terça-feira, 3 de novembro de 2015

Opinião do dia – Fernando Henrique Cardoso

A saída da crise requer a formação de uma nova conjuntura na qual seja possível pôr na ordem do dia os cinco ou seis pontos fundamentais ao redor dos quais se forme um novo consenso nacional. Não se trata de aliança entre partidos, grupelhos e setores da sociedade. Trata-se de dar novo rumo ao País na busca de melhor sociedade futura. Não precisamos de salvacionismos, mas da elaboração de ideias que se possam substantivar em políticas que atendam ao interesse nacional e aos anseios populares.

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Fernando Henrique Cardoso é sociólogo, foi presidente da República. “Por uma agenda nacional”, O Estado de S. Paulo, 1 de novembro de 2015

‘O PT não vai acabar, mas deve mudar’, diz Luiz Werneck Vianna

Entrevista.

• Sociólogo avalia como "preocupante" citações a Lula em investigações da PF, mas vê força no PT para superar dificuldades

Por Alexandra Martins – O Estado de S. Paulo

Com mais de 50 anos de experiência, o sociólogo Luiz Werneck Vianna, professor da PUC-RJ, atua principalmente nas áreas de judicialização da política, relações entre os Poderes e, mais recentemente, nas gestões do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nesta entrevista ao Estado, durante o 39.º Encontro Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), Vianna avalia como “preocupante” o fato de Lula e dois filhos dele serem citados em investigações da Polícia Federal e diz que “já passou da hora de o PT fazer uma autocrítica”. Ele acredita, no entanto, que o partido não deve acabar, mas “deve mudar”.

Como o sr. avalia a crise envolvendo Lula e o PT?

Essa vizinhança das investigações com relação ao ex-presidente (Luiz Inácio Lula da Silva) é algo muito preocupante. Ele é uma das maiores lideranças políticas do Brasil contemporâneo, criou um partido que é uma presença ainda relevante na nossa história política. Em algum momento esse partido, que tinha uma trajetória feliz, falhou pensando na ampliação da sua projeção. Com isso, trouxe também uma carga negativa, o patrimonialismo (a falta de distinção entre patrimônio público e privado). Essa (investigação) é uma questão política, certamente, embora agora esteja sendo tratada como fato policial. Espero que o ex-presidente tenha um tratamento justo do ponto de vista policial. 

Do ponto de vista político, no entanto, é inevitável constatar que isso chegou a seu sistema nervoso central (do PT), sua liderança maior partidária. Que sua defesa seja feita fora dos trâmites policiais e passe a ser feita no fórum da política. O PT passou da hora de fazer uma autocrítica. A esta altura, as lideranças mais pesadas não ignoram os elementos de erro que se introduziram. O PT não vai acabar, aliás, não deve acabar, mas deve mudar.

Qual o papel do Lula nessa mudança do PT?

(Ele) Tem que se defender bem e definir uma linha de ação onde as mudanças fiquem muito presentes no horizonte. Não podem ser palavras ao vento.

As eleições municipais de 2016 devem ser um teste da força do PT. O sr. acredita que o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, possa deixar o PT e disputar a reeleição por outro partido?

Ele entra fraco na disputa, sem dúvida. Qualquer um que seja do PT, entra fraco. Para ele, politicamente, é interessante sair sim, mas, por razões ético-morais, ele fica. Politicamente nada o agarraria. O futuro dele está fora do PT, mas pode ser que ele - que tem feito uma boa administração, relativamente bem aceita pela cidade - fique lá por esses motivos.

Interessa à senadora Marta Suplicy (PMDB) que Haddad fique no PT?

Ela seria a primeira beneficiária. Já é. Acho que ela só pode ser deslocada caso o Haddad vá para a Rede (Sustentabilidade, da ex-ministra Marina Silva).

Como o PSDB se posiciona nessa disputa municipal?

O governador Geraldo Alckmin (PSDB) está olhando sobretudo para 2018, em sua eleição presidencial. Ele só não pode perder de vista o seu mundo local, a sua aldeia, onde ele não pode errar muito. Ele só vai se posicionar sobre as eleições municipais de 2016 depois que o Haddad se decidir onde ficar. Se ele ficar no PT, o cálculo dele é um, se o Haddad aceitar a solução da Rede, o cálculo passa a ser outro.

O sr. vê algum sinal de melhora para o PT no cenário até as próximas eleições?

A economia pode melhorar, soprando a favor do governo. Esse é um ponto, pois pode melhorar sim. Se há melhora na economia, o mundo do trabalho olha com jeito mais favorável para o governo.

Analistas econômicos acham difícil uma melhora a curto prazo. O sr. acredita então que há exagero nessa avaliação?

Você vê e lê de tudo aí, não é uma ciência exata. Quando eles estão falando em economia, a linguagem deles está mais orientada para um mundo das expectativas do que para o mundo das coisas efetivamente reais. O que está valendo é a narrativa. A economia real, as coisas sólidas estão andando.

Como o sr. vê informações de que Lula e seu grupo gostariam da troca do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo?

Aí ele (Lula) está cometendo um equívoco de personalizar as vicissitudes dele mesmo nesse ministro. Mesmo que o Cardozo quisesse, ele não teria como mudar o curso de nenhuma investigação porque essas agências - como a Polícia Federal e o Ministério Público Federal - não vão voltar atrás. Podem até entender uma tentativa de freá-las como sinal para aprofundar mais nas investigações. A Operação Lava Jato vai se diversificando e duvido que agora essa orientação que eles tomaram em direção ao Palácio do Planalto mude de direção.

O sr. acredita que o governo deveria lançar um ‘bote salva-vidas’ ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), fazendo um acordo com ele para salvar seu mandato e evitar que avancem no Congresso pedidos de impeachment de Dilma?

Que bote é esse? Qual poderia ser? Só se o Cardozo tivesse condições de parar (a investigação), mas ele não tem. E além do mais, o procurador-geral da República(Rodrigo Janot) está com gosto de sangue na boca, ele não vai retroceder (em relação à investigação envolvendo o presidente da Câmara). E o Cunha sabe disso.

O sr. acredita que Cunha pode usar o impeachment para ganhar força política?

O Cunha vai tentar não cair e só. Dilma não está sozinha, já Cunha não tem nada. Ele tem (apenas) seus correligionários, seus neopentecostais. Mas ele não está inerme (sem armas) para quem quiser derrubá-lo, e ele pode apertar o botão (e dar início ao processo de impeachment).

Então o sr. avalia que o impeachment pode ocorrer de fato?

É um risco imenso, pode ser que ele venha. O PT tem seus apoios na sociedade, inclusive de setores organizados dos trabalhadores subalternos da sociedade. Getúlio (Vargas), em 1954, quando se mata, vivia um isolamento político quanto às elites e aos trabalhadores. No dia em que ele se mata, a manchete do jornal Novos Rumos, do Partido Comunista, era pela derrubada de Getúlio. Na madrugada, quando se soube do suicídio, esses jornais foram recolhidos da banca pelos próprios editores porque o suicídio tinha mudado a onda negativa, consensualmente negativa. Mas não é a Dilma que tem isso, é o PT, é o Lula.

Isso quer dizer que a onda negativa poderia ser revertida se houver impeachment?

Essa onda negativa pode virar positiva sim.

PT usa eleição para plano de ‘reconstrução’

• Partido retoma estratégia dos anos 1980 e pretende lançar maior número possível de candidatos em 2016 para defender sua imagem

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

Sem poder contar com financiamentos empresariais e em meio à maior crise de imagem de sua história, o PT decidiu adotar nas eleições municipais do ano que vem uma estratégia semelhante à que era usada nos anos 1980, nas origens do partido. A ideia é lançar o maior número possível de candidatos a prefeito, mesmo com poucas chances de vitória, para ocupar os espaços no debate político, principalmente no rádio e na TV, para fazer a defesa do partido.

Se nos anos 1980 as candidaturas foram usadas na estratégia de construção do PT e difusão de suas bandeiras, agora fazem parte do esforço de reconstrução da sigla, abalada por intermináveis denúncias de corrupção envolvendo seus principais líderes e pelas crises econômica e política que marcam o segundo mandato da presidente Dilma Rousseff.

Em documentos oficiais, o PT ainda fala em “manter a trajetória de crescimento”, mas em conversas reservadas integrantes do partido admitem que, em função da crise, a legenda deve, pela primeira vez em sua história, sair de uma eleição municipal menor do que entrou.

“As eleições não são um fim em si mesmo”, diz a resolução eleitoral aprovada quinta-feira pelo Diretório Nacional do PT. O documento marca o início formal do debate eleitoral e define a estratégia para 2016.

