segunda-feira, 25 de abril de 2016

Opinião do dia – Fernando Gabeira

Esse espetáculo decadente me entristece, apenas isso. Um jovem senador do PT disse que não dará sossego ao novo governo. O país terá de trabalhar muito para sair da crise e deve se concentrar nisso. Mesmo porque a própria Lava-Jato vai se encarregar de não dar sossego aos petistas, inclusive ao jovem senador.

Dilma foi cassada por crime de responsabilidade fiscal, decretos secretos para financiar um rombo de milhões, criar uma ilusão de prosperidade e vencer as eleições. Repetiu o erro em 2015. Se não fosse cassada por isso, seria pelos fatos de Curitiba: campanha com dinheiro do Petrolão, tentativa de obstruir a Justiça. O que vem de Curitiba não resulta apenas em impeachment, mas possivelmente em anos de cadeia. E cadeia, jovem senador, é um lugar que sintetizo numa frase que vi em várias celas onde estive preso e dezenas que visitei: “aqui, o filho chora, e mãe não ouve”.

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- Fernando Gabeira é jornalista. ‘Feio, mas necessário’. O Globo, 24/4/2016

Com apenas 5 votos pró- Dilma, comissão abre trabalhos hoje

• Governo já prevê derrota também no plenário do Senado e estuda ir ao Supremo

A comissão especial do Senado que analisará o processo de impeachment será instalada hoje com cenário amplamente desfavorável à presidente: apenas cinco dos 21 integrantes apoiam Dilma Rousseff. O parecer sobre a aceitação do processo será votado até 9 de maio, quando segue para o plenário, onde ela também não tem maioria. Diante da derrota iminente, o governo pensa em recorrer ao STF, e aliados falam em criar um “tribunal internacional”, sem valor jurídico, para denunciar o que chamam de farsa. A intenção da presidente de invocar a cláusula democrática do Mercosul para que o Brasil seja punido, se ela perder o cargo, seria derrotada se votada hoje.

Cenário sombrio para Dilma

• Em comissão de 21 integrantes a ser instalada hoje no Senado, só cinco apoiam presidente

Eduardo Bresciani, Maria Lima - O Globo

- BRASÍLIA-O Senado elege hoje os parlamentares que formarão a comissão especial que analisará o processo de impeachment em um cenário no qual a presidente Dilma Rousseff conta com apenas cinco votos entre os 21 integrantes. Apesar da larga desvantagem, o governo e o PT dizem acreditar em uma virada para evitar a admissibilidade do processo, que levaria a um afastamento de Dilma por 180 dias. Mas já trabalham também para que, no cenário de derrota, além de possíveis questionamentos no Supremo Tribunal Federal ( STF), como já admitiu o advogado- geral da União, José Eduardo Cardozo, seja formado até um “tribunal internacional” com juristas estrangeiros para acompanhar o julgamento final no Congresso — uma estratégia sem valor jurídico para tentar influenciar a opinião pública.

O comando do colegiado deve ficar com uma dupla que tem a discrição como ponto em comum. Antonio Anastasia (PSDB- MG) e Raimundo Lira ( PMDB- PB), relator e presidente, respectivamente, devem ser confirmados amanhã para as funções durante a instalação da comissão. Os dois são descritos como extremamente leais a seus partidos, o que significa que é dada como irreversível a posição contra o governo. Os petistas criticam a indicação de Anastasia justamente por afirmar que ele já tem “voto pronto” no caso. Anastasia é o braço- direito do presidente nacional do PSDB, Aécio Neves, em Minas Gerais.

A eleição da comissão pelo plenário deveria ter ocorrido semana passada, mas o PT conseguiu, com ajuda do presidente do Senado, Renan Calheiros ( PMDB- AL), adiar essa etapa. O governo quer alongar o processo ao máximo porque, além da desvantagem na comissão, não teria como resistir no plenário, onde a oposição precisa de 41 votos; e 48 senadores já se dizem a favor do afastamento, em enquete do GLOBO.

— Tem clima de virada na sociedade e vamos para o debate. Temos os argumentos do nosso lado, porque não há crime e há uma insegurança cada vez maior com Michel Temer. Sabemos que é difícil, mas não jogaremos a toalha — disse o senador Lindbergh Farias ( PT- RJ), um dos votos a favor de Dilma.

O discurso de que ainda é possível evitar o afastamento da presidente, porém, não impede a preparação para batalhas futuras. Lindbergh conta que há uma articulação para reunir juristas de vários países, que acompanhariam o processo e mostrariam que haveria uma “fraude”.

— Começamos a fazer a articulação de uma rede internacional. Queremos montar um tribunal paralelo de acompanhamento do julgamento, com juristas das principais universidades do mundo. Os grandes julgamentos sempre têm algo assim. Teremos esses juristas emitindo pareceres para desmoralizar isso tudo como uma grande fraude — diz o petista.

O parecer aprovado pela Câmara restringiu os fatos apontados no processo de impeachment como crime de responsabilidade: “pedaladas fiscais” de 2015 e decretos de crédito suplementar do mesmo ano. Para o governo, no debate de mérito é possível demonstrar que isso não sustentaria uma punição tão grave. O ministro José Eduardo Cardozo já admitiu o recurso ao Supremo como alternativa.

Raimundo Lira já anunciou que abrirá espaço para Cardozo falar na comissão e que pretende usar o prazo máximo de dez dias úteis. Por esse cronograma, até 12 de maio deve ser tomada em plenário a decisão sobre a admissibilidade e o consequente afastamento de Dilma. O líder do DEM, Ronaldo Caiado (GO), critica o calendário:

— O Brasil derretendo e eles querendo procrastinar. Vamos ficar quase um mês nesta situação de um país sem governo.

Caiado concorda que houve a restrição da denúncia contra Dilma aos temas de 2015. Afirma que a oposição não cometerá um “erro primário” de ampliar o espectro. E acredita que, caso o tema seja levado ao Supremo, dificilmente a Corte tomará qualquer decisão, uma vez que a Constituição determina que cabe ao Senado decidir se houve crime de responsabilidade.

O líder do DEM afirma ainda que o governo busca uma “ingerência indevida” ao pedir ajuda internacional para defender Dilma e questiona quem bancaria os juristas que reforçariam a estratégia de defesa.

Futuro presidente da comissão, Lira é descrito por parlamentares dos dois lados como fiel ao líder do PMDB, Eunício Oliveira (PMDB- CE). Ele é suplente de Vital do Rêgo e assumiu após o titular ter sido indicado para o Tribunal de Contas da União (TCU). É parente por afinidade do ex-senador cassado Luiz Estevão de Oliveira. Já passou por PDS, PRN — apoiou a eleição de Fernando Collor em 1989 — e agora está no PMDB. Foi constituinte em 1988. Tinha anunciado voto contra Dilma na comissão, mas pediu para ser tratado como “indeciso” e, assim, ter a isenção necessária para a função.

Anastasia foi homem forte de todos os governos de Aécio. Aos 26 anos, assessorou o relator da Constituinte mineira Bonifácio Mourão. Aos 29, já professor na UFMG, foi secretário- adjunto de Planejamento do governo Hélio Garcia. Sua atuação em Minas o levou para Brasília, onde foi secretário- executivo dos ministérios do Trabalho e da Justiça na gestão Fernando Henrique. Só então teve o primeiro contato com o então deputado Aécio Neves. A partir desse encontro, não se separaram: ele foi secretário de Planejamento, vice de Aécio e seu sucessor.

O tucano chegou ao Senado em fevereiro de 2015. Um mês depois passou a ser investigado na Operação Lava- Jato, com base num depoimento do policial Jayme de Oliveira Filho, o Careca. O policial disse ter entregado dinheiro numa casa em Belo Horizonte, a pedido do doleiro Alberto Youssef, a uma pessoa que se parecia com Anastasia. Em agosto de 2015, o procurador-geral Rodrigo Janot pediu o arquivamento. Janot reiterou que não há elementos para vincular o caso ao senador, e o ministro Teori Zavascki arquivou o caso em fevereiro.

Punição para o Brasil, sugerida pela presidente, seria rejeitada pelo Mercosul

• Dilma citou violação da cláusula democrática, em caso de impeachment

Janaína Figueiredo, Eliane Oliveira - O Globo

- BUENOS AIRES E BRASÍLIA- Caso a presidente Dilma Rousseff cumpra o que declarou na última sexta- feira, em Nova York, após participar de uma reunião sobre clima, e invocar formalmente a cláusula democrática do Mercosul, por causa do processo de impeachment que enfrenta no Congresso, terá seu pedido rejeitado. Paraguai e Argentina não apoiam a ideia e não há consenso entre as autoridades uruguaias. O único país que defenderia uma punição seria a Venezuela.

A estratégia do Palácio do Planalto é não reivindicar diretamente a suspensão ou uma moção de apoio a Dilma. A saída seria os venezuelanos tomarem a frente nessa empreitada. A decisão a favor de uma eventual punição precisaria ser tomada por consenso. Um único membro contra detonaria qualquer possibilidade de uso da cláusula democrática — que, se adotada, teria como consequências desde a suspensão do Brasil da união aduaneira sul- americana até a exclusão do país de acordos de cooperação na região.

