Raymundo Costa | Valor Econômico
Entrevista com o cientista político Murillo Aragão
BRASÍLIA - De um posto privilegiado em Brasília, o consultor e advogado Murillo Aragão faz uma espécie de necropsia do PSDB e prevê dias difíceis para Geraldo Alckmin e os tucanos na campanha presidencial. "Quando o centro precisou, o PSDB titubeou", diz Aragão, e observa que isso abriu uma avenida para novos postulantes como Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Henrique Meirelles (PSD-GO). "A base de apoio no Congresso não julga que deve ser solidária com o PSDB porque a recíproca não é verdadeira".
Todos os eventos políticos recentes foram seguidos "por dentro" pelo advogado, que assentou praça no centro nervoso da política em 1982. Aragão entende que o PT perdeu tempo ao não criar alternativa para Lula, que tem história para contar, mas pode não sair candidato. Ele não se preocupa com a autofagia entre os candidatos governistas e acha até que aumentou a chance de aprovação da reforma da Previdência.
"Quando o centro precisou, o PSDB titubeou"
O ritmo frenético da política congressual voltou a Brasília, após o longo inverno dos governos do PT, que pouco ou quase nenhuma importância davam aos demais partidos, sobretudo àqueles situados do centro para a direita. Desde a reeleição de Dilma Rousseff, em 2014, ocorreu o impedimento da presidente e seu sucessor, o vice Michel Temer conseguiu salvar o pescoço em duas sessões de tirar o fôlego da Câmara dos Deputados, sem falar de episódios com a destituição e cassação do mandato do ex-deputado Eduardo Cunha, as tentativas de "estancar a sangria" da Lava-Jato e a votação e não votação das reformas.
Todos esses eventos foram acompanhados "de dentro" pelo advogado Murillo Aragão, que assentou praça no centro nervoso da política em 1982 e transformou a Arko Advice numa das principais empresas de consultoria do país. Aragão, dono de uma carteira de quase 100 clientes, entre os quais uma dezena que frequenta o topo do PIB, disfarça, mas algumas vezes esteve no centro dos acontecimentos não só como observador, mas também como protagonista. Os principais telefones do Palácio do Planalto estão na sua agenda.
Desse posto privilegiado, Aragão faz a necropsia do PSDB, partido que em princípio deveria liderar o centro político, e prevê dias difíceis para o governador Geraldo Alckmin e os tucanos na campanha, o que abriu uma avenida para novos postulantes como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles (PSD-GO). "Quando o centro precisou, o PSDB titubeou", diz. "A base de apoio no Congresso não julga que deve ser solidária com o PSDB porque a recíproca não é verdadeira".
Ao contrário de Jair Bolsonaro, todos os pré-candidatos do centro têm uma narrativa para sustentar suas candidaturas. E Temer não deve ser esquecido. Aragão entende que o PT perdeu tempo ao não criar uma alternativa para Lula, que tem uma história para contar, mas pode não sair candidato. Ele não parece preocupado com a autofagia entre os candidatos governistas e acha até que melhoraram as possibilidades de aprovação da reforma da Previdência, provavelmente em março. "Interessa a todos os presidenciáveis".
Abaixo, trechos da entrevista que Aragão concedeu ao Valor, na tarde de terça-feira:
Valor: O fato de tantos pré-candidatos estarem busca do centro político não é significativo de que o centro não tem candidato nenhum?
Murillo Aragão: Naturalmente, o centro deveria ser liderado pelo presidente da República, que representa a nova maioria que assumiu o governo após o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Essa é uma realidade que decorre de um governo que, ainda que impopular, é politicamente operacional e tem uma base mais majoritária dentro do Congresso. Pode-se questionar, com uma nota de rodapé, se a base é suficiente para aprovar a reforma previdenciária ou não. Mas ela é uma base majoritária.
Valor: Se o presidente não lidera, alguém deveria liderar.
Aragão: Em decorrência dessa situação do presidente, o PSDB, que sempre foi o polo preferencial da disputa contra o PT, nesses últimos anos, teria que ter um entendimento com o presidente com vistas a sucessão. Isso seria o segundo desdobramento. O primeiro desdobramento é que condução do processo é do presidente, porque o presidente tem maioria na Câmara e lidera um governo que está bem posto, ou que está posto. Dois, como tradicional polo de oposição ao PT, o PSDB tem também uma certa primazia, o natural seria que houvesse uma entendimento entre esses dois polos.