quarta-feira, 3 de abril de 2024

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Acusação contra Moro desafia a lógica e a realidade

O Globo

Relator do processo de cassação do senador não encontrou motivo para desprezar o voto de quase 2 milhões

O senador Sergio Moro (União-PR), eleito com quase 2 milhões de votos, cometeu diversos erros em sua carreira como juiz da Operação Lava-Jato e como político. Mas as falhas da Lava-Jato nada têm a ver com o processo que ele enfrenta na Justiça Eleitoral. Nas ações do PT e do PL pedindo a cassação de seu mandato, as evidências apresentadas desafiam a lógica e a realidade dos fatos.

Moro é acusado de gastos excessivos, caixa dois e uso indevido dos meios de comunicação na pré-campanha de 2022. No início daquele ano, ele tentava viabilizar sua candidatura à Presidência pelo Podemos. Por falta de recursos da legenda para sustentar uma campanha presidencial, migrou para o União Brasil. No novo partido, seu nome foi deixado de lado. Decidiu então concorrer a deputado federal por São Paulo. Sem conseguir provar domicílio eleitoral no estado, optou por disputar uma vaga ao Senado pelo Paraná.

Martin Wolf* - Democracia é melhor que autocracia

Valor Econômico

Seria realmente uma coincidência todos os países ricos do mundo, com exceção de alguns com recursos naturais abundantes, serem democracias liberais?

Na semana passada, discuti o estado precário da democracia em webinário organizado por uma organização de mídia indiana. Depois de minha apresentação, uma pessoa do público perguntou por que os indianos deveriam ter qualquer interesse na democracia. Não seria uma ideia do Ocidente imposta ao restante do mundo? Os países em desenvolvimento não estariam em melhor situação com autocracias tradicionais?

Fiquei ao mesmo tempo perturbado e satisfeito com a pergunta - perturbado porque quando um membro da elite com ensino da Índia a faz em um fórum público, ela revela alguma coisa, mas satisfeito porque sei que muitos outros também a estão fazendo neste momento, e não apenas em países em desenvolvimento. O poder de atração da tirania está crescendo.

O relatório Freedom in the World 2024, de um centro de estudos independente, a Freedom House, assevera que “a liberdade global diminuiu pelo 18º ano consecutivo em 2023”. Nos últimos dez anos, houve um grande declínio nos direitos políticos e civis em muitos países em desenvolvimento. Sob o governo de Narendra Modi, a Índia é, infelizmente, um desses países.

Fernando Exman - Luz que entra pela fresta da janela partidária

Valor Econômico

O que está em jogo, além do pleito municipal deste ano, é o tabuleiro de 2026

Governo, oposição e Centrão intensificam as articulações nesta reta final da janela partidária. A fresta se fecha na sexta-feira (5), e dela surgirá uma nova correlação de forças políticas. O que está em jogo, além do pleito municipal deste ano, é o tabuleiro de 2026.

Os parlamentares foram para seus redutos eleitorais com um novo tipo de arma a tiracolo: o poder de barganha que ganharam com a crescente impositividade das emendas ao Orçamento. Nas contas de um especialista, dependendo do Estado do parlamentar, um deputado federal pode ter neste ano de R$ 50 milhões a R$ 68 milhões para destinar a projetos por meio de emendas individuais e de bancada. É muita coisa. E isso sem falar nas emendas de comissão, cuja liberação depende de um acordo com o governo ou a derrubada do veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Orçamento.

Mas, além das articulações no varejo, existem os acertos mais amplos. E estes dependem das estratégias dos partidos.

Luiz Carlos Azedo - Pacheco sobe o tom contra governo nas desonerações

Correio Braziliense

Um Congresso de maioria conservadora tem a tendência de reduzir impostos e forçar o governo a enxugar gastos; no nosso caso, o gasto migra para os parlamentares

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), fugiu ao seu estilo mineiro, nesta terça-feira, e disse que a medida provisória do governo que reonerava as folhas de pagamento de empresas e municípios “só gerou atraso e instabilidade”. Pacheco respondeu a declarações do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que se disse surpreso com a decisão do presidente do Senado. Nos bastidores, a equipe de Haddad qualificava a decisão como “susto” e “pancada”.