“Vamos ter como centro do debate a defesa do PT. Isso vai nos levar a um número grande de candidaturas para que os espaços políticos sejam ocupados, principalmente onde há rádio e TV”, disse o presidente do PT, Rui Falcão. Segundo ele, a ideia é lançar o “maior número possível” de candidatos desde que não atropelem alianças já consolidadas com partidos da base. O foco principal é a eleição geral de 2018.

A estratégia vai no sentido contrário à adotada nos últimos pleitos, quando o PT adotou uma postura mais pragmática, privilegiando as cidades onde o partido tinha chances reais de vitória e, nas demais, fez coligações com aliados.

Anti-petismo. Alguns pré-candidatos já reclamam da orientação. Muitos deles querem esconder o PT e Dilma e focar suas campanhas nas questões locais para se preservar do desgaste do governo e da rejeição ao partido.

O anti-petismo já é visto como um dos maiores entraves para os candidatos do partido em 2016. Por isso, vários prefeitos estão deixando a legenda para concorrer por outras siglas. Dos 632 prefeitos eleitos pelo PT em 2012, 69 saíram. Isso levou o próprio Lula a abordar o assunto na quinta-feira. “Quem quiser sair que saia. Este partido tem porta de entrada e porta de saída”.

Outra semelhança da estratégia traçada para 2016 em relação aos primórdios do petismo é a falta de dinheiro. O partido aboliu as contribuições empresariais em suas campanhas. “Nada melhor do que usar o verbo e gastar muita sola de sapato”, disse Falcão em comunicado à militância petista.

Neste cenário, a reeleição de Fernando Haddad em São Paulo ganhou ainda mais importância. “Se ganharmos São Paulo ganhamos a eleição”, disse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em reunião do Conselho Político do PT, em setembro.

O prefeito enfrenta os piores índices de popularidade desde sua eleição e já consultou aliados sobre a possibilidade de deixar o partido. Segundo o presidente do PT paulistano, Paulo Fiorilo, a nova estratégia vai exigir esforço. “Aquela militância dos anos 80 ficou muito distante do PT”, admitiu.

“Mas por outro lado o PT, com seus 37 diretórios zonais, tem mais capilaridade para fazer o diálogo com a população, algo necessário em uma campanha com pouco dinheiro”, completou.

O PT também ainda não sabe o que fazer com Dilma. “Ainda não discutimos isso. Temos que saber se ainda vem algum recurso federal, com o que podemos contar”, disse Fiorilo.

Amigo de Dirceu que se tornou delator na Lava-Jato deixa prisão

• Fernando Moura admitiu ter recebido propina de R$ 2,3 milhões

Jaqueline Falcão e Cleide Carvalho - O Globo

-SÃO PAULO- O lobista Fernando Antônio Hourneaux de Moura, amigo do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, preso na 17ª fase da Operação Lava-Jato, foi solto ontem de manhã, após passar três meses na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba. Preso em agosto, ele assinou acordo de delação premiada um mês depois.

Denunciado por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa, por ter se associado ao ex-ministro para obter vantagens ilícitas em contratos da Petrobras, Moura cumprirá prisão domiciliar por três anos no mesmo condomínio Santa Fé onde morava Dirceu, em Vinhedo (SP).

Moura admitiu ter recebido R$ 2,3 milhões em propina até 2013. Em depoimento, disse ter atuado com o então secretáriogeral do PT, Silvio Pereira, em 2002, para selecionar os nomes que assumiriam os 32 mil cargos comissionados no governo federal no primeiro mandato do ex-presidente Lula. Por indicação de um dos sócios da empreiteira Etesco, emplacou Renato Duque na Diretoria de Serviços da Petrobras.

Com Duque no cargo, a empreiteira foi beneficiada com contratos. Foi Moura também quem aproximou da Petrobras as empresas Hope e Personal, que seguem investigadas na Lava-Jato. A Hope fechou R$ 3,5 bilhões em contratos com a Petrobras entre 2007 e 2014. A Personal, R$ 2,2 bihões.

Moura afirmou que a Etesco pagava 3% de propina sobre o valor dos contratos, dos quais dois terços eram destinados para o diretório regional do PT. Ele contou ter viajado com Sílvio Pereira para levar dinheiro a diretórios do PT no Rio, Vitória e Fortaleza nas campanhas municipais de 2004.

Quando Pereira foi flagrado no escândalo do mensalão, por ter recebido uma Land Rover da empresa GDK, o lobista procurou Dirceu e disse ter sido orientado a deixar o país “até a poeira baixar”. Em 2006, passou a viver em Miami e a receber “mesada” de R$ 100 mil mensais. Comprou um apartamento na Avenida Collins, em Miami Beach, e um automóvel Aston Martin.

A Polícia Federal estimou que Dirceu recebeu cerca de R$ 19 milhões em propinas (o ex-ministro nega) e que Moura ficou com R$ 5,9 milhões. Moura admitiu ter recebido menos da metade desse valor. Pelo acordo, 20% de seus bens no exterior serão confiscados, e ele pagará multa equivalente a 80% de seus bens fora do Brasil — a relação de bens não foi divulgada.

MP português apura suposta propina a petistas

• Segundo o jornal ‘Público’, escritório associado a Dirceu foi intermediário

- O Globo

-SÃO PAULO- O ex-ministro da Casa Civil José Dirceu completa hoje três meses de prisão na Operação Lava-Jato com um motivo a mais para se preocupar. Segundo reportagem publicada ontem no jornal português “Público”, a Procuradoria-Geral da República de Portugal investiga se a associação entre a Oi e a Portugal Telecom, em 2010, rendeu comissões a integrantes do PT no Brasil. Segundo o jornal, a exigência teria sido de 50 milhões de euros, com depósito a ser feito em Macau. O pagamento de comissão teria sido feito por acionistas da Oi, encabeçados pela Andrade Gutierrez, por movimentações via Angola ou Venezuela.

Em janeiro deste ano, a sede da Portugal Telecom, em Lisboa, foi alvo de operação policial. O jornal afirma que o negócio foi intermediado pelo escritório Fernando Lima, João Abrantes Serra e José Pedro Fernandes (LSF & Associados), ligado a Dirceu. Segundo a reportagem, o escritório recebeu pagamentos da Portugal Telecom de 50 mil euros mensais. Teria recebido 200 mil euros até os pagamentos serem suspensos por decisão interna. O jornal informa que o escritório confirmou ter atuado na negociação entre a Portugal Telecom e a Oi. O advogado de José Dirceu, Roberto Podval, disse que as investigações em Portugal são sigilosas e que não tem informações sobre o assunto.

Integrantes da força-tarefa da Lava-Jato confirmam que as informações sobre a Operação Marquês, que levou à prisão o ex-primeiro ministro português José Sócrates, amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e outras derivadas dela, como a do Banco Espírito Santo e Portugal Telecom, estão sendo compartilhadas com o Brasil, que também colabora, como contrapartida.

— Há parceria e troca de informações com Portugal — afirmou a fonte.

Em nota, a Andrade Gutierrez informou que não fará mais pronunciamentos “para garantir que não haja qualquer prejuízo à defesa de seus colaboradores e ex-colaboradores”. Executivos da empresa são réus na Lava-Jato.

MP e PF abrem seis frentes de investigação contra Lula

Por André Guilherme Vieira – Valor Econômico

SÃO PAULO - O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal (PF) estão fechando o cerco ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em ao menos seis frentes de apuração criminal. Documentos anexados a estas investigações mostram o avanço sobre negócios ligados direta ou indiretamente ao petista.

Uma dessas apurações é o Procedimento Investigatório Criminal (PIC) aberto no Distrito Federal, sobre suposto tráfico de influência internacional em favor da Odebrecht.

A Operação Zelotes investiga pagamentos recebidos por Luís Claudio, filho do ex-presidente, e a suspeita de que seu ex-chefe de Gabinete, Gilberto Carvalho, posteriormente ministro da Secretaria-Geral da Presidência na gestão Dilma, tenha supostamente atuado para tráfico de influência e corrupção com empresas do setor automotivo.

Já existe na Lava-Jato a suspeita de que o navio-sonda da Petrobras Vitoria 10000 supostamente teria sido entregue para operação da Schahin - sem licitação - por intermediação do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula. Como contrapartida, o banco Schahin supostamente quitaria dívida de R$ 60 milhões da campanha de Lula de 2006. O empresário supostamente teria solicitado R$ 2 milhões ao lobista Fernando "Baiano" Soares destinados a uma nora de Lula. Bumlai nega.

A Lava-Jato ainda examina os pagamentos de empresas investigadas à LILS, constituída por Lula para receber por suas palestras, e ao Instituto Lula, entidade mantida pelo ex-presidente "para o desenvolvimento nacional e a redução de desigualdades" e dirigida por Paulo Okamotto, ex-presidente do Sebrae.

