a decisão final.

E o que disse o TCU? Que o negócio considerado "bom" pela diretoria da Petrobrás provocou um prejuízo de US$ 792 milhões - bem superior aos US$ 530 milhões anteriormente admitidos pela atual presidente da estatal, Graça Foster -, e apontou várias irregularidades no processo.

Determinou em princípio o bloqueio dos bens dos diretores da empresa sob o governo de Luiz Inácio da Silva. Portanto, se do ponto de vista do País já não há nada a comemorar, sob o aspecto partidário menos ainda. Afinal de contas, a presidente Dilma pessoalmente está isenta, mas o mesmo já não se pode dizer do PT.

Compreende-se até certo ponto o alívio com que o Palácio do Planalto recebeu a notícia. Seria um prejuízo para a candidatura se houvesse responsabilização da presidente Dilma. Ocorre, porém, que essa questão não pode ser examinada exclusivamente sob o prisma eleitoral, considerando que o escandaloso é o negócio em si.

E a oposição, que tanto acusa o governo de ver as coisas apenas por essa ótica, cometeu o mesmo pecado ao acusar de maneira leviana o TCU de ter cedido a pressões políticas para isentar o Conselho de Administração e, consequentemente, a presidente da República.

Pelo visto, os oposicionistas esperavam que o relator, ministro José Jorge, assumisse papel de político ligado ao DEM, ministro no governo Fernando Henrique Cardoso e vice na chapa do tucano Geraldo Alckmin na eleição de 2006.

O relatório dele foi acatado por unanimidade. Explicou que nessa fase preferiu se concentrar nos operadores diretos do negócio. Razoável, nenhum absurdo. Não faz sentido é falar em acertos porque não há evidências, só suposições.

Tivesse sido diferente, a oposição estaria soltando foguetes e a situação acusando o TCU de usar o órgão para crucificar a presidente.

Em ambientes em que todos os santos são de barro o mais prudente é carregar o andor mais devagar.

Cacife. Aliados da presidente Dilma no Rio de Janeiro demonstram desagrado com os agrados dela ao candidato do PMDB ao governo do Estado, Luiz Fernando Pezão, com quem teria encontro de prefeitos ontem à noite. Reclamam falta de atenção, mas já estão todos seguros no palanque: Lindbergh Farias (PT), Marcelo Crivella (PRB) e Anthony Garotinho (PR).

Enquanto isso, o PMDB soube valorizar o passe: a seção regional bandeou-se para o tucano Aécio Neves, lançou o movimento "Aezão" e tem 1.500 candidatos a deputado, além de prefeitos e vereadores, trabalhando nas ruas.

Eliane Cantanhêde : "Anão diplomático"

- Folha de S. Paulo

Depois de três anos e meio de uma política externa dorminhoca, o Brasil deu um pulo da cama, tomou-se de brios e partiu para cima de Israel.

Em sintonia fina com o Planalto e num mesmo dia, o Itamaraty votou a favor de uma resolução dura contra Israel no Conselho de Direitos Humanos da ONU, soltou uma nota com zero firula, convocou o embaixador brasileiro em Tel Aviv e chamou o embaixador israelense em Brasília para dar um recado mal humorado.

A nota oficial, condena "energicamente o uso desproporcional da força" e foi recebida como uma declaração de guerra diplomática por Israel, que reagiu também de forma surpreendente e ácida, ora criticando a "irrelevância" da diplomacia brasileira, ora chamando o Brasil de "anão diplomático". Planalto e Itamaraty bufaram.

As relações entre Brasil e Israel têm sido pautadas pelo pragmatismo, por exemplo, na área comercial, mas nunca foram de amor. Portanto, o Brasil se fingiu de desentendido na guerra civil síria, assistiu de camarote o desastre político no Egito e, pior, lavou as mãos quando os vorazes russos passaram a devorar nacos da Ucrânia. Mas o país se sentiu à vontade para condenar Israel. E com motivos inquestionáveis.

Mortes são dolorosas em quaisquer circunstâncias, mas mortes de militares em guerras e em situação de tensão são compreensíveis, como são agora as pouco mais de 30 mortes de soldados israelenses. Mas como não ver, não ouvir e não gritar diante de centenas de mortes de civis palestinos (e de onde quer que seja), ainda mais se grande parte delas são de mulheres e crianças? E como não ver, não ouvir e não gritar que caíram mais de 700 de um lado e menos de 5% disso no outro? Crime de guerra?