Impeachment fora da pauta
Anteontem, houve uma reunião de chanceleres da União de Nações Sul- Americanas ( Unasul) em Quito, no Equador. O tema do impeachment não entrou na pauta, pelo menos oficialmente, segundo uma graduada fonte da área diplomática. Hoje, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, estará em Montevidéu, no Uruguai, para um encontro de ministros do Mercosul para celebrar os 25 anos do bloco. O assunto poderá ser tratado nos bastidores.

Em meados de 2012, o governo Dilma foi o principal promotor, com o da ex- presidente argentina Cristina Kirchner, da aplicação da cláusula democrática do Mercosul para suspender o Paraguai do bloco, por considerar inconstitucional e ilegal o impeachment do então presidente Fernando Lugo. O Paraguai, confirmou ao GLOBO uma alta fonte do governo do presidente Horacio Cartes, culpa Dilma por uma retaliação que causou “graves problemas econômicos ao país” há quase quatro anos. Os paraguaios não estão dispostos a apoiar a implementação da mesma cláusula contra um eventual governo de Michel Temer.

A mesma posição, por diferentes motivos, é sustentada pelo governo do presidente argentino, Mauricio Macri. A coalizão esquerdista Frente Ampla, que governa o Uruguai desde 2005, está dividida, mas até agora vem se impondo a posição contra a ativação da cláusula. O único sócio do Brasil que defenderia uma punição ao país, em caso de derrota de Dilma no Senado, seria a Venezuela do presidente Nicolás Maduro.

— O Paraguai foi o país que impediu, recentemente, que a Unasul organizasse uma cúpula de chefes de Estado para defender o governo Dilma. Consideramos que seria uma ingerência em questões internas de um país que tem independência de poderes — disse a fonte do governo Cartes.

Venezuela: voz isolada
Segundo essa fonte, “a eventual saída de Dilma do governo provoca até mesmo certo alívio em setores do governo paraguaio, porque muitos nunca a perdoaram por ter liderado a campanha contra nosso país quando Lugo foi destituído”. O Paraguai só retornou ao bloco meses após a posse de Cartes, em agosto de 2013.

Em Montevidéu, o governo do presidente Tabaré Vázquez está dividido em alas pró e contra um pronunciamento contundente de condenação ao processo de impeachment. Segundo reportagem do semanário “Busqueda”, a crise brasileira foi discutida em 18 de abril, na reunião de ministros do governo Vázquez.

O Executivo argentino nunca aderiu à tese do “golpe” contra Dilma e, como Paraguai e Uruguai, não está disposto a votar a favor da suspensão do Brasil. Já o presidente venezuelano acha que o governo do PT enfrenta um “golpe da Justiça, da mídia e do Congresso”, “um golpe contra todos os povos da América Latina”. (* Correspondente)

Em meio a divergência no PSDB, Serra se reúne com Temer

• Vice-presidente recebe senador tucano, favorável à ocupação de cargos em eventual novo governo

Em posição oposta e de olho na corrida presidencial de 2018, Aécio e Alckmin propõem que partido apenas dê apoio no Congresso, mas sem ocupar ministérios

Enquanto PSDB diverge, Serra se reúne com Temer

• De olho em 2018, Alckmin e Aécio são contra participar de governo do PMDB; senador paulista é a favor

Júnia Gama - Globo

- BRASÍLIA- Em meio a divergências internas no PSDB sobre a ocupação de cargos num eventual governo de Michel Temer, o senador José Serra ( PSDB- SP) pediu uma conversa ontem com o vice- presidente. O encontro ocorreu à noite, no Palácio do Jaburu, em Brasília, residência oficial do vice-presidente. Apesar da resistência no PSDB, Serra negocia ocupar um ministério num eventual governo do peemedebista.

Para o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), e para o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, os tucanos devem dar sustentação congressual a Temer, mas sem participar formalmente do governo. Os dois são os mais fortes pré-candidatos tucanos para disputar a Presidência, em 2018. Serra corre por fora.

No PMDB, há uma preocupação para que um convite a Serra não melindre a cúpula tucana. Um dos principais articuladores de Temer afirma que conta com o PSDB no governo, mas avalia que não haveria como colocar Serra no governo sem um acordo com todo o tucanato.

— Tem que ter o PSDB. Isso vai fazer com que o Serra, que é um quadro excepcional, tenha que construir isso lá para poder figurar no governo. Se não, a gente traz o Serra e briga com o PSDB. Isso não vamos fazer. Não dá para brigar com o PSDB — diz o interlocutor de Temer.

Serra é cotado para pasta na área social
A expectativa do entorno do vice é que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso atue para buscar uma convergência de posições.

— Tanto Alckmin quanto Aécio estão cuidando dos seus próprios planos para 2018 e, por isso, precisamos do ex- presidente Fernando Henrique porque ele está acima disso e olha mais adiante — avalia.

Serra é cotado para assumir uma pasta na área social do governo que tenha grande porte, como Saúde ou Educação. O senador, no entanto, sinalizou a interlocutores ter interesse em integrar a área econômica. Apesar das conversas, um convite a Serra somente deve ocorrer após o PSDB ser pacificado internamente. A ala ligada a Alckmin passou a defender que aqueles que desejam integrar o governo se licenciem do partido. Já Aécio diz que não haverá indicação partidária, mas tampouco punição para quem quiser participar.

Entre os aliados de Aécio e Alckmin, há uma avaliação de que o PSDB pouco teria a ganhar ao entrar no governo, já que Temer enfrentará uma situação de grave crise econômica e convulsão política. Semana passada, Aécio expressou sua preocupação:

— Se você indica nomes, vira sócio de algo que não se sabe o que vai ser ainda. Parafraseando Drummond: no meio do caminho, tem um governo Temer. Vamos ver o que fazer com ele. Nosso consenso é que esse será o governo do PMDB, não é do PSDB. Nós temos um projeto próprio para o Brasil que será efetivado por meio das eleições presidenciais em 2018 — comentou Aécio.

Um interlocutor de Alckmin frisa que o governador e Aécio, apesar de estarem em trincheiras diferentes, cada um trabalhando para ser o nome do partido em 2018, fazem análises semelhantes a respeito da eventual participação num governo Temer. Caso triunfe, as glórias ficarão para o PMDB e pouco agregarão ao PSDB — os bons resultados ficariam, ainda, restritos a José Serra, cotado para ocupar um ministério, fortalecendose na disputa com Alckmin e Aécio. Caso fracasse, poderá afetar a imagem do PSDB e comprometer o projeto da sigla para 2018.

— Tanto o Geraldo quanto o Aécio têm uma visão parecida. Se o governo for bem, será mérito do PMDB; se não for, o PSDB corre risco de se desgastar junto. Essa é a leitura. O cuidado em não participar formalmente é uma tentativa de preservar o PSDB para 2018 — afirma este tucano.

A diferença no comportamento entre os dois está no nível de pressão que cada um está impondo sobre o tema. Alckmin tenta de forma mais enfática evitar que um tucano assuma um ministério no governo Temer, uma disputa que tem como pano de fundo a influência sobre o PSDB paulista, onde está o maior colégio eleitoral do Brasil. Aliado de Alckmin, o secretário- geral do partido, deputado Silvio Torres ( SP), já defendeu que aqueles que queiram ingressar na gestão do PMDB se licenciem do partido. Aécio adotou um tom mais suave, disse que não vai “dar uma de PT e expulsar do partido”.

Para Serra, trata- se de uma oportunidade para levar a cabo seu projeto presidencial, após duas tentativas frustradas: em 2002, quando foi derrotado por Lula, e em 2010, quando Dilma Rousseff ganhou. Uma gestão exitosa num governo do PMDB pode qualificá- lo para o futuro.

Não à toa, Serra tem elevado a pressão para que a cúpula do PSDB dê aval à sua participação no governo Temer. Anteontem, Serra divulgou em seu Twitter mensagem criticando a resistência em compor com o PMDB: “Seria bizarro o PSDB ajudar a fazer o impeachment de Dilma e depois, por questiúnculas e cálculos mesquinhos, lavar as mãos e fugir a suas responsabilidades com o país”, disse.

Após encontro no Jaburu, presidente da Fiesp diz que vice é contra aumento de impostos

• Proposta de ajuste fiscal levada por Skaf sugere redução da máquina e cortes no orçamento

- O Globo

- BRASÍLIA- Acompanhado de outros dirigentes da entidade, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo ( Fiesp), Paulo Skaf, apresentou ontem ao vice- presidente Michel Temer, em reunião no Palácio do Jaburu, a proposta para um ajuste fiscal sem aumento de impostos. A redução do tamanho da máquina governamental estaria entre as sugestões.

Na saída, Skaf afirmou que Temer concordou com a ideia, embora não tenha assumido qualquer compromisso, como abrir mão de uma nova CPMF.