Ao mesmo tempo em que Haddad se dizia surpreso, Pacheco reiterava de público que o governo sabia do posicionamento do Senado contrário à reoneração. E que havia avisado também que o assunto não seria resolvido por medida provisória, como pretendia o governo. As medidas provisórias têm vigência imediata de seis meses, mas precisam ser referendadas pelo Congresso para não perderem a validade.

No governo, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, segundo Pacheco, estava informado da sua decisão. De certa forma, o susto e a surpresa de Haddad revelam falta de comunicação entre a equipe econômica e o Palácio do Planalto. Para o presidente do Senado, não existe constitucionalidade na medida provisória que revogava uma lei promulgada pelo Congresso, a da desoneração. Cerca de 3 mil prefeituras estão sendo beneficiadas, num ano em que prefeitos e vereadores pressionam intensamente o Congresso.

Lu Aiko Otta - Seletivo, um tributo em atitude suspeita

Valor Econômico

Jogo de pressões para obter tratamento tributário privilegiado está só começando

Em meio à refrega travada pelo governo para ajustar as contas públicas primordialmente pela via do aumento das receitas, circula no mercado o receio que o Imposto Seletivo, criado na reforma tributária aprovada em 2023, venha a ser utilizado como um reforço da arrecadação. É um receio infundado, segundo afirmou fonte da área econômica à coluna.

Esse temor surge num contexto de gastos crescentes por parte do governo, apontou a diretora de macroeconomia do banco Santander, Ana Paula Vescovi, no evento “Caminhos do Brasil”, promovido por Valor, “O Globo” e rádio CBN. Num quadro assim, os impostos são os grandes financiadores, observou.

Vinicius Torres Freire - Como sabotar um ano razoável

Folha de S. Paulo

Semanas azedas nos EUA e gambiarras para elevar gasto atrapalham bom início de 2024

O ano começou quentinho na economia. Deu esperança de um crescimento de ao menos 2% neste 2024. Não é grande coisa, mas é melhor do que o frio miserável dos anos de 2017 a 2019, de 1,4% ao ano.

Quem sabe possa ser ainda melhor, como torce o Ministério da Fazenda. Tomara. Pena que, nas últimas semanas, caíram umas gotas d’água nesse chope barato e umas moscas na nossa sopa.

Para começar com uma velha história infelizmente sempre atual, o clima voltou a azedar nas finanças, por causa da economia americana. O dólar foi a R$ 5,06; em dezembro, baixara a R$ 4,83.

Bruno Boghossian - A farra das pré-campanhas

Folha de S. Paulo

Senador pode ser salvo ou cassado por leitura de juízes sobre regras feitas pela metade

Em novembro de 2021, o Podemos alugou um auditório, contratou uma produtora, mandou fazer cartazes e comprou o lanche para a cerimônia de filiação de Sergio Moro. O ex-juiz discursou como pré-candidato a presidente e aproveitou para voltar aos holofotes, meses depois de pedir demissão do governo Bolsonaro.

Um calhamaço de notas fiscais, uma calculadora e um pouco de bom senso jurídico seriam suficientes para esclarecer se aquelas e outras despesas, ainda na pré-campanha, deram uma vantagem indevida a Moro na eleição de 2022. A turma envolvida na ação que corre no TRE do Paraná parece mais afeita a certos contorcionismos.

Wilson Gomes* - O caos do debate público

Folha de S. Paulo

Enquanto isso a política institucional segue seu caminho, em geral pouco virtuoso

São tempos muito tumultuados na política. Estamos quase todos perdidos, patinando em gelo fino, não controlamos sequer o vocabulário da conversa social e brigamos por palavras e designações como em outros tempos, igualmente fatais, lutávamos pela fé verdadeira ou por conquista de terras e riquezas. E quem não se sente confuso há de ser porque deve estar investindo na confusão para faturar com o caos.