A posição brasileira, clara e dura, marca uma inflexão da política externa de Dilma, a meses do fim do governo, e confirma que Israel perdeu a guerra da opinião pública internacional e está cada vez mais isolado.

Marta Arretche: Os Estados e a Federação

- Valor Econômico

Os Estados brasileiros perderam espaço na Federação! O diagnóstico não diz respeito apenas à questão fiscal. Nem mesmo ao poder dos governadores na política nacional. Diz respeito ao papel dos Estados nas funções de governo.

O modelo de Federação que adotamos desde 1988 consolidou uma divisão vertical de funções na qual a União executa as políticas de renda - previdência, seguro-desemprego, programa Bolsa Família, valores do salário mínimo - ao passo que os municípios prestam os principais serviços essenciais: saúde básica, educação fundamental, coleta de lixo, infraestrutura urbana, transporte, habitação social. Aos Estados, cabe apoiá-los no exercício destas funções. Mas também são responsáveis pelas políticas que têm apresentado pior desempenho: segurança pública e gestão metropolitana. A União também regula e supervisiona a execução das políticas compartilhadas, além de reduzir desigualdades de gasto pela via dos fundos de participação e das transferências condicionadas.

O eleitor percebe e aprova este arranjo! Financiados pela Fapesp e pelo CNPq, juntamente com Rogério Schlegel e Diogo Ferrari, realizamos no Centro de Estudos da Metrópole um "survey" sobre as percepções de uma amostra nacional representativa, com 2.285 eleitores, sobre a Federação brasileira (em março de 2013, para evitar que a proximidade das campanhas eleitorais afetasse a avaliação dos entrevistados). Pequena amostra dos resultados está nos gráficos abaixo.

Para a esmagadora maioria, o coração da política brasileira é a União: as eleições federais são as mais importantes e é nesta esfera que as decisões mais importantes são tomadas. A política municipal é vista como mais importante que a política estadual: um quinto da amostra considera que as eleições e decisões mais importantes ocorrem no município.

Não há sinais de descontentamento com este arranjo! Um quarto dos entrevistados manteria este arranjo (grupo pró-status quo). Se fosse para mudar algo, cerca de um quinto fortaleceria o governo central ou os municípios. Se examinamos o que o grupo pro-status quo quer manter (quarto disco abaixo), aumenta para 30,6% a parcela dos defensores da União e para 23,8% a preferência pelo municipalismo.

Apenas uma pequena minoria vê os Estados como mais importantes e defende que estes tenham sua autoridade ampliada.

Não é o Nordeste - usual suspeito de apoiar o governo federal - que explica esta ordenação de preferências. Em todas as regiões, a preferência pela "federalização" supera a preferência pelo municipalismo e é pelo menos duas vezes superior àquela favorável ao fortalecimento dos Estados. A única exceção é a região Sul, em que a preferência pelo municipalismo supera o apoio ao fortalecimento da União. Ainda assim, mesmo na região Sul, 24% consideram que a União deve ter seu poder ampliado.

Esta distribuição de preferências está fortemente associada à renda. O apoio à "federalização" é majoritário entre os mais pobres. À medida que aumenta a renda, diminui a preferência pelo fortalecimento da União e aumenta o apoio ao municipalismo.

Estas evidências confirmam parte do que já sabíamos. Das eleições que ocorrerão em poucos meses, as eleições para presidente são as mais importantes. Mas esclarecem algo que não sabíamos. A preferência do eleitor está em desacordo com o prognóstico que considera urgente e necessária uma reforma profunda de nossa Federação. Se nossa pesquisa está certa, reformas nesta direção não contarão com forte apoio no eleitorado, em particular dos mais pobres. Na melhor das hipóteses, estão em linha com as preferências dos eleitores mais ricos.

Quais são as origens desta perda de importância dos Estados? Argumento influente sustenta que tudo começou no Plano Real e nas medidas de estabilização do governo FHC, que privaram os Estados de fontes mais fáceis de receita, como o imposto inflacionário, os bancos estaduais e o endividamento. Mas, se os Estados eram tão poderosos até ali, como foi possível a aprovação destas medidas? Seria o eleitor tão volátil a ponto de abandonar seu apoio a um nível de governo em tão pouco tempo?

Na verdade, os Estados já perderam na Constituição Federal de 1988. Perderam receita para os municípios e autoridade sobre políticas para a União. As políticas da União e dos municípios são muito mais visíveis para o eleitor do que as políticas estaduais. Na história brasileira, desde Getúlio Vargas, é o governo federal que está associado às políticas que melhoraram a vida dos mais pobres. Esta trajetória vem de longe.