— Ele (Temer) não é a favor de aumento de impostos. Ele respeita muito esse processo ( de impeachment) que não está concluído — afirmou.

Perguntado sobre o que ouviu de Temer após apresentar sua proposta de arrumar as contas públicas fazendo cortes nos gastos do governo, sem aumentar impostos, Skaf não deu detalhes:

— Não vim pegar compromissos do vice- presidente, mas mostrar uma realidade pela qual as empresas e as pessoas estão passando.

O encontro com o vice durou cerca de seis horas. Apesar da longa reunião, Skaf negou que tenha conversado com Temer sobre a composição de um futuro governo ou sido sondado para um posto.

Skaf foi candidato ao governo de São Paulo nas últimas eleições pelo PMDB. É amigo de Temer e participou, com outros líderes empresariais, de um movimento a favor do impeachment da presidente Dilma Rousseff.

O dirigente da Fiesp disse que, mesmo num governo Temer, combaterá o aumento de impostos.

— O governo não teria moral de pedir à sociedade mais impostos. Tem que mostrar serviço primeiro, cortando despesas para acertar suas contas dentro do seu orçamento, como as famílias e as empresas fazem — disse.

Skaf propôs uma reavaliação do orçamento para preservar os programas sociais e também passar a credibilidade de que o país precisa para ter um ambiente propício ao investimento.

Temer descarta recriação da CPMF e aumento de impostos se assumir

• Equipe do vice avalia que País não tem como suportar uma elevação da carga tributária neste momento de recessão da economia; após visita ao Palácio do Jaburu, presidente da Fiesp, Paulo Skaf, disse haver formas de aumentar receitas apenas cortando gastos públicos

Murilo Rodrigues Alves e Vera Rosa - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O vice-presidente Michel Temer descarta aumentar impostos em vigor e também rejeita criar um tributo nos mesmos moldes da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), se assumir a Presidência da República.

Em conversas com alguns de seus principais conselheiros, o vice avaliou que, com a economia em recessão, o País não tem como suportar essa carga agora.

A estratégia para fechar as contas públicas numa eventual gestão de Temer passa pelo corte de gastos públicos e reformas estruturais, a exemplo das mudanças sugeridas para a Previdência. A solução tem o apoio do ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles, com quem Temer conversou no sábado, e do ex-ministro da Fazenda Delfim Netto, que se reuniu com ele na semana passada.

No domingo, foi a vez do presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, se encontrar com Temer, no Palácio do Jaburu, para entregar uma proposta de ajuste fiscal sem aumento de impostos, com enfoque no corte de gastos públicos e na melhoria da gestão. A reunião durou seis horas. Na saída, Skaf afirmou que, embora o objetivo da visita não fosse “colher compromissos”, Temer concordou com a visão de que o aumento da carga tributária acabaria agravando a crise econômica.

“Numa situação como essa, em que os serviços públicos são de má qualidade, de escândalos de corrupção, o governo não deveria ter essa moral de pedir à sociedade mais impostos”, afirmou Skaf. “Tem que mostrar serviço primeiro. Tem que dar o exemplo, cortar desperdício, cortar gastos, acertar as contas dentro do orçamento. A partir daí, com a retomada do crescimento, a arrecadação de impostos aumentará naturalmente.”

A Fiesp é responsável pela campanha “Não vou pagar o pato”, contra o aumento de tributos, e esteve presente no apoio ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A campanha nasceu em setembro de 2015, contra a reedição da CPMF. A entidade não revela o valor da campanha, financiada em parte com recursos públicos.

Arrecadação. Filiado ao PMDB, Skaf agora desponta como conselheiro de Temer e disse ontem que não apoiará, “em hipótese nenhuma”, a volta do tributo ou a criação de outro imposto. “Há, sim, formas de se ajustar as contas, sem aumento de impostos, sem prejuízo dos programas sociais. Há muito desperdício, muito gasto que pode ser evitado”, afirmou.

Estudos da Fiesp mostram que a cada um ponto porcentual de aumento do Produto Interno Bruto (PIB), a arrecadação aumenta 1,5.

Skaf disse que não conversou com o vice sobre a formação do Ministério, caso o impeachment da presidente seja aprovado no Senado. Meirelles foi sondado no sábado por Temer para comandar a Fazenda. Embora oficialmente negue a sondagem, Meirelles disse a Temer que pode aceitar a tarefa, desde que tenha carta branca para comandar a área econômica, sem ingerências políticas.

A exigência prevê que a escolha de nomes para o Ministério do Planejamento, Banco Central, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e até Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passe pelo seu crivo.

Temer e Meirelles combinaram de voltar a conversar em meados de maio, após o julgamento do processo de impeachment no plenário do Senado.

Como tucanos, PSB quer apoio sem cargos

Temer enfrenta dificuldade para montar base no Congresso

• PSB, com 33 deputados e sete senadores, repete o PSDB, que resiste a formar governo se o vice assumir o Planalto

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

FOZ DE IGUAÇU - Sob a expectativa de assumir o Palácio do Planalto, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) está tendo dificuldade para montar uma base aliada consistente no Congresso. Principal interlocutor do gabinete de uma provável transição, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) não está conseguindo amarrar apoios.

Na quinta-feira, a direção executiva do PSB, partido que conta com 33 deputados federais e sete senadores, se reunirá para definir uma posição sobre uma eventual administração Temer. A maioria do colegiado defende a mesma linha que hoje é majoritária no PSDB: não participar com cargos caso Temer assuma a Presidência. A proposta é apoiada pela maioria da direção da legenda e defendida por dois caciques do partido, o vice-governador de São Paulo, Márcio França, e o governador de Pernambuco, Paulo Câmara.

“Uma virtual nova administração precisa ter liberdade para escolher os melhores quadros. É preciso acabar com o toma lá, dá cá”, diz o presidente do PSB, Carlos Siqueira. O discurso oficial do gabinete de transição é que eventual novo governo terá, de partida, os 367 votos favoráveis ao impedimento de Dilma Rousseff na Câmara, número que viabiliza a votação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC).

Centrão. Na prática, porém, a “independência orgânica” dos dois maiores partidos de oposição tende a levar Temer para a permanente e desgastante negociação de varejo com partidos como PP, PSD e PR, que compõem o chamado centrão.

“Tem partido que morreu com a Dilma e pode acabar ressuscitando no governo Temer”, diz o deputado Silvio Torres (SP), secretário-geral do PSDB. Ele defende a licença do partido por tucanos que aceitarem cargos em eventual novo governo.

Para não perder o controle sobre suas bancadas, a cúpula do DEM já visitou Temer.

Disse que dará apoio congressual ao novo governo, mas exigiu que qualquer conversa aconteça em caráter institucional. “Se ele precisar do apoio de um quadro nosso, a conversa será institucional”, diz o senador José Agripino, presidente do DEM. A lista de prioridades do partido já está definida: os deputados Mendonça Filho (PE), Rodrigo Maia (RJ) e José Carlos Aleluia (BA) e o senador Ronaldo Caiado (GO), aposta do DEM para 2018.

Aliados de Temer reconhecem que a proposta de reduzir o número de ministérios é simpática, mas dificultará a montagem da base. A saída será ocupar o segundo escalão, mas isso pode gerar um agenda negativa.

Governo estuda ir ao Supremo se perder na Comissão Especial do Senado

• Palácio do Planalto quer questionar na Corte mérito do processo e pedir a nulidade da denúncia contra a presidente Dilma

Vera Rosa e Ricardo Brito - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - Sem votos para barrar a deposição da presidente Dilma Rousseff, o governo pretende recorrer ao Supremo Tribunal Federal para pedir a nulidade do processo logo que a Comissão Especial do impeachment aprovar o eventual afastamento da petista no Senado, antes mesmo da votação decisiva do plenário.

A Advocacia-Geral da União (AGU) ainda não entrou com recurso contra a decisão da Câmara – que autorizou a abertura do impeachment – para não “banalizar” o expediente. Mas, a partir da primeira manifestação dos senadores, irá à Justiça questionar o mérito do processo.

Embora ministros digam ser possível reverter votos, nos bastidores o comentário no Palácio do Planalto é que Dilma não tem chance nessa primeira etapa do processo no Senado e já estudam estratégias para o julgamento final. Na tarde de hoje, o plenário do Senado vai eleger os 42 titulares e suplentes da Comissão Especial.

“Eu vou procurar os senadores para explicar nossas razões. Trata-se de uma situação em que não existe crime de responsabilidade contra a presidente”, disse o ministro da AGU, José Eduardo Cardozo, que se reuniu ontem com Dilma, no Palácio da Alvorada. “Os argumentos estão do nosso lado. Se forem discutir crime, sabem que não existe”, reforçou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), que será titular da comissão.

Cardozo destacou que o Supremo nunca examinou se há justa causa para o impeachment de Dilma nem “desvio de poder” do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), algoz da presidente. O STF, avaliam governistas, não discutiu o mérito do crime propriamente dito, debruçando-se sobre parte dos procedimentos.

