segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Opinião do dia – Dora Kramer

O PT já viveu situação oposta da que vive hoje, durante os vários anos em que contou com o entusiasmo da população. O partido em geral e Luiz Inácio da Silva em particular desfrutaram de uma paixão por vezes insana, cega aos casos que evidenciavam abusos decorrentes da mistura do dinheiro público com a atividade partidária desde os primórdios da gestão petista e surda às barbaridades ditas por Lula em seus discursos diários quando presidente.

Livre, até de reação à altura, para dizer o que bem quisesse. Inclusive para pregar o ódio a “eles” (os poucos que discordavam) e fomentar a intolerância em relação não apenas ao exercício, como à simples existência de oposicionistas no País. Estes cresceram e apareceram. De minoria viraram maioria e assim caminha a democracia num Brasil que aguenta o tranco e, com liberdade, supera as adversidades.
------------------------
Dora Kramer, jornalista, ‘Sagrada divergência’, O Estado de S. Paulo, 27.12.15.

Corte de cargos só chegou a 11% do anunciado por Dilma.

• Eliminação de secretarias e redução de salários também ficaram no papel

• Necessidade de oferecer mais postos a partidos aliados em troca de apoio na Câmara, em meio ao processo de impeachment, emperrou a reforma anunciada como parte do ajuste para cobrir o déficit no Orçamento

Três meses após a presidente Dilma anunciar uma reforma que previa o corte de 3 mil cargos de confiança, a extinção de 30 secretarias especiais e uma economia anual de R$ 200 milhões, quase nada saiu do papel, nem mesmo a redução dos salários dela, do vice Michel Temer e dos ministros, informam SIMONE IGLESIAS e MARTHA BECK. O corte de gastos com pessoal foi um dos pontos do pacote anunciado por Dilma para cobrir o déficit de R$ 30,5 bilhões previsto no Orçamento de 2016. Dos 3 mil cargos, só 346 foram cortados. Das 30 secretarias, só sete deixaram de existir. Após o anúncio do enxugamento, Dilma teve de dar mais cargos a aliados em troca de apoio contra o impeachment.

Promessa descumprida

• De 3 mil cargos que seriam extintos por Dilma, apenas 346 foram cortados até agora

Simone Iglesias, Martha Beck - O Globo

-BRASÍLIA- A reforma administrativa anunciada pela presidente Dilma Rousseff no início de outubro, prevendo reduções de salários, de ministérios, de secretarias especiais e de cargos comissionados, mal saiu do papel. Pressionada a enxugar a máquina pública para cobrir o déficit de R$ 30,5 bilhões previsto na ocasião no Orçamento de 2016, a presidente prometeu cortar ministérios e reduzir número de cargos de confiança, mas, até agora, os cortes foram pífios.

Dos 3 mil cargos que segundo Dilma seriam extintos, apenas 346 foram efetivamente cortados. Das 30 secretarias, só sete deixaram de existir. Dilma, o vice Michel Temer e os ministros teriam seus salários reduzidos de R$ 30.934,70 para R$ 27.841,23. Isso também ainda não aconteceu. A previsão do governo era economizar com esses cortes R$ 200 milhões. O montante alcançado até agora foi de apenas R$ 16,1 milhões.

O governo explica que a redução de salários depende do Congresso. Dilma enviou o pedido dias depois do anúncio da medida, porque é preciso editar um decreto legislativo para reduzir vencimentos. Mas o decreto ainda não foi apreciado pelos congressistas. Quanto aos demais cortes, a explicação de auxiliares de Dilma é que a necessidade de negociar cargos com aliados em troca de apoio na Câmara, em meio à abertura do processo de impeachment, paralisou a reforma.

Distribuição de mais cargos a aliados
Logo após o anúncio do enxugamento, Dilma ampliou o espaço do PMDB, entregando ao partido os ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia. O PDT, que comandava o Ministério do Trabalho, passou para as Comunicações, estrutura maior do que aquela que a legenda ocupava anteriormente.

Além de ter de entregar a esses partidos mais funções, Dilma deu mais cargos do 2º escalão a PR, PRB e PP, reduzindo a possibilidade de passar a tesoura nos cargos comissionados e nas secretarias ligadas aos ministérios. A dificuldade de cortar cargos de ministérios mais políticos fica evidente quando se vê a redução feita pelo Planejamento, essencialmente técnico. Dos 346 cargos extintos, 216 foram dessa pasta.

A reforma teria como marca a redução de ministérios. Em agosto, o plano do governo era cortar dez pastas. Quando oficialmente anunciada em outubro, porém, a reforma reduziu em oito o número de pastas, caindo de 39 para 31. Isso se deu a partir de fusão e incorporação de 11 estruturas — que geraram três novos ministérios. Mas até agora apenas cinco das que seriam extintas realmente foram cortadas: Secretaria Geral, Secretaria de Relações Institucionais e Micro e Pequena Empresa se fundiram para criar a nova Secretaria de Governo, passando de 545 cargos comissionados para 431; o Gabinete de Segurança Institucional foi extinto e teve as atribuições distribuídas por outros órgãos, reduzindo de 50 para 34 os cargos comissionados; e Assuntos Estratégicos passou a ser um órgão do Planejamento — pasta com maior redução de cargos de livre nomeação, de 1.263 para 1.047.

Anunciadas há dois meses, as fusões entre os ministérios do Trabalho e da Previdência e entre as secretarias de Igualdade Racial, Mulheres e Direitos Humanos, além da extinção da Pesca, ainda não foram finalizadas. Faltam decretos para formalizar as mudanças.
Por e-mail ao GLOBO, o Planejamento afirma que os cargos de ministros do Trabalho, da Pesca, do Gabinete de Segurança Institucional, de Relações Institucionais, de Assuntos Estratégicos, da Igualdade Racial, das Mulheres, da Micro e Pequena Empresa, e de Assuntos Estratégicos foram extintos. Admite, no entanto, que as estruturas desses ministérios ainda não foram reduzidas.

“Estão sendo elaboradas as estruturas do Ministério do Trabalho e da Previdência Social (fusão do Ministério do Trabalho com o da Previdência), do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e de Direitos Humanos (Fusão da SEDH, com Seppir e SPM) e do Ministério da Agricultura (que passará a executar as competências do Ministério da Pesca)”, diz nota do Planejamento.

— Realmente a reforma está andando a passos lentos. Mas há questões políticas envolvidas que tornam os cortes mais difíceis. O governo vai cumprir o que prometeu. Lentamente, mas vai — afirmou ao GLOBO uma fonte do Planalto.

Fusão de secretarias na Fazenda
Responsável pelo diagnóstico da reforma e defensor do enxugamento da máquina, Nelson Barbosa (Fazenda) chegou à pasta garantindo que sua tesoura começará em breve a dar resultados. No próximo ano, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) vai ser absorvida pela de Política Econômica (SPE). O atual secretário da Seae, Paulo Corrêa, que chegou em 2015 a convite do ex-ministro Joaquim Levy, permanecerá no posto só até o fim de janeiro.

