sexta-feira, 1 de julho de 2022

Vera Magalhães: Bolsonaro é premiado por sua incompetência

O Globo

Quando historiadores forem analisar o governo Jair Bolsonaro, um dos fatores sobre o qual terão de se debruçar é o fato de como a incompetência extrema do presidente e de seus auxiliares é constantemente premiada com colheres de chá que acabam por premiar a falta de planejamento.

A aprovação de afogadilho de um enorme cheque em branco eleitoral para o presidente distribuir grana viva às vésperas da eleição, ao arrepio flagrante da Constituição, da lei eleitoral, da Lei de Responsabilidade Fiscal e do teto de gastos é só a mais recente dessas incompreensíveis ajudas que Bolsonaro, mesmo deixando claras suas piores intenções, consegue receber de todos, inclusive da oposição.

Foi assim com a PEC que promoveu a pedalada descarada nos precatórios, que nada mais são que dívidas transitadas em julgado; com a mais recente emenda que promoveu uma tunga no ICMS de Estados e municípios apenas para conter o faniquito do presidente para baixar o preço dos combustíveis de forma terceirizada, e que, como previsto não foi efetiva; com as sucessivas e inimagináveis intervenções na direção da Petrobras, que acontecem sem que ninguém tente impedir, entre outros episódios recentes e mais remotos.

Agora o Senado acaba de dar lastro ao desespero eleitoral de Bolsonaro, fornecendo a ele uma vantagem econômica absurda em relação aos adversários. Como cria uma narrativa chantagista de que se trata de combater a fome, a insegurança alimentar e a perda de renda provocada com a inflação — como se todos esses flagelos reais não fossem obra continuada justamente da inoperância do governo e de sua capacidade de planejar medidas de longo prazo — o governo consegue fazer com que  um rombo de R$ 40 bilhões para promover benesses eleitoreiras seja aprovado praticamente por unanimidade, com beneplácito inclusive do PT.

Míriam Leitão: Oposição caiu na armadilha do governo Bolsonaro

O Globo

aprovação da chamada PEC 01, com ampla maioria de votos da oposição, mostra que esses senadores caíram na armadilha criada pelo governo Bolsonaro. O presidente ganhou um cheque em branco para ampliar despesas a menos de 100 dias das eleições, desrespeitando as leis fiscais e eleitorais do país.

O único parlamentar com coragem de fazer a coisa certa foi o senador José Serra (PSDB-SP), que foi o voto contrário nos dois turnos de apreciação da matéria no Senado. A ilusão dos senadores oposicionistas é achar que conseguiram melhorar o texto, evitando o pior cenário.

Laura Karpuska*: Instituições avariadas

O Estado de S. Paulo

A classe política se cala para o mais novo golpe às instituições feito por este governo

Desde que assumiu a Presidência, Jair Bolsonaro trabalha para minar a confiança nas instituições brasileiras. Seu foco nunca foi fazer reformas econômicas de natureza liberal, nem mesmo defender uma pauta conservadora nos costumes. Bolsonaro governa pelo caos, usando-o como estratégia de manutenção do poder e de apropriação do Estado por pequenos grupos de interesse.

O foco desta coluna era elencar o risco de Bolsonaro acelerar o derretimento institucional para tentar, a qualquer custo, ganhar as eleições. A pauta do Senado desta semana serviu como exemplo prático disso, mostrando que o governo Bolsonaro não está sozinho nesta empreitada. Enquanto escrevo, o Senado vota uma Proposta de Emenda à Constituição que coloca o País em “estado de emergência” por conta dos aumentos do petróleo. Inicialmente, a proposta previa compensar Estados que decidissem zerar o ICMS dos combustíveis.