Não tenho explicações, só faço mapas. Infelizmente. Mas o que sei da nossa peculiar era política é que uma grande parte do desentendimento acontece por duas razões. A primeira é que o debate público provavelmente nunca esteve tão saturado, com tanta gente falando coisas tão diferentes ao mesmo tempo, o que leva todos a gritarem na esperança de serem ouvidas. O mercado de ideias, na metáfora liberal, virou uma feira superlotada, sob um sol escaldante, com mais vendedores do que compradores, em que todos berram e quase ninguém ouve ou entende.

Vera Rosa – O voto deToffoli para virar o jogo no STF

O Estado de S. Paulo

Ministro é contra descriminalizar maconha e vai citar Anvisa, Congresso e Executivo

Desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) fechou o cerco contra Jair Bolsonaro, aliados do ex-presidente aumentaram o tom do confronto com a Corte. O STF já tem maioria para estabelecer que não existe possibilidade de intervenção militar “dentro das quatro linhas da Constituição”. Além disso, está a um passo de ampliar o alcance do foro privilegiado para autoridades, mesmo que sejam “ex”, o que prejudica Bolsonaro.

A próxima batalha será o julgamento sobre a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal, que mobiliza o mundo evangélico na cruzada contra “demônios” da esquerda e preocupa o Planalto. É justamente aí que entra o ministro do STF Dias Toffoli.

José Roberto Batochio* - Sobre parlamentares e prisão preventiva

O Estado de S. Paulo

Ao plenário da Câmara caberá uma decisão exclusiva acerca da legalidade da prisão, e não prejulgar o mérito das repulsivas ações atribuídas ao deputado Chiquinho Brazão

Aproximavam-se as comemorações do Dia da Independência no ano de 1968, Sete de Setembro em que os militares encastelados no poder exaltavam o golpe de Estado que haviam perpetrado quatro anos antes, quando um deputado do MDBRJ subiu à tribuna para sugerir que nos bailes comemorativos da efeméride as moças não aceitassem dançar com oficiais das Forças Armadas. Acostumado desde abril de 1964 a cassar mandatos e suspender direitos políticos de parlamentares por meio dos Atos Institucionais (AI) 1 e 2, então já sem validade, o governo dobrou-se à Constituição vigorante, e a Procuradoria-Geral da República requereu ao Supremo Tribunal Federal que se instaurasse processo para cassar o mandato de Márcio Moreira Alves.

A Carta democrática de 1946 estabelecia, no art. 45, que os membros do Congresso Nacional não poderiam “ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente, sem prévia licença de sua Câmara”. Em votação histórica, a 12 de dezembro de 1968 a Câmara negou trânsito ao processo contra Moreira Alves, por 216 a 141 votos e 12 abstenções. Apesar de heroica, foi uma vitória de Pirro, pois no dia seguinte o comando militar desfechou autogolpe, proclamou seu quinto e mais truculento ato institucional, fechou o Congresso e cassou o mandato do deputado, suspendeu garantias fundamentais, institucionalizou a censura à imprensa, além de outras inomináveis arbitrariedades.

Vera Magalhães - Para selar pacto, Lula tem de cumprir acordos

O Globo

O governo tem sido useiro e vezeiro na arte de descumprir todos os entendimentos que sela com o Legislativo

Diante da consumação de mais uma derrota anunciada na relação com o Congresso, o ministro Fernando Haddad (Fazenda) defendeu a necessidade de que haja um pacto entre os três Poderes para o cumprimento da política fiscal. Nada mais justo. Desde que comece pelo óbvio: pacto e acordo são sinônimos, e o governo tem sido useiro e vezeiro na arte de descumprir todos os entendimentos que sela com o Legislativo.

