terça-feira, 9 de julho de 2024

O que a mídia pensa | Editoriais / Opiniões

Voto útil barrou extrema direita, mas enfraqueceu Macron

O Globo

Estratégia funcionou para deter avanço do RN. Persiste, porém, incerteza sobre o futuro na França

A estratégia do voto útil, que uniu legendas da centro-direita à extrema esquerda nas eleições legislativas da França, conseguiu barrar a vitória do Reunião Nacional (RN), de extrema direita. Com um comparecimento eleitoral recorde de 67%, os franceses mais uma vez impuseram um limite à ascensão ao poder do partido extremista, que saíra vitorioso no primeiro turno. O RN registrou um crescimento histórico e obteve 143 das 577 cadeiras da Assembleia Nacional — ou 25%, percentual que só havia superado no segundo turno de eleições presidenciais —, mas ficou longe do primeiro lugar e da maioria absoluta que pareciam a seu alcance.

Ainda que tenham se dissipado os temores sobre uma vitória do RN, ainda persiste a ansiedade sobre o futuro. Nenhum grupo obteve a maioria necessária para formar um governo. A coalizão mais votada, do esquerdista Nova Frente Popular (NFP), somou 182 deputados. Mas trata-de de um grupo heterogêneo. Fazem parte dele a legenda de extrema esquerda França Insubmissa (FI), com 74 deputados desse total, os socialistas, com 59, os verdes, comunistas e outros partidos, com 47. Em segundo lugar ficou o grupo de centro do presidente Emmanuel Macron, com 168 deputados. Em terceiro, o RN.

Pedro Cafardo - Real foi um plano genial, mas não perfeito

Valor Econômico

Justas homenagens sobre os 30 anos da estabilização monetária pecaram pela falta de crítica aos problemas que o plano não conseguiu resolver

O país comemorou nas últimas semanas os 30 anos do Plano Real, que livrou os brasileiros da hiperinflação. Foram justas as comemorações e corretos os inúmeros elogios ao grupo de jovens economistas que estruturaram o plano, hoje todos com cabelos brancos.

Justas e apropriadas foram também as homenagens ao ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, na época ministro da Fazenda e braço firme de sustentação do programa perante o governo do então presidente Itamar Franco.

Até o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, um dos críticos do plano naquela época, visitou Fernando Henrique, hoje com 93 anos, num implícito reconhecimento de sua posição equivocada 30 anos atrás.

Quem viveu aqueles anos terríveis em que as remarcações eram contínuas e os salários não acompanhavam a corrida dos preços tem a obrigação de testemunhar a genialidade do modelo que promoveu a estabilização monetária no país. Aquilo ressuscitou o Brasil.

Andrea Jubé - Lula testa novo bordão para evangélicos

Valor Econômico

Aposta agora é no uso da palavra ‘família’

Sem alarde, enquanto as atenções voltavam-se para suas declarações sobre o equilíbrio fiscal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva começou a testar, há poucos dias, uma nova estratégia para tentar melhorar a interlocução com a população evangélica. Esse público representa cerca de um terço dos brasileiros e aderiu em massa ao bolsonarismo.

“Se tem uma coisa que eu aprendi com a [minha mãe] dona Lindu foi responsabilidade fiscal, cuidar do meu pagamento, cuidar do meu salário, cuidar da minha família”, discursou Lula na sexta-feira (5), na inauguração de novo prédio da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em Osasco (SP). “E hoje a minha família é o Brasil”, exaltou.

Carlos Andreazza - Orçamento secreto imbrochável

O Estado de S. Paulo

De Bolsonaro a Lula, sempre com Lira e Alcolumbre, Parlamentarismo orçamentário vigente não perde a energia

Imbrochável mesmo – com “tesão de 20 anos” – é o Parlamentarismo orçamentário vigente. De Bolsonaro a Lula, sempre com Lira e Alcolumbre, sem perder a energia. Aula de transição e continuidade.