São centenas de quebras de sigilo, além de laudos que discorrem sobre informações obtidas durante ações de busca e apreensão em endereços de pessoas e empresas investigadas.

O Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Ministério da Fazenda identificou movimentações de cerca de R$ 300 milhões consideradas atípicas, segundo reportagem da revista "Época". O órgão analisou transações bancárias de Lula e dos ex-ministros Antônio Palocci (Fazenda), Erenice Guerra (Casa Civil) e Fernando Pimentel (Desenvolvimento), diz a revista.

Na Zelotes os investigadores já chegaram à "antessala" de Lula", como descrito no relatório de análise de atividades de lobistas e empresas com acesso direto ao então chefe de gabinete Gilberto Carvalho, homem de confiança de Lula. O ex-ministro é descrito como parte de um "conluio" para atender a demandas de empresas automotivas, interessadas em isenção fiscal para o setor, diz a PF.

Os investigadores também suspeitam que empresa de Luís Cláudio, filho de Lula, possa ter recebido supostamente R$ 1,5 milhão em recursos cuja licitude é colocada em xeque pela Zelotes. Luís Cláudio foi intimado a prestar esclarecimentos à PF esta semana. Suspeita-se que os valores foram pagos à LFT pela Marcondes e Mautoni, consultoria apontada como o cerne de suposto esquema de corrupção para que o então presidente sancionasse medidas provisórias com isenções tributárias.

Apesar de Lula não ser oficialmente investigado na Lava-Jato, sua empresa, a LILS, e o Instituto Lula, estão sob investigação por pagamentos recebidos de empreiteiras acusadas pelo MPF de integrar cartel em licitações bilionárias da Petrobras. Foram R$ 3 milhões recebidos da Camargo Corrêa pelo Instituto Lula, a título de "contribuições e doações" e "bônus eleitoral", entre 2011 e 2013. Além de R$ 1,5 milhão pago pela empreiteira à LILS, afirma a PF. Apesar de a documentação apreendida na contabilidade da Camargo registrar a saída dos valores com a finalidade de doação e bônus eleitoral, a empreiteira e o Instituto Lula alegam que as contribuições se referem a apoio institucional e patrocínio de palestras feitas por Lula no exterior.

Em 15 de outubro, Lula prestou depoimento espontâneo - e reservado - ao MPF do Distrito Federal, dando a sua versão dos fatos. A suspeita é de que ele supostamente teria praticado tráfico de influência internacional em favor da Odebrecht. A empreiteira, descrita pela Lava-Jato como à frente de suposto cartel na Petrobras, pagou cerca de R$ 4 milhões a Lula por 10 palestras. O Tribunal de Contas da União (TCU) questiona a regularidade do crédito de quase US$ 750 milhões concedido pelo banco de fomento à Odebrecht. (Colaborou Letícia Casado, de Brasília)

Judiciário tomou para si o papel da redenção moral, diz Werneck Vianna

Por Cristiane Agostine – Valor Econômico

CAXAMBU (MG) - O Judiciário tomou para si o papel de redenção moral do país. Os responsáveis por investigações recentes de casos de corrupção, como a Operação Lava-Jato, assumiram um discurso de "saneamento ético" e é preciso que haja um "auto-limite" para evitar que o papel desse Poder seja colocado em xeque. A análise é do sociólogo Luiz Werneck Vianna, professor-pesquisador da PUC-Rio.

Para Werneck Vianna, ao mesmo tempo em que é positivo o fato de o Judiciário mostrar-se independente de pressões e "controles espúrios", é necessário que os representantes desse Poder evitem a "arrogância institucional" e fujam, sobretudo, "do papel messiânico de salvar o país".

"O Judiciário tomou para si o papel da redenção moral", afirmou o sociólogo, durante uma mesa redonda sobre a crise e a judicialização no sistema político brasileiro, no 39º encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (Anpocs), em Caxambu (MG), na semana passada. Em entrevista ao Valor, Werneck Vianna diz que "isso está presente na retórica dos juízes envolvidos na Lava-Jato", por exemplo. "Eles não acham que estão enfrentando apenas um caso técnico. Acham que estão envolvidos numa missão de saneamento ético-moral do país, assim como ocorreu com a Operação Mãos Limpas, na Itália", afirma.

Para o sociólogo, se não houver uma "auto-contenção" do próprio Judiciário, há riscos de "perder tudo", com possíveis contestações sobre as investigações e punições determinadas pelos juízes nos casos recentes de corrupção.

A "judicialização da política" e o fortalecimento do Judiciário são um "fenômeno mundial", analisa o sociólogo. Na história brasileira, esse Poder se fortaleceu nos últimos anos ao tomar decisões no lugar do Legislativo, como o reconhecimento da união homoafetiva e a proibição do financiamento empresarial de campanha, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). "O crescimento, nessa escala, do Judiciário deve-se em boa parte ao fato de as instituições republicanas terem se enfraquecido. À medida que o Legislativo deixou esse vácuo, o Judiciário ocupou", diz Werneck Vianna, lembrando, em seguida, que o próprio Legislativo passou a recorrer ao Judiciário para recorrer a questões internas do Congresso.

Em caso recente, o Executivo recorreu ao Supremo para questionar o rito a ser seguido pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), em um eventual processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. "Os outros Poderes estão legitimando essa presença assustadora do Judiciário na vida do país", diz o sociólogo.

Mesmo com o enfraquecimento do Executivo com a crise política, Werneck Vianna evita projetar os cenários mais pessimistas tanto para o governo Dilma quanto para o PT. A pressão pelo impeachment se arrefeceu neste momento, com a resistência de parte do PSDB em apoiar o afastamento da presidente, e ainda não foram criadas condições políticas para o "day-after" de uma eventual queda de Dilma. O PT, com integrantes investigados na Operação Lava-Jato, tende a perder força e espaço nas prefeituras nas eleições de 2016, mas não será aniquilado. "Partidos são instituições longevas, difíceis de morrer", diz.

No entanto, o sociólogo critica o PT por aderir a "práticas patrimonialistas" e por ter se envolvido em graves escândalos de corrupção, como o mensalão e o "petrolão" em busca de um novo mandato na Presidência a qualquer preço. Ao contrário das previsões que fez em 2012, quando analisou que o mensalão poderia servir para o PT se modernizar, Werneck Vianna diz que os desvios de recursos na Petrobras são ainda mais letais do que o escândalo de dez anos atrás e mostraram que o partido da presidente Dilma se perdeu na "volúpia" por manter-se no poder.

Os escândalos de corrupção, com os desvios éticos, diz, afetam o futuro da esquerda no país e são um risco até mesmo para a democracia brasileira. "É muita denúncia. É perigoso para a democracia brasileira. As instituições são fortes, mas não invencíveis. Se forem muito pressionadas podem ruir", diz.

A repórter viajou a convite da Anpocs

Câmara inicia processo contra Cunha

O processo que poderá levar à cassação do mandato do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), será aberto hoje no Conselho de Ética da Casa em clima de confronto. Aliados do peemedebista pretendem rejeitar a admissibilidade da acusação, segundo a qual ele quebrou o decoro ao dizer na CPI da Petrobras que não possuía contas no exterior. Opositores de Cunha prometem recorrer ao plenário da Câmara, caso o Conselho de Ética não dê prosseguimento ao caso.

Contagem regressiva

• Conselho de Ética da Câmara instaura hoje processo que pode levar à cassação de Cunha

Eduardo Bresciani e Evandro Éboli - O Globo

-BRASÍLIA- O Conselho de Ética da Câmara dos Deputados instaura hoje processo disciplinar que pode levar à cassação do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Enquanto aliados de Cunha trabalham para arquivar o processo na fase preliminar, adversários já preparam estratégia para levar o debate ao plenário da Câmara caso isso ocorra. Na reunião marcada para esta tarde, será feito um sorteio de três integrantes do Conselho. O presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PSD-BA), escolherá posteriormente um deles para relatar o caso. O escolhido vai apresentar um parecer preliminar para que o Conselho decida se há motivos para investigar o presidente da Casa por quebra de decoro.
A representação do PSOL e da Rede contra Cunha aponta que ele mentiu a seus pares ao negar, na CPI da Petrobras, ter contas no exterior. O Supremo Tribunal Federal (STF) abriu um inquérito no mês passado, a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), para apurar crimes de lavagem de dinheiro e corrupção com base em documentação do Ministério Público da Suíça apontando Cunha e sua mulher, Cláudia Cruz, como beneficiários de quatro contas no banco Julius Baer. Contas que teriam sido abastecidas com recursos desviados de contrato com a Petrobras. Além disso, o presidente da Câmara já foi denunciado pela PGR por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo recebimento de propina relativa à contratação de navios-sonda pela estatal.