Marta Arretche é professora titular do Departamento de Ciência Política na USP, diretora do Centro de Estudos da Metrópole

Washington Novaes: Apesar de fortes avanços, novas rotas indispensáveis

- O Estado de S. Paulo

A Organização das Nações Unidas (ONU), ao mesmo tempo que faz um relatório sobre a realização das metas do Desenvolvimento do Milênio, que seguirão até o ano que vem, já cuida de novos objetivos. E não é pessimista. Acha que a vida de "milhões de pessoas" melhorou com esforços locais, regionais e nacionais, que reduziram a pobreza, levaram 2,3 bilhões de pessoas ao acesso à água de boa qualidade, melhoraram as condições de moradia em favelas e promoveram a igualdade entre sexos na frequência a escolas. Se essa rota prosseguir, diz, o mundo superará também as metas no combate à malária, à tuberculose e à aids, e promoverá maior participação das mulheres na política.

Nos últimos 20 anos, a probabilidade de uma criança morrer antes dos 5 anos caiu pela metade, o que significa 17 mil menos mortes por dia, com a taxa de mortalidade materna também baixando 45% entre 1990 e 2013. Os tratamentos para aids salvaram 6,6 milhões de vidas desde 1995, 3,3 milhões de mortes por malária foram evitadas, a luta contra a tuberculose poupou 22 milhões de vidas, um quarto da população mundial passou a dispor de instalações sanitárias em sua casa - mas 1 bilhão ainda "defeca ao ar livre".

A ONU, entretanto, volta a advertir que a concentração de pessoas nas áreas urbanas do mundo já está em 54% do total e chegará a 66% - mais 2,5 bilhões - em 2050, principalmente na Índia (mais 404 milhões), na China (292 milhões) e na Nigéria. O mundo passará das 10 megacidades (mais de 10 milhões de pessoas cada) que existem hoje para 28, com o total de 453 milhões. Entre elas, São Paulo, com 12,24 milhões.

Como se fará para administrar os grandes espaços urbanos? Hoje, a maior dificuldade de um administrador público nas áreas urbanas está na necessidade de trabalhar simultaneamente em dois planos: 1) Como atender às necessidades imediatas das populações em áreas como transporte, habitação, mobilidade e manutenção da qualidade de vida; e 2) como fazê-lo sem perder a perspectiva mais ampla de readequar a ocupação do espaço urbano, reconformá-lo à necessidade de reverter a insustentável aglomeração, que já é uma das preocupações maiores da ONU, por exemplo.

Os esforços terão de ser gigantescos. Para ficar num exemplo, a Europa terá de investir US$ 1 trilhão em energias renováveis, até 2030, para reduzir suas emissões de gases poluentes na geração de energia de 1,3 bilhão de toneladas anuais para 564 milhões de toneladas. Se não o fizer, as mudanças climáticas que já afetam duramente o continente serão muito mais graves ainda - diz o relatório Bloomberg New Energy Finance (14/7). O esforço maior terá de ser nas áreas de energias solar e eólica.

Até 2030, dizem os estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a tendência no Brasil será de um "acelerado envelhecimento da população", que estará no total em 208 milhões de pessoas. A população idosa, com mais de 60 anos, já em 23 milhões em 2011, poderá significar uma porcentagem ainda maior desse segmento. Em São Paulo são hoje 13,18% da população com mais de 60 anos, que serão 20,1% em 2030 - ante 13,18% de jovens até 15 anos, segundo o Sistema Estadual de Análise (Estado, 23/1). Também poderão crescer os índices de jovens que não trabalham nem estudam e dos que só estudam. Tudo nisso exigirá novas políticas específicas.

Artigo do sociólogo José de Souza Martins, neste jornal (6/7), chama a atenção para que a tendência ou intenção de apenas "deslocar pobres para o meio de ricos ou vice-versa", como colocam como objetivo maior tantos planos para as grandes cidades, pode "apenas desdobrar a ideologia oficial do processo social aparente". Com a impressão de resolver problemas, mas sem conseguir. Porque "os beneficiados pelas habitações sociais em enclaves de classes sociais mais altas serão assediados por compradores que não resistirão à tentação de comprar apartamentos baratos em bairros ricos, no espaço de outra classe". Ou seja, cuidar-se-ia apenas da "moldura do quadro, e não do quadro".