Assim, o novo secretário de Política Econômica, Manoel Pires, que era o chefe da Assessoria Econômica do Planejamento, também vai comandar a Seae futuramente. A Seae foi perdendo funções ao longo do tempo. Uma delas era dar parecer para fusões de empresas. Mas, quando a nova estrutura do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) surgiu, a secretaria perdeu importante atribuição, e, diante disso, Barbosa resolveu fundi-la a outro órgão.


Orçamento de 2016 prevê receita com tributo que ainda não existe

• Em meio à crise política, governo não conseguiu aprovar volta da CPMF

Cristiane Jungblut - O Globo

Não é só a reforma administrativa que caminha a passos lentos. O ajuste fiscal ainda está bastante incompleto, embora várias de suas medidas tenham sido aprovadas ao longo de 2015. O governo enfrentará um rombo nas receitas do próximo ano, porque não conseguiu aprovar a principal medida para gerar arrecadação: a recriação da CPMF.

O Orçamento da União de 2016, já aprovado pelo Congresso, prevê uma receita de R$ 10,15 bilhões com uma contribuição que ainda nem existe. Além disso, a briga pública na área econômica sobre o tamanho da meta fiscal de 2016 desgastou o ex-ministro Joaquim Levy, que foi substituído na Fazenda por seu rival nas discussões, Nelson Barbosa (ex-Planejamento).

Levy visitava toda semana o Congresso, especialmente o Senado, para pedir apoio às medidas da segunda fase do ajuste, que ou não foram aprovadas ou custaram a sair do papel. Foi o caso do projeto sobre a repatriação de recursos, que só foi aprovado pelo Senado em dezembro, depois de muita polêmica na Câmara. Com isso, o governo só contará com o dinheiro em 2016. Há uma previsão de receita de R$ 21,1 bilhões no ano que vem.

Dificuldade para criação de impostos
Os parlamentares já avisaram a Barbosa que sua ida para a Fazenda não muda o clima político no Congresso, que é contrário à criação de impostos. O relator das receitas no Orçamento da União de 2016, senador Acir Gurgacz (PDTRO), disse que a troca na Fazenda não alterou o quadro:

— O clima é o mesmo. Não é por causa de um ministro, é porque não temos posição de aumentar imposto.

Já o relator do Orçamento da União de 2016, deputado Ricardo Barros (PPPR), disse que a aprovação da CPMF em 2016 é “uma necessidade” para o governo. No Orçamento aprovado, estão previstas receitas de R$ 10,15 bilhões com a CPMF a partir de setembro de 2016. A previsão do início da arrecadação apenas em setembro é justamente porque ainda será preciso aprovar uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para recriar a CPMF, que fora extinta em 2007.

Ricardo Barros diz achar que ainda é preciso analisar o clima político, diante das novas denúncias da Operação Lava-Jato, para saber se há viabilidade política para aprovar a PEC. O Congresso, até agora, é contra criar mais impostos.

— Primeiro, a criação da CPMF é uma necessidade para o governo. Como percebemos, as receitas incluem a CPMF e os recursos da repatriação. O governo precisa confirmar essas receitas para não ter que mudar a meta fiscal de 2016 — disse Barros.

Além de não ter conseguido recriar a CPMF, o governo não obteve sucesso na prorrogação da DRU (Desvinculação de Receitas da União), mecanismo que permite ao governo mexer livremente em parte de suas receitas. O governo demorou a enviar a proposta ao Congresso, e ela ainda não avançou significativamente. Como a prorrogação não foi votada, a DRU perde a validade no fim deste mês. Como também é uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), precisa ser aprovada em duas votações tanto na Câmara quanto no Senado. O governo ainda quer aumentar a alíquota da DRU para 30%, mas o Congresso só aceita os atuais 20%.

Metas fiscais foram aprovadas
O Congresso mudou praticamente todas as propostas de ajuste fiscal enviadas pelo governo, especialmente nas medidas provisórias. Além disso, o Planalto desistiu de medidas que tiveram forte reação, como a ideia de taxar o chamado Sistema S.

A principal vitória do governo foi a aprovação das metas fiscais de 2015 e 2016. O governo precisava decidir o tamanho do esforço fiscal para o pagamento de juros, para só depois encaminhar as propostas de geração de receitas e redução de despesas. Mesmo assim, o governo já avisou que, sem a criação da CPMF e a reforma da Previdência, a conta não vai fechar.

Governadores querem agenda comum com a União contra a crise econômica

• Chefes dos Executivos estaduais discutem hoje em Brasília elaboração de uma pauta que pede a retomada dos investimentos e da discussão sobre o pagamento das dívidas dos Estados; o tucano Pedro Taques, do Mato Grosso, já propôs moratória de três anos

Murilo Rodrigues Alves - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Com dificuldades para enfrentar a frustração de receitas diante da crise econômica, governadores se reúnem hoje em Brasília para discutir a elaboração de uma agenda de propostas visando a melhora do ambiente econômico do País. O documento será entregue ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa.

O encontro dos chefes dos Executivos estaduais para discutir a conjuntura política e econômica foi articulado pelo governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB). Até ontem haviam confirmado presença 13 governadores, que fazem oposição ao governo federal – entre eles, os tucanos Geraldo Alckmin (São Paulo) e Marconi Perillo (Goiás) – quanto fiéis aliados de Dilma Rousseff, como o petista Fernando Pimentel (Minas Gerais) e o peemedebista Luiz Fernando Pezão (Rio de Janeiro).

“Vivemos a mesma realidade e enfrentamos problemas comuns”, afirmou Rollemberg, que citou, como exemplos, a questão do financiamento a investimentos, a geração de empregos e o pagamento das dívidas com a União. O objetivo dos governadores, segundo Rollemberg, é também estabelecer uma atuação conjunta para monitorar as votações no Congresso.

Os governos estaduais já discutiam em conjunto alternativas para enfrentar a crise fiscal, mas querem afinar o discurso para entregar uma pauta pós-ajuste, com enfoque em medidas para estimular o crescimento econômico. Contam com a adesão de Barbosa a uma agenda mais desenvolvimentista. O encontro dos governadores está marcado para o meio-dia.

Assim como a equipe econômica de Dilma, os Estados também precisaram recorrer a “remédios amargos” – termo usado pela presidente para definir o aumento de impostos e corte de investimentos e de benefícios sociais – para fechar as contas em 2015.

LRF. De acordo com o último relatório de gestão fiscal dos Estados – elaborado em setembro pelo Tesouro Nacional e com dados consolidados até agosto deste ano –, a parcela da receita que os governos estaduais gastam com o pagamento de servidores públicos está no nível mais alto nos 15 anos de vigência da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). O recorde ocorreu principalmente por causa da queda de arrecadação provocada pela retração da economia.

Nos 12 meses encerrados em agosto deste ano, os governos de 26 Estados e o Distrito Federal gastaram, em média, 46,75% de sua receita corrente líquida com a folha de pessoal. Em agosto do ano passado, quando a crise ainda não havia se manifestado em toda sua gravidade, esse indicador estava em 44,75%. O patamar de 45% não era superado desde 2000, ano em que a LRF entrou em vigor.

