quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Carnaval aponta caminho para negócios no Brasil

O Globo

País tem vocação evidente e potencial enorme a explorar com as indústrias criativas

Oficialmente, o carnaval acabou na terça-feira, mas, para prefeituras e estados, o clima ainda é de comemoração. Com tempo ensolarado na maior parte do país, o evento foi um sucesso, traduzido em ruas apinhadas de foliões, atrações sedutoras, hotéis lotados, serviços a todo vapor e arrecadação garantida. A indústria criativa mostrou seu vigor e deixou claro que carnaval não é só diversão. É também um ótimo negócio.

Em 2021 e 2022, a festa sofreu o baque da pandemia. A recuperação iniciada em 2023 se consolidou na festa deste ano. Antes da folia, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) estimara que os festejos enfim superariam os níveis pré-pandemia, em especial nos estados que têm o carnaval como atração turística. Mas o carnaval tem o mérito de fazer girar várias rodas da economia. No Rio, o desfile da Portela, inspirado no livro “Um defeito de cor”, de Ana Maria Gonçalves, fez esgotar os volumes da obra após a apresentação. Mesmo aqueles que fogem da folia contribuem para movimentar o turismo em seus destinos mais pacatos.

Merval Pereira - A origem de tudo

O Globo

O que havia, antes da eleição, era a vontade de impedir sua realização com o temor de que os “socialistas” voltassem ao poder. O que houve, depois da eleição, foi a tentativa de impedir que a vontade popular se concretizasse.

Em um país disfuncional como o Brasil, é possível confundir ações legais com ilegais, desde que se queira. Todo presidente da República eleito democraticamente tem a seu dispor uma série de medidas constitucionais a ser usadas em defesa do Estado Democrático de Direito. Portanto um presidente, como Bolsonaro era, discutir com assessores a adoção de medidas abrangidas pelo Estado de Emergência estaria perfeitamente dentro da lei.

Os próximos passos teriam de ser dados convocando o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, solicitando depois a permissão do Congresso, no caso de Estado de Sítio, ou a ratificação, no caso do Estado de Defesa, o que não aconteceu. Graças às trapalhadas do Exército de Brancaleone, porém, sabemos hoje que não havia nenhuma razão prevista na Constituição para que se pensasse numa solução de força para impedir a eleição de 2022 ou a permanência de Lula como sucessor de Bolsonaro depois da vitória em segundo turno.

Malu Gaspar – Os militares e seu baú de segredos

O Globo

A esta altura do campeonato, ninguém em sã consciência diria que ainda há risco de golpe de Estado no BrasilJair Bolsonaro está inelegível, as sucessivas operações da Polícia Federal e as sentenças de Alexandre de Moraes extirparam os golpistas do cenário político, os sinais da caserna são de calmaria.

Mesmo assim, sobram interrogações sobre o que se deu no interior das Forças Armadas no governo passado e sobre como se permitiu que chegássemos tão perto de uma ruptura institucional.

Algumas perguntas começam a ser respondidas com as revelações da operação sobre o ex-presidente, seus ministros militares e outros 13 oficiais envolvidos no planejamento do golpe. O pouco que veio à tona, porém, foi suficiente para demonstrar quão profundo é o baú de segredos dos militares.

Míriam Leitão - A disputa não é entre Lula e Lira

O Globo

O poder excessivo do Congresso não é um complicador apenas para o governo atual. Irá constranger qualquer outra administração

É fácil imaginar que este primeiro semestre legislativo será tenso na relação com o executivo, principalmente na pauta econômica. Há muitas matérias importantes e o presidente da Câmara, Arthur Lira, só tem a ganhar mantendo o clima estressado. Já conseguiu nomeações no governo e agora está preparado para derrubar o veto a R$ 5,6 bilhões de emendas de comissão. É quase certo que será derrubado, porque isso representará mais recursos para o Congresso administrar e elevará o cacife de Lira para fazer seu sucessor. Esse poder excessivo do Congresso é um complicador para o país, não apenas um problema do governo Lula.