Fernando Luiz Abrucio*: O casamento da barbárie com o atraso

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Havia no Brasil uma grande agenda de modernização pela frente, só que o bolsonarismo interrompeu este processo civilizatório

O governo Bolsonaro é o casamento do atraso com a barbárie. Este projeto está levando o país a um enorme retrocesso, que já pode ser contado em termos de décadas. O Brasil tinha tido vários avanços institucionais e sociais desde a redemocratização, especialmente com a Constituição de 1988, mas também por meio de melhorias ocorridas em diversos mandatos. Ainda havia uma grande agenda de modernização pela frente, só que o bolsonarismo interrompeu este processo civilizatório e se corre o risco agora de sobrar apenas um Estado destruído e uma sociedade dominada pela lógica da violência.

A modernização brasileira ocorreu em múltiplas dimensões desde o final do regime militar. O primeiro ganho foi político. O país tornou-se democrático, realizando oito eleições presidenciais livres e com alternâncias de poder. Houve uma ampliação dos mecanismos de participação popular e fiscalização dos governantes, de modo que o Estado se tornou mais aberto à sociedade e transparente. A democracia brasileira tinha ganhado uma forma inédita, pois escolhia livremente os seus representantes por um método limpo de seleção e podia controlá-los para evitar o arbítrio, o pior dos males de qualquer regime político.

O segundo ganho desse processo civilizatório foi social. Houve enormes avanços em indicadores de saúde, num país historicamente marcado pela desassistência aos mais pobres, especialmente as crianças, mulheres e idosos. Sinal disso foi a melhora substancial nas taxas de mortalidade infantil, expectativa de vida, saúde materna, entre outros.

José de Souza Martins*: O poder paralelo e do avesso

Valor Econômico / Eu & Fim de Semana

Garimpo, madeireiros, pesca, invasão de terras indígenas, grilagem e devastação ambiental são indicações de que o Estado pode ter perdido o controle de uma parte do território

O assassinato do indigenista Bruno Araújo Pereira e do jornalista Dom Phillips mostrou-nos que, na estrutura social e política da sociedade brasileira, transformados, persistem dois Brasis. O Brasil legal, que é aquele em que supomos viver e do qual supomos ser cidadãos, e o Brasil paralelo e clandestino, das formas disfarçadas de violação das leis e de minimização adaptativa das instituições aos requisitos de preservação e reprodução do atraso.

As eleições de 2018 acordaram e deram força ao Brasil retrógrado e sobrevivente de todos os nossos atrasos acumulados e represados desde as escravidões, a indígena formalmente encerrada em 1755 e a africana, em 1888. Esse Brasil acordou pós-moderno, na definição de Néstor García Canclini, sem moderno ter sido.

Arcaica concepção de poder e cômica tirania desenham um modelo de atraso lucrativo, o do poder pessoal e dos misticismos híbridos que desaguaram nas seitas e religiões de negócio. Nossas misérias se juntaram numa conspiração alienadora para usurpar o direito de expressão democrática do povo.

Eliane Cantanhêde: Tensão pré-eleitoral

O Estado de S. Paulo

Com ex-ministro preso e presidente da CEF atacando moças, Bolsonaro prepara planos B e C

O presidente Jair Bolsonaro está no seu inferno astral, ou com tensão pré-eleitoral, empilhando notícias negativas, uma em cima da outra, o tempo todo. É aquela história: o candidato à reeleição tem vitrine, caneta, verbas, cargos e puxa-sacos, mas também é vidraça. Tem de responder pelo que acontece.

Não bastassem inflação, gasolina, diesel, gás e 33 milhões de famintos, temos o assassinato de Dom Phillips e Bruno Araújo Pereira jogando luzes na implicância de Bolsonaro com indígenas e o ex-ministro Milton Ribeiro preso pela PF. Além de revelar que o presidente pôs os dois pastores vigaristas no MEC e lhe passou informação privilegiada sobre a busca e apreensão.

Agora vêm os relatos de mulheres sobre ataques, mãos bobas e convites indecorosos do ex-presidente da Caixa Econômica Federal Pedro Guimarães, bolsonarista roxo e arroz de festa nas tais lives de quintafeira e em viagens dentro e fora do País. Se Bolsonaro já faz piadas sexistas e grosseiras com o presidente de Portugal, imagine-se com o machão amigo.