Os aliados de Cunha, porém, trabalham para encerrar o processo no Conselho ainda na fase preliminar. O parecer apresentado nesta primeira fase vai avaliar se a representação deve ou não ser admitida. Somente se a maioria do Conselho entender que o processo deve seguir adiante é que começarão os depoimentos e demais diligências para coleta de provas. Os opositores de Cunha já falam em recorrer ao plenário da Câmara, caso o Conselho aprove um parecer preliminar pelo arquivamento. O Código de Ética prevê que, para ser levado ao plenário, é necessário que esse recurso tenha o apoio de um décimo dos 513 deputados (51 assinaturas). No plenário, essa votação, se ocorrer, será simbólica, com os favoráveis ou contra Cunha levantando as mãos. Se um dos partidos pedir verificação, aí a votação será nominal, com cada parlamentar se manifestando no painel eletrônico.

O próprio presidente do colegiado disse que assinará o eventual recurso. Como não há previsão de que Cunha se defenda oficialmente nesta fase, ele argumenta que o Conselho não pode encerrar o processo sem ouvir o presidente da Casa:

— Se for rejeitada a admissibilidade, eu assinarei o recurso. Tem que dar a oportunidade ao representado de se defender e provar sua inocência — afirmou Araújo.

Titular no Conselho, Júlio Delgado (PSB-MG) também diz que assinará um eventual pedido de recurso. O deputado do PSB antecipou ao GLOBO que, antes da reunião de hoje, irá se declarar impedido de ser o relator. O próprio presidente já tinha defendido a exclusão de Delgado por ele ter enfrentado Cunha na disputa contra a presidência da Câmara. Mas continuará titular e vai votar no caso.

— Sabendo que uma eventual escolha do meu nome pode levar o presidente Cunha a requerer meu impedimento e protelar ainda mais o processo, vou requerer meu afastamento — disse Delgado.

Apesar de o Código de Ética não prever a apresentação de defesa já nesta fase, o presidente da Câmara afirma que irá se pronunciar.

— Depois de notificado verei o que fazer. E irei me manifestar, sim. Antes do preliminar — afirmou Cunha ao GLOBO, por mensagem de texto.

Presidente do Conselho, José Carlos Araújo afirma que não há previsão de qualquer defesa nesta primeira fase. O Código de Ética prevê que, somente se o processo for adiante, haverá a notificação de Cunha. Araújo disse que deve nomear o relator do caso amanhã.

— Teremos o sorteio e preciso ter pelo menos 24 horas para conversar, para saber qual a disposição deles — afirmou.

O deputado Silvio Costa (PSC-PE), um dos parlamentares mais críticos a Cunha, acha que não há risco de ser rejeitada a admissibilidade, mas diz que, caso isso ocorra, vai liderar o recolhimento de apoios para levar o caso ao plenário:

— Claro que vou recorrer. E não faltarão deputados para assinar. Mas acho que esse risco não se corre de jeito nenhum.


Conselho de Ética facilita escolha de relator pró-Cunha

• Decisão de órgão da Câmara amplia chance de sorteio para a relatoria favorecer políticos ligados ao presidente da Casa

Daniel Carvalho, Bernardo Caram, Isadora Peron e IsabelA Bonfim – O Estado de S. Paulo

Uma decisão do Conselho de Ética ampliou as possibilidades de aliados de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) ocuparem a relatoria do processo por quebra de decoro parlamentar que pode culminar com a cassação do mandato do presidente da Câmara. O processo no colegiado será instaurado nesta terça-feira, 3.

O peemedebista é acusado de ter mentido à CPI da Petrobrás ao negar que possuía contas no exterior. Posteriormente, a pedido da Procuradoria-Geral da República, um inquérito foi aberto no Supremo Tribunal Federal para apurar se recursos atribuídos a Cunha na Suíça foram abastecidos com propina do esquema de corrupção da Petrobrás investigado na Operação Lava Jato.

O presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PSD-BA), decidiu adotar a formação atual de blocos partidários para a organização do sorteio que dará origem a uma lista de três nomes de onde será escolhido o relator do processo.

Pelo Código de Ética da Casa, não podem assumir a relatoria deputados do Estado, do partido e do bloco partidário do representado, no caso, Cunha. Ou seja, ficam de fora do sorteio parlamentares do Rio de Janeiro, do PMDB e do bloco do qual a legenda faz parte. Há algumas semanas, havia dúvida sobre qual bloco deveria ser levado em consideração, se aquele formado para a eleição do presidente da Câmara no início deste ano que inclui o PMDB e mais 1
2 partidos, seis deles com assento no Conselho de Ética; ou o novo, composto apenas por PMDB e PEN.

“Vai valer o bloco atual. O inicial acabou, eles desmancharam. Se está valendo para as outras coisas da Câmara esse bloco, para o Conselho de Ética também vale ele”, disse nesta segunda Araújo ao Estado.

A decisão abre espaço para que deputados aliados e integrantes de partidos próximos a Cunha participem do sorteio, ampliando as chances de um parlamentar pró-Cunha assumir a relatoria. A decisão poupa da restrição nomes de PTB (1), PP (2), PSC (1), PRB (1), DEM (1) e Solidariedade (1).

Este último, inclusive, trocará seu representante. Fiel aliado de Cunha, o deputado Paulo Pereira da Silva, o Paulinho da Força (SD-SP), vai operar, mais uma vez, para proteger o presidente da Câmara. Preencherá com um de seus quadros favoráveis a Cunha a vaga que ficará aberta com a renúncia do deputado Wladimir Costa (SD-PA) por “problemas de saúde”. Até a tarde desta segunda-feira, 2, havia três nomes sobre a mesa de Paulinho: o hoje suplente do Conselho Genecias Noronha (CE), Fernando Francischini (PR) e Augusto Coutinho (PE). Pelas regras do Conselho de Ética, um de seus membros só pode ser substituído em caso de renúncia ou morte.

O sorteio será realizado na tarde desta terça, mas o escolhido de José Carlos Araújo só deve ser anunciado amanhã. “Vou conversar com os três. Tenho que ver quem vou escolher e o que está pensando. Se eu vir que tem algum deles que não está disposto a apurar o fato, não vou escolher”, disse o presidente do Conselho.

Divisão. A escolha de um relator favorável é crucial para Cunha, pois será ele quem apresentará o texto a ser votado pelo colegiado. Nos bastidores, o mapeamento da posição de cada conselheiro apresenta um cenário dividido entre aqueles com tendência pró-Cunha, anti-Cunha e os indefinidos.
A partir desta terça, começa-se a contar os 90 dias úteis de duração do processo contra Cunha. A previsão é de que a apreciação do caso só seja concluída entre março e abril do ano que vem devido ao recesso parlamentar e feriados, como o do carnaval.

No PT, partido da presidente Dilma Rousseff, o entendimento é de que a conclusão do caso de Cunha somente no ano que vem aumenta as chances de o governo conseguir aprovar medidas de ajuste fiscal e esfria o movimento pró-impeachment, que pode ser desencadeado pelo peemedebista ao se sentir acuado. “Para nós está muito claro que há duas prioridades: não ter o pedido de impeachment e o governo conseguir votar esse ajuste”, afirmou o deputado Zé Geraldo (PT-PA). Integrante do Conselho de Ética, ele avalia que Cunha tornou-se “indefensável”. “Ele está muito anêmico, não tem mais fôlego para ser a ofensiva contra o governo, contra a Dilma e contra o PT”, disse o petista.

Sua posição contraria a do seu partido que, na semana passada, aprovou uma resolução no Diretório Nacional em que fez críticas à atuação política de Cunha, mas não menciona em nenhum momento as denúncias de corrupção contra ele. A legenda também não defendeu a cassação do deputado no Conselho de Ética, como queria parte da bancada, sob o argumento de que não pode fazer prejulgamentos.

No Palácio do Planalto, a avaliação é de que Cunha tem maioria no Conselho e não vai deixar o cargo pela via “política”. Por isso, a ordem é manter o diálogo “institucional” com o presidente da Câmara e segurar o PT, para que o partido não lidere a ofensiva contra o peemedebista. O ministro da Casa Civil, Jaques Wagner, vai continuar fazendo a ponte com Cunha. O governo deve contar ainda com o apoio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na interlocução com o presidente da Câmara.

Até mesmo no PSDB, partido que vinha apoiando Eduardo Cunha na expectativa de que o peemedebista desse início ao processo de impeachment de Dilma, o entendimento é de que a situação do deputado ficou mais crítica depois da divulgação de documentos que comprovam que ele e a mulher mantinham contas secretas na Suíça.

Mercado prevê inflação maior e recessão mais profunda em 2015

Por Ana Conceição – Valor Econômico

SÃO PAULO - Analistas do mercado financeiro continuam a piorar as estimativas de inflação e atividade para o biênio 2015-2016, de acordo com o boletim Focus, do Banco Central (BC).