Marcelo Baumann Burgos* - Favela e democracia

O Globo

Para defender a democracia também precisaremos dar atenção aos danos que a narcomilícia produz no tecido da sociedade civil

Cidade colonial e Corte de um Império escravocrata, o Rio de Janeiro produz um tipo peculiar de segregação urbana, que faz das favelas uma forma racializada de configuração urbana, por isso mesmo fartamente instrumentalizada como antítese da cidade, um lugar habitado por um “outro”, contra o qual se opõe um ideal de cidade europeia e branca. A esse passivo histórico, devemos a crônica estigmatização da favela, que sustenta toda sorte de violência contra a sua população: da privação de saneamento à exposição a grupos armados paramilitares e às repetitivas incursões policiais, que em nada alteram esse quadro, mas que deixam um triste saldo de mortes e de traumas.

Para superarmos esse passado e imaginarmos um outro futuro, um primeiro passo é reconhecer que os que mais cultivam a democracia na cidade estão nas favelas e periferias. Mais especificamente, em seus coletivos e organizações que, há décadas, e cotidianamente, vêm lutando pelo direito a vida, educação, saúde, saneamento, cultura e outros direitos urbanos. Um segundo passo é reconhecer que são justamente eles os mais ameaçados pela simbiose em curso entre milícia e narcotráfico.

Maria Cristina Fernandes - As chances e os riscos de Lula no pós-Bolsonaro

Valor Econômico

É a frustração com aquilo que se faz do voto do eleitor que aduba a antipolítica e leva os “valores” a tomar o lugar da melhoria de vida como indutor de preferência eleitoral

Crescem as evidências de que a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro passe de 8 para 30 anos. É esta a conta se, à pena de abuso de poder político e econômico determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral, somarem-se condenações por tentativa de golpe, abolição do Estado de Direito e associação criminosa.

O cenário autoriza a que se abram as apostas para o que vai ser do pós-Bolsonaro. A primeira delas indica uma extrema-direita incorporada à paisagem, sob um sarrafo de 20% dos votos, com poder de desequilibrar o jogo, mas sem fôlego para alavancar uma fatia majoritária do eleitorado.

Como parece ter ficado claro que o PL embarcou na aventura golpista, ao partido seria reservado o mesmo destino. Não perderia o registro, mas ficaria sem puxador de votos para as bancadas proporcionais ou fôlego para bancar candidaturas majoritárias. Sem janela para mudança de partido até 2026, seus parlamentares manteriam o PL com a maior bancada da Câmara e a segunda do Senado, mas sem a mesma força para impor sua agenda, notadamente na pauta anti-STF.

Não foi Bolsonaro quem levou Valdemar Costa Neto a reaprender o caminho da cadeia, mas foi a aliança com o golpismo que proporcionou o flagrante dos velhos vícios. Já terá sido convencido a virar a página do que restar do seu partido.

Vinicius Torres Freire - Bolsonaro e os 'irmãos' do golpe

Folha de S. Paulo

Política parlamentar e judicial deve pesar mais no futuro do capitão

Jair Bolsonaro convocou manifestação para a avenida Paulista a fim de conseguir uma foto. É o que diz literalmente no vídeo de Carnaval em que chamou o povo para o que seria um "ato pacífico em defesa do nosso Estado democrático de direito", no qual pretende se defender das acusações dos "últimos meses".

Bolsonaro quer reunir forças para um contra-ataque. Mas, a não ser em caso de fiasco ou multidão muito excepcionais, o destino do capitão das trevas depende mais da política, parlamentar e judicial, e dos achados da polícia.

"Mais do que discurso, uma fotografia de todos vocês, porque vocês são as pessoas mais importantes desse evento, para mostrar, para o Brasil e para o mundo, a nossa união, as nossas preocupações e o que nós queremos: Deus, pátria, família e liberdade", disse.

