- O Estado de S.Paulo
Assusta que haja adeptos dessa ideia, ignorantes do que foi o regime militar
A nefasta combinação de depressão econômica com a descoberta da corrupção que lavrou no País, atingindo as principais lideranças políticas, provoca, por desinformação, manifestações em favor da volta dos militares ao poder, dando apoio ao pré-candidato Jair Bolsonaro, entusiasta dos métodos da ditadura, com discurso agressivo em prol da repressão violenta. Todavia cabe, antes, recordar a situação política e econômica nos anos 1980.
Em agosto de 1983, Ulysses Guimarães, ao voltar de descanso e recuperação que fizera no interior de São Paulo, solicitou-me que, na condição de presidente interino da Fundação Pedroso Horta, do PMDB, organizasse manifestação em favor das eleições diretas e contra a desastrosa política econômica do governo Figueiredo. Tenho guardada a folha de bloco com o timbre da Câmara dos Deputados em que Ulysses, com sua letra de médico, anotou no que consistiria o ato. Deveria reunir 10 mil pessoas, tendo três temas: eleições diretas, moratória e desemprego.
Misturavam-se a reivindicação política por eleição direta com a análise – juntamente com economistas como Celso Furtado, João Manuel Cardoso de Mello, Luiz Gonzaga Belluzzo e José Serra – da trágica situação econômica que vitimava gravemente as classes média e baixa.
Em carta, assinada por Ulysses, presidente nacional do PMDB, Fernando Henrique Cardoso, presidente estadual, e por mim, lançava-se o movimento, Fala Brasil. Na carta, dirigida à militância do PMDB e a todas as lideranças da sociedade civil, convocava-se a participar de reunião em 1.º de outubro na Assembleia Legislativa de São Paulo, com o grito em prol das eleições diretas e de basta ao Decreto 2.045, ao desemprego, à recessão.
Na luta pelas eleições diretas abordava-se também a questão econômica, pois se vivia instante de profunda carestia, com inflação galopante e redução drástica do produto interno bruto (PIB). Com efeito, a inflação era desesperante, superara os 100% em 1981 e 1982. Naqueles meses, julho, agosto e setembro de 1983, a inflação atingira mais de 10% ao mês. O PIB fora negativo em 1981 (-4,3%), em 1982 fora positivo (0,8%) e negativo em 1983 (-2,9%).