A mediana das projeções para o aumento do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para este ano subiu, pela sétima semana, de 9,85% para 9,91%. Para 2016, avançou de 6,22% para 6,29%. Em 12 meses, houve uma ligeira desaceleração, de 6,50% para 6,47%.

No caso do IPCA de outubro, que será divulgado nesta semana pelo IBGE, foi previsto uma elevação de 0,79%.

Apesar de esperarem uma inflação mais alta, os analistas não mexeram nas expectativas para o juro básico da economia. As projeções para a Selic ao fim deste ano e do próximo ficaram em 14,25% e 13%, respectivamente.

Entre os analistas Top 5, os que mais acertam as previsões, as estimativas para o IPCA estão mais altas que as do mercado em geral e eles também mantiveram suas projeções de Selic. Para o IPCA deste ano, a expectativa é de aumento de 10,03%, em vez de 9,95%, e, para o próximo, de 7,33%, em lugar de 7,30%. A Selic seguiu em 14,25% e 12,75%, nesta ordem.

Entre os fatores que influenciam a inflação, o Focus mostra uma nova deterioração nas estimativas para os preços administrados em 2015, indo de alta de 16,11% para 16,5%, e no próximo calendário, saindo de 6,6% para 6,75% de incremento. Ficaram estáveis as projeções para o dólar ao fim de ambos os anos, em R$ 4 e R$ 4,20.

Quanto à atividade, a projeção para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) saiu de queda de 3,02% para recuo de 3,05% neste ano (16ª revisão para baixo) e de contração de 1,43% para declínio de 1,51% no próximo exercício. A produção industrial deve se retrair 7% em 2015, mesma estimativa contemplada anteriormente. Em 2016, a queda deve se situar em 2%. Antes, o prognóstico era de recuo de 1,5%.

Crise piora e mercado já fala em queda de 3% do PIB também em 2016

• Projeções de bancos e consultorias apontam que o Brasil vai passar por dois anos consecutivos de contração da economia, e o recuo acumulado nos dois anos pode ser o maior já registrado no País pelo menos desde o início do século passado

Luiz Guilherme Gerbelli - O Estado de S. Paulo

A economia brasileira pode estar no meio da mais severa crise em mais de um século. Já há consenso entre os analistas de que o Brasil enfrentará dois anos de recessão, o que não ocorria desde 1930. O recuo deste ano é apontado pelos analistas como algo próximo de 3%. Os números para 2016 ainda variam bastante, mas, se estiverem corretas as projeções mais pessimistas que começam a aparecer, com queda até superior a 3%, o quadro será mais desalentador: o ciclo econômico do atual biênio vai ser o pior pelo menos desde 1901, início da série histórica disponível no Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

O Bank of America Merrill Lynch já prevê para 2016 um recuo de 3,5% no PIB, número pior que a queda de 3,3% projetada para este ano. O Banco Fibra prevê para o ano que vem queda de 2,6%, enquanto o BNP Paribas já projeta um recuo de 2,5%.

A revisão de parte dos bancos e consultorias para o cenário econômico ocorreu principalmente por causa da fraqueza dos indicadores divulgados ao longo deste segundo semestre. Nos últimos meses, a economia brasileira vem colhendo uma série de dados negativos em quase todos os setores, sobretudo na indústria, e tem enfrentando uma deterioração muito acentuada no mercado de trabalho.

“Para 2015, percebemos um aprofundamento da recessão no segundo semestre puxado pelo setor industrial. Os estoques continuam elevados, em especial os da cadeia automobilística”, diz Rodolfo Margato, economista do banco Santander. O banco revisou a sua projeção para o PIB deste ano de -2,8% para -3,2%. E a recessão esperada para 2016 passou de -1% para -2%.


Debate: Qual é a saída para a crise


CONVITE

• Data: Quinta, 5 de novembro às 18:00 - 21:30

• Local: Associaçao Scholem Aleichem- ASA - Rua São Clemente, 155 fundos
Botafogo - Rio de Janeiro (perto da Estação do Metro Botafogo)

• Debatedores: os economistas Mansueto Almeida (IPEA), Felipe Salto (FGV-SP), José Luis Oreiro (UFRJ) e Sérgio Besserman (PUC-Rio)

• Moderador: Luiz Sérgio Henriques (vice-presidente da FAP

• Promoção: Fundação Astrojildo Pereira (FAP)

Convide seus amigos

Merval Pereira - Baixa política

- O Globo

Apoio ao presidente da Câmara é exemplo da baixa política atual. Exemplar do momento político que vivemos é o apoio de oposição e governo ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha, por motivos diferentes, é certo, mas baseado na mesma baixa política que há muito vem prevalecendo no nosso presidencialismo de coalizão cansado de uma guerra nada santa.

O fato de os dois principais polos partidários de nossa democracia estarem empenhados, mais ou menos explicitamente, em preservar Cunha — o do governo para impedir o impeachment da presidente Dilma, a oposição na esperança de viabilizá-lo — demonstra quão baixo nível atingimos, a ponto de um político desmoralizado pelos fatos ter ainda fôlego para comandar as ações no Congresso.

Por esse motivo, o país está paralisado, pois as forças que o comandam vivem justamente dessa afasia política. O país está dependente da ação de instituições autônomas do Estado não controláveis pelos poderes políticos momentaneamente no poder, como a Polícia Federal, o Ministério Público, a Receita Federal, o Judiciário de maneira geral (aí incluídos o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral, apesar da tentativa de influência política de quem nomeou os ministros) e operações como a Lava-Jato, Zelotes e outras. Paradoxalmente, isso demonstra que nossa democracia funciona.

É delas que vêm as informações que movimentam a opinião pública e farão, em momento que ainda não se vislumbra mas certamente chegará, com que o Congresso sinta que não há mais espaço para manobras mesquinhas da baixa política.

A oposição errou, e ainda erra, mas agora com menos intensidade, ao jogar todas as suas fichas na antecipação do impeachment, sem aguardar que os trâmites legais sejam concluídos pelo TSE, pelo TCU e pelo Congresso, dando margem a que os governistas, acuados pelos fatos, denunciem a fantasia do golpe democrático, quando o que está em andamento é uma série de investigações que vão montando um triste quadro da dominação através de manipulações criminosas de diversas modalidades, em benefício do partido político no poder e seus apaniguados.

Toda essa teia, que se antevia desde que o mensalão foi descoberto, agora está sendo destrinchada pelas investigações, mostrando um conluio entre agentes públicos e privados de tão vasta dimensão que somente um país anestesiado poderia aceitar sem uma indignação cívica que se reflita nas ruas.

Por outro lado, a indignação nada cívica do ex-presidente Lula com as investigações sobre ele e sua família é tão reveladora do seu caráter autoritário que não espanta que esteja a defender interferência governamental nas ações da Polícia Federal. A presidente Dilma e seu ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, não o fazem simplesmente porque não podem, mesmo que o quisessem.

Criou-se como blindagem da presidente Dilma a tese de que ela não enriqueceu no poder, o que quer dizer que não pode ser “impichada”. Como se os crimes de responsabilidade contra o Orçamento que praticou não fossem passíveis de punição prevista na Constituição. Ou como se os indícios cada vez mais claros de que as eleições petistas vêm sendo financiadas por dinheiro da corrupção desde 2006 pelo menos não justificassem a cassação da chapa pelo TSE. Ou como se não tivesse responsabilidade pela corrupção na Petrobras.

Como a anestesia está aos poucos perdendo o efeito, como demonstram as pesquisas de opinião, é de se esperar que o tempo político acabe se encontrando com o da realidade, esgotando a capacidade de seguir adiante com essa farsa populista que levou o país à bancarrota.

Anos de recessão, reafirme-se, provocados por uma política econômica destrambelhada e por abusos do poder econômico para garantir a permanência do mesmo grupo no poder durante décadas, uma dominação do país por ações criminosas que vão sendo desveladas por instituições do Estado que garantem que não nos transformemos em uma República de Bananas como aquelas com que o poderoso chefão do petismo se relaciona em tenebrosas transações políticas e econômicas que agora estão sendo devidamente investigadas.

República de Bananas seremos se continuarmos a aceitar essa imposição de um grupo político sobre o país, e se a Constituição em vigor não puder ser utilizada para dar um basta a essa usurpação a que estamos submetidos.

Luiz Carlos Azedo - O impasse da hora

• O sistema político está bloqueado. Mas, se quiser, o PMDB tem força no Congresso para promover uma ruptura no sistema de forças que domina a vida política nacional, com ou sem Dilma

- Correio Braziliense

Cada dia que passa a democracia brasileira dá sinais de que está sendo bloqueada pela contradição entre um sistema de poder carcomido pela corrupção e a incompetência e a necessidade de reformas estruturais para superar a crise na qual o país mergulhou.