A intenção do governo, agora, é juntar tudo o que considera “atropelo” à lei por parte de Cunha para argumentar que há vícios no processo de impeachment e tentar enterrá-lo. “Na autorização da denúncia pela Câmara ninguém debateu o crime pela qual a presidente era acusada. Além disso, nas razões dos votos dos parlamentares, houve até quem citasse pedaladas de 2014”, afirmou Cardozo, ao lembrar que o processo se refere apenas a atos de 2015.

Tribunal. Em outra frente, o governo e o PT planejam criar uma espécie de tribunal internacional paralelo, para acompanhamento do processo, com a participação de juristas do mundo inteiro. Lindbergh disse que o tribunal pode reunir 8 mil estudiosos do Direito. “A intenção é desmascarar a fraude e o golpe no País”, afirmou.

Os governistas vão questionar formalmente hoje, durante a eleição dos integrantes da Comissão Especial, a escolha do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) como relator. Lembrarão que o tucano, aliado de Aécio Neves (PSDB-MG), é de um partido declaradamente interessado no impeachment de Dilma e que a escolha de relatores teria de respeitar o critério do tamanho das legendas, e não dos blocos partidários.

Confronto entre Dilma e Temer chega à área social

Por Andrea Jubé e Cristiane Agostine – Valor Econômico

BRASÍLIA e SÃO PAULO - Na semana em que o Senado começa a analisar o processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer miram a área social. O PMDB divulga o documento "Ponte para o Futuro 2 - Travessia Social", que detalhará as propostas para o segmento e busca neutralizar o discurso de Dilma e do PT de que seu eventual governo eliminará programas e restringirá direitos.

Em outra frente, Dilma reforçará o discurso do "golpe" e buscará o apoio de seus eleitores e dos movimentos sociais para concluir o mandato. A presidente volta ao palanque na Bahia, em mais uma cerimônia de entrega de unidades do Minha Casa, Minha Vida, vitrine de seus programas sociais.

O ex-ministro Moreira Franco, um dos formuladores do "Travessia Social", disse ao Valor que os programas sociais comandados por Dilma estão "destruídos". Lembrou que não há reajuste do Bolsa Família desde 2014 e que faltam recursos para projetos de educação. O documento do PMDB para a área social foi elaborado por ele e pelo economista Ricardo Paes de Barros, referência em desigualdade e pobreza. A proposta é aprimorar os programas sociais existentes, mas apontar saídas para a dependência do Estado.

De seu lado, os movimentos sociais, em estratégia articulada com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com o PT, preparam uma ofensiva contra Temer e o PMDB com chamados para mobilizações e paralisações em todo o país. Nesta semana, o MTST pretende bloquear entre 30 e 40 rodovias e avenidas em 10 Estados. No domingo, as entidades se reunirão para fazer do 1º de Maio um dia de luta contra o impeachment de Dilma.

A ideia é reforçar que Temer não terá legitimidade nem respaldo popular para aprovar as principais medidas de sua gestão, ainda que faça acenos como o aumento do valor do Bolsa Família. Os grupos planejam também uma greve geral, sem data definida. Apesar da perspectiva de que será difícil mudar no Senado a decisão da Câmara sobre o impeachment, Lula e lideranças dos movimentos definiram que é preciso manter a pressão sobre os senadores.

Área social é destaque no confronto da semana entre Dilma e Temer
Na semana em que o Senado começa a analisar o processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer miram a área social. Até amanhã, o PMDB divulga o documento "Ponte para o Futuro 2 - Travessia Social", que detalhará as propostas de Temer para o segmento e busca neutralizar o discurso de Dilma e dos petistas de que seu eventual governo eliminará programas e restringirá direitos.

Em outra frente, Dilma reforçará o discurso do "golpe" e buscará o apoio de seus eleitores e dos movimentos sociais para concluir o mandato. Amanhã a presidente volta ao palanque na Bahia - um dos Estados que lhe garantiu mais votos na Câmara dos Deputados contra o impeachment -, em mais uma cerimônia de entrega de unidades do Minha Casa, Minha Vida, vitrine de seus programas sociais.

O Minha Casa, Minha Vida é um dos programas mencionados no documento "Travessia Social", e que Temer pretende aprimorar. Segundo dados do Ministério das Cidades, os governos Lula e Dilma já entregaram 2,63 milhões de casas. E na gestão Dilma, restam ser entregues mais 1,5 milhão de moradias, que já foram contratadas com a Caixa Econômica Federal.

O ex-ministro Wellington Moreira Franco, um dos formuladores do "Travessia Social", disse ao Valor que os programas sociais comandados por Dilma estão "destruídos". Lembrou que não há reajuste do Bolsa Família desde 2014 - naquele ano, os benefícios foram reajustados em 10%. Observou que faltam recursos ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e que professores do Programa de Acesso ao Ensino Técnico (Pronatec) não estariam recebendo salários.

O documento do PMDB para a área social foi elaborado por Moreira Franco e pelo economista Ricardo Paes de Barros, um dos "pais" do programa Bolsa Família e referência em desigualdade e pobreza. A proposta é aprimorar os programas sociais existentes, identificar fraudes e, principalmente, apontar "portas de saída" para a dependência do Estado.

O nome "Travessia Social" é criação do publicitário Elsinho Mouco, que também assinou os últimos programas do PMDB, já com discurso de oposição ao governo. O documento é a principal "vacina" que Temer e o PMDB usarão contra a retórica de Dilma e Lula de que haverá retrocesso e perdas de conquistas sociais.

Enquanto o PMDB entra na disputa pela área social, a presidente Dilma continuará a encarnar o papel de "vítima" e intensificará a exposição pública. Além da entrega de casas na Bahia, ela prosseguirá com a ofensiva internacional.

Depois de reafirmar a ilegalidade do impeachment à imprensa internacional, após sua participação na conferência da Organização das Nações Unidas (ONU), Dilma reforçará o discurso do "golpe" à jornalista Christiane Amanpour, da rede CNN, a quem concede entrevista nesta semana.

Dilma também discute a estratégia jurídica com o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo. Chegou ao Palácio do Planalto a notícia de que ministros do Supremo Tribunal Federal estão irritados com o discurso do "golpe" e com a excessiva judicialização do processo. Por isso, prevalece por ora a ideia de recorrer ao STF somente depois que o Senado votar a admissibilidade do processo, o que está previsto para 12 de maio. Se Dilma for afastada, então será o momento de Cardozo retornar ao STF, agora para alegar a falta de "justa causa" para o processo, ou seja, a inexistência de crime de responsabilidade.

Paralelamente, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente do PT, Rui Falcão, vão ecoar o discurso do "golpe" travestido de impeachment constitucional para interlocutores internacionais. A denúncia será transmitida durante discursos no seminário internacional da "Aliança Progressista", que reúne partidos socialistas, democratas, progressistas e trabalhistas. O evento que ocorre hoje em São Paulo reúne dirigentes de siglas europeias e latino-americanas, como o ex-primeiro-ministro italiano Massimo D'Alema, presidente da Fundación de Estudios Progresistas Europeos (FEPS), Monica Xavier, secretaria-geral do Partido Socialista do Uruguai e o ex-prefeito da Cidade do México Marcelo Ebrard.

As articulações políticas vão se concentrar na capital federal nesta semana. Depois de comandar reuniões em São Paulo, Michel Temer passa a semana em Brasília. Nos próximos dias, receberá o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que é apontado como seu desafeto.

Dilma reúne hoje ministros do núcleo político e lideranças da base aliada no Senado, para afinar sua estratégia de defesa. E o ex-presidente Lula volta amanhã a Brasília, para retomar as articulações contra o impeachment.

Ciclo perverso – Aécio Neves

- Folha de S. Paulo

A poucos dias da comemoração do Dia do Trabalho, milhões de brasileiros compartilham o mesmo sonho: voltar a trabalhar com a carteira assinada.

Apenas em março, 118 mil pessoas perderam seus empregos no mercado formal, o pior resultado em 25 anos. Em todo o Brasil já são mais de 10 milhões de trabalhadores à margem do mercado. Números que se tornam mais preocupantes quando compreendidos na dimensão familiar. A perda do emprego por um trabalhador ou trabalhadora chefe de família impacta a vida de um universo ainda maior de pessoas.

O governo de transição que, ao que tudo indica, se avizinha, tem uma enorme lista de ações emergenciais a serem implementadas na tentativa de salvar o país. É preciso reorganizar as contas públicas, tirar da inércia os setores produtivos, iniciar reformas estruturantes e adotar um pacote de medidas capazes de restabelecer a confiança do mercado e dos cidadãos.

Qualquer ação emergencial, no entanto, precisará ter como prioridade a questão do trabalho, tal a gravidade da situação. Segundo estudo do Instituto Teotônio Vilela, tomando-se como referência o ano de 2015, em um conjunto de 59 países, o Brasil foi o campeão mundial em geração de desemprego. O segundo lugar foi a Nigéria, país que sofre com o terrorismo e com a queda do preço do petróleo.