O impacto da retração da economia nas contas estaduais é generalizado. Conforme os dados mais atualizados do Banco Central, a recessão foi maior nas regiões Sul e Norte, como consequência, principalmente do desempenho negativo das vendas do comércio e da produção industrial.

Moratória. Um dos pontos que os governadores querem tratar com Barbosa não deve ser bem recebido pelo ministro: um afrouxamento no pagamento da dívida dos Estados com a União. O montante fechou 2014 em R$ 553,7 bilhões, ante uma receita líquida total de R$ 497,9 bilhões.

No dia 18, o Consórcio Interestadual do Brasil Central, que reúne os governadores de Goiás, Rondônia, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e do Distrito Federal, decidiram propor ao governo federal a suspensão temporária do pagamento da dívida dos seus Estados, que, em conjunto, supera R$ 36,5 bilhões.

Em 1998, a dívida dessas unidades da Federação era pouco superior a R$ 4 bilhões. Passados 17 anos, os Estados ainda continuam devendo R$ 36,5 bilhões, mesmo tendo pago R$ 23,6 bilhões nesses últimos anos.

“Isso é uma vergonha”, afirmou na ocasião o governador de Goiás, Marconi Perillo, presidente do consórcio. Ele disse que entregará, em nome dos Estados associados, carta à presidente Dilma Rousseff, manifestando a posição contrária dos governadores à diminuição dos repasses do Fundo Constitucional do Centro-Oeste.

Governador de Mato Grosso, Pedro Taques propõe moratória da dívida dos Estados com a União durante os próximos três anos. “Preciso encontrar dinheiro para janeiro e fevereiro, quando ocorre uma queda sazonal do ICMS”, declarou Taques em Cuiabá, no último dia 21.

Segundo ele, “a moratória é a saída para amenizar os efeitos da crise econômica que afeta o Brasil e atinge os Estados”. Em sua avaliação, se os Estados deixam de pagar durante três anos terão como investir e gerar empregos e renda. Os Estados do chamado Brasil Central querem ganhar adesão de outras unidades, principalmente Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. / Colaboraram Pedro Venceslau, Marília Assunção, Fátima Lessa e Célia bretas Tahan

Governadores debatem a crise

Um grupo de governadores, entre eles Pezão, do Rio, e Alckmin, de SP, se reúne hoje, em Brasília, para discutir saídas contra a crise financeira que atinge todos os estados.

Governadores discutem crise econômica hoje em Brasília

• Ideia é debater propostas a serem apresentadas a Nelson Barbosa

Cristiane Jungblut, Gabriela Valente, Martha Beck - O Globo

-BRASÍLIA- Enfrentando grandes dificuldades financeiras, um grupo de governadores se reunirá hoje em Brasília para discutir propostas de mudanças na economia que serão apresentadas ao novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa. O encontro está sendo organizado pelo governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg (PSB). Até ontem, tinham confirmado presença 13 governadores, entre eles o do Rio, Luiz Fernando Pezão (PMDB).

A lista é completada pelos de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB); Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT); Bahia, Rui Costa (PT); Pernambuco, Paulo Câmara (PSB); Ceará, Camilo Santana (PT); Maranhão, Flávio Dino (PCdoB); Goiás, Marconi Perillo (PSDB); Alagoas, Renan Filho (PMDB); Piauí, Wellington Dias (PT); Sergipe, Jackson Barreto (PMDB); e Tocantins, Marcelo Miranda (PMDB).

Segundo assessores de Rollemberg, há uma preocupação com a grave situação financeira e fiscal dos estados, que tiveram dificuldades para fechar as contas de 2015 e ainda enfrentam restrições de caixa. Por isso, o governador do Distrito Federal decidiu organizar a reunião em sua residência oficial, em Brasília, a partir do meio-dia.

Empréstimos e financiamento à saúde
Rollemberg disse que entre os pontos em debate deverão estar o financiamento da Saúde e a capacidade de os estados contraírem empréstimos. O debate deve incluir ainda a possibilidade de estados e municípios ficarem com uma fatia da CPMF — que o governo tenta aprovar, mas ainda não avançou no Congresso. O problema, diz o governador do DF, é que esse tema não unifica os governadores.

O governo propôs uma alíquota de 0,2% que ficaria integralmente com a União; os governadores que apoiam a criação do imposto queriam aumentar para 0,38% e ficar com uma fatia dos recursos. A presidente Dilma Rousseff disse que eles teriam que negociar diretamente com o Congresso.

Rollemberg disse ao GLOBO que a ideia do encontro é discutir a questão econômica, e não o processo de impeachment de Dilma:

— É para discutir uma agenda política e econômica que nos unifique. Mas essa conversa não tem a ver com a CPMF, no sentido de que não sei se ela unifica ou não. Há pontos que unificam os estados: a liberação de novos financiamentos, com aval do governo federal; a rediscussão das dívidas junto à União; e a questão da Saúde. Isso explodiu agora no Rio, mas é problema comum dos estados.

Dilma comanda reunião ministerial
No Palácio do Planalto, dez dias após serem anunciados no cargo, os novos ministros da Fazenda, Nelson Barbosa, e do Planejamento, Valdir Simão, terão reunião com Dilma e os ministros Jaques Wagner (Casa Civil), Ricardo Berzoini (Governo) e Miguel Rossetto (Trabalho e Previdência). Hoje, às 15h, os três discutirão com os ministros do núcleo político as prioridades da economia em 2016 e a estratégia para aprovar as matérias de interesse do governo no Congresso, que analisa o impeachment da presidente e é alvo de denúncias da Operação Lava-Jato.

Dilma discutirá com o grupo de ministros medidas para reativar a economia que possam ser apresentadas aos parlamentares logo na volta do recesso. A estimativa dos analistas do mercado financeiro é que a economia encolha 2,8% em 2016. Neste ano, está sendo estimada uma recessão de 3,7%.

O governo também deve discutir como aprovar a CPMF e a prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU), pontos críticos para o ajuste fiscal. Além disso, a presidente precisa tratar da reforma da Previdência, um dos pontos mais destacados por Barbosa ao assumir o cargo.

Dilma foi recomendada por aliados a não se envolver publicamente na reforma da Previdência, que é tema sensível, especialmente em meio ao impeachment. Mas ela deve dar orientações aos ministros sobre como esse tema será encaminhado.

Crise no Rio afeta principais bandeiras do governo Pezão

Italo Nogueira, Marco Antônio Martins – Folha de S. Paulo

RIO - Há um ano, o Instituto Estadual do Cérebro do Rio de Janeiro era tido como um exemplo na rede pública. O Hospital da Mulher era classificado como referência no atendimento à gestante. As UPAs (Unidades de Pronto Atendimento) 24 horas, criadas no Rio, inspiraram a política federal.

Exibidos à exaustão na campanha de 2014, os dois primeiros estão fechados. As últimas, quando não estão fechadas o dia todo, funcionam parcialmente, atendendo só casos considerados graves.