De um lado, estão as forças políticas que controlam o governo Dilma e o Congresso; de outro, a maioria da população e os agentes econômicos que sofrem as consequências desse impasse, que lançou o país numa recessão de 3% do PIB neste ano. E, agora, em consequência, deixa milhões de trabalhadores desempregados, quebra milhares de empresas, liquida pequenos e médios empreendimentos, sucateia a indústria nacional.

Todos os diagnósticos sobre a situação da economia convergem para a tese de que o Estado brasileiro é anacrônico, grande e perdulário. À conclusão de que o fisiologismo e o patrimonialismo dos políticos se tornou insuportável. É que a sociedade já não consegue sustentar um governo capaz de provocar, num só ano, como neste, um deficit fiscal que pode chegar aos R$ 110 bilhões. Paga-se muitos impostos, e pouco se tem em troca.

Nada impede que a situação, que já parece o fundo do poço, possa piorar. Em circunstâncias normais, porém, provocaria uma mudança de rumos no governo, como a sociedade demanda. Mas acontece que a presidente Dilma Rousseff não é capaz de fazê-la, por vários motivos. Dois, porém, se destacam. O primeiro é de ordem objetiva: ela é prisioneira do sistema de forças que a levou ao poder; o segundo, subjetivo: suas concepções voluntaristas, que nos trouxeram a esse estado de coisas, não mudaram.

Mas há que se indagar: por que as forças políticas no Congresso não são capazes de promover uma ruptura com tudo isso? A resposta implica retomar o começo dessa prosa: a democracia brasileira está bloqueada pelos grandes partidos. Todas as tentativas de mudanças feitas no Congresso, sob pressão da opinião pública, para arejar o sistema político fracassaram. Esses partidos temem o surgimento de uma alternativa de poder à margem deles, embora esteja evidente, pelas manifestações da sociedade, que isso só contribui para que algo surja fora do âmbito partidário.

Duas décadas demonstram que a polarização PT versus PSDB pode interessar às lideranças de ambos, mas não já é capaz de oferecer uma saída para o impasse atual. Se levarmos em conta que a presidente Dilma Rousseff tem mais três anos de mandato, o agravamento e a permanência da crise nos aproximam cada vez mais da situação da Argentina e da Venezuela.

Por ironia, porém, o desenlace desse confronto é urdido por um partido coadjuvante dessa polarização, o PMDB, cujo comportamento até agora tem sido dar sustentação a quem está no poder e disso tirar o máximo proveito, de forma fisiológica e patrimonialista. Tanto é assim que os presidentes da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), estão na mira da Operação Lava-Jato, que desnudou a crise ética a partir das investigações sobre o esquema de corrupção montado na Petrobras para financiar o hegemonismo petista.

Palavras ao vento
Algo se move. O sinal é o documento apresentado pelo vice-presidente da República, Michel Temer, para discussão no congresso do PMDB. Na verdade, é uma proposta de governo, que está muito mais calcada na crise atual do que nos cenários possíveis para 2018. Quem conhece os bastidores do Congresso sabe, porém, que a proposta não tem sintonia plena com os demais caciques do partido. Pode-se concluir: papel aceita tudo!

Ocorre que a coisa muda de figura se o documento for um compromisso de Michel Temer com os agentes econômicos e os partidos de oposição, o que posicionaria o vice-presidente da República como uma alternativa de poder caso a presidente Dilma Rousseff renuncie ou venha a ser apeada do poder por um processo de impeachment no Congresso. Elaborado sob a coordenação do presidente da Fundação Ulysses Guimarães, o ex-ministro Moreira Franco, o texto rompe com as concepções nacional-desenvolvimentistas do PT e propõe um ajuste estrutural da economia, de caráter liberal-social.

Defende, entre outras coisas, que se estabeleça uma idade mínima para a aposentadoria (60 anos para mulheres e 65 anos para homens); que os gastos com saúde e educação deixem de ter patamares mínimos, definidos pela Constituição; que se deixe de indexar o reajuste dos benefícios sociais e previdenciários ao salário mínimo; que o regime para a exploração de petróleo não seja mais de partilha, que onera a Petrobras; e que as convenções coletivas de trabalho prevaleçam sobre as normas legais, salvo quanto aos direitos básicos. Isso é música para empresários, prefeitos e governadores na crise atual.

O PMDB propõe privatizações e concessões em logística e infraestrutura, e também acordos comerciais com os Estados Unidos, a Europa e a Ásia, “com ou sem a companhia do Mercosul”. E insinua a necessidade de formação de um governo de união nacional, que restabeleça o diálogo e una o país. Tudo pode não passar de palavras ao vento, porque o sistema político está bloqueado. Mas, se quiser, o PMDB tem força no Congresso para promover uma ruptura no sistema de forças que domina a vida política nacional, com ou sem Dilma, ainda mais porque os principais líderes políticos do país estão com altos índices de rejeição.

Bernardo Mello Franco - Betinho, 80

- Folha de S. Paulo

O corpo frágil, sustentado em pernas finas como gravetos, lhe dava um certo ar de santo. Ao mesmo tempo em que perdia a luta contra a Aids, ele liderava uma admirável campanha contra a fome que mobilizou o país nos anos 90.

O sociólogo Herbert de Souza é tema de "Betinho - A esperança equilibrista", recém-lançado nos cinemas. Num tempo marcado pelo pessimismo, o documentário lembra como o Brasil já foi pior. Em 1993, o país tinha 32 milhões de habitantes na miséria, segundo o Ipea.

O filme também mostra que o Brasil pode ser melhor. Cerca de três milhões de voluntários se organizaram nos comitês da Ação pela Cidadania, sem cobrar nada em troca. A causa atraiu artistas que hoje só se unem para censurar livros biográficos.

Betinho era um sobrevivente. Driblou a tuberculose na infância, a hemofilia e a perseguição dos militares após o golpe de 1964. Ficou conhecido na campanha pela anistia, que acompanhou à distância. Ele era o "irmão do Henfil" da música "O bêbado e o equilibrista", de João Bosco e Aldir Blanc, que virou hino da luta pelo retorno dos exilados.

De volta ao país, engajou-se em sucessivos movimentos: pela ética na política, pelo tratamento dos portadores de HIV e contra a fome. Insistia que a sociedade não deve esperar que o governo aja, mas tem o dever de pressioná-lo a se mexer.

A imagem de unanimidade nacional sofreu um baque em 1994, com a revelação de que Betinho aceitou doação de bicheiros para uma ONG de apoio a vítimas de Aids. Ele pediu desculpas e disse que não devia ser tratado como santo. "As pessoas acham que não cometo erros", desabafou, em entrevista reproduzida no filme. À luz dos escândalos de hoje, a penitência parece um exagero.

O fundador da campanha contra a miséria morreu em 1997. Não viveu para ver o Brasil deixar o vergonhoso Mapa da Fome da ONU, o que só aconteceria no fim do ano passado. Nesta terça, Betinho faria 80 anos.

Xico Graziano - Aquicultura de verdade

- O Estado de S. Paulo

Acabou o Ministério da Pesca e Aquicultura. Ainda bem. Irrelevante, servia de palco para negociatas políticas. Sua extinção livrará o setor produtivo da tramoia. Ganhará o profissionalismo. Sorte dos verdadeiros pescadores e aquicultores do Brasil.

Foi Lula, em 2003, que criou o esdrúxulo ministério, entregando-o ao seu amigo petista José Fritsch, então derrotado para o governo de Santa Catarina. O novo órgão permaneceu satisfazendo o PT catarinense até 2012, quando Dilma Rousseff nomeou o senador Marcelo Crivella (PRB), bispo carioca da Igreja Universal, para comandá-lo. Piada pronta: um pescador de almas no barco. Puro trambique.

Iniciado seu segundo governo, Dilma mexeu nas redes: pôs Helder Barbalho (PMDB), recém-derrotado para o governo do Pará, para cuidar da pesca. Filho de Jader, a familiaridade do moço com a atividade era desconhecida. Não fazia diferença. Importava, como nestes 12 anos de existência, a acomodação política. De quebra, chaves da corrupção.

Enquanto os piscicultores do Brasil sofreram anos tentando conseguir autorizações para uso de águas públicas, duas falcatruas correram soltas no Ministério da Pesca. A primeira, ligada às permissões para a pesca industrial, grandes barcos no mar. Todos sabiam que, há anos, rolava propina nessa matéria, mas se calavam temerosos do poder. Coincidência ou não, na semana passada a Polícia Federal desbaratou a quadrilha, chefiada pelo número dois do antigo ministério, Clemenson Pinheiro. Preso na Operação Enredados juntamente com outras 18 pessoas, eles cobravam uma média de R$ 100 mil por licença para pesca na costa brasileira. O esquema contava com a participação de servidores, armadores, representantes sindicais e intermediários. Uma trama graúda.