A deterioração do mercado de trabalho é o retrato cruel de uma economia paralisada. Sem crescimento, as empresas param de investir e passam a demitir, o poder de compra das famílias cai e as vendas despencam. Com a recessão instalada, o ciclo se repete. O desemprego precisa merecer a atenção do país, não apenas como estatística econômica, mas no seu aspecto social, como elemento devastador e desagregador da vida familiar. Hoje, ele atinge trabalhadores com todos os níveis de escolaridade, inclusive os profissionais com curso superior.

Tudo isso contribui para desenhar um futuro de profunda incerteza. Ao deslocar para fora do mercado um enorme contingente de profissionais experientes e qualificados, estamos colocando em risco parte substancial do esforço feito, nos últimos anos, em qualificação e formação de mão de obra. É como se, de uma hora para outra, o país ficasse com menos potencial para voltar a crescer.

A retomada da economia tão desejada pela nação terá de cumprir um duro percurso. Foram muitos os descalabros promovidos em anos de inépcia e irresponsabilidade. O país já disse que quer mudanças e o Parlamento brasileiro está alinhado com este sentimento dominante. Precisamos ter clareza não apenas da profundidade da crise na qual estamos imersos, mas, principalmente, da necessária urgência em começar a superá-la.
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Aécio Neves é senador e presidente nacional do PSDB

Roteiros para tragédia brasileira - Fausto Matto Grosso

Jornal da Cidade (MS)

Dizia um filósofo nascido no reino da Prússia, que os homens fazem a história, mas não a fazem como desejam, nem dentro das condições que gostariam, suas ações são condicionadas, assim, pelo contexto histórico em que vivem. Parto dessa ideia para analisar as difíceis saídas para a tragédia vivida pelo país.

Considero, também, alguns pressupostos. Primeiramente, a continuidade do processo democrático está garantida em qualquer circunstância. O Brasil amadureceu e as instituições democráticas funcionam normalmente, garantidas pela Constituição, pelas instituições existentes e pela vontade majoritária da Nação. Não há hipóteses de golpes.

Da mesma forma, ninguém conseguirá segurar o processo de apuração dos atos de corrupção desencadeados pela operação Lava-Jato e outras, que sinalizam uma nova marcação no tempo histórico da sociedade brasileira. Tombarão tantos quantos forem sendo apontados, comprovadamente, pelas ações do Ministério Público e da Polícia Federal, com inteiro apoio da população.

Outro aspecto importante é que, em hipótese alguma, existe a possibilidade de o bloco de poder atual voltar a ter condições de liderar o processo de saída da crise. Não há volta nesse processo desencadeado a partir do impeachment na Câmara, com previsível confirmação de legitimidade pelo Supremo Tribunal Federal. Presenciamos o esgotamento do ciclo do lulo-petismo.

O futuro, entretanto, poderá nos reservar ainda muitas surpresas com vários desdobramentos possíveis. O fator de maior impacto ficará por conta de uma eventual anulação das eleições de 2014 pelo TSE, por conta de financiamento eleitoral ilegal, decorrente da corrupção. Com seu rito próprio, esse tipo de decisão costuma ser demorado. O tempo do TSE poderá implicar em novas eleições diretas ainda neste ano ou eleição indireta pelo Congresso a partir de janeiro do próximo ano.

Diante disso, no processo da vida real, o contexto em que vivemos é o de termos, em curto prazo, Michel Temer como presidente. É assim que manda o ordenamento jurídico existente. Temer estará brevemente diante do desafio do seu contexto histórico. Terá ele capacidade de montar um ministério de alto nível, com capacidade técnica e política e representatividade nas forças sociais que apostam nas mudanças? Imagino que sim, até por instinto de sobrevivência, poderá fazê-lo, repetindo um papel semelhante ao de Itamar Franco após o impeachment de Collor.

Só assim, com um amplo entendimento nacional - político e social – poderá o novo governo, responsavelmente, arrancar o Brasil da sua crise, ainda assim por um processo extremamente penoso.

Não me refiro a esse arranjo congressual espúrio que tem marcado a política brasileira nos últimos anos. A representação política está em crise, a qualidade dos políticos piorou muito, falta-nos lideres com compromissos republicanos e com credibilidade. A votação do impeachment na Câmara, a despeito do resultado positivo, com poucas exceções, foi de bizarrice explícita e chocante, exibição pública de personalismo alienado, de populismo e de provincianismo.

O conjunto das forças políticas e sociais que vierem a compor esse governo de transição deverá estar tão solidamente alicerçado, de maneira que esse arranjo possa sobreviver até mesmo à substituição de Temer, se atingido pela justiça. Poderá esse bloco, inclusive se projetar como futura aliança eleitoral no caso de convocação antecipada de novas eleições complementares. Naturalmente ficará fora desse arranjo o PT, o que não é novidade histórica.

Caberá a essa nova gestão o desafio de realizar as reformas estruturantes que não podem mais ser adiadas e, para tanto, precisará da contribuição de todos aqueles verdadeiramente comprometidos com o país. Assim, após uma transição penosa, diante da magnitude da herança maldita deixada pelo lulo-petimo, o país poderá encontrar caminho mais seguro a partir das eleições de 2018.
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Fausto Matto Grosso é engenheiro e professor, membro do Diretório Nacional do PPS

A hora e a vez de Lula - Ricardo Noblat

- O Globo

No passado, os golpes foram feitos com tanques e armas. Hoje, bastam mãos propensas a rasgar a Constituição Dilma Rousseff

Na tarde quente do domingo, 5 de junho de 2005, um homem de meia- idade e uma vidente famosa em São Paulo foram admitidos no apartamento do então presidente Lula, em São Bernardo do Campo. Lula e a mulher conversaram a sós por 20 minutos. Depois que ela foi embora, Lula contou ao homem sobre o terremoto que ameaçava desestabilizar o seu governo e sobre o que faria para tentar sobreviver.

NAS TRÊS SEMANAS anteriores, o noticiário girava em torno de um único assunto: a compra pelo governo de votos de deputados para aprovar projetos do seu interesse. Feita pelo deputado Roberto Jefferson ( RJ), presidente do PTB, a denúncia ganhara status de escândalo e estava prestes a ser alçada à condição de maior escândalo de corrupção desde a chegada do PT ao poder.

PARA ISSO, só faltava Jefferson conceder uma entrevista explicando em detalhes tudo o que dissera até ali e acrescentando novas revelações. Pouco antes da chegada do homem e da vidente ao seu apartamento, Lula ficara sabendo que já não faltava mais nada. Jefferson falara à jornalista Renata Lo Prete, da “Folha de S. Paulo”. E a entrevista seria publicada no dia seguinte.

ENTRE OUTRAS COISAS, Jefferson diria que deputados de partidos aliados do governo recebiam o que chamou de um “mensalão” de R$ 30 mil pago pelo tesoureiro do PT Delúbio Soares. Segundo Jefferson, ele alertara a respeito vários ministros do governo — entre eles, José Dirceu, da Casa Civil; e Antonio Palocci, da Fazenda. No janeiro anterior, alertara também o próprio Lula, que chorou.

“A ENTREVISTA DO Roberto vai virar o país de cabeça para baixo”, comentou Lula com o amigo que o ouvia em silêncio. “Todo mundo vai achar que o governo não se sustentará mais de pé e que talvez nem consiga chegar ao fim. Mas acredite: a montanha vai parir um rato. Pensam que vão me destruir. Pois vou me reeleger e fazer meu sucessor”.

LULA NÃO CONTOU como imaginava sobreviver. Mas como se falasse sozinho, aduziu em voz baixa: “Vou aproveitar para me livrar de Zé Dirceu e até de Palocci”. De Dirceu, Lula se livraria dali a um mês, ao forçá-lo a pedir demissão. Dirceu assumiu seu mandato de deputado federal, mas foi cassado. Acabou condenado a sete anos e 11 meses de prisão. Ficou 11 meses preso.

FOI PRESO novamente pela Lava- Jato no ano passado e virou réu. Quanto a Palocci, Lula se livrou dele em março de 2006, quando o caseiro Francenildo Costa teve seu sigilo bancário quebrado ilegalmente pelo governo. Francenildo havia flagrado Palocci uma dezena de vezes numa mansão de Brasília frequentada por prostitutas e lobistas.

O MENSALÃO NÃO foi um escândalo, e o petrolão, outro. Rodrigo Janot, procurador- geral da República, admitiu semana passada que os dois não passam de uma coisa só — um bilionário esquema de corrupção para sustentar no poder o PT e seus aliados. Lula reelegeu- se, elegeu Dilma e a reelegeu. Mas Dilma está a poucos dias de cair. E ele, Lula...

A LAVA- JATO DISPÕE de indícios e provas suficientes para prendê-lo por obstrução da Justiça, ocultação de bens em nomes de terceiros e recebimento de dinheiro por palestras que não fez. Lula só não foi preso ainda porque o Supremo Tribunal Federal avocou a responsabilidade de decidir o futuro dele, uma vez que Dilma o havia nomeado ministro. Em breve, pode mandar prendê-lo. Ou deixar que o juiz Sérgio Moro o faça.