A atual crise financeira no Rio de Janeiro comprometeu programas usados em 2014 como vitrines eleitorais pelo governador Luiz Fernando Pezão (PMDB).

Bandeiras de campanha de Pezão em outros setores da administração também foram afetadas. Até agora, nenhuma das 40 novas UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) prometidas durante a eleição foi inaugurada.

Houve ainda redução no subsídio pago no Bilhete Único do transporte e extinção na tarifa do metrô.

Duas bibliotecas-parques quase fecharam por falta de recursos –desfecho que só foi evitado porque a Prefeitura do Rio decidiu assumir os custos de manutenção.

O Estado mantém uma taxa de investimento de 10% do total de suas despesas, uma das mais altas do país. Mas são obras bancadas por empréstimos que vêm com destino definido; dinheiro que não pode ser redirecionado para outros setores.

O colapso nos principais programas do Estado é fruto da queda brusca na arrecadação, principalmente a partir de outubro.

A estimativa é que a receita com ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), a principal fonte de receita própria, seja de R$ 32 bilhões, um valor 16% inferior aos R$ 38 bilhões originalmente previstos.
novo cenário

Nos últimos oito anos, desde a eleição do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB), o Rio aumentou sua taxa de investimento graças aos repasses de verbas federais.

Isso permitiu que a arrecadação própria –em alta com o bom desempenho da economia à época– bancasse a criação de programas custosos, como o das UPPs, o Bilhete Único e o de "hospitais-modelos", iniciativas que ampliaram a despesa corrente.

A partir de 2010, a transferência de recursos passou a cair. Mas os investimentos seguiram em alta, desta vez com empréstimos autorizados pela União. O Estado do Rio passou então a registrar deficit primários sucessivos.

A crise econômica iniciada no segundo semestre de 2014 criou um novo cenário.

Além da redução da arrecadação do ICMS, a queda no preço do barril de petróleo, item de destaque nas finanças locais, afetou a receita do Estado com royalties (estão hoje cerca de 25% menores do que o previsto).

A situação só não é pior porque o Estado conseguiu receitas extraordinárias neste ano. Fechou acordos com empresas devedoras que renderam R$ 459 milhões.

O secretário de Fazenda, Júlio Bueno, diz que o Rio depende de novas receitas assim para pagar as despesas previstas para o ano que vem, estimadas em R$ 80 bilhões.

Para tentar minimizar o problema urgente da saúde, o governo federal anunciou na quarta-feira (23) um repasse de R$ 45 milhões para a área e prometeu mais R$ 90 milhões até 10 de janeiro.

Garantiu ainda envio de itens básicos, como ataduras, agulhas e remédios, no valor total de R$ 20 milhões.

O encolhimento das finanças do Rio coincide com o protagonismo do PMDB local no cenário político. Nos últimos meses, o PMDB-RJ tornou-se peça fundamental no jogo de poder em torno da presidente Dilma Rousseff.

É do PMDB do Rio o principal algoz da petista, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, articulador do pedido de impeachment.

E são do diretório peemedebista fluminense também alguns dos principais defensores de Dilma, como o próprio Pezão, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o líder do partido na Câmara dos Deputados, Leonardo Picciani.

Para cientistas políticos, 2016 será tão ou mais turbulento que 2015

Por Fernando Taquari – Valor Econômico

SÃO PAULO - "Este foi um ano que não começou e insiste em não acabar". A declaração foi feita pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao anunciar, em tom de desabafo, o fim do ano legislativo, no dia 17 de dezembro. Com a frase de efeito, o senador pemedebista procurou dar uma dimensão do quadro de instabilidade que se instalou na política brasileira desde a eleição presidencial. Este ano, no entanto, representou o início de uma crise que deve ter um desfecho nos próximos meses, o que faz de 2016, segundo cientistas políticos ouvidos pelo Valor, um ano igual ou até mais turbulento do que foi 2015, a depender dos acontecimentos.

A expectativa leva em conta o andamento do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de pedir o afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e sua eventual sucessão, os desdobramentos das operações Lava-Jato e Zelotes, sempre imprevisíveis, e as eleições municipais, além de fatos imponderáveis da política dentro de um quadro de aperto econômico. Para Carlos Melo, cientista político do Insper, o desenrolar dos fatos originados neste ano permitirá ao país deixar o momento de paralisia em que se encontra por conta do impasse em torno da saída ou não de Dilma da Presidência da República.

"Agora, é impossível dizer se vai ou não ter o impeachment. Ninguém tem essa resposta neste momento. Tudo vai depender das articulações do Congresso e das vozes das ruas. De concreto, vejo que, ao contrário de 1992, há uma tensão maior. Existem dois lados em disputa. O impeachment de [Fernando] Collor uniu o país na época. O da Dilma certamente não vai unir", observa Melo. Além disso, o professor do Insper aposta que o Palácio do Planalto continuará, em 2016, "refém" do Congresso e da economia. "Não vejo perspectivas animadoras neste sentido. O governo segue sem força para construir uma coalizão segura e para reverter o cenário pessimista na economia", acrescenta.

Já o cientista político Cláudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP), ressalta que a permanência de Cunha como presidente da Câmara, a despeito do pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR), aumenta o poder de fogo da oposição e os riscos ao governo Dilma. Mesmo assim, considera sua continuidade no cargo insustentável dado o cerco do Ministério Público Federal (MPF) e a quantidade de provas reunidas pela Lava-Jato. "A política está muito volúvel. Fica difícil prever. De todo modo, me parece que, no caso do Cunha, a questão não é se vai acontecer, mas quando", afirma. Se isso acontecer, diz Couto, o governo também perde o discurso por um lado, embora se veja livre de um desafeto.

"Ter o Cunha como contraponto é um alento e uma vantagem. Garante à presidente Dilma ir à TV dizer que não tem contas no exterior e nem a investigação de um fato criminoso contra si", afirma o professor da FGV. Uma eventual sucessão na Câmara tampouco é garantia de sucesso, segundo os dois cientistas políticos, uma vez que alguns dos nomes comentados nos bastidores, como os dos deputados Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) e Leonardo Picciani (PMDB-RJ), não inspiram tanta confiança. "Apesar de ser um aliado hoje, não podemos esquecer o histórico do Picciani, que fez campanha para o adversário de Dilma em 2014 [Aécio Neves, candidato do PSDB], lembra Melo.

"Já Jarbas faz oposição e é um desafeto do governo que tem a seu favor o fato de não haver nada que o comprometa do ponto de vista moral", afirma Couto. A hipótese mais provável até aqui, no entanto, é que o vice-presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), aliado de Cunha, assuma o comando caso o pemedebista seja afastado pelo Supremo. "Mas se, por acaso, os deputados contrariarem o entendimento preliminar da secretaria-geral da Mesa e ocorra novas eleições, não acredito que o governo terá força para fazer o sucessor", prevê o cientista político do Insper.