Grande parte das visões urbanísticas de hoje formula propostas que parecem alheias a transformações importantes - como, por exemplo, a tendência de boa parte da população a renunciar a compras in loco em shopping centers e migrar para compras via internet, que alguns estudos dizem já estar na casa dos 9% do total. Outros estudos (Estado, 2/7) chamam a atenção para a realidade dos Estados Unidos, onde é progressivo "o desinteresse" por shopping centers, a ponto de já em 2007 nenhum empreendimento desse tipo haver sido aberto.

E como se fará para contornar as lógicas apenas financeiras - empresariais e até pessoais - que parecem tudo comandar? Estudo de 2011, de S. Vitali, J. Glattfelder e S. Battiston (New Scientist, 22/10/2011), citado por Ladislau Dowbor, identificou 1.318 corporações num universo de 43.060 grandes empresas transnacionais, escolhidas entre 37 milhões. Esse núcleo, que concentra, segundo os autores, 20% das receitas globais de vendas, "detém um controle sobre a economia real que atinge 60% de todas as vendas realizadas no mundo todo". Daí decorre uma lógica que acaba prevalecendo em toda parte, embora a concentração de poder "em si não seja boa nem ruim - mas essa interconexão pode ser", ao final. "Na verdade, 1% das companhias controla 40% da rede inteira", afirmam eles. E "a maioria são bancos".

Não se trata de lógicas ou ações fora da lei. Mas certamente essas lógicas terão de ser confrontadas com horizontes que a ONU aponta em suas metas do Desenvolvimento do Milênio. E confrontadas com as estratégias indispensáveis para enfrentar os gigantescos problemas da progressiva concentração urbana. Se não formos por aí, a vida nos grandes aglomerados será cada vez menos suportável - mas sem rotas de saída.

Washington Novaes é jornalista

Eduardo Giannetti: Trabalho alienado

- Folha de S. Paulo

Fernando Pessoa ganhou a vida como tradutor de cartas comerciais; T. S. Eliot como bancário. John Stuart Mill dava expediente na East India Company, e Charles Peirce, no instituto de geografia americano. Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade foram servidores públicos exemplares.

O que é trabalho? O exemplo desses criadores --entre tantos que poderiam ser lembrados-- é sugestivo. Embora premidos a trabalhar para pagar as contas no fim do mês, eles souberam encontrar no seu trabalho fora do emprego --independente de paga e, em alguns casos, até do apreço dos contemporâneos-- uma razão de viver.

Isso permite distinguir duas concepções discrepantes: o trabalho como ganha-pão, exercido sob a pressão da necessidade, e o trabalho como vocação, ou seja, como uma atividade voluntária, não necessariamente remunerada, por meio da qual se busca dar vazão ao impulso criador e alcançar um sentido de realização pessoal.

O ideal de um mundo liberto do trabalho imposto de fora, como obrigação alheia à livre escolha individual, tem uma longa história. A formulação clássica é devida a Marx.

Na sociedade comunista, afiançava ele na "Crítica ao Programa de Gotha" de 1875, "quando tiver desaparecido a subordinação escravizadora dos indivíduos à divisão do trabalho", o trabalho deixará de ser "apenas um meio de vida para tornar-se, ele próprio, a primeira necessidade vital".

O comunismo, sabemos, não honrou a promessa. Ao contrário, levou a alienação do trabalho a novos píncaros, como no conhecido lamento do funcionário soviético --"nós fingimos que trabalhamos e eles fingem que nos pagam". Nada disso, porém, diminui o problema ou faz dele uma prerrogativa do marxismo.

Como já alertava Mill em 1848: "Trabalhar pelo preço oferecido por outro e para o lucro deste, sem interesse algum pelo trabalho --sendo o preço do trabalho ajustado pela competição hostil, com um lado pedindo o mais possível e o outro pagando o menos que puder-- não é, mesmo quando os salários são elevados, um estado satisfatório para seres humanos que deixaram de julgar-se inferiores àqueles a quem servem".

O espantoso é que, não obstante o furioso aumento da produtividade desde o século 19 --o que poderia, em tese, reduzir a necessidade do trabalho alienado--, estamos hoje ainda mais distantes do ideal projetado pelos economistas clássicos do que quando eles o formularam.

A escalada do consumo atropelou o valor da autonomia na vida prática e engoliu o sonho do trabalho como esfera de autorrealização humana. O ter --e não o fazer-- nos define. Não é à toa que o sentimento do vazio, em meio à toda tecnologia e abundância ocidentais, só faz crescer.