Bernardo Mello Franco: O malandro e os otários

O Globo

Todo dia, um malandro e um otário saem de casa. Quando eles se encontram, sai negócio. Na sabedoria popular, é comum que um político assuma o lugar do malandro. Mas os papéis podem se inverter: basta que ele cruze com o apresentador José Luiz Datena.

Há dez anos, o âncora do Brasil Urgente ameaça disputar algum cargo público. Há dez anos, ele anuncia que mudou de ideia, fazendo de trouxas todos os políticos que o cortejaram.

A lenga-lenga começou em 2012, quando o apresentador ensaiou concorrer à Prefeitura de São Paulo. “Às vezes, tenho vontade de me candidatar para corrigir as coisas de dentro”, declarou. A frase deflagrou uma guerra entre partidos interessados em filiá-lo.

Meses depois, Datena anunciou que continuaria na TV. E ainda ironizou as celebridades que trocam o estúdio pelo palanque: “O fato de o cara ter popularidade não vai necessariamente significar que ele é um bom administrador ou que tenha credibilidade”.

Cristian Klein: Caixa de surpresas do bolsonarismo

Valor Econômico

Desistência de Datena reforça isolamento eleitoral de presidente

A força e a fraqueza do radicalismo político estão na rigidez de ideias e de métodos. De tão contundentes e persistentes são capazes de dobrar e solapar instituições e adversários - transformados em inimigos - assim como podem ser vítimas da própria intransigência e isolamento. O desempenho da popularidade do presidente Jair Bolsonaro (PL) expressa o saldo desses resultados contraditórios.

Pesquisas eleitorais, uma atrás da outra, mostram a resiliência das intenções de votos de Bolsonaro, a despeito de uma sequência de fatos políticos negativos nas últimas semanas: comoção pela morte de dois defensores da Amazônia e dos povos indígenas, em meio à política de descaso do governo em favor de grileiros, garimpeiros e madeireiros ilegais; a alta da inflação e do preço dos combustíveis; o agravamento do escândalo de corrupção no Ministério da Educação; as acusações de assédio moral e sexual contra o presidente da Caixa Econômica Federal etc.

Claudia Safatle: Quebrando tabus

Valor Econômico

Solução para preços é privatizar as refinarias da Petrobras

A discussão sobre os preços dos combustíveis no país já deu um importante fruto: quebrou o tabu sobre a eventual privatização da Petrobras. E no debate interno do governo há posições técnicas que não são necessariamente as mesmas da empresa estatal, que advoga com unhas e dentes a necessidade de seguir o preço internacional do petróleo, que é uma commodity.

O que o governo quer da empresa, no curto prazo, é que ela segure os reajustes de preços por uns três a quatro meses, até passar as eleições. Mas, para que haja espaço no mercado de combustíveis para um regime concorrencial, em que os preços podem cair, é preciso fazer mudanças estruturais. E essas começam pela privatização da área do refino.

Flávia Oliveira: Um governo contra as mulheres

O Globo

Três horas antes de as denúncias de assédio sexual a funcionárias por Pedro Guimarães, agora ex-presidente da Caixa, tornarem-se públicas pelo site Metrópoles, na terça-feira Jair Bolsonaro celebrava numa rede social a geração de 277 mil vagas formais no Brasil em maio e a primeira taxa de desemprego de um dígito em sete anos. O saldo positivo do emprego com carteira assinada fora divulgado na véspera, com base de dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged). A taxa de desocupação de 9,8% no trimestre março-maio —de fato, a primeira abaixo de 10% desde o mesmo período de 2015 — só seria oficialmente conhecida ontem de manhã, quando o IBGE apresentou os resultados da Pnad Contínua.