A oposição beneficiou-se ao pegar carona no desgaste do governo, mas também está refém do processo e da tração entre o Planalto e o PMDB, segundo Melo. "Os tucanos são mais passivos da crise do que agentes", diz Melo. Couto, contudo, acredita que o PSDB pode colher frutos em 2016 com o discurso unificado em favor do impeachment, como os tucanos esforçaram-se em demonstrar em um encontro partidário com as principais lideranças da sigla realizado em meados de dezembro.

Quanto às eleições municipais ambos argumentam que o PT deve pagar o preço pelos esquemas de corrupção desvendados em 2015, embora hajam outros partidos envolvidos. "O desgaste do PT será maior. Porém, isso não se configura a favor do PSDB. A eleição de prefeito tem dinâmica própria. O resultado pode surpreender", diz Couto. Melo prevê ainda que o cenário de baixa arrecadação e aperto fiscal torna a eleição mais difícil para prefeitos que tentam a reeleição ou buscam fazer sucessor.

Cunha diz em rede social não ser o 'vilão do País'

• Presidente da Câmara desabafa nas redes sociais e critica divulgação de boato sobre suposta viagem de sua família para Cuba

Luciana Nunes leal - O Estado de S. Paulo

Rio - O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), voltou ao Twitter neste domingo, 27, para negar que tenha viajado com a família para Cuba. Cunha reclamou de ser tratado como “vilão do País” – “como seu eu fosse o chefe do governo que assaltou a Petrobrás”, afirmou. O deputado disse que pediu aos filhos para “fecharem” suas redes sociais, xingou um colunista do jornal “O Globo” que divulgou que ele e sua família teriam ido para Cuba.

Cunha citou a impopularidade da presidente Dilma Rousseff. “70 por cento dos brasileiros rejeitam a presidente e pedem o seu impeachment, incluindo a maior parte dos 54 milhões que a elegeram”. O deputado disse ter sido “eleito por 232 mil eleitores do Rio, como representante de parte da população”.

A notícia sobre a suposta viagem a Cuba foi publicada por coluna do jornal “O Globo” neste sábado, 26, depois de uma das filhas de Cunha publicar em sua conta no Instagram uma imagem com um gesto obsceno e o comentário “see you in Cuba” (vejo você em Cuba). A imagem era reprodução de uma fotografia publicada pela modelo Kellen Jenner, irmã da socialite americana Kim Kardashian.

No sábado, Cunha negou a viagem no Twitter: “"Para os idiotas desinformados que plantaram notícias falsas. Estou no Rio e segunda a tarde estarei em Brasília".

Neste domingo, voltou a negar a viagem, que chamou de “evidente mentira”. Segundo o deputado, “a maior parte da família” está com ele no Rio de Janeiro. O presidente da Câmara encerrou a série de textos no Twitter desejando bom domingo inclusive a seus “detratores”.

Aécio Neves: Para merecer 2016

- Folha de S. Paulo

É inacreditável, mas no apagar das luzes de 2015, vimos reprisado um velho filme que a nação não suporta mais assistir. Estamos falando de mais um ataque frontal à legislação em vigor no país.

Vamos aos fatos. O governo federal violou de forma deliberada e intencional os princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal, fraudando ostensivamente o Orçamento da União, o que levou ao descalabro das contas públicas em 2015.

Quem assim atestou, por unanimidade, foi o Tribunal de Contas da União, entendendo que as contas fiscais do governo federal de 2014 continham irregularidades que feriram preceitos constitucionais, a Lei Orçamentária e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Esta é a realidade nua e crua que a nação conhece muito bem.

O parecer do relator da Comissão Mista do Orçamento, ao recomendar ao Congresso a aprovação das contas da presidente, contraria o parecer técnico do TCU, que mostra, com clareza, que o governo federal cometeu diversos atos ilegais, inclusive contra a Constituição. É um retrocesso com o qual não podemos compactuar.

O quadro de aparente contradição criado pelo parecer em questão é propício ao governo que acaba de empreender mais uma de suas piruetas. Para quitar a conta em atraso das pedaladas fiscais –manobras em que os bancos públicos foram utilizados para pagar despesas orçamentárias, criando uma ilusão contábil que mascara o déficit nas contas públicas– o comando petista vem a campo com os seus velhos artifícios.

No vácuo do recesso parlamentar e das festas de fim de ano, o governo editou uma medida provisória autorizando o uso do saldo financeiro da conta única do Tesouro Nacional para pagar despesas primárias em atraso, o que viola o artigo 8º da LRF. Este saldo deveria ser usado apenas para o pagamento de dívida pública.

Sei que esse tema soa secundário para muitos. Afinal, diante do drama da saúde pública do país, diante da realidade que esmaga diariamente o sonho de milhões de brasileiros, questões como essa podem parecer sem importância, afeitas apenas ao mundo político. Não são.

Na mesma semana em que tenta sinalizar responsabilidade e transparência ao país e ao mundo, o governo patrocinou nova manobra que tem como consequência imediata o aumento da desconfiança dos investidores e da sociedade. Continuamos tendo dois governos: o do discurso e o da realidade.

Esse foi um ano especialmente difícil. Para merecermos um ano melhor, é imprescindível que sejamos capazes de preservar e aperfeiçoar tudo o que assegura a qualidade da nossa democracia. Isso significa defender o cumprimento das leis. Meu compromisso com o Brasil não se curva. Torço para que o seu também não. Com muita esperança, Feliz 2016!
-------------
Aécio Neves, senador, presidente nacional do PSDB

Ricardo Noblat: 2015, o ano que segue!

- O Globo

“Sou contra o impeachment, porque creio que ele livrará o PT da responsabilidade sobre a crise atual”. Fernanda Torres, atriz

Como pode sobreviver um presidente que arrastou seu país para o buraco? Muito mal, imagino, salvo se não se sentir culpado pelo que fez. Dilma é uma economista medíocre. Mas até uma economista assim era capaz de perceber que as medidas adotadas no seu primeiro governo estavam dando errado. E que perseverar com elas provocaria o desastre que se desenhava. Pois perseverou. Para reeleger-se.

É POR ISSO que não deve ser perdoada. Não faltaram alertas para o desastre iminente e quase inevitável. Ela desdenhou deles, por ignorância ou cálculo político. Ou uma mistura das duas coisas. Se tentasse corrigir a rota da economia, o mais certo seria a derrota eleitoral. Foram meses de mentiras destiladas no rádio e na televisão. Para ao fim e ao cabo reeleger-se por pouco.

UM PRESIDENTE pode proceder assim? Tanto pode que Dilma procedeu. Não foi o primeiro presidente. Vale tudo pelo poder. Só não vale entregá-lo, menos ainda a adversários. Fernando Henrique entregou-o a Lula na esperança de sucedê-lo quatro anos depois. Lula flertou com o terceiro mandato consecutivo, mas acabou entregando o poder a Dilma para retomá-lo no ano passado.

