terça-feira, 6 de fevereiro de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais /Opiniões

Escândalo expõe falha no controle externo da Abin

O Globo

Autoridades devem aproveitar oportunidade para aperfeiçoar regulação das ações de inteligência

As suspeitas de uso da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para fins políticos ou pessoais no governo Jair Bolsonaro são graves. Há indícios de monitoramento ilegal via celular, confecção de relatórios contra adversários e tentativa de atrapalhar o trabalho de investigadores. Além da atividade da polícia e da Justiça, o episódio suscita ação noutra esfera — a regulatória.

Não é a primeira vez que ficam patentes falhas no controle externo da Abin. O uso da agência já foi questionado durante a Operação Satiagraha, em 2008, com suspeita de espionagem ilegal de políticos e juízes. Ou no monitoramento em 2013 do então governador de Pernambuco, Eduardo Campos, pré-candidato à Presidência. Dificuldades na supervisão da inteligência também não são exclusivas do Brasil. Outras democracias adotam mecanismos próprios para evitar que a espionagem se volte contra a população em favor de interesses políticos ou privados.

Cristovam Buarque* - Via alternativa: publicizar

Correio Braziliense

A falta desta visão alternativa aos polos faz com que a terceira via fique vazia, ora para um lado, ora para o outro, dos dois extremos. Um dos pontos dessa oscilação é a maneira como se enfrenta a questão das estatais

Faz anos que os analistas e militantes políticos denunciam e reclamam da política dividida em extremos e, por isso, tentam defender a ideia de uma terceira via, esquecendo que o problema dos polos não está em suas posições extremas, mas no fato que ambos são conservadores em suas posições antigas e nostálgicas. Estão obsoletos, não apresentam novas ideias para o futuro diferente que o progresso requer. Mais grave, a terceira via se limita a dizer que nem é de um lado nem é do outro, sem apresentar uma via alternativa. A política brasileira está dividida entre dois polos obsoletos e um centro vazio.

Luiz Carlos Azedo - Arthur Lira voltou do recesso parlamentar falando grosso

Correio Braziliense

Está escrito nas estrelas que o Congresso derrubará os vetos no valor de R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão

Aconteceu o que já era esperado, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), voltou do recesso falando grosso com o Palácio do Planalto. A insatisfação com o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, por causa do não cumprimento de acordos pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, vazada para a imprensa nos bastidores políticos, é um recado de que a relação da maioria dos deputados, que não é governista, não será como no carnaval passado. A ausência de Lira na posse do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, na semana passada, já fora uma demonstração desse desconforto.

Está escrito nas estrelas que o Congresso derrubará os vetos no valor de R$ 5,6 bilhões em emendas de comissão, que substituíram as chamadas emendas de relator, ou “emendas secretas”, proibidas pelo Supremo. Lira disse que o Orçamento é de todos os brasileiros, não só do Executivo, e não pode ficar engessado por quem não foi eleito. “A boa política, como sabemos, apoia-se num pilar essencial: o respeito aos acordos firmados e o cumprimento à palavra empenhada”, disse Lira.

Maria Cristina Fernandes - No palanque, presidente da Câmara se fragiliza

Valor Econômico

Ao listar projetos cruciais ao governo que pautou e aprovou, Lira passou recibo de um poder de barganha hoje esvaziado

Quando um integrante da linha sucessória da Presidência da República despreza encontros com os demais presidentes de Poderes e opta por um discurso em tom descalibrado para a plateia, é fragilidade que exibe.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ainda passou recibo. Ao recitar tudo que a Câmara havia entregue para viabilizar o primeiro ano do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PEC da Transição, mudança no Carf, reforma tributária e redução na dedução do ICMS), Lira mostrou a pouca tinta de sua caneta.

Noves fora a regulamentação da reforma tributária, não tem mais em suas mãos projetos fundamentais para as contas do governo. O poder de barganha se esvazia num ano em que tem pressa para arrancar suas demandas. Seja porque, em função das eleições municipais, se aproxima o prazo (abril) de vedação das transferências voluntárias da União, prejudicando a liberação de emendas, seja porque já foi dada a contagem regressiva para sua permanência na mesa diretora.

Andrea Jubé - A incrível arte da transfiguração na política

Valor Econômico

Metamorfose mais emblemática continua sendo a do vice-presidente Geraldo Alckmin

“Quando Gregor Samsa, certa manhã, despertou de sonhos intranquilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado em um inseto monstruoso. Estava deitado sobre as costas duras como couraça e viu, quando ergueu um pouco a cabeça, a barriga abaulada, marrom, dividida em segmentos arqueados, sobre a qual o lençol, pronto para deslizar por completo, já mal se segurava”.

Assim começa “A metamorfose”, de Franz Kafka: uma das sequências mais conhecidas e emblemáticas da literatura universal.