Marca das gestões dessa rapaziada à frente do Congresso? A institucionalização do orçamento secreto, ora já sob a terceira fachada. O Parlamento administrador de fundos orçamentários crescentes sobre cujos usos pervertidos não tem qualquer responsabilidade.

Atenção ao que se arma. As regulamentações da reforma tributária como objeto circunstancial para os negócios. A instrumentalização das pressas a todo vapor. Tem de aprovar antes do recesso. Corrida de dez dias. Emboladas as jorrações dos bilhões em emendas e dos lobbies pela cesta básica – imposto do pecado para os outros pecadores. Ninguém reclamará agora do regime de urgências. É pela boa causa.

Rubens Barbosa - Uma política externa para o mundo atual

O Estado de S. Paulo

A visão de que estava havendo a restauração de uma política externa ativa e altiva minimizou ou ignorou as mudanças pelas quais o Brasil, a América do Sul e o mundo estão atravessando

O Brasil voltou. O presidente Lula da Silva, no início de seu governo, repetiu essa afirmação como o recomeço da política externa depois de um período, no governo anterior, em que as atitudes e posições brasileiras isolaram o País e o então Brasil foi visto como um pária no cenário internacional. A visão de que estava havendo a restauração de uma política externa ativa e altiva, como caracterizada nos dois primeiros mandatos, minimizou ou ignorou as mudanças e transformações pelas quais o Brasil, a região sul-americana e o mundo estão atravessando. Sem falar nos desafios e nos riscos para perseguir as novas oportunidades que estão se abrindo ao País.

Martin Wolf - As escolhas difíceis de Keir Starmer no Reino Unido

Financial Times / Valor Econômico

O desafio para o Partido Trabalhista não é apenas governar bem, mas restaurar a confiança ao fazê-lo

Keir Starmer conquistou uma enorme maioria parlamentar com um apoio surpreendentemente frágil. O Partido Trabalhista obteve apenas 34% dos votos. A mudança no apoio aos conservadores desde sua grande vitória de 2019 também demonstra a inconstância extrema do eleitorado.

Talvez o mais perturbador seja o fato de um novo relatório do National Centre for Social Research afirmar que “a confiança nos governos nunca esteve tão baixa”. Os detalhes são preocupantes: “45% dos participantes ‘quase nunca’ acredita que os governos britânicos de qualquer partido colocam as necessidades da nação acima dos interesses de seus próprios partidos; 58% ‘quase nunca' acreditam que os políticos de qualquer partido no Reino Unido dizem a verdade quando se encontram em uma situação difícil; e 71% acreditam que a economia está pior por causa do Brexit, a principal política do governo conservador”.

Merval Pereira - Longa negociação

O Globo

A França escapou de um governo de extrema direita, mas está às voltas com um Parlamento fragmentado, o que torna o cenário político indefinido

A vitória da esquerda na França e no Reino Unido mostrou que o presidente Lula sabe em teoria o que fazer politicamente para enfrentar a extrema direita brasileira, encarnada em Bolsonaro, embora sua prática tenha se mostrado ineficiente até agora. Tanto para montar uma coalizão partidária viável, quanto para colocar em ação um governo de união democrática.

Lula disse que os resultados eleitorais reforçam a importância do diálogo entre os segmentos progressistas, “em defesa da democracia e da justiça social”. O presidente classificou de “demonstração de grandeza e maturidade das forças políticas da França que se uniram contra o extremismo nas eleições legislativas”.

Joel Pinheiro da Fonseca - Democracia e moderação salvaram a França

Folha de S. Paulo

Será preciso mostrar à sociedade que a direita nacionalista não tem respostas para os problemas

Macron e todos os que acreditam numa sociedade aberta e plural respiram aliviados com o mau resultado do Reunião Nacional nas eleições legislativas francesas. Foi —é preciso lembrar— o melhor resultado de sua história, mas ficou aquém da esperada maior bancada e ainda mais de uma maioria de parlamentares.

