O Globo
Governo eleito precisa entender o resultado
apertado do segundo turno
As manifestações golpistas em diversas
capitais, em frente a prédios do Exército, são consequência não de supostas
fraudes eleitorais, que não aconteceram, mas da tentativa permanente do
presidente derrotado de virar a mesa durante todo o seu mandato. Ao demorar
quase 45 horas para se pronunciar sobre o resultado da eleição, e ao fazê-lo de
maneira estudadamente cifrada para permitir que seus seguidores mais radicais —
os que estão nas ruas pedindo intervenção militar — entendessem que estimulava
suas ações antidemocráticas, Bolsonaro alimenta o ambiente conturbado desde o
início de seu governo.
Sabe-se que, mais uma vez, foi preciso
muita insistência para que o presidente moderasse o palavreado em seu
pronunciamento, suficiente para que a transição democrática fosse iniciada com
o reconhecimento do resultado, ao agradecer os 58 milhões de votos que recebeu
no segundo turno. Meias-palavras ditas de má vontade, que precisaram ser
interpretadas por uma nota oficial do Supremo Tribunal Federal (STF), que as
tornou a aceitação oficial do resultado da eleição.
Tão sibilino foi no seu pronunciamento de dois minutos — para quem falou apenas 15 minutos na tribuna mundial da ONU, até que foi muito —, que teve de pedir explicitamente numa live que os caminhoneiros desobstruíssem as rodovias. Mas voltou a dar força para as manifestações que aconteceram, endossando indiretamente a palavra de ordem que as dominou, o pedido de intervenção militar.