A transformação como capacidade fantástica ou instinto da condição humana inspirou igualmente escritores brasileiros. “Mecê tá ouvindo, nhem? Tá aperceiando Eu sou onça, não falei?! Ai. Não falei - eu viro onça? Onça grande, tupixaba. Ói unha minha: mecê olha - unhão preto, unha dura Cê vem, me cheira: tenho catinga de onça?”

Luiz Schymura* - O árduo trabalho para manter as contas públicas em ordem

Valor Econômico

Os desafios são grandes, mas o cuidado e a atenção com o tema vêm crescendo a cada dia

Houve muito agito no campo fiscal ao longo do período que abrange o fim de 2022 e todo o ano de 2023. A “emenda da transição” (EC 126 de dezembro de 2022) é o marco do início da movimentação. Dentro do texto aprovado, duas medidas merecem registro: a normalização do volume das despesas discricionárias, impedindo o apagão da máquina pública; e a fixação, de forma permanente, do Bolsa Família num valor mais elevado, atendendo a um pleito que a cada dia ganhava mais adeptos entre os formadores de opinião e a classe política. Na sequência, houve a implementação do novo arcabouço fiscal, cujo papel crucial de “ancorar” as expectativas de solvência das contas públicas foi exitoso. Não parou por aí. Um grande pacote de medidas de reoneração e aperfeiçoamento do sistema tributário também foi sancionado, e o ano se encerrou com uma rodada de redução de passivos fiscais: pagamento de precatórios atrasados e acordo com Estados sobre a indenização relativa à desoneração de ICMS que estava em vigor desde o governo anterior. Além disso, houve um importante feito: a tão aguardada emenda constitucional da reforma da tributação indireta foi finalmente aprovada.

Marcelo de Azevedo Granato* - Tudo ao mesmo tempo agora

O Estado de S. Paulo

Em várias partes do mundo, partidos e movimentos políticos têm apostado fortemente em projetos radicais e imediatistas para atrair eleitores

A América Latina foi palco de dois eventos importantes no final de 2023: a posse do autodeclarado anarcocapitalista Javier Milei como presidente da Argentina e a segunda rejeição, pela população chilena, de uma nova Constituição para o país. Dois eventos que sugerem o estado de espírito da política destes tempos, em que os tradicionais projetos de reformas setoriais e progressivas são substituídos por projetos de mudanças globais e imediatas.

No caso argentino, o desafio de Milei é solucionar uma profunda crise econômica e fiscal. Em seu discurso de posse, disse que “não há dinheiro” e que fará “um tratamento de choque” no país, porque “não há espaço para o gradualismo”. Ainda em suas palavras: “Hoje começa uma nova era na Argentina (...) Os argentinos expressaram de forma esmagadora uma vontade de mudança que não tem retorno. Não há volta atrás”. Logo após, Milei desvalorizou a moeda argentina, congelou obras públicas, reduziu subsídios, assinou um Decreto de Necessidade e Urgência promovendo uma desregulamentação da economia do país e, mais recentemente, propôs um pacote de medidas que prevê fim das eleições primárias, novas regras para reajuste de aposentados, aumento da pena de prisão para quem participar de atos contra o governo, etc. (Pacote de Milei decreta emergência até 2025, muda eleições, endurece segurança e desregula economia , Estadão, 27/12/2023).

Eliane Cantanhêde - Taí, uma guerra transparente

O Estado de S. Paulo

Toffoli dobra a aposta e leva o escândalo da suspensão de multas à mídia internacional

O ministro do STF Dias Toffoli deu de ombros para a repercussão fortemente negativa à suspensão do pagamento de multas bilionárias da J&F e da Novonor/Odebrecht por corrupção e dobrou a aposta com uma briga para lá de audaciosa: contra a Transparência Internacional (TI), ONG respeitada no mundo inteiro por seu monitoramento justamente da... corrupção. Um escândalo que parecia doméstico agora é internacional.

No Índice de Percepção da Corrupção de 2023, feito pela TI, o Brasil caiu dez posições, para o pior desempenho desde 1995, em 104º lugar entre 180 países. O relatório, que atribui a culpa ao governo Jair Bolsonaro e ao primeiro ano do terceiro mandato de Lula, cita Dias Toffoli nove vezes.

Carlos Andreazza - Dias Toffoli desce a ladeira


O Globo

Não haverá precedentes ao grau de ingenuidade de quem acreditar que J&F e Odebrecht voltarão a pagar as multas conforme contratado em seus acordos de leniência. A inexistência de prazo para as revisões não deixa dúvida. A suspensão é anistia. No horizonte próximo: a anistia geral.

(E será o caso de perguntar por onde vai a indignação de Fernando Haddad ante decisão judicial que lhe derrubou a arrecadação. Já se mobiliza a Advocacia-Geral da União?)