FALTOU-LHE CORAGEM para tal. A Lava-Jato tornara Lula vulnerável. Foi nos dois governos dele que a roubalheira na Petrobras deixou de servir apenas aos que dela se beneficiavam para ser aproveitada por um partido e seus aliados, empenhados em permanecer no poder por longo, longo tempo. Dilma sepultou o projeto de poder de Lula e sua turma, essa é que é a verdade. Não o fez por bem, mas por incompetência.

DE TODO MODO, merece o reconhecimento dos que enxergam na alternância no poder uma das muitas vantagens da democracia sobre os outros tipos de regime político. Pena que o preço pago pela façanha de Dilma seja o saldo cruel de um ano que não terminará daqui a três dias, como prescreve o calendário. Não. O “annus horribilis” de 2015 se estenderá pelos próximos.

CERCADO POR economistas liberais, improvável que Michel Temer não tenha se dado conta de que o governo caminhava para o abismo. Concedo que é um vice decorativo; e de uma presidente que só escuta ela mesma e os que com ela concordam. Mas José Alencar, vice de Lula, nunca deixou de manifestar suas discordâncias com a política econômica do governo. Por que Temer não? E por que só agora discorda?

TUDO INDICA, graças a um presidente da Câmara dos Deputados velhaco e a uma oposição covarde, que o país seguirá sob o comando de Dilma até o fim do seu mandato; ou à espera de que a sorte a remova para dar lugar a... a Temer, autor de uma carta de amor ridícula como são todas as cartas de amor? Ou a Eduardo Cunha, que no caso de queda de Dilma e Temer convocaria uma nova eleição presidencial e governaria por três meses?

A CARTA DE Temer a Dilma foi o maior erro de um vice que pareceu cansado de esperar. Temer jamais poderia tê-la escrito nos termos que o fez; apequenou-se; e deu ensejo a ser chamado de traidor. Temer jamais poderia tê-la enviado a Dilma sem a certeza de que o PMDB respaldaria seu gesto. Ele corre o risco de, confrontado pelo senador Renan Calheiros e pelo PMDB chapa-branca, perder a presidência do partido.

SAIO DE FÉRIAS. Voltarei a escrever na primeira segunda-feira de fevereiro. Apesar das previsões em contrário, desejo-lhes um feliz 2016.

Marcos Nobre: 2015 e o século 21

• Paris foi um emblema de 2015

- Valor Econômico

Há um bom tempo a economia brasileira se integrou diretamente a cadeias de investimento, produção e consumo globais, sem as quais não tem mais como funcionar. Não obstante, o debate público está ainda longe de refletir essa nova situação. Um persistente pensamento de fundo parece continuar a ver o país da perspectiva do espaço sideral. A Conferência do Clima (CoP-21), encerrada há duas semanas em Paris, ou o um milhão de refugiados que chegaram à União Europeia ao longo de 2015 continuam a aparecer por aqui como eventos de outro planeta, infelizmente ameaçado por um possível colapso ambiental e por crises migratórias disruptivas.

E, no entanto, foi no Rio de Janeiro, em 1992, que boa parte da nova agenda ambiental começou a ser construída. Na Conferência das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o Meio Ambiente, a Rio-92, institucionalizou-se pela primeira vez a questão ambiental em escala global, tendo como horizonte a ideia de "desenvolvimento sustentável". Se a ideia parece hoje tão corriqueira e antiquada quanto um telefone fixo, antes dela era muito comum que a questão ambiental fosse vista como um falso problema ou como uma armadilha ideológica. Para grande parte do pensamento econômico, por exemplo, sempre haveria uma solução tecnológica para problemas trazidos pelo desenvolvimento e pela própria tecnologia. Também não faltava quem dissesse que as restrições ambientais não passavam de mais um expediente para que os países ricos impedissem o desenvolvimento dos países pobres.

Não que o "desenvolvimento sustentável" tenha mudado a curva da desgraça planetária. Pelo contrário, a globalização produziu uma aceleração dos desequilíbrios ambientais. Mas o slogan sacramentado em 1992 no Rio conseguiu colocar a questão ambiental no topo da agenda mundial. Foi nesse momento que algo como um Ministério do Meio Ambiente passou a ser tão comum quanto um Ministério da Fazenda. Foi a promessa de compatibilidade de desenvolvimento com manutenção das condições climáticas de habitação do planeta que permitiu que certa consciência ambiental difusa se estabelecesse como uma evidência.

Nas últimas duas décadas, um movimento ambientalista já altamente institucionalizado deu um segundo passo. Desenvolvimento sustentável, que seja. Mas a escala e o ritmo de transformação que o slogan promete é incompatível com a situação de emergência ambiental em que já se encontra o planeta. Não é mais possível ignorar que a ameaça de colapso é real e iminente. Toda a energia de movimentos sociais ambientalistas de três décadas acabou pegando carona no rastro de misérias da globalização para deixar sua mensagem: se a utilização do planeta continuar a ser subordinada à lógica de desenvolvimento econômico que prevaleceu no século XX, não haverá o que desenvolver no século XXII, talvez antes disso ainda.

Mas tampouco se trata apenas da ameaça de colapso econômico-ambiental. Entre as abstrações da economia e do meio ambiente o que existe são pessoas. E a imensa maioria delas se encontra alijada dos benefícios do desenvolvimento. Ao longo do século XX, essas desigualdades foram tratadas com repressão e muros. A disputa geopolítica entre EUA e União Soviética pretendia justificar o apoio a regimes ditatoriais da parte de ambos os lados, impedindo a circulação de pessoas e de informação, restringindo os movimentos de contestação e as aspirações à participação política. O que havia em alguns lugares era igualitarismo ditatorial, em outros ilhas de democracia limitada, em que a luta social conseguiu impor restrições às desigualdades extremas.

Hoje, a informação circula de maneira instantânea e altamente difusa. A movimentação de pessoas é intensa e massiva. A democracia se impôs como modelo de pensamento dominante para a coordenação da convivência social. Junto com essa ideia de democracia vieram certas noções de justiça social em que desigualdades extremas são intrinsecamente ilegítimas. Como a democracia ainda é pouca e como as desigualdades extremas persistem, também uma crise social global faz par com a crise ambiental.

Enfrentar essa crise com guerras, apoio a novas ditaduras e construção de muros de contenção é solução ilusória, mesmo para quem não tem problema em aceitar um raciocínio político cínico. Ainda que o terrorismo seja um problema real, o slogan da "guerra ao terrorismo" toma o sintoma pela causa e só faz agravar as verdadeiras fontes do problema. A crise dos refugiados na Europa representa apenas o topo dessa crise social. Por absurdo que possa parecer, quem arrisca a vida se lançando ao mar em condições precárias é ainda alguém que dispõe de algum patrimônio, de alguns recursos para ser extorquido por traficantes de pessoas. Os mais miseráveis não conseguem sequer deixar os campos de refugiados em que se amontoam.