Podem-se falar muitas coisas do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), mas ele tem sido bastante objetivo e direto ao delimitar, nas negociações para a votação da pauta econômica do governo, o que tem condições de passar na Casa que comanda e o que não tem a menor chance.

Textos de propostas, de medidas provisórias a PECs, são discutidos item a item em reuniões na residência oficial da Câmara e, ainda assim, muitas vezes são alterados com o dedo do governo, até da Fazenda, no Senado, quando não submetidos a vetos de Lula depois de referendados pelas duas Casas.

No Senado, a situação não é muito diferente, a não ser porque Rodrigo Pacheco (PSD-MG) tem demonstrado até mais boa vontade com os desacertos da articulação política da gestão Lula. Basta pegar o exemplo da Medida Provisória 1.202, que Pacheco acaba de revogar em parte.

Bernardo Mello Franco – O passado é teimoso

O Globo

O Supremo Tribunal Federal adverte: a Constituição não autoriza militar a dar golpe de Estado.

A Corte formou maioria para dizer o óbvio. As Forças Armadas não podem romper a legalidade a pretexto de defender a ordem ou arbitrar disputas entre os Poderes.

A discussão parece bizantina. E é. Mesmo assim, foi levantada por uma leitura distorcida do artigo 142. O texto tem sido usado, nos últimos anos, para defender um golpe camuflado de “intervenção militar”.

O ministro Luís Roberto Barroso definiu a tese como “terraplanismo constitucional”. “Em nenhuma hipótese, a Constituição submete o poder civil ao poder militar”, escreveu, em decisão de 2020.

Sete ministros já votaram no julgamento em curso. Todos rechaçaram a tentativa de espremer a Carta para arrancar o que ela não diz. Nem André Mendonça, nomeado por Jair Bolsonaro, ousou endossar o golpismo.

Elio Gaspari - A tragédia de Sergio Moro

O Globo

Seja qual for a decisão do TRE, a corrupção ganha

Está em curso o julgamento do processo que poderá terminar na cassação do mandato do senador Sergio Moro. Se ele for condenado, a corrupção ganha porque o símbolo da maior operação de combate à corrupção da História nacional foi apanhado em malfeitorias eleitorais. Se for absolvido, a corrupção também ganha, porque, tendo cometido ilegalidades, saiu inteiro.

A situação parece absurda, mas segue uma lógica demonstrada na segunda metade do século passado pelo economista sueco Gunnar Myrdal. Leis complexas e ambíguas são produzidas pelo Estado e por burocratas para preservar a prática da corrupção.

Passados dez anos, no Supremo Tribunal Federal descostura-se o manto de moralidade da Operação Lava-Jato. Confissões são desconsideradas, e multas são congeladas. Em poucas palavras, no cumprimento de leis complexas e ambíguas, o jogo virou.

Zeina Latif - O Brasil continua perdendo muitas oportunidades

O Globo

Fizemos importantes lições de casa na área externa, mas o desafio ainda é grande

Desde 2007, o Brasil é credor líquido em dólar, o que significa ter reservas internacionais (atualmente em US$ 355 bilhões) superiores à dívida externa (US$ 344 bilhões). De um lado, um país que conquistou o posto de grande exportador de commodities, setor que também atrai muitos investimentos. De outro, o trabalho do Banco Central (BC) de adquirir as divisas geradas e, assim, construir um colchão de segurança para o país.

Apesar de a aquisição das reservas ter sido feita com recursos da emissão de dívida pública interna, e não com recursos orçamentários da União, ela permitiu o país superar a chamada “vulnerabilidade externa” do país, que se referia à elevada sensibilidade a choques externos. Sacudidas no mundo, com elevações de juros internacionais ou crises de liquidez, produziam alta forte do dólar, por conta dos elevados compromissos externos, em um contexto de dificuldade para se contrair mais dívidas.

Poesia | Quadrilha, de Carlos Drummond de Andrade

 

Música | Alcione, Zeca do Trombone, Leci Brandão - O Morro não tem vez (Tom Jobim, Vinicius de Moraes)