A segunda fraude se disfarça com vestes sociais. Existe uma transferência de dinheiro que o governo federal repassa aos pescadores artesanais para compensar sua perda de renda nas épocas do “defeso”, quando o Ibama proíbe a captura de certas espécies visando a proteger a reprodução dos cardumes. Muito bem. Acontece que o combate à pobreza virou uma boca-livre para seduzir eleitorado. Segundo denunciou Marlos Ápyus, o Censo do IBGE (2010) encontrou 413.551 pescadores em atividade no Brasil. Naquele ano, porém, o Ministério da Pesca tinha 853.231 mil pescadores recebendo o “seguro-defeso”, no valor de um salário mínimo por mês, durante quatro meses. Somente em Brasília, onde não existe mar nem rio, existiam 7 mil falsos pescadores recebendo o benefício. Picaretagem da grossa.

Mais que a pesca, a aquicultura vem se destacando na agenda do futuro da alimentação humana. O motivo é óbvio: os cardumes naturais de peixes e crustáceos se esgotam, mundialmente, por causa da pressão exercida pela pesca tradicional, diante da crescente demanda da população. Produzir pescados em cativeiro, bem como reproduzir outros organismos de água doce ou salgada, virou atividade promissora. Ampara-a o extraordinário avanço tecnológico na nutrição e na genética dos espécimes. Basta ver o delicioso, e relativamente barato, filé de saint peter, uma espécie de tilápia, na gôndola dos supermercados. Ou o avermelhado salmão chileno.

Surgiram também as “fazendas” de camarão, instaladas em manguezais ou regiões lagunares próximas ao litoral, especialmente no Nordeste. A carcinocultura, como se denomina tal criação, passou a abastecer o mercado com o camarão “cinza”, menos saboroso, porém bem mais barato que as espécies marinhas. Resultado: democratizou-se o consumo do camarão fresco. Dessa história de sucesso também participam as algas, os mexilhões, as ostras. Sensacional.

Dados oficiais mostram que, da produção brasileira de pescado (2013), 38,4% já se originam da piscicultura. E, desta, grande parte (82%) se origina nas águas continentais, não nas marinhas. Em todo o mundo, a aquicultura responde por quase metade (48,9%) das carnes de pescado. A China responde, sozinha, por 62% da aquicultura mundial, seguida da Índia (6,3%). O Brasil, após uma década de Ministério da Pesca, manteve seu distante 12.º lugar no ranking mundial, com cerca de 1% da produção total.

Existe, sim, enorme potencial para crescimento da aquicultura nacional. A posição é unânime entre os estudiosos do assunto, que defendem maior apoio ao setor, com novos marcos regulatórios, mais pesquisas e financiamento das atividades. Muita proteína de excelente qualidade se esconde nessa virtuosa equação. Foi daí que alguém teve a ideia de criar um ministério. Lula capturou-a para servir à sua lógica política. Um desastre.

Nada comprova que a nova estrutura de gestão tenha influenciado a realidade produtiva. Durante sua existência, planos maravilhosos foram lançados, em lindas cerimônias. Prometeram-se mundos e fundos. Mas a produção nacional de pescado cresceu, no período, abaixo de 2% ao ano. As importações se elevaram. O que cresceu, mesmo, foi o desperdício de dinheiro público.

Fora o vexame internacional. Em 2014, a Controladoria-Geral da União divulgou auditoria apontando uma série de irregularidades na pasta, incluindo a divulgação de dados falsos sobre a produção pesqueira e aquícola nacional. Informações mentirosas foram encaminhadas à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e à Comissão Internacional para Conservação do Atum Atlântico (Iccat). Vergonhoso.

Talvez agora, libertadas dos esquemas safados, a pesca e a aquicultura se expandam de verdade. Os brasileiros merecem. Não apenas apreciar em sua mesa as delícias criadas nas águas, ou obtidas na pesca sustentável, mas também viver longe desses peixes podres da política nacional.

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Xico Graziano é agrônomo, foi secretário de Agricultura e secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo.

Fernando Exman - Impeachment reflui e ajuste domina agenda

• Cai tradicional slogan do PT de que "eles quebraram o país"

- Valor Econômico

Há sempre uma cautelosa ponderação de que o cenário é demasiadamente volátil para se respirar totalmente aliviado. Garantir que a situação está sob controle, então, nem pensar. Mesmo assim, a presidente Dilma Rousseff e seus articuladores políticos observaram nas últimas duas semanas um arrefecimento no que até então parecia um iminente risco de enfrentarem um impeachment. Mas ainda buscam estimar quanto tempo esse cenário perdurará, enquanto partidos de situação e oposição analisam o custo-benefício de se assumir o governo a poucos meses das eleições municipais.

A mensagem do Palácio do Planalto é de distensão. Dilma e seus auxiliares sabem que parte dos aliados quer romper com o governo e isso levará até mesmo líderes de legendas governistas a adotarem posicionamentos conflitantes com as posições do Executivo porque precisam acenar para a suas bases eleitorais.

Na semana passada, o PMDB apresentou à sociedade um plano próprio para retirar o país da crise, numa demonstração de que de fato usará o congresso agendado para o dia 17 de novembro para dar início a uma marcha que tem as eleições de 2018 como destino e na qual gradualmente se descolará do governo e do PT.

Esse tipo de movimento não se limita ao PMDB. O PDT não dá a Dilma garantia alguma de que votará a favor de medidas do ajuste fiscal que possam atingir direitos dos trabalhadores, mesmo ganhando peso na reforma ministerial feita pela presidente. E já lançou o ex-ministro Ciro Gomes como possível pré-candidato a presidente para 2018.

A tramitação do Orçamento do ano que vem é outro exemplo. O relator da proposta orçamentária, deputado Ricardo Barros (PP-PR), é vice-líder do governo na Câmara. Isso não lhe impôs nenhum constrangimento ao defender um corte do Bolsa Família. Pelo contrário. O parlamentar vem recebendo apoio nas redes sociais de seus eleitores, que assim como o PP têm um perfil mais liberal e não são os maiores entusiastas do aumento de gastos com os programas sociais do governo do qual participam.

O que há em comum entre essas iniciativas são críticas a diversas políticas adotadas pelas administrações de Dilma e do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, as quais resultaram na desaceleração da economia, com um crescimento da taxa de desemprego que pode atingir dois dígitos em breve, um quadro fiscal desafiador e a alta da inflação.

Não mais apenas quem foi chamado de "pessimista" por Dilma durante a disputa eleitoral que aponta o difícil momento da economia doméstica. Em uma recente análise sobre o mercado de trabalho, por exemplo, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), entidade vinculada ao Ministério do Planejamento, afirmou que "a taxa de desemprego apresenta uma tendência de elevação expressiva".

Apesar da negação petista em relação à relevância da opinião das agências de classificação de risco, o cenário fiscal divulgado pelo próprio Ministério do Planejamento e pelo Tesouro Nacional no fim de outubro faz um alerta que não é novidade para o mercado: a eventual perda do grau de investimento dado por uma segunda das três grandes agências pode ter efeitos "consideráveis" sobre os indicadores financeiros e econômicos do Brasil, com resultados negativos para os investimentos e a oferta de crédito - justamente a aposta do PT e de Lula para a retomada da atividade econômica. Investidores acreditam que a decisão de uma dessas agências deve ocorrer já no início do ano que vem e refletirá o que o governo conseguir realizar nos próximos meses.

Não à toa o ex-presidente, que até então vinha criticando a estratégia do governo de sua sucessora, tenta agora redirecionar seu partido a fim de acelerar a aprovação do ajuste fiscal no Congresso e abrir espaço para uma agenda positiva o mais rápido possível. Sem um apoio integral da bancada petista no Parlamento, Dilma e seus articuladores sabem que não contarão com a unidade da base aliada.

Estar ao lado de um governo pouco popular já é ruim. Assumir um ônus político que nem mesmo o partido da presidente quer pode representar uma demanda grande demais aos parlamentares que terão de dar as caras em suas bases eleitorais para disputar alguma prefeitura no ano que vem, eleger aliados ou preparar o terreno para o pleito de 2018. Pemedebistas fazem questão de pontuar que a capilaridade conquistada nas eleições locais é o ativo responsável por deixar a sigla bem posicionada na cena política nacional.

Alas majoritárias dos partidos aliados não têm a convicção de que o impeachment seria um movimento em que todos sairiam ganhando a médio e longo prazos. "E depois do impeachment?", perguntam-se alguns desses líderes, lembrando que seria necessária a formação de uma maioria no Congresso para a aprovação de medidas impopulares.