Por quem Lula chorou? – Valdo Cruz

- Folha de S. Paulo

Lula foi às lágrimas no dia da derrota da batalha do impeachment. Ao lado de Dilma, ele chorou três vezes quando a Câmara aprovou a abertura do processo de impedimento contra sua criatura.
O ato de chorar implica profundo sofrimento e demanda respeito – a não ser quando são vertidas lágrimas de crocodilo, o que não era o caso. Mas por quem Lula chorou?

Por Dilma? Certamente, ao ver a seu lado, no Palácio da Alvorada, alguém que, pela história política, não merecia tal destino. Só que Lula também sabe que ela, durante seu governo, fez por onde ser derrotada.
O ex-presidente deve ter se lembrado dos inúmeros conselhos dados à petista nos últimos anos, mas que não foram acatados. Ali, em seu silêncio e olhando pelas vidraças do Alvorada, deve ter se perguntado: por que ela não me ouviu? E chorou.

Pelo PT? Também, ao notar que naquele momento ficava mais complicada sua tarefa de recuperar o projeto original de seu partido, perdido nas negociatas do petrolão ao virar farinha do mesmo saco e aderir ao velho esquema da propina.

Por ele mesmo? Com certeza, ao sentir que o legado de seu governo corre sério risco de ser aniquilado pelo fracasso da administração de sua sucessora. Naquele instante, Lula deve ter refletido: por que a escolhi candidata? E chorou.

Pelo Brasil? Talvez, mas deveria, porque não tivesse hoje o país mais de 10 milhões de desempregados e mergulhado na pior recessão da história o destino não reservaria tal desfecho para ele e Dilma Rousseff.

Em suas reflexões, o ex-presidente deve estar, principalmente, matutando com os amigos: por que sua criatura nunca fez, de fato, uma autocrítica e assumiu seus erros.

Enfim, interlocutores e amigos de Lula têm a avaliação de que Dilma se aproxima da hora de se afastar do governo numa atitude de autonegação –e quando não se enxerga os próprios erros não se evita os precipícios. Deu no que deu. E em choro.

Matungos e azarões - José Roberto de Toledo

- O Estado de S. Paulo

Tucanos e petistas perdem terreno na corrida presidencial. Qual corrida? Podemos ainda não saber quando será sua chegada, mas a largada ocorreu quando a Câmara autorizou o impeachment de Dilma Rousseff. Pesquisa inédita do Ibope revela novo potencial de voto de sete políticos que, queiram ou não, estão no páreo. Os resultados não são bons para ninguém: nenhum nome avança. Mas são piores para os três do PSDB como também para o do PT.

A pressão popular por uma chegada antecipada é grande: 62% querem eleger um novo presidente já. Pouca gente aprecia as alternativas. Só 25% defendem a permanência de Dilma e meros 8% preferem um governo do vice Michel Temer. O problema para a imensa maioria dos eleitores é que esses 8% concentram-se em Brasília – em especial no Congresso, no Palácio do Jaburu, no Supremo e – a ver – no Tribunal Superior Eleitoral.

Entre quem diz ter votado em Dilma em 2014, as opiniões estão divididas: 45% são pró-continuidade, e 44%, pró-eleição. Entre os que votaram em Aécio Neves (PSDB), três em cada quatro gostariam que Dilma e Temer saíssem, e um novo eleito entrasse: 77%, contra 13% pró-Temer. Essa era, faz pouco tempo, a posição do PSDB. A mudança de lado do partido talvez ajude e explicar por que seus presidenciáveis estão ficando para trás na corrida.

Aécio Neves chegou a ter 51% de potencial de voto em 2014. A taxa caiu para 40% em fevereiro deste ano, e chegou agora em abril a 32%: 11% votariam com certeza no tucano, e 21% dizem que poderiam votar. Sua rejeição cresceu de 44% para 53% desde fevereiro. O desconhecimento oscilou de 14% para 12%. O resto não soube ou não quis responder. Dos 11% que votariam certamente em Aécio, metade (5%) votaria só nele. É seu eleitor exclusivo.

Geraldo Alckmin (PSDB) tinha 29% de potencial em outubro de 2015, oscilou para 30% em fevereiro e caiu para 24% agora (6% votariam com certeza, e 18% poderiam votar). Sua rejeição subiu de 47% para 53% desde fevereiro. Outros 22% dizem não conhecê-lo. O eleitorado exclusivo do governador paulista é de 1%.

José Serra (PSDB) tinha 32% de potencial em outubro de 2015, ficou com os mesmos 32% em fevereiro e caiu para 28% agora (7% votariam com certeza, e 21% poderiam votar). Sua rejeição oscilou de 52% para 54% desde fevereiro. Outros 16% não o conhecem. O eleitorado exclusivo do senador paulista é de 2%.

Lula (PT) chegou a ter 58% de potencial de voto em 2014. A taxa despencou para 34% em fevereiro deste ano, e foi agora para 31%: 19% votariam com certeza no petista, e 12% dizem que poderiam votar. Sua rejeição cresceu de 61% para 65% desde fevereiro. O desconhecimento oscilou de 3% para 2%. A exemplo da rejeição, o eleitorado exclusivo do ex-presidente é o maior de todos: 14%.

Marina Silva (Rede) chegou a 56% de potencial de voto em 2014. A taxa caiu para 41% em fevereiro deste ano, e oscilou agora para 39%: 12% votariam com certeza nela, e 27% dizem que poderiam votar. Sua rejeição cresceu de 42% para 46% desde fevereiro. E o seu desconhecimento oscilou de 15% para 13%. O eleitorado exclusivo da ex-senadora do Acre é de 6%.

Ciro Gomes (PDT) não saiu do lugar. Tinha 20% de potencial em outubro de 2015, foi a 19% em fevereiro e ficou com os mesmos 19% agora (4% votariam com certeza, e 15% poderiam votar). Sua rejeição permanece em 45%. Outros 34% não o conhecem. O eleitorado exclusivo do ex-governador cearense é de 1%.

Jair Bolsonaro (PSC) entrou pela primeira vez na pesquisa e chegou a 11% de potencial de voto: 5% votariam com certeza, e 6% poderiam votar. Outros 34% dizem que não votariam nele de jeito nenhum. Sua rejeição é menor que a dos demais talvez porque ele é o mais desconhecido: 54% não o conhecem. O eleitorado exclusivo do militar da reserva é de 4%.

Como se vê, a corrida presidencial está aberta a azarões.

O governo Temer em foto de corpo inteiro - Marcos Nobre

• É o PSDB que precisa de Temer

- Valor Econômico

Não é porque João Santana está preso em Curitiba que Dilma Rousseff deixaria de usar pesquisas de opinião para orientar seus movimentos. A pecha de "traidor" colou em Michel Temer. Como colou a ideia de que o quase-presidente vai chegar lá "no tapetão". Foi assim que o slogan do "golpe" se espalhou para além da base que defendeu o mandato da presidente. Daí a tolerância para que Dilma exerça o direito de espernear. Daí também o receio do entorno de Temer de que a esperneança vire capacidade efetiva de resistência. Foi assim que, em ano de Olimpíada no país, o circo de horrores do impeachment bananeiro saiu em tournée para o mundo todo poder admirar.

Só que tudo isso nada tem que ver com apoio para que Dilma fique ou retorne. Reconhecer o direito da vítima de espernear não muda o fato de que o "traíra" ganhou a parada. O raciocínio é de um cruel realismo: a manobra foi registrada e não foi bonita, mas também não se vê como o resultado poderia ser revertido. O risco é Dilma confundir as duas coisas, direito de espernear com chances de retomar seu mandato. Se fizer isso, vai esticar a corda para além do prazo que lhe foi dado para se retirar com alguma dignidade. Do ponto de vista dos movimentos que resistem ao impeachment e à posse de Michel Temer na Presidência, o que está em causa é já o futuro, é a reorganização da esquerda na oposição ao novo governo e não mais o governo Dilma.

Tornou-se obrigatório para quem apoiou o impeachment externar horror e repulsa ao lixão da política. Tornou-se obrigatório falar em governo de união nacional e em um ministério de notáveis. Como se um ministério limpinho pudesse conferir ao quase-presidente a legitimidade que seu governo não teria, aplacando consciências e, principalmente, as urnas em futuras eleições. Temer não se recusa a representar a pantomima. Pelo contrário, posa de Itamar Franco precursor do Plano Real. Faz o discurso da unidade e se desdobra para dar a impressão de que está batalhando sem tréguas para trazer para o governo os melhores quadros, independentemente de partidos.

E aí faz exatamente o contrário. Quando janta com Arminio Fraga, quem está presente é o presidente do PSDB, Aécio Neves. Quando se encontra com Henrique Meirelles, na cadeira ao lado está Gilberto Kassab, o presidente do partido a que o ex-presidente do Banco Central está filiado, o PSD. Temer está em busca de acordos partidários e não de pretensos avalistas de seu futuro governo. Temer não precisa de fiadores.