Maria Hermínia Tavares* - A força dos ressentidos

Folha de S. Paulo

Imagens revelam mais do que a tentativa de abolição do Estado de Direito

O vídeo recém-divulgado da reunião de Bolsonaro com seus ministros, em 22 de julho de 2022, revela mais do que a escancarada intenção de evitar a derrota eleitoral a qualquer custo, aí incluída a abolição do Estado de Direito.

Ele desnuda também o sentimento mais entranhado do então presidente —o que lhe permite mobilizar uma parcela dos seus seguidores fiéis. O nome dessa marca de Caim é ressentimento.

Enquanto o encontro não começava para valer, o ex-capitão, com a sua costumeira fala trôpega, ia batendo na tecla da imaginária fraude eleitoral que seus adversários estariam preparando.

Eis que, aos 9 minutos e 56 segundos da gravação, explode em autodesprezo e amargura pela maneira como foi tratado durante sua longa experiência de deputado federal. "Baixo clero" e "gozado" são os únicos epítetos a que recorre para descrever-se e que podem ser aqui reproduzidos sem ferir as recomendações do Manual da Redação desta Folha e a sensibilidade dos leitores. O resto é um amontoado de rancorosos palavrões.

William Waack - O cálculo de Bolsonaro

O Estado de S. Paulo

O ex-presidente aposta na impopularidade do Supremo Tribunal Federal

Foi sempre difícil estabelecer o que era estratégia ou fantasia na cabeça do personagem político Jair Bolsonaro. Sempre pareceu mais “sentir” do que “pensar” em como agir.

Juntou delírios (como o negacionismo da ciência) a uma por vezes precisa avaliação da realidade política e social, como foi a descrição que fez, no já famoso vídeo da reunião ministerial de julho de 2022, da própria vitória em 2018. “Foi uma cagada”, disse.

De fato, é uma boa definição da excepcionalidade da conjunção de fatores que o permitiu derrotar as engrenagens políticas, o “sistema”, as previsões. De lá para cá Bolsonaro parece ter acreditado que a excepcionalidade sempre se repetiria a seu favor.

Roberto Macedo* - Brasil: o Estado do bem e do mal-estar social

O Estado de S. Paulo

A expansão do Estado do bem-estar social prejudicou o investimento público e o crescimento econômico, gerando também o Estado do mal-estar social

O conceito de Estado do bem-estar social teve origem no final do século 19 e é creditado ao estadista alemão Otto von Bismarck. Embora alguns programas assistenciais já existissem há tempos, ele foi o primeiro a introduzir programas compulsórios de assistência e previdência social em escala nacional na Alemanha. Mais detalhes em https://capitalresearch.com.br/blog/welfare-state/.

Na primeira metade do século 20, o Brasil passou a seguir a mesma linha, com destaque para a criação da Previdência Social. A chamada Lei Eloy Chaves, de 1923, é tida como o marco inicial da história dessa previdência. Mais recentemente, cresceram muito os chamados benefícios sociais, em particular o Bolsa Família. Neste artigo, argumentarei que a expansão a meu ver desequilibrada de programas como esses prejudicaram os investimentos públicos como em infraestrutura e, assim, o crescimento econômico do País, gerando mal-estar na forma de maior desemprego, subemprego e salários baixos, entre outros aspectos.

Felipe Salto* - As emendas PIX

O Estado de S. Paulo

O artigo 83 da LDO de 2024 é mero paliativo. O mal precisa ser cortado pela raiz, eliminando-se da Constituição essa sandice orçamentária

O PIX foi uma boa inovação do Banco Central, ao baratear e facilitar as transações financeiras. Mas há outro PIX, este bastante perigoso, gestado e parido pelo Congresso. Trata-se das emendas parlamentares na modalidade “transferência especial”. Sem lenço e sem documento, recursos públicos voam de Brasília para os municípios sem transparência.