Dias Toffoli, monocrata de causas CNPJ, anistiou as empresas, retirada a grade — não a que protegia o STF depois do 8 de Janeiro — para que outras vítimas do “pau de arara do século XXI”, oprimidos como Emílio Odebrecht, reivindiquem a formalização do pagamento interrompido. A Odebrecht pediu em janeiro. Levaria em fevereiro. A J&F levara em dezembro.

Cláudio Carraly* - O enfrentamento da extrema-direita e o papel da imprensa

Nos tempos contemporâneos, a ascensão da extrema-direita e a disseminação de discursos de ódio têm provocado profunda inquietação na sociedade global. A utilização desses discursos, como uma tática para ganhar espaço na mídia tradicional, tem alimentado uma onda fascista que se espalhou mundo afora, minando os valores fundamentais da democracia, da tolerância e da diversidade. Diante dessa conjuntura, é imperativo explorar estratégias pela imprensa e pela sociedade democrática para responder de maneira eficaz a essa tática sem cair na armadilha de se tornarem meios de propaganda para os extremistas de direita. Analiso o papel da imprensa, os desafios que ela enfrenta e como apresentar abordagens fundamentadas e aprofundadas para preservar a integridade da informação e defesa da democracia.

Adriana Fernandes - Proposta paralela de regulamentação da reforma tributária vai tirar poder dos Fiscos

Folha de S. Paulo

Parlamentares disputam protagonismo em decisão de detalhes de como funcionará novo sistema de tributos

A volta dos trabalhos do Congresso começa nesta segunda-feira (5) já com a disputa por protagonismo em torno da regulamentação da reforma tributária sobre os impostos do consumo.

O gatilho começou porque o Ministério da Fazenda criou 19 grupos de trabalho para regulamentar o texto da emenda constitucional, porém, não incluiu nenhum representante do setor privado. Nenhum sequer.

Os grupos foram instalados e os ânimos não arrefeceram. Pelo contrário, deu mote para que os Congressistas (alguns deles da oposição e que votaram contra a PEC da reforma) se organizassem para começar o ano legislativo com a pauta paralela da regulamentação.

Dora Kramer - O silêncio dos coniventes

Folha de S. Paulo

Executivo e Judiciário olham inertes a anulação de ilícitos expostos em excesso de provas

Muito já se falou, em tom de discordância e espanto, sobre as decisões do ministro Dias Toffoli de anular provas e suspender multas decorrentes da corrupção assumida por empresas envolvidas em negócios escusos com políticos, partidos e governos. As razões alegadas pelo ministro de suspeição dos investigadores e supostos atos de constrangimento ilegal na obtenção das confissões são contestadas pelos fatos, mas as decisões estão tomadas e já produzem efeito cascata.

Alvaro Costa e Silva - Para Lula, Bolsonaro continua o adversário a ser batido

Folha de S. Paulo

Eleições nas capitais mostram o país paralisado em 2022

Um candidato anticomunista, antivacina, armamentista, a favor do voto impresso e do impeachment de ministros do Supremo. Bolsonaro? Não, um genérico —o coronel aposentado da Polícia Militar Ricardo Mello Araújo—, sugestão de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, para vice na chapa de reeleição do prefeito de São PauloRicardo Nunes.

A escolha, óbvio, tem o aval do ex-presidente tornado inelegível e investigado por uma penca de crimes —da tentativa de golpe a ter transformado a Abin num covil de arapongas trabalhando para ele e sua família. Atual vendedor de cursinhos, o capitão responde até por importunar baleias. Poderia haver aí um certo exagero, se não fosse mais um crime. Perpetrado como estratégia para cutucar a sociedade e mobilizar seus seguidores.

Quais as credenciais de Mello Araújo, ex-comandante da Rota, para administrar a maior cidade do Brasil? A carteirinha de bolsonarista fanático. Em 2021, convocou veteranos da PM para as manifestações golpistas no 7 de Setembro: "Não podemos permitir que o comunismo assuma nosso país". Quando presidiu a Ceagesp, em 2020, quis instalar um clube de tiro nas dependências da empresa.

Hélio Schwartsman - Os católicos e o DIU

Folha de S. Paulo

Católicos devem ter direito à objeção de consciência, mas quem não oferece todos os métodos contraceptivos não poderia estar no SUS

É fácil ser liberal em relação a posições com as quais concordamos. Como defensor do direito ao aborto, nem pestanejo antes de afirmar em alto e bom som que mulheres devem ser soberanas sobre seus úteros.

Já defender o direito de um médico ou instituição médica católicos de não realizar procedimentos contrários aos ensinamentos de sua religião, como a inserção de DIUs, é mais sofrido. Mas, como tenho um gosto inexplicável pela coerência, não vejo como não estender aos católicos o princípio de que cada um deve ser livre para definir o que vai ou não fazer, desde que a ação ou inação não se converta em ameaça a terceiros. Não estamos aqui falando de um procedimento de emergência, o que mudaria o caráter da discussão.

Poesia | Vinicius de Moraes - Poema Enjoadinho

 

Música | Não deixe o samba morrer - Alcione