Como presidente da República, vai se comportar da mesma maneira que como presidente do PMDB. Vai dividir o governo segundo os feudos existentes e exigir lealdade formal dos vassalos, só efetivamente cobrada em casos extremos, conforme manda a praxe. Só entrará em campo para resolver disputas de cercas entre feudos. O tal presidencialismo de coalizão que se diz ter vigorado no país por mais de duas décadas vai parecer um parlamentarismo sueco perto do presidencialismo de feudalização que será implantado a partir de maio.

Em governos anteriores, tentou-se com maior ou menor sucesso estabelecer pelo menos um cordão sanitário que mantivesse ao abrigo da feudalização áreas como a econômica, a da saúde ou da educação. Eram áreas consideradas estratégicas dentro de um projeto de governo mais ou menos coerente e coeso. No novo modelo, esse tipo de restrição não irá mais vigorar nem haverá unidade de projeto facilmente identificável.

Mas haverá coerência e unidade na política econômica, condição de sobrevivência do futuro governo. O único feudo inegociável é o da boca do cofre. O novo Joaquim Levy, tenha ele agora o nome de Henrique Meirelles ou outro, terá efetivamente poder sobre a área econômica. Não terá mais de lutar com a própria sombra para implementar a velha nova política de ajuste. A única limitação é calibrar o garrote para tentar evitar explosões sociais incontroláveis. Foi esse o principal legado de 2015 para o governo Temer.

É certo que os feudos terão muito menos recursos com a tesoura da Fazenda funcionando efetivamente. Todo mundo terá de se contentar com pouco. Mas é bem melhor do que nada. Alguma previsibilidade voltará ao cenário partidário. No fundo, a adesão do sistema político ao impeachment se deu porque os partidos já não tinham mais poder efetivo sobre os seus próprios quinhões de governo. Sob Dilma, a paralisia tinha tomado conta da administração. Ninguém conseguia mais ajustar minimamente os gastos de seus feudos às necessidades do ciclo eleitoral. A opção por Temer, por arriscada que fosse, permitia o restabelecimento de um planejamento político mínimo, o que o governo Dilma já não podia mais oferecer.

Para quem apoiou o impeachment, é impossível se distanciar do futuro governo Temer. O máximo a que se pode aspirar é fazer discursos pedindo que o lixão da política se transforme em aterro sanitário, é dar declarações em favor da implantação de alguma coleta seletiva. Mas não é possível dizer que nada tem que ver com o futuro governo. Querendo ou não, quem apoiou o impeachment tem seu destino político colado ao do governo Temer.

Quase todos os partidos demonstram ter plena consciência desse desdobramento. A grande exceção continua a ser o PSDB, que faz como se não fosse com ele. Antes da votação na Câmara, o partido declarou apoio não apenas ao impeachment, mas a um futuro governo Temer. Sua responsabilidade pelo atual estado de coisas é maior do que a de qualquer outro partido pró-impeachment. Dizer que não pariu o governo Temer e querer que outros o embalem não vai livrar a cara em 2018. Aderindo ou não ao futuro governo, o muro tucano desmoronou, juntamente com o próprio PSDB.

Parece perda de tempo se ocupar com a decisão que o partido tomará no dia 3 maio sobre seu posicionamento em relação ao governo Temer. O PSDB é o último a poder dizer que não sabia de nada, que foi traído e que agora está chocado com a imagem de corpo inteiro de um governo do PMDB. O que de fato a foto mostra é que o PSDB precisa muito mais de Temer do que Temer do PSDB.
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Marcos Nobre é professor de filosofia política da Unicamp e pesquisador do Cebrap.

Governo de transição e de reconstrução nacional - Marcus Pestana

- O Tempo (MG)

Como esperado, a Câmara dos Deputados aprovou por 367 votos a 137 o processo de impeachment. O dilatado placar realça o esgotamento de toda e qualquer possibilidade de Dilma continuar à frente do governo. Apesar do festival de justificativas difusas e inadequadas nas declarações de votos de deputados e deputadas, invocando motivações familiares, provincianas ou religiosas, a manifestação da representação política da população foi inequívoca. Houve amplo direito de defesa, e jogaram duro para tentar reverter o resultado. Mas a evidência de que houve crimes em abundância predominou na votação histórica do dia 17 de abril de 2016.

A tentativa inócua de vitimização de Dilma, como mulher honesta e íntegra, e a repetição a esmo de que não haveria golpe restaram inúteis. Ora, José Dirceu, João Santana e João Vaccari Neto estão presos, e Dilma nada tem a ver com isso? Seria um caso crônico de má escolha de companhias ou a expressão máxima de uma solidão doentia? Quanto ao golpe inexistente, já se pronunciaram juristas renomados, a OAB e o próprio STF, ao fixar o rito do processo de impeachment.

Hoje, a maioria dos brasileiros visualiza com clareza e repudia a ocorrência de fraudes fiscais, desrespeito às leis e à Constituição, obstrução da Justiça, crimes e estelionato eleitorais e abuso de poder. Por isso, a tentativa de Dilma de vestir a fantasia de vítima injustiçada se aproxima de ridícula farsa.

O Senado Federal recepcionou o processo e instalará hoje a comissão que apreciará a admissibilidade. Minas terá protagonismo na figura do senador Antonio Anastasia. A votação do afastamento preliminar de Dilma se dará até 15 de maio. Dificilmente, o Senado Federal reverterá a decisão da ampla maioria da Câmara dos Deputados.

Aceito isso, vem a preocupação com o “day after”. O Brasil atravessa uma das mais profundas crises de sua história. Terá o governo Temer ousadia, legitimidade e condições de empreender as reformas necessárias? Há uma chance, se não reproduzirmos os velhos e surrados erros do presidencialismo de cooptação. O governo Temer precisa ser encarado como transitório, emergencial e de reconstrução nacional. Não deve ser construído na lógica de um governo clássico de coalizão partidária. Até certo ponto, deve estar “acima dos partidos”. Sua legitimidade se dará pela credibilidade do novo ministério, pela coragem em suas atitudes e pela construção de expectativas positivas em relação ao futuro. Será que a pequena política permitirá?

A bancada federal do PSDB se reunirá amanhã com o presidente do partido, Aécio Neves. Não queremos cargos. A posição majoritária na bancada é não indicar ministros e quadros. Por outro lado, apoiamos vigorosamente no Congresso uma agenda de mudanças estruturais e um programa emergencial de superação da crise.

O PSDB quer, sim, governar o Brasil, mas por meio da porta aberta em eleições livres e democráticas pela sociedade brasileira em 2018.
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Marcus Pestana é deputado federal (PSDB-MG)

Parasitas da agonia – Vinicius Mota

- Folha de S. Paulo

O longo intervalo entre a votação do impeachment na Câmara e o juízo para instalá-lo, no Senado, expõe Dilma Rousseff a um triste espetáculo. O "reality show" exibe a derrocada física e psicológica da figura que ocupa, sem exercer, o principal cargo da República.

A cada fala em que deslegitima a arquitetura constitucional, a mesma responsável por sua ascensão, Dilma se distancia mais da respeitabilidade. O pior castigo para um mandatário compelido a discursar todo dia é não ser levado a sério.

Quem seria capaz de manter o equilíbrio, a coerência e o sentido de sua missão institucional numa situação como essa? Quanta crueldade é obrigar um presidente de fato deposto –não há volta para quem reuniu contra si mais de 70% dos deputados– a definhar em praça pública!

O erro menor coube ao Supremo, que complicou a leitura deste trecho da Carta: "Admitida a acusação contra o Presidente, por dois terços da Câmara, será ele submetido a julgamento perante o Senado nos crimes de responsabilidade".

O voto derrotado do ministro Edson Fachin, que reconhecia ser da Câmara o papel crucial, ajustava-se melhor à natureza sobretudo política do impeachment. Fachin deveria ser imitado na autocontenção que demonstra em face do Legislativo.

A culpa principal, contudo, é das lideranças que parasitam a lenta agonia de Dilma. Lula e o PT querem uma mártir para evitar o cisma que ameaça retirar da sigla a supremacia na esquerda. Renan Calheiros, Aécio Neves e outros figurões da centro-direita aproveitam o interregno para negociar a adesão ao novo governo.

Nenhum dos dois lados dá a mínima para salvaguardar seja a dignidade de Dilma Rousseff, seja a grandeza da Presidência da República. Se recobrasse o discernimento, Dilma encontraria na renúncia a chave para explodir o conluio que promove esse impiedoso ritual de sacrifício.

Para Aécio, basta apoiar, não precisa participar - Dora Kramer

- O Estado de S. Paulo

O presidente do PSDB, senador Aécio Neves, marcou para o dia 3 de maio uma reunião da Executiva Nacional para anunciar oficialmente a posição do partido em relação ao cada vez mais provável governo de Michel Temer. Contrariamente ao que defendem os paulistas José Serra e Geraldo Alckmin, Aécio tem uma convicção formada que, segundo ele, será corroborada por seus correligionários: apoiar, mas não participar. Ou seja, dar votos, mas não ocupar ministérios.