Ruy Castro: Bolsonaro derrete

Folha de S. Paulo

E daí?, diz ele. Está certo de que, se não ganhar, tem bala para levar assim mesmo

Os marqueteiros de Jair Bolsonaro devem estar cortando os pulsos. Seu candidato se dedica a melar a imagem que tentam vender dele, baseada na potoca de 2018 e que poderia dar certo de novo: seus discursos sobre Deus, pátria, família e corrupção. Todas essas palavras já derreteram. Os profissionais se desesperam, porque o Bolsonaro de comício é um fantasma diante do Bolsonaro real.

Deus, por exemplo. Seu nome disputa em incidência com "porra" na boca de Bolsonaro. Às vezes Bolsonaro usa "porra" no lugar do ponto e outras no lugar da vírgula. Antes dele, nunca houve um presidente, nem João Batista Figueiredo, o mais grosso até então, que concluísse suas manifestações públicas com "porra". Sendo "porra" o chulo de "esperma", imagina-se como reagem as famílias católicas e evangélicas que se pautam por certo recato. E como estará Deus se sentindo nessa vizinhança verbal? Não esquecer que Ele ainda é um poderoso cabo eleitoral.

Hélio Schwartsman: Corrupção insignificante

Folha de S. Paulo

Qual valor abaixo do qual os casos de corrupção não devem nos preocupar?

Embalado pela prisão de Milton Ribeiro, escrevi na semana passada uma coluna sobre a corrupção no entorno de Jair Bolsonaro. Vários leitores me recriminaram por não ter feito uma comparação entre os valores que teriam sido desviados na atual gestão e os surrupiados sob a administração petista. De fato, não me debrucei sobre o problema. Até onde é possível analisar, o esquema do petrolão era mais amplo e sofisticado e deve ter resultado em montantes maiores. A proverbial incompetência do governo Bolsonaro vale também para a corrupção.

Reinaldo Azevedo: Um pastelão amador e sangrento

Folha de S. Paulo

Se bolsonarismo fosse obra de ficção, pecaria por falta de verossimilhança

Se fosse obra de ficção, o governo Bolsonaro não passaria pelo crivo de críticos exigentes. Falta-lhe verossimilhança, esse conceito tão caro à literatura e ao drama. Tudo é tão caricatural e grotesco que um editor de livros ou um diretor de teatro ou cinema diriam: "Não dá para aceitar essa porcaria. Se a arte não reproduzir minimamente os critérios de razoabilidade e plausibilidade do mundo real, é impossível haver comunicação com o público". Antes de jogar o texto no lixo, esse meu crítico imaginário pensaria, com ar aborrecido: "Vá ler Aristóteles e não me amole. Ou escolha o caminho da literatura fantástica".

Os contrastes exagerados; a falta de nuances de caráter; o lobo que não disfarça a sua natureza mesmo em pele de cordeiro; a hipocrisia rasgada; o sujeito que vocaliza o contrário daquilo que pensa e que pratica o oposto do que diz... Nada disso rende boas histórias. Há bem mais do que 50 tons de maldade e de bondade nas pessoas. Sem ambiguidade não se constroem boas personagens. Vivemos, no entanto, um pastelão amador e sangrento. O bolsonarismo é um vilão sem imaginação. A personagem principal faz troça de doentes que morrem sufocados.

Vinicius Torres Freire: Bolsonaro coloca bomba no futuro do país

Folha de S. Paulo

Governo e Congresso aprovam leis que estouram orçamento e o crédito público

A única emergência nova no Brasil é o momento crítico da candidatura de Jair Bolsonaro. Mas não há lei que autorize o arrombamento dos cofres e das leis do Orçamento em caso de perigo para a reeleição. Como se sabe, é para isso que serve essa PEC dos Auxílios, a dita "Kamikaze". PEC: Proposta de Emenda à Constituição.

O que menos gente percebe é o efeito duradouro que os arrombamentos terão sobre as taxas de juros e, pois, sobre o crescimento e, portanto, sobre pobreza e miséria e o futuro do periclitante próximo governo.