Há uma conjunção perversa de crises globais que têm no horizonte formas diferentes de colapso. Mas não é difícil ver quais são as alternativas no seu enfrentamento. Pode ser um combate coordenado às desigualdades em nível global, ou a aposta na construção de muros de contenção para quem se encontra alijado dos benefícios do desenvolvimento. Pode ser transição para uma economia de baixo carbono, ou colapso ambiental. Tanto em 1992, no Rio, como em 2015, em Paris, países ricos se comprometeram com a transferência de recursos financeiros para que países pobres possam se desenvolver lançando mão de fontes de energia alternativas aos combustíveis fósseis. A promessa da Rio-92 não foi cumprida.

Na CoP-21, como em nenhuma outra conferência antes dela, foi emblemática a conjunção de crises que caracteriza o momento de transição atual. Em Paris, estiveram lado a lado mudança climática, ataques terroristas e crise de refugiados. O verdadeiro não-resultado do encontro foi a não decisão quanto a qual deve ser a crise prioritária, aquela que dará a diretriz para enfeixar as demais. Se o impasse tende a persistir por um longo período ainda, o que se sabe é que do seu encaminhamento que surgirá a cara do século 21.
-----------------
Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap.

Vinicius Mota: Petropesadelo

- Folha de S. Paulo

"Lula não é Chávez, e o PT não é bolivariano", ouviu-se ao longo dos últimos 13 anos, enquanto o chavismo mergulhava no experimento autoritário. O petismo, com sua larga roda de amizades na opinião pública, difundiu a ideia de que vivíamos um progressismo responsável.

A propaganda estava errada. O furor intervencionista, as fraudes contra o Orçamento e a prestação de contas, o conúbio do poder estatal com empresários sedentos por privilégios (nossa "boliburguesia") e a sem-cerimônia de alterar as regras do jogo econômico para moldá-las a apetites de ocasião mostraram-se traços constitutivos do petismo no governo.

O PT aderiu com volúpia à vaga populista regional, encontrou parceiros poderosos na política e na sociedade e contou com beneplácito na academia e na imprensa. O estrago ao exaurir-se o ciclo não terá as proporções bolivarianas porque o Brasil é mais desenvolvido que a Venezuela.

O petróleo e a Petrobras –núcleos do intervencionismo lulista– não dominam a economia brasileira, à diferença do que ocorre na Venezuela. A autonomia das instituições de controle do Poder Executivo também é mais elevada no Brasil.

Ainda assim, a destruição em segmentos e regiões mais afetados pelo petropopulismo será extensa e duradoura. O setor público do Rio de Janeiro está quebrado, como temos visto, porque fiou-se na continuidade da bonança petrolífera.

A crise, que priva a população fluminense de serviços básicos, está no início. A Opep, dos países exportadores de petróleo, prevê que apenas em 2040 a cotação do barril, hoje abaixo de US$ 40, retome os US$ 100 registrados no ano passado.

Serão décadas de dificuldades para Estados e municípios dependentes dos impostos sobre a atividade petrolífera. O sofrimento será mitigado porque o Brasil não embarcou totalmente no petropesadelo e poderá socorrer governos em apuros.

Denis Lerrer Rosenfield: Crise permanente

- O Estado de S. Paulo

Engana-se quem pensa que a crise possa amainar, seja pela decisão do Supremo, que deu um fôlego ao governo, seja pela troca do ministro da Fazenda, seja pelo caráter intempestivo e contraditório do neoaliado da presidente, senador Renan Calheiros. O seu caráter é estrutural, nada tendo sido feito que possa alterar esse quadro. O governo continua respirando artificialmente, com a ajuda de aparelhos, sobretudo os derivados da apropriação partidária do Estado.

O governo e o PT, além de não serem nada afeitos ao princípio lógico de não contradição, também costumam atentar a outro princípio, o da causalidade. Não seria, pois, de espantar que a insensatez e a desorientação tenham se tornado métodos de governar. Vejamos alguns desses casos.

Primeiro. A substituição do ministro da Fazenda Joaquim Levy pelo ministro do Planejamento Nelson Barbosa é ilustrativa da confusão entre causa e efeito. A escolha do ministro Barbosa tem sido alardeada como sendo a ocasião de abandono de um ajuste fiscal estrito em proveito do “crescimento”. Ou seja, o ex-ministro Levy seria o culpado do desemprego, da inflação, da queda do PIB, da elevação do dólar e assim por diante. Ora, a crise econômica e social é nada mais do que o efeito da “nova matriz econômica”, que teve como um dos seus artífices o novo ministro da Fazenda. De efeito, Levy aparece como causa e Barbosa, de causa, desaparece como tendo sido um dos responsáveis do atual descalabro. Causa e efeito são subvertidos, como se a lógica pudesse ser simplesmente descartada. E somos governados por ilógicos!

Segundo. A presidente Dilma se considera uma grande economista e se vê no espelho na escolha de Nelson Barbosa como seu novo ministro. É como se, enfim, pudesse ter se visto livre daquele “neoliberal”, preocupado com as contas públicas e avesso à gastança governamental. É como se o “neoliberalismo” fosse o responsável do atual buraco em que se vê metido o País, quando ele não tem nada que ver com isso. A crise brasileira é o mais nítido produto de uma política econômica de esquerda, estatizante, profundamente desconfiada da economia de mercado.

Terceiro. O PT passa, agora, a responsabilizar o ex-ministro Joaquim Levy pela recessão, pelo aumento da inflação e pelo desemprego produzidos pela própria esquerda. Pretendem mais do mesmo enquanto solução para os problemas por eles mesmos criados. Desrespeitam a lógica, pois apenas se apresentam como sem-pensamento. Deveriam constituir o Movimento dos Sem-Pensamento, irmanados aos Sem-Terra, aos Sem-Teto e assim por diante. O seu contentamento pela escolha do ministro Nelson Barbosa já é um sinal extremamente perigoso de que o partido possa, agora, influir mais diretamente na política econômica. A economia em frangalhos pode se espatifar ainda mais, como mostram os exemplos, admirados por esta esquerda, da Venezuela e da Argentina.

Quarto. Com o objetivo de acalmar os mercados, o novo ministro acaba de anunciar que levará a cabo uma cada vez mais necessária reforma da Previdência. Se o fizer, será um ponto extremamente importante para o País, que o porá em confronto com a mesma esquerda que o levou ao poder. Terá de mexer com privilégios profundamente arraigados e defendidos corporativamente com unhas e dentes.

Note-se, contudo, que o governo, nos últimos anos, só tem multiplicado fóruns e comissões para estudar a reforma da Previdência, não chegando a nenhum resultado. Como se anúncios e comissões fossem por si mesmos soluções, não carecendo de nenhuma medida concreta. As “propostas” anunciadas não têm nenhuma credibilidade. Seus autores não geram confiança.

Quinto. A decisão do Supremo, criando ainda mais obstáculos ao processo de impeachment, terminou por aumentar a confusão reinante. Em vez de ter se comportado como uma instância arbitral, escolheu tornar-se parte do problema, e não fator equacionador dele. Poderia ter escolhido o caminho de mero garantidor de regras, em vez de ter enveredado por um ativismo jurídico, criando ritos, em vez de simplesmente garantir os existentes. Os casos do voto aberto e de chapas avulsas geram mais confusão por conflitarem não apenas com a Constituição, mas com o regimento, as práticas e a tradição da Câmara dos Deputados. Embargos declaratórios serão interpostos pela Câmara, fazendo com que o processo de impeachment se alongue ainda mais. Pior ainda, trataram os deputados e os senadores como menores de idade que devem ser tutelados.