Isso a fim de não criar na população a ideia de que seria um governo também do PSDB. “É preciso ficar muito bem entendido que nós temos nosso projeto para 2018 e dele não abrimos mão.” Provavelmente reside aí o motivo pelo qual o economista Arminio Fraga tem dito reiteradas vezes que ajuda, mas não integra a equipe de Temer, caso venha a concretizar o afastamento da presidente Dilma Rousseff. Arminio, como se sabe, havia sido escolhido pelo então candidato a presidente para o comando da Fazenda, se ganhasse a eleição de 2014.

Há também no PSDB uma espécie de “programa mínimo”, uma agenda que o partido gostaria de ver encaminhada. De imediato enxugamento na máquina administrativa, fim das nomeações mediante apadrinhamento partidário nas empresas estatais, nas agências reguladoras e nos fundos de pensão. Junto a isso, claro, as reformas política, trabalhista e da Previdência.

Se fosse para dar um conselho a Michel Temer – que, aliás, já deu – Aécio Neves diria que ele não tem tempo para errar, “precisa transformar a expectativa do País em boa impressão”. E recorrendo à frase do designer americano Aaron Burns, completa: “Você nunca tem a segunda chance de causar uma boa impressão”.

E se está tudo bem desenhado, se a decisão está tomada, por que esperar ainda uma semana para anunciar? Em tese, porque é necessário aguardar o juízo de admissibilidade da Comissão Especial do Senado. Na prática, duas razões. Uma, tentar pacificar a questão internamente. A outra, vamos buscar naquilo que Temer depreendeu do encontro que teve com Aécio e Fernando Henrique Cardoso na segunda-feira passada, quando o senador mineiro disse ao vice Temer que a conversa entre PSDB e PMDB deve ser “institucional”. De presidente (de partido) para presidente (da República).

No entendimento do grupo de Temer, isso quer dizer que as coisas não estão assim tão definidas e que há jogo ainda para ser jogado desde que conduzido por Aécio, sem acertos paralelos ou acordos pontuais. Já o presidente do PSDB explica a situação de outra maneira, bem mais direta: os tucanos não virarão as costas, garantem apoio no Congresso, mas na perspectiva de que se trata de um governo do PMDB. Outra turma.

Agora, sem grandes radicalismos, como convém ao tucanato. Por exemplo, se Temer convidar e o senador José Serra aceitar ocupar um ministério, o partido não terá objeções, muito menos fará como o PT que expulsou Luiza Erundina quando ela assumiu a pasta da Administração do no governo de Itamar Franco. Apenas deixará claro que quem aceitar (Serra ou outra pessoa) o fará em nome pessoal.

A mentira do golpe - Paulo Guedes

• A falsa narrativa é na verdade o maior de todos os golpes que poderiam ser desferidos contra o regime democrático brasileiro

- O Globo

A presidente Dilma teve o bom senso de não atacar nossas instituições em sua fala na ONU. Pois a falsa narrativa de que estaria sofrendo um golpe pelo processo de impeachment é na verdade o maior de todos os golpes que poderiam ser desferidos contra o regime democrático. A mentira do golpe é pior do que “um gravíssimo equívoco” e “uma ofensa às nossas instituições”, como condenaram os ministros do Supremo Celso de Mello e Dias Toffoli. É uma perversa convocação à militância na tentativa de manter o poder, apesar das evidências de desrespeito à lei orçamentária e de omissão ou cumplicidade com a roubalheira. É também uma desonesta desculpa para o colapso político e econômico de um país exaurido pela incompetência e pela corrupção.

Compromete nosso futuro porque tenta ocultar o aperfeiçoamento institucional que experimentamos. O despertar de instituições republicanas revela disfunções de um capitalismo de quadrilha, em que se associam a falta de transparência e a corrupção no aparelho de Estado à compra de sustentação parlamentar, cimentando degenerada aliança de piratas privados e criaturas do pântano político. O impeachment de Collor foi golpe contra presidente que não era de “esquerda” e não dividiu o butim? 

Ou foi avanço institucional pela declaração de independência do Legislativo? Poder que exerce agora atribuições constitucionais avaliando a admissibilidade do impeachment de Dilma. Como um Judiciário independente celebrará no futuro as atuações históricas de Joaquim Barbosa e Sergio Moro.

É o fim da administração centralizada gerencialmente caótica (excesso de ministérios) e politicamente desarticulada (sem sintonia com Estados e municípios). Prioridades da democracia emergente (saúde, educação, saneamento) exigem políticas públicas de execução descentralizada. A lipoaspiração do governo federal (reforma administrativa) e a descentralização de recursos para Estados e municípios (reforma fiscal) aumentam a eficiência e melhoram a governabilidade. Impostos disfuncionais (reforma tributária), relações de trabalho obsoletas, encargos sociais proibitivos (reformas trabalhista e previdenciária) e marcos regulatórios deficientes impedem investimentos. As reformas na política e na economia são urgentes e indissociáveis.

Vice-presidente escuta diagnósticos pessimistas – Editorial / Valor Econômico

O ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, admitiu, na semana passada, a possibilidade de um novo contingenciamento das dotações orçamentárias, em virtude da queda continuada das receitas da União. Por isso, Barbosa pediu pressa ao Congresso Nacional para que vote a mudança da meta fiscal deste ano, que autoriza o governo a fazer déficit primário neste ano. Só com a alteração da meta o governo não seria obrigado a fazer os novos cortes, que podem paralisar a administração federal. O apelo do ministro da Fazenda dá uma dimensão precisa da situação dramática das contas da União.

Essa é a realidade sobre a qual a equipe do vice-presidente Michel Temer terá que se debruçar, caso o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff seja acolhido pelo Senado. No encontro que manteve com o economista Armínio Fraga, Temer ouviu que a situação é mais dramática do que aparenta, pois estaria camuflada nas últimas semanas pelo impacto da melhora do mercado internacional e pela própria perspectiva do afastamento de Dilma.

Os diagnósticos que os economistas estão fazendo ao vice-presidente mostram que o Tesouro está quebrado, a grande maioria dos Estados está quebrada, a situação da Petrobras e dos bancos estatais é delicadíssima, existindo a possibilidade concreta de que o Tesouro seja obrigado a capitalizá-los.

A conclusão que o vice-presidente estaria tirando das conversas com os economistas, de acordo com relatos da imprensa, é a de que não poderá se comprometer com o reequilíbrio das contas públicas em um prazo curto. O estrago feito pela gestão de Dilma Rousseff foi grande e para atingir o equilíbrio do Orçamento seria necessário fazer um corte monumental nas despesas, algo como R$ 100 bilhões. Essa tarefa não é politicamente viável.

Se Temer vier a assumir a presidência da República, a ideia será, portanto, a de executar um programa de ajuste que resgate a capacidade do setor público gerar superávits, mas de forma gradual. Em vez de prometer equilíbrio das contas já em 2017, o que não seria crível para o mercado, o programa de Temer apontaria superávit primário para 2019 ou 2020.

A execução de um programa de ajuste crível, por uma equipe econômica com credibilidade, promoveria um choque de confiança que ajudaria a retomada do crescimento. O aumento da atividade econômica resultaria em mais receitas tributárias, o que fortaleceria o equilíbrio das contas públicas. Essa é a estratégia que parece estar sendo delineada pelos assessores mais diretos de Temer.

Para demonstrar o espírito de austeridade que pretende imprimir ao seu governo, o vice-presidente estaria disposto a reduzir os atuais 32 ministérios para cerca de 20 e fazer um corte substancial nos cargos comissionados. A economia com essas medidas é pequena, mas os assessores de Temer acham que elas teriam um valor simbólico importante neste momento.

Para dar certo, a estratégia de ajuste gradual das contas públicas precisa, no entanto, ser acompanhada de medidas concretas que fortaleçam as expectativas favoráveis geradas inicialmente. Só terá futuro um plano que diga para a sociedade o que o governo vai fazer para evitar o aumento continuado das despesas obrigatórias, em ritmo maior do que o crescimento da economia.

Entre as medidas que estão sendo discutidas pelos assessores mais próximos do vice-presidente estão, de acordo com os relatos da imprensa, a desvinculação das verbas orçamentárias, desindexação dos gastos sociais da variação do salário mínimo, a reforma tributária, a flexibilização do mercado de trabalho e a reforma da Previdência Social, com o estabelecimento da idade mínima para a aposentadoria.

Todas essas mudanças necessitam de amplo apoio político, que o vice-presidente terá que garantir. Ele não conseguirá fazer isso sozinho. Como ocorreu com o Plano Real, executado no governo de outro vice-presidente que substituiu o titular também por causa de impeachment, somente com apoio das principais lideranças políticas do país será possível executar um programa que reequilibre as contas do setor público brasileiro. Esse é um desafio que terá que contar com a ajuda de todos.