A inflação está acima de 10% desde setembro de 2021. A inflação da comida estava perto dos recordes do século no final de 2020, FAZ UM ANO E MEIO. A miséria explodiu em 2021. É possível que até tenha caído um tico em 2022, embora quem sofra de fome, frio e desespero não deva ter notado a diferença.

Por que oposição no Senado votou a favor da PEC Eleitoral, que dá ‘cheque em branco’ para Bolsonaro

Parlamentares fizeram duras críticas, mas não tiveram coragem de figurar em lista contra a proposta que aumenta verbas públicas para programas sociais, mesmo dando vantagem eleitoral ao presidente

Por Manoel Ventura, Camila Zarur e Alice Cravo / O Globo

BRASÍLIA - O Senado aprovou ontem, em dois turnos, a proposta de emenda à Constituição (PEC) Eleitoral, que institui até o fim do ano um estado de emergência no Brasil. O objetivo é viabilizar a criação e a ampliação de uma série de benefícios sociais a três meses das eleições.

A aprovação dessa PEC em tramitação acelerada, segundo juristas, abre um precedente perigoso e irreversível, pois pode permitir que qualquer pretexto seja usado tanto para driblar a lei eleitoral como para afrontar a Constituição, criando um “vale-tudo eleitoral”. Além disso, a medida provoca um impacto bilionário nas contas públicas.

Senadores da oposição admitem os riscos da PEC e que ela dá um "cheque em branco" para Bolsonaro em plena corrida eleitoral. O presidente está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto e aposta nos gastos públicos para tentar superar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na liderança. Mesmo assim, praticamente todos os senadores da oposição votaram a favor da PEC.

No primeiro turno, a PEC foi aprovada por 72 votos a favor e 1 contrário. No segundo turno, por 67 votos a favor e 1 contrário. Até mesmo a senadora Simonte Tebet (MDB-MS), pré-candidata à Presidência da República, votou a favor, apesar de criticar o texto da PEC como feito "na coxa".

Tasso Jereissati (PSDB-CE), cotado para ser vice de Tebet, também votou a favor. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), um dos mais aguerridos oposicionistas, votou a favor no primeiro turno e ausentou-se no segundo. O único voto contra foi o do senador José Serra (PSDB-SP).

José Serra: ‘Há apenas poucas semanas o Senado descobriu que as famílias passam fome'

‘Pacote de bondades’ é eleitoreiro e compromete o futuro das contas públicas, afirma parlamentar em rede social

Por O Globo

Único voto contra a PEC Eleitoral, que liberou gastos de R$ 41,2 bilhões a três meses das eleições numa clara afronta à Constituição, o senador José Serra (PSDB-SP) criticou no Twitter a medida:

“Há apenas poucas semanas o Senado descobriu que famílias passam fome e que esperam na fila dos benefícios?” escreveu o senador.

A PEC foi aprovada no Senado em primeiro turno por 72 votos a favor e um contra, de Serra. No segundo turno, foram 67 votos a favor. O texto segue agora para a Câmara dos Deputados.

Ao justificar o voto contra a medida, que vai aumentar o valor do Auxílio Brasil para R$ 600, além de criar um vale-caminhoneiro de R$ 1 mil por mês e um benefício de R$ 200 para taxistas, Serra destacou que “o ‘pacote de bondades’ é eleitoreiro, só vai até dezembro de 2022 e compromete o futuro das contas públicas”.

PEC das Bondades é inconstitucional e afronta à democracia, diz ex-presidente do STF

Proposta foi aprovada em 1º turno no Senado nesta quinta-feira e institui até o fim do ano um estado de emergência, o que libera o governo para aumentar gastos públicos às vésperas da eleição

Por Mariana Muniz / O Globo 

Brasília - Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e por duas vezes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro aposentado Carlos Velloso avalia como "inconstitucional" e uma "afronta à democracia" a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que institui até o fim do ano um estado de emergência para viabilizar a criação e a ampliação de benefícios sociais a três meses das eleições. O texto foi aprovado em primeiro turno no Senado no início da noite de hoje.