Apesar disso, não parece que o discurso nacionalista, anti-imigração e anti-integração global (ou, no caso da UE, continental) vá desaparecer. Ele segue forte e, se seus adversários não conseguirem entregar resultados e narrativas mais persuasivas, crescente. Marine Le Pen declarou que sua vitória foi "apenas postergada". Está nas mãos de Macron e da coalizão entre esquerda e centro enterrar ou cumprir essa profecia.

Dora Kramer - A direita se prepara

Folha de S. Paulo

Já a esquerda dá uma relaxada, talvez por não achar que deva maiores explicações ao eleitorado

Obediente à dinâmica da comparação mútua, Jair Bolsonaro (PL) se inspira no exemplo de Luiz Inácio da Silva (PT) para fazer de conta que poderá ser candidato a presidente em 2026.

Tudo é possível, embora seja altamente improvável como se viu em 2018, quando a candidatura de Fernando Haddad (PT) foi registrada na última hora.

No entanto, o dado concreto não conta nessa história relatada sob os auspícios da ideia de manter esperançosa a militância de direita acomodada no guarda-chuva do que se chama de bolsonarismo.

Hélio Schwartsman - Cordão sanitário

Folha de S. Paulo

Aliança entre esquerdistas e centristas na França barra ainda que momentaneamente avanço da ultradireita

O "cordon sanitaire" funcionou mais uma vez. O partido de ultradireita francês Reunião Nacional (RN), que saíra à frente no primeiro turno das eleições legislativas, foi bloqueado por uma aliança de esquerdistas e centristas e acabou ficando em terceiro lugar. Nos distritos em que a disputa se dava entre três ou mais candidatos (no sistema francês, todos os que obtêm mais de 12,5% dos votos passam para o segundo turno), aqueles que estavam em pior situação abandonaram a corrida, facilitando a escolha do eleitor que desejava barrar a RN.

Alvaro Costa e Silva - Bolsonaro adota estilo 'roubei sim, e daí?'

Folha de S. Paulo

Indiciamento no caso das joias atrapalha candidatos do capitão

Se em São Paulo a disputa prossegue embolada, repetindo-se o cenário das últimas eleições presidenciais, com Ricardo Nunes e Guilherme Boulos cabeça a cabeça, no Rio o bolsonarismo caminha para o abismo. Caso nada mude até outubro, desenha-se, mais do que uma derrota, uma lavada histórica em seu próprio berço de nascimento.

O Datafolha espanta: Eduardo Paes, aliado de Lula, tem 53% das intenções de voto, muitas das quais de bolsonaristas. Alexandre Ramagem aparece em terceiro, com 7%, perdendo para Tarcísio Motta, do PSOL, com 9%. Para se ter uma ideia da mudança de humor dos cariocas, em 2020 Marcelo Crivella, tido e havido como um dos piores prefeitos da cidade, conseguiu ir para o segundo turno contra Paes.

Ricardo José de Azevedo Marinho - Paixão pelo Possível

Blog Voto Positivo

A compostura política não deve ser confundida com a social, que, embora aparente ser menos importante para o futuro das sociedades, carrega um papel sobejo. A compostura social refere-se às regras de boas maneiras, à ideia de bom gosto e às normas de comportamento social que começam a ser estabelecidas no século XV e que são bem descritas pelo mestre da história dos costumes Norbert Elías (1897-1990) e às quais o grande filósofo Erasmo de Rotterdam (1466-1536), que deixando fluir por um momento seu grande gênio, dedicou em 1530 um pequeno livro que fez muito sucesso a época, De civilitate morum puerilium (Da civilidade pueril), um livro curioso e divertido aos nosso olhos, em que desenvolve o conceito de civilidade também caro ao saudoso Emmanuel Le Roy Ladurie (1920-2023), um conjunto de bons costumes válido para se comportar na vida e que opera para toda a sociedade.