Sexto. O caso do neoaliado, senador Renan Calheiros, é também um caso particularmente interessante, pois, enquanto a presidente e o PT vociferam contra o deputado Eduardo Cunha, escolhem como parceiro um senador que tem seis inquéritos em curso no Supremo Tribunal Federal. Aliás, não deixa de ser curioso que o seu caso não receba o mesmo tratamento, pela Procuradoria-Geral da República, que o do presidente da Câmara. Não se trata, por parte do governo, de uma escolha ética, mas de uma mera tentativa de enfraquecer o vice-presidente, alcançando-o em sua posição de presidente do PMDB. O senador presta um imenso desserviço ao seu partido e ao País, tendo como único objetivo uma suposta retribuição governamental que lhe possa, eventualmente, ser garantida nos tempos difíceis que estão por vir.

Em suma, no contexto mais geral da atual crise política, o governo e o PT, utilizando-se de seus aliados de ocasião no próprio PMDB, procuram inviabilizar o vice-presidente enquanto alternativa de poder, minando-o como presidente do partido. Tudo passa a valer, inclusive a ausência completa de moralidade pública e pessoal, que, a bem dizer, foi simplesmente abandonada nos últimos 13 anos.
O Brasil não conta neste jogo, que tem como única finalidade evitar o impeachment, por mais que o País rume, assim, para o precipício.
----------------
É professor de filosofia na UFRGS.

Valdo Cruz: Triqueda?

- Folha de S. Paulo

Última semana de um ano que não vai deixar saudades, vem aí 2016 com uma certeza e várias dúvidas. Vamos conviver com mais um período de recessão, uma retração que pode ser de 2% do PIB (Produto Interno Bruto).

Como seria bom que tais previsões estivessem erradas, tal como aconteceu no início deste ano que teima em não acabar. Lá em janeiro o mercado previa um crescimento pequeno, mas jamais um tombo de quase 4% como deve ocorrer em 2015.

Serão dois anos de recessão sob a era petista, trazendo todo tipo de incerteza, deixando indefinido o futuro do governo Dilma e do PT, partido que pode simplesmente desidratar-se por completo depois de concluída a Operação Lava Jato.

Este cenário sombrio assombra a cúpula petista, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à frente -outro que hoje não sabe como será o amanhã-, e vai agitar como nunca a disputa pelos rumos da administração Dilma Rousseff em 2016.

No Palácio do Planalto, a equipe de Dilma fala abertamente que o futuro da chefe está atrelado ao desempenho da economia. Se ela transmitir alguma esperança de que a vida vai melhorar, tudo bem. Caso contrário, até assessores bem próximos da petista põem em dúvida seu futuro.

Daí que a pressão sobre Nelson Barbosa, novo ministro da Fazenda, será pesada. Depois de derrubar Joaquim Levy, a turma petista vai cobrar de seu substituto o impossível, tirar o país da recessão num passe de mágica, usando fórmulas milagrosas como pegar a grana das reservas internacionais para transformar em crédito para a economia.

Esta guerra interna mal-administrada pela presidente Dilma, que ajudou a travar a economia neste ano que termina, pode complicar ainda mais o que vem chegando.

Pior, coloca em perigo até 2017. Se o governo seguir imobilizado pela disputa interna, o país corre o risco de ter um terceiro ano de retração. Um tricampeonato trágico.

Marcus Pestana: Adeus, triste 2015, que venha o nebuloso

- O Tempo (MG)

Cartomantes, videntes, jogadores de búzios: salvai-nos! Pintem de dourado as perspectivas de nosso futuro imediato. Todas as preces sejam lançadas aos céus. Que a fé desse povo guerreiro rasgue novos horizontes longe da nebulosa realidade presente.

O ano de 2015 não deixará saudades. De positivo, somente o vigor das instituições republicanas e democráticas e a mobilização nas ruas, mostrando que outro país é possível.

A economia brasileira está derretendo em depressão profunda. Marcha à ré no PIB de 3%. Desemprego batendo na porta de 9 milhões de trabalhadores. A indústria brasileira indo pelo ralo. Inflação alta de 10%. Agências de classificação de risco rebaixando o Brasil para a segunda divisão. Estrangulamento fiscal absoluto. Déficit nominal de 10% do PIB. Dívida bruta na casa dos 70% do PIB. Investimento público raquítico. A renda por habitante despencando 8% em três anos. Desmoralização da contabilidade pública com maquiagens contábeis, pedaladas fiscais e decretos ilegais. Crise de credibilidade e confiança. O governo sem bússola colocando o país à deriva.

Paralelamente, a Lava Jato mostrou um quadro devastador em que a corrupção sistêmica e institucionalizada foi convertida em método de governo do “presidencialismo de cooptação”. Orquestrada pelo PT, uma extensa rede de desvios lançou seus tentáculos por toda a máquina pública. As cifras bilionárias fizeram o mensalão parecer um jogo de crianças. A indignação da sociedade foi encontrar resposta em figuras como o juiz Sérgio Moro, o procurador da República Deltan Dallagnol ou até mesmo o simpático japonês da Polícia Federal, Newton Ishii.

Os chefes dos Poderes Executivo e Legislativo estão no centro dos acontecimentos. Dilma foi ministra de Minas e Energia, presidente do Conselho da Petrobras e “Mãe do PAC”. Todas as obras fontes de corrupção estavam sob a sua alçada. Por ação ou omissão, conivência ou incompetência, comando ou negligência, teve o domínio dos fatos. Se não é beneficiária pessoal, é, no mínimo, beneficiária política e deve responder por isso. Renan Calheiros e Eduardo Cunha estão diante de graves e fortes denúncias, submetidos a investigação. Tudo isso bastaria para transformar 2015 em um ano destrutivo face às esperanças da sociedade brasileira.

Some-se a isso o estelionato eleitoral com promessas, como a diminuição da tarifa de energia, transformadas em pesadelo para a população e a rejeição absoluta ao governo lulopetista de Dilma, e construímos uma base nada animadora para a decolagem de 2016. Sem falar no desastre ambiental de Mariana.

A perspectiva de um crescimento negativo novamente de 2,5%, de 11 milhões de desempregados ao final do ano e da permanência em suspense do destino de Dilma e Cunha já craveja de interrogações o ambiente de 2016.

Mas o Brasil é maior que a crise. E perder a esperança não iluminará o futuro. Um 2016 feliz dependerá de todos nós.
--------------------
Marcus Pestana, deputado federal (PSDB-MG)

Fernando Pessoa: Poema em linha reta

Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.

E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo.
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado
[sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.

Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe — todos eles príncipes — na vida…

Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,

Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?

Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.

Lencinho Querido - Marisa Monte