— Essa PEC é flagrantemente inconstitucional, porque atinge o direito à Democracia, que é uma cláusula pétrea da nossa Constituição. A proposta prejudica a eleição, o voto periódico, que é o fundamento da nossa Democracia —, afirma Velloso ao GLOBO.

O ministro, que hoje atua como jurista e advogado, foi presidente do STF de 1999 a 2001, e atuou na Corte de 1990 a 2006, quando se aposentou. Para ele, há uma parcela de responsabilidade do Legislativo em permitir que uma PEC driblando a lei eleitoral seja analisada e, talvez, aprovada.

— É preocupante que o Legislativo brasileiro assuma a responsabilidade, o ônus, de aprovar uma PEC que pode ter consequências tão graves —, disse.

Senado aprova PEC que autoriza bilhões para caminhoneiros, taxistas e Auxílio em ano eleitoral

Custo de pacote cresce para R$ 41,25 bi; texto institui estado de emergência

Renato Machado, Idiana Tomazelli / Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - Senado aprovou nesta quinta-feira (30) a PEC (proposta de emenda à Constituição) que institui um estado de emergência para permitir que o presidente Jair Bolsonaro (PL) fure o teto de gastos e abra os cofres públicos a pouco mais de três meses das eleições.

O texto dá aval ao governo para turbinar programas sociais até o fim do ano sem esbarrar em restrições da lei eleitoral, que existem para evitar o uso da máquina pública em favor de algum candidato. Bolsonaro ocupa o segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

As medidas terão um custo total de R$ 41,25 bilhões —valor maior que os R$ 38,75 bilhões acertados na véspera, em mais um movimento de aumento da fatura. Quando as medidas para atacar a alta de combustíveis começaram a ser discutidas, o gasto extra era projetado em R$ 29,6 bilhões.

A PEC prevê a ampliação temporária do Auxílio Brasil em R$ 200, levando o benefício mínimo a R$ 600 até o fim do ano. O texto também autoriza o governo a zerar a fila do Auxílio Brasil, criar um auxílio para caminhoneiros autônomos e dobrar o valor do Auxílio Gás.

De última hora, as lideranças do governo fecharam um acordo para incluir um benefício de R$ 2 bilhões a taxistas e ampliar em R$ 500 milhões os recursos para o programa Alimenta Brasil, que financia a aquisição de alimentos para doação a famílias carentes.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho do presidente da República, reconheceu que a ampliação da fatura enfrentou oposição do Ministério da Economia. "O presidente Bolsonaro teve que entrar no circuito por uma certa resistência da parte da Economia", disse durante a sessão.

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Editoriais

PEC aprovada no Senado é afronta à democracia

O Globo

O Senado aprovou ontem, num congraçamento raro entre governo e oposição, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que desfere um ataque frontal à democracia brasileira. Na superfície, essa PEC da Bondade permite apenas instituir um estado de emergência temporário, até o fim do ano, para ampliar o valor do Auxílio Brasil a R$ 600, beneficiar caminhoneiros, taxistas e consumidores de gás. Seriam medidas eleitoreiras, condenáveis em razão do impacto fiscal no Orçamento, mas até defensáveis diante da alta dos combustíveis e da atual calamidade social — obviamente a situação exige medidas do Congresso. Mas a PEC faz isso do jeito errado e traz consequências inaceitáveis.

Com um olhar mais atento, logo se percebe que o novo instrumento acaba com o equilíbrio na disputa eleitoral e fere, segundo juristas, princípios fundamentais da Constituição. É por isso que, se confirmada a aprovação na Câmara na semana que vem, ele precisará ser revisado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As mudanças equivalem a anotar um gol de mão para o time da casa na final do campeonato.

Poesia | Bertolt Brecht: Nada é impossível de mudar

 

Música | MPB4 e Roberta Sá: Cicatrizes (Miltinho e Paulo César Pinheiro)