Assim, a presidente Dilma chega ao fim do primeiro ano do seu novo mandato: sem grandes realizações a ostentar, pressionada por uma possível abertura de processo de impeachment e um ajuste fiscal a concluir. Terá ainda de verificar dia a dia se essa ponderação feita por integrantes da base aliada se trata mesmo de uma reflexão sobre o custo-benefício do impeachment ou um discurso para justificar o enfraquecimento do movimento favorável ao seu afastamento.

"Eles quebraram o país duas vezes", insistiu à exaustão o slogan petista nas últimas disputas eleitorais, com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à frente. Dilma foi além: "Eles quebraram o país três vezes", reforçava a presidente na campanha à reeleição, acrescentando que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso entregara ao seu sucessor um país "desequilibrado, com desemprego bastante elevado, numa situação muito precária". O cenário atual não é muito diferente do descrito por Dilma, e ninguém quer ser o "eles que quebraram o país" nos próximos pleitos.

Vinicius Torres Freire- Ideias fúnebres no Brasil zumbi

- Folha de S. Paulo

1. "Conquistas sociais" de quase uma década vão se perder em um triênio de recessão, 2014-16, se diz. Se foi tão pouco e tão breve, eram "conquistas" e "sociais"?

2. Este curto século 21 foi de reparações diminutas dos danos da nossa guerra social sempiterna: Bolsas diversas, cotas, subsídios para a educação superior ruim, subsídios para novas "Cohabs". Etc.

3. O trabalho se manteve precário. Não se trata aqui dos bicos. Trata-se de um sistema social e econômico de produzir empregos de escasso sentido humano e produtivo. De precariedade sistêmica.

4. Dos 92 milhões de ocupados no país, 6 milhões são domésticos. Um em quinze. Ganham em média um terço do rendimento médio do restante dos trabalhos. Se estes já não são grande coisa, meça-se o tamanho do trabalho doméstico pelas reações selvagens à mera tentativa de equiparação legal aos demais.

5. Há 1,42 milhão de domésticos no Estado de São Paulo, também 1 em 15 trabalhadores. Ganham em média pouco mais de R$ 900, menos que o piso de porteiros ou ascensoristas.

Há uns 125 mil porteiros na cidade de São Paulo, dizem sindicatos; 30 mil ascensoristas; 30 mil zeladores. Há 15 mil cobradores de ônibus. No Estado, há cerca de 290 mil seguranças privados legalizados; cerca de 100 mil frentistas.

6. Algo deu muito errado para que se sujeitasse tamanha massa de pessoas a ganhar tão pouco por trabalhos tão pouco produtivos, pois. Que faltam educação e infraestrutura é obvio. Por que faltam é a pergunta complicada.

7. O número de domésticos voltou a aumentar em 2014.

8. Nestes anos de reparações diminutas da guerra social e do ativismo reformista simbólico, identitário ou similar, a esquerda e suas lideranças pouco ou nada trataram de educação popular e, menos ainda, de SUS.

9. O governo da esquerda entrou em colapso a partir de 2013. Junho de 2013 parece ter acelerado ainda mais a marcha forçada da inépcia e da falta de sentido da política econômica de comprar paliativos sociais e empregos incertos com aumento de dívida pública, que também financiava o outro lado do balcão, empresas grandes e oligopólios, com subsídios muito maiores, um resumo rápido da "Pax Luliana", a grande conciliação.

Junho de 2013, o tombo do prestígio do governo e as necessidades eleitoreiras a seguir levaram o erro catastrófico ao paroxismo. Mas "erro" é explicação simplória para esta caminhada à beira do abismo.

10. O ódio contribuiu para o impasse dilacerado a que chegamos. A intensidade do ódio não é fácil de explicar: as rendas de todos subiam, não houve imposição de perdas econômicas decisivas a grupo nenhum.

Sim, houve fricção de status, ameaça simbólica da ordem, para pincelar numa frase um assunto imenso. O ódio começou bem antes do ressentimento nas derrotas eleitorais e da exposição inédita de um sistema de fraude (corrupção imensa e estelionato eleitoral).

11. Por que foi assim (anos de analgésicos sociais, anabolizantes econômicos, corrupção essencial do sistema, pública e privada, reacionarismo parlamentar)? Que política produziu isso? Este impasse apático vai acabar apenas quando ou se a recessão produzir conflito generalizado?

Celso Ming - Dinheiro sob cerco

• O objetivo mais importante do projeto de lei que deve voltar a ser discutido essa semana não é a repatriação desses recursos, mas sua regularização

- O Estado de S. Paulo

Está previsto para esta semana o reinício das discussões na Câmara dos Deputados do substitutivo ao projeto de lei que define os termos da regularização de recursos no exterior (Projeto de Lei 2.960/15).

É uma dinheirama que pode chegar a US$ 400 bilhões, conforme estimativa do ministro da Fazenda, Joaquim Levy, contida no texto das justificativas que acompanham o projeto.

São capitais equivalentes a mais de dois anos de receitas com exportações do Brasil. Esses recursos podem estar lá fora há muitos anos, sob várias formas: depósitos bancários, imóveis, objetos de arte, intangíveis (marcas, direitos autorais, patentes), títulos, ações, veículos, embarcações, etc.
Não é repatriação de recursos mantidos no exterior, mas regularização. O objetivo do governo é aumentar a receita

O objetivo mais importante do projeto de lei não é a repatriação desses recursos, mas sua regularização. Eles podem continuar no exterior. O empenho do governo em aprová-lo está no seu potencial de obtenção de receitas imediatas, que desembarcariam neste Brasil tremendamente carente de recursos (veja o Confira).

A regularização, com força de anistia fiscal, implicará cobrança de 15% de Imposto de Renda e de outros 15% de multa. Esse novo regime tem prazo de validade: 210 dias. Teria, no limite, potencial de arrecadação de R$ 480 bilhões, se todos os que tivessem recursos no exterior aceitassem os termos da regularização.

Mais realista, o ministro Levy imagina que poderia arrecadar entre R$ 100 bilhões e R$ 150 bilhões, com base no que já obtiveram os tesouros da Argentina (US$ 4,7 bilhões), da Itália (€ 100 bilhões) e da Turquia (€ 47,3 bilhões). Mas por que o contribuinte brasileiro aceitaria confessar a manutenção desses recursos no exterior se nada mudou em relação às razões que o levaram a mandá-los para lá, como falta de confiança, sonegação, corrupção, etc.?

A novidade é a nova política global de tratamento desses recursos denominada Força-Tarefa em Ações Financeiras (Financial Action Task Force). Foi acertada no âmbito do Grupo dos Vinte (G-20) e liderada pelos Estados Unidos e pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), com o objetivo de cortar pela raiz as principais fontes de cobertura do terrorismo mundial.

Com base na ação direta dessa força-tarefa, tanto paraísos fiscais (Panamá e Ilhas Cook), como países que até agora garantiam estrito sigilo bancário (como Luxemburgo e Suíça) passaram a escancarar contas bancárias e a rastrear a movimentação de recursos suspeitos.

Ou seja, titulares de recursos até agora não reconhecidos estão sujeitos à identificação e a tratamento adequado por instituições internacionais (e também nacionais) de controle fiscal ou de segurança. Ou seja, o cerco vai sendo fechado sobre recursos de origem criminosa (contrabando de armamentos, narcotráfico, sonegação, corrupção, lavagem de dinheiro, etc.). Nessas condições, um certo número de contribuintes pode passar a ter interesse na regularização imediata dessa riqueza.

O problema aqui no Brasil é que os políticos alcançados pelas dezenas de operações contra a corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha parecem dispostos a contrabandear para dentro do projeto de lei em exame anistias especiais em seu próprio benefício.

CONFIRA:
Regime Especial
O nome oficial do novo estatuto que garante anistia ao reconhecimento de recursos não declarados no exterior é Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (Rerct).

Para este ano, não dá
Com base no projeto de lei, Levy contava com uma receita de R$ 11,4 bilhões em 2015, o que corresponde a 35,6% do que pretende obter com a CPMF em 2016. Ainda que seja aprovado nas próximas semanas, é mais uma projeção que deve frustrar-se por falta de tempo hábil para toda a tramitação de regularização do dinheiro.

Complicação
O programa acolhe apenas recursos de origem comprovadamente lícita, o que demanda regulamentação complicada, o que exige mais tempo.

Dinheiro escondido
O especialista Gabriel Zucman, autor do livro sobre paraísos fiscais ‘The Hidden Wealth of Nations’ calcula que há US$ 7,6 trilhões (8% dos ativos financeiros mundiais) depositados em paraísos fiscais.