Em 2015, por meio da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) n.º 61, propôs-se a novidade. O objetivo? Permitir repasses diretos aos municípios e Estados, como se fossem adicionais aos Fundo de Participação. Só que estes são uma maneira de partilhar os recursos que pertencem, pela letra da Constituição, a todos os entes federados. Trata-se do Imposto de Renda e do Imposto sobre Produtos Industrializados. Isso nada tem a ver com as emendas, cuja fonte é dinheiro da União. E só dela.

Celso Ming - Inadimplência e descuido dos bancos

O Estado de S. Paulo

No forte aumento da inadimplência (dívidas em atraso) no mercado de crédito estão, também, as digitais dos bancos, que vêm descuidando da administração de risco.

Na edição de domingo, esta Coluna destacou a disparada da inadimplência que, em 2023, atingiu 29,5% das famílias brasileiras. É fator que enfraquece o consumo, derruba a produção e aumenta o custo do crédito. O governo Lula limita-se a criticar o Banco Central pela política monetária restritiva (juros altos) e a aplicar band-aid com o Programa Desenrola.

É preciso investir em longo prazo na educação financeira do consumidor para que administre melhor seu orçamento e aumentar a regulação no setor. Falta empenho do governo para inibir a oferta predatória de crédito por bancos, fintechs e comércio.

Congresso omite autores de repasses de emendas de comissão

Dimitrius Dantas e Patrik Camporez / O Globo (14.2.24)

Embora não seja divulgada a autoria oficialmente, parlamentares costumam ser celebrados por apadrinhar recursos a seus redutos

No centro de uma crise entre governo e Congresso, as emendas de comissão têm sido usadas por deputados para irrigar suas bases eleitorais em um mecanismo que omite os verdadeiros responsáveis pelas indicações dos repasses. O cruzamento entre informações fornecidas por congressistas, manifestação de prefeitos nas redes sociais e uma planilha do Congresso enviada ao Executivo, obtida pelo GLOBO, mostra que, embora não seja divulgada a autoria oficialmente, parlamentares costumam ser celebrados por apadrinhar recursos a seus redutos. Para especialistas, essa opacidade compromete o controle dos gastos públicos.

As emendas de comissão foram inchadas em 2023 após o fim do orçamento secreto — extinto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) pela falta de transparência quanto às indicações — e em meio às negociações da chamada “PEC da Transição”, que ampliou o Orçamento federal após a eleição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa modalidade, que não é de execução obrigatória, alcançou o valor de R$ 6,8 bilhões no ano passado. Para 2024, o Orçamento aprovado pelo Congresso previa R$ 16,6 bilhões para este tipo de despesa. O presidente vetou R$ 5,6 bilhões, deixando R$ 11 bilhões disponíveis. O corte deu início ao mais novo capítulo de tensão entre Executivo e Legislativo.

Luiz Carlos Azedo - Viradouro mostra a força da origem ancestral

Correio Braziliense

O enredo da Viradouro vai além da interpretação de carnavais, malandros e heróis, clássico de Roberto DaMatta, que mergulha no dilema do Brasil de grandes desigualdades

A primeira grande revolução nos desfiles de escola de samba foi protagonizada pelo Salgueiro, em 1963, com o enredo Xica da Silva. O coreógrafo Fernando Pamplona deslumbrou o público e o mundo do samba, no primeiro desfile da Avenida Rio Branco, com uma protagonista negra e uma revolução nas coreografias, com fantasias e adereços concebidos para serem vistas de cima para baixo, ou seja, das arquibancadas e das janelas dos prédios.

A história da ex-escrava que se uniu a João Fernandes de Oliveira, responsável pela exploração dos diamantes no Arraial do Tijuco (atual Diamantina), no auge do Ciclo da Mineração, foi narrada com uma explosão vermelha e branca, resplandescente, porque a escola se encheu de brilhos para desfilar ao raiar do sol, que subiu por trás da Catedral da Candelária, enquanto o povo gritava “já ganhou!”

Poesia | Poema de sete faces, de Carlos Drummond de Andrade

 

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