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão* - Apropriação privada e liberdade de expressão

Toda essa polêmica aberta pelos políticos, em tempos pré-eleitorais, sobre a velada intenção de privatizar as praias brasileiras, espaço de descanso, diversão e lazer de quase 100 milhões de brasileiros, provoca uma boa mobilização. Faz-me lembrar do esquecido artista plástico Ricardo Saunders, que desencadeou, em   Florianópolis, uma campanha, de denúncia contra a apropriação particular de quase sessenta praias da Ilha. Foram ocupadas pelas imobiliárias, entre 1960 e 1970, entusiasmadas com a enorme atração que exerciam sobre os argentinos. Em São Paulo já surgiam os primeiros condomínios privados.

Saunders, de origem paraense, morava em Brasília, mas casara-se com a pintora catarinense, Vera Sabino, e vivia agora em Florianópolis. Era encantado com a paisagem da Ilha. Durante três anos caminhou solitário pelo seu entorno, carregando cavaletes, tintas e pincéis, tentando recompor, em telas, a paisagem original daquelas belíssimas praias, protegidas como   terrenos de Marinha.  Seus quadros desapareceram rapidamente. 

Raul Jungmann - Imposto é obstáculo à transição energética

O Globo

O caminho para uma economia de baixo carbono é impossível sem a ampliação da eletrificação

A mineração brasileira tem papel estratégico na transição energética do mundo e pode contribuir para que o país se torne seu principal protagonista. O caminho para uma economia de baixo carbono é impossível sem ampliar a eletrificação, seja por meio de baterias, aerogeradores ou placas solares. Tudo isso exige minerais críticos e estratégicos, como lítio, nióbio, terras-raras e cobre. O minério de ferro, de que nosso país é um dos maiores produtores mundiais, é estratégico para a descarbonização do planeta não apenas na produção dos equipamentos mencionados, mas também como insumo primordial para o aço verde, que será viável a partir do hidrogênio verde, usado como substituto do coque (um produto fóssil) no alto-forno siderúrgico.

Luiz Carlos Azedo - Tudo começou com Luís XIV: "O Estado sou eu"

Correio Braziliense

Na Presidência, Bolsonaro comportou-se como se fosse a personificação do Estado, imaginou que os presentes que recebeu na Arábia Saudita fariam parte do seu patrimônio pessoal

A frase L'État c'est moi, no original em francês, é atribuída ao Rei Luís XIV (1638-1715), também conhecido por Rei-Sol, que governou a França e Navarra entre 1643 e 1715. É a síntese do absolutismo, no qual a centralização do poder na figura do rei possibilitou a consolidação dos Estados nacionais, em aliança com a burguesia comercial, que seria fundamental para a expansão europeia e o desenvolvimento do mercantilismo. A oração completa é je suis la Loi, je suis l'État; l'État c'est moi (eu sou a lei, eu sou o Estado; o Estado sou eu!). Na monarquia absolutista, o rei controlava a segurança, as contas do governo, as alianças internacionais, o Exército, a Marinha e o espaço público.

Míriam Leitão - Os detalhes que chocam e revelam

O Globo

O farto relatório da PF mostra que o ex-presidente Bolsonaro não só sabia, mas coordenou todo esquema de venda das joias

O ex-presidente Jair Bolsonaro sabia em minúcias de todo o esquema da venda das joias que pertenciam ao patrimônio público, a ponto de comemorar com o notório “Selva”, quando o seu então ajudante de ordens enviou o link do leilão. Ele recebeu em mãos e fracionada, diretamente do general Mauro Lourena Cid, a quantia de US$ 68 mil. A Polícia Federal trouxe fartos documentos, diálogos, trocas de mensagens e evidências para sustentar o pedido de indiciamento de todos os 12 envolvidos neste escândalo. As câmaras da Receita Federal mostraram como se tentou entrar furtivamente com presentes oficiais. A saída das joias também foi na surdina. O dinheiro da venda dos bens públicos, provavelmente, foi o que sustentou os gastos do ex-presidente no exterior, dado que ele não movimentou as próprias contas. Portanto foi feito em proveito próprio.

Poesia | O constante diálogo, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Pecado Capital